15 julho 2005

Não percebo...

Estava eu decidido a comentar o postal que transporta o artigo do Dr. António Cluny, quando dei conta que era trabalho inglório. São tantos e tamanhos os elogios à dissertação, que achei que, por muitos e bons que fossem os argumentos, não colheriam. E, depois daquela história de falar sobre arte, que me demonstrou que estou a ficar senil, acanhei-me ainda mais. Mas há uma coisa que eu não posso deixar de dizer: então o Dr. Arnaldo Matos, lá por ser figura proeminente do MRPP, já não pode ter opinião? E é argumento arremessável vir dizer que o "grande educador da classe operária" é advogado de uma empresa petrolífera? Por quê? Será que as suas palavras seriam mais aceitáveis se ele se limitasse a ser advogado oficioso?

14 comentários:

josé disse...

O Arnaldo Matos tanto pode ter opinião que lha deram, ao convidá-lo para o programa ´Prós & Prós, (no caso, contra os magistrados e demais agentes da justiça e a favor dos suspeitos do processo Casa Pia).

A parte do programa que focou os problemas da justiça foi um requisitório panfletário lançado pelo Arnaldo Matos à boa e velha maneira dos tempos dos murais do PREC ( "nem mais um soldado para as colónias", poderia mudar-se em "PGR, fora"), percursores avant la lettre, dos sound bytes a la Portas e a la Jorge Coelho, os dois cultores mais impressionantes desta técnica rudimentar, mas eficaz, de comunicação.

Assim, ao vituperar e anatematizar o papel do PGR no processo Casa Pia e nas violações do segredo de justiça que toda a gente condena sem saber exactamente porquê e a quem imputar com justeza e certeza, o antigo e actual maoista que afrmou para quem o quis ouvir que não esqueceu nada e nada de novo aprendeu, mostrou algo de misterioso:
Não é inocente a escolha de participantes no programa. Não quero fazer juizes de intenção maldosos sobre a jornalista que o coordena e executa, mas levanta-me a mais séria reserva saber que há "conselheiros" permanentes do programa com um perfil ajustado a certo mainstream de bloco central e que é exactamente o sector da sociedade portuguesa que quer mudanças na Justiça para que tudo fique bem sossegado.
Refiro-me expressamente ao processo Casa Pia e às suas envolvências mais escandalosas que alguns desses próceres através de romagens a S. Bento tentaram já, pelo menos por duas vezes, alterar e impedir certos efeitos que me aprecem também inevitáveis, pois o sol não se pode tapar com peneiras.
Refiro-me concretamente às suspeitas de envolvimento de alguns notáveis nos actos escabrosos denunciados.
É essa parte do problema que não está resolvida e que tem de ser esclarecida. Ou existiram ou não existiram! Esconder e varrer o assunto para debaixo do tapete dos arquivamentos, sem dar crédito nesses casos, dando-o noutros, é que me parece a maior das iniquidades e a maior fonte de problemas para a credibilidade para a justiça.
É este o nó górdio de todos os problemas da Justiça, para certos sectores que nunca se teriam preocupado com ela, não fora este caso abalar com este sistema.

Uma vez a suspeita instalada desta maneira, não há forma de a afastar senão com a maior e mais inteira transparência. Esconder este problema, como o pretendem fazer esses famosos da política e da sociedade, só contribuirá para alimentar o monstro e o fantasma do descrédito que já não é pequeno.
Assim, por este caminho que o Prós & COntras também trilha - e basta atentar nos nomes que já lá foram e nos "conselheiros" técnicos para perceber isso mesmo- iremos dar ao beco onde se encontra a besta!
Não tenho a mais pequena dúvida e é uma questão de tempo.

Primo de Amarante disse...

Caro José: ao se esgrimir (recorrentemente)as próprias suspeitas como argumentos, não estaremos perto do estilo utilizado pela inquisição?!... O que é feito daquele princípio: até prova em contrário são inocentes?!...
Há dias estava em Tribunal e ouvi a advogada do F.T. argumentar com uma acusação. Soube, depois, que essa acusação já tinha sido julgada e o arguido (a referida advogada defendia a parte contrária e, portanto,esteve presente)tinha sido absolvido.E até se sabe, hoje, que absolvição foi feita com inteira justiça. Fiquei não só perplexo como revoltado com a manipulação da citada advogada. Por este andar, onde pararemos!?...
Repare: eu não estou a defender esta ou aquela personagem, mas apenas princípios. Se os princípios são meras retóricas, então terá de estar tudo em causa.
Peço-lhe muita desculpa, mas não resisti a este comentário/desabafo.

josé disse...

E fez muito bem, porque o assunto é de extrema delicadeza e suscita muitas reservas e perplexidades.

Mas como escrevi, não há forma de tapar o sol com uma peneira. No caso, as suspeitas foram lançadas ao vento e não se deve esperar que seja a força eólica que as afaste...
Se essas suspeitas fossem veiculadas por tolos, deveríamos todos fazer orelhas moucas. Mas não foram!
E assim, permanecerá encerrado em arcas encoiradas tudo aquilo que não deveria estar.
A pacificação social de muitos sectores esclarecidos da sociedade portuguesa só ocorrerá quando tudo ficar e estiver esclarecido em termos aceitáveis. Não está a té agora e o que sinto é que há muita gente que por boa fé ou por comprensível atavismo ligado a preconceitos derivados de clubismo político-partidário tende não só a absolver " os nossos" como a nem sequer a dar o mínimo crédito a quem possa colocar em dúvida tal "certeza", pelo simples facto de que tal "não pode ser".

Ora este " não pode ser", por ser aquilo que não pode, é negativo para qualquer espírito livre e que aceite como útil a discussão de assuntos , incluindo os que são tabu.

Quem não está por dentro do processo, tende a dvidir-se entre os que afastam à partida toda e qualquer suspeita "porque não pode ser" e aqueles que se reservam as suspeitas, mas não ficam esclarecidos.

Há um meio de dar volta a isto? Há!
Maior transparência e abertura do segredo de justiça.Isso significa abrir uma caixa de Pandora? Não sei.Se calhar não. O contrário, sei-o , significa manter caixas encoiradas, com tudo o que de negativo isso traz.

Percebo onde quer chegar e as reservas que isto lhe suscita.
Mas entenda que desta discussão também pode sair alguma luz.

Agora tenho alguma pressa, mas voltarei com todo o gosto e disponilibidade ( e boa fé também) à conversa se assim achar por bem.

M.C.R. disse...

Ora vamos lá: eu não me importo muito com as opiniões do dr Cluny, tanto mais que já lhe ouvi muitas e diversas. Gostaria apenas de relembrar ao referido cavalheiro que o dr Arnaldo de Matos tem um passado enquanto no dr Cluny não vejo, sequer, especial futuro.
Em 2º lugar também eu, que devo ser fascista ou algo no género, não estou assim tão convencido da bondade das greves num orgão de soberania.
Mas como ainda não reflecti tanto quanto deveria, não me custa aceitar como boas as razões dos que a acham legítima.
Todavia só um reparo: não venham mais tarde os senhores magistrados e os senhores juízes querer, como querem continuamente, especial deferência por parte dos outros restantes e comuns cidadãos.
Aquilo que seria "l'honneur et servitude..." dos magistrados acaba. Para sempre!
E penso que o dr Cluny (e os seus mais obnubilados defensores) ainda não entendeu isto. Ou entendeu mas como bom português achará que se encontrará uma solução para manter os privilégios e ganhar mais uns direitos...
E penso que há muito bom operador da justiça que se toma por Zorro ou pelo justiceiro de Bengala.
E penso que os métodos expeditos e inquisitorais são isso mesmo: expeditivos e inquisitoriais (de inquisição grotesca e peninsular, caros amigos, repito: grotesca e peninsular)
E façam-me a fineza de não me virem dizer que o que digo é só porque na Casa Pia há peixe graudo, financeira e politicamente falando.
Na Casa Pia tem havido um inenarrável rumor que vem de todos os lados. Repito de todos os lados, mesmo daquele que agora põe prcessos por via do segredinho de justiça.
Um pouco de pudor, valha-nos Deus!
Caro Carteiro: nem sempre estamos de acordo mas que as mãos não lhe esmoreçam.

Um abraço

josé disse...

Ah! uma boa e bela polémica em perspectiva, agora que se prepara o tempo estival de algum repouso!

Por partes:
1.Sobre o Cluny, nada a dizer, uma vez que ainda guardo certas reticências, mas que o escrito é valeroso, lá isso é! Arranjar um paralelo com a situação italiana a propósito da autonomia e até da independências das magistraturas é assunto mais do que candente-determinante para a vivência em democracia. Foi isso que disseram A. Spataro ( basta fazer uma busca no Google para ver quem é o prestígio que traz consigo), Orlando Afonso e um espanhol que falaram no Estoril há uns meses atrás e onde Cluny também meteu uma "bucha" sobre os meios do DCIAP e afins, reportando-se a promessas que vêm de 1987!
Muita gente pensa que as magistraturas são um corpo unido e tipicamente corporativo ( et pour cause). Não penso assim e não é por cegueira voluntária ou até involuntária, parece-me.
O corporativismo faz-se sentir muitas vezes nos Conselhos superiores a propósito de assuntos de natureza disciplinar, mas nestes assuntos fundamentais sobre princípios, não me parece que assim seja.
Até acho estranho que as pessoas esclarecidas não se interroguem sobre a justeza dos argumentos dos magistrados e tendam a desvalorizá-los, em favor dos do governo quanto se torna evidente que o governo se puder cerceia a autonomia e a independência, porque é natural que o faça. O poder executivo, se não for fiscalizado por quem de direito, incluindo a instância judicial através do controlo da legalidade e acção penal e cível contra a ilegalidade, toma o freio nos dentes.
Alguém duvida deste saber comum?!
Então porque desmerecem nos propósitos dos magistrados quando reivindicam a garantia de autonomia e independência?! Estas garantias são principalmente para o povo que somos todos nós e em nome do qual se faz justiça.
O parti-pris contra os magistrados advirá dos privilégios...mas que privilégios, santo deus?!
O vencimento?! Give me a break! A irresponsabilidade dos juizes?! É um mal necessário! A tendência inquisidora do MP? É inevitável, mas pode e deve ser controlado e desbastada.

Mas não me venham com o discurso da desconfiança sobre a magistratura, generalizando e apropriando também um sentimento difuso contra quem tem o dever estrito de investigar crimes; ser incómodo para os poderes por inerência da função e tornar-se uma espécie de controleiro da democracia.
O poder judicial é um poder que não merece ser aviltado, como o está a ser por este inenarrável Alberto Costa, himself, pois o problema aqui é estritamente pessoal. Se fosse o António Costa as coisas seriam um pouco diferentes. Se fosse o Alberto Martins, da mesma área e sensibildiade talve fossem diferentes. Se fosse outro qualquer o problema por-se-ia em moldes diferentes. Agora, este?! COm o historial que traz de Macau? Com a entrevista que deu no 10 de Junho? Com isto tudo em cima do currículo?!

Sobre a casa pia e adjacências, espero pela resposta do caro compadre...

josé disse...

Caro compadre:

Para discutir princípios sobre justiça, teremos de voltar ao princípio.
Nestes assuntos da justiça formalizada pode co-existir aquilo que a física quântica explica em relação aos electrões: uma dada realidade de facto pode estar em dois ou mais sítios ao mesmo tempo!
Se os electrões podem, porque não nós mesmos que também somos feitos dessa matéria?
Há quem explique ( ver o último número da revista Discover) que o segredo jaz no fenómeno da gravidade.
O paralelo é muito interessante, pelo seguinte:

Peranto um facto real, passado, por exemplo, um abuso sexual de algumas crianças ou jovens, ocorrido verdadeiramente e contado pelas vítimas como tal, pode apresentar-se um quadro analítico susceptível de compreensão segundo os critérios da física quântica.
A realidade pode coexistir em dois locais ao mesmo tempo: uma, é a realidade do facto; outra, a realidade do facto aferida em termos processuais e que pode negar aquela; uma outra ainda é a realidade do facto definida em termos de julgado transitado e que pode muito bem ser aquela ou aqueloutra.
A realidade é só uma? Parece-me bem que sim!
Então porque se desmultiplica e ás vezes uma não demonstra a existêncida da outra? Por causa da "gravidade"!
Porque há realidades que não se querem nem podem assumir como tal, son pena de o mundo cair em cima e virar de pernas par o ar e por isso, negam-se como se fossem virtualidades inventadas por vítimas mentirosas; testemunhas falsas e frutos de cabalas diversas.
Perante esta interpretação, as leis da física quântica explicam que um electrão pode estar em dois sítios ao mesmo tempo, mas a realidade visível nega-nos, até agora, a possibilidade de nós próprios podermos ser ubíquos integralmente ou mesmo tornarmos ubíquos os objectos que nos interessem.
A questão parece tornar-se por isso um problema de tempo, dinheiro, sorte e génio para descobrir o segredo da matéria.

Tirando esta analogia( e bricadeira até certo ponto), o problema da realidade factual e a verdade processual, continua por discutir e analisar.

Lá iremos, porque a seriedade do princípio do in dubio pro reo, não pode servir para encobrir malandros que por força do virtuosismo processual e outras manigâncias legais, se ocultam e tornal virtualmente inmputáveis.

M.C.R. disse...

Meus Caros Amigos
deixo ao compadre a argumentação ética porquanto parece-me que está a ir muito bem, pesem embora algumas discordãncias que não afectam os princípios.
Também não quero retirar mérito (e muito!, mas já nos vamos habituando á qualidade dos pontos de vista de José),
todavia:
os poderes caríssimo José, em democracia convivem dentro de parâmetros de saudavel guerrilha. e isto já foi anunciado por esse admirável Montesquieu que Deus tenha.
Não sei se foi o churchill que deu aquela famosa definição de democracia mais ou menos como "o pior dos regimes mas o único suportável". tenho por mim que o velho leão queria referir-se a isto mesmo ou pelo menos ao duelo executivo/legislativo,
E agora, V. virá, ferina mas mansamente, dizer-me: mas o judicial não é habitualmente refeido nestas trocas de galhardetes. O mundo do jurídico não é deste reino (ou vice-versa).
Ora bem: é sim senhor! Tem andado disfarçado, ou andou disfarçado porquanto a sociedade em que se movia era glauca, pouco transparente e não havia estas modernices: televisão, blogues, e-mailes, telefones, escutas, enfim esta fogachada toda que já transformou o mundo, o nosso, o único, num universo orwelliano.
O crime agora é mais visivel, mais reprovável. a democracia "democratizou-o", massificou-o. As Nurembergas e os tribunais de Haia ornaram o eco do crime mais ruidoso do que o próprio crime.
E os agentes judiciais ou judiciários aumentaram, foram recrutar-se a todas as classes, entraram na luta de classes. É a vitória de Marx, meu caro José!
Tem 30 0 u 40 anos esta ideia de uma "nova magistratura" encarregada pela sociedade organizada atrás dos mass média, duma cruzada contra o inimigo que está em toda a parte. O crime é uma pandemia.
Todavia, como ensinava o barbudo de Trier, se as infra-estruturas sociais mudaram o mesmo não se passou ( ou não se passou tão paralelamente) com as super-estruturas, com o produto dos nossos cerebrozinhos de homo sapiens sapiens, com a nossa "Weltanschauung".
eu, por exemplo, ainda tenho do professor primário aquela ideia antiga e boa dum portador da nova luz, de um "intelectual orgânico" (para citar Gramsci -Esta é para lhe responder ao Sparatto, viu? -) de uma mítica classe operária ou enfim de uma mitica massa popular que não tem quem lhe enuncie os objectivos que ela própria segrega.
só que...já não existem esses professores mas tão só umas criaturas que bem ou mal se encarregam de ensinar a "soletra" áos anjinhos do lar por pouco e mau dinheiro. Se fosse o Vasco Pulido Valente, diria que as criancinhas alunas e ps pais que as pariram desprezam profundamente estes proletários da educação que por sua vez também não têm especial consideração pela sua missão e pelo rebanho de que cuidam. claro que há excepções (o compadre há-de dizer-mas todas...) mas i meu retrato não é assim tão mal tirado.
Saindo desta curva pelos senhores professores passemos à "augusta classe" dos "becados" (E convenhamos que togas e becas são de um ridiculo atroz e dão tão pouco geito quannto uma capa e batina de estudantaço acoimbrado). Também já não são os filhos família da classe média alta que recorriam a este ofício depois dos dois manos mais velhos terem ido respectivamente para padre e militar (ora aí estão mais duas profissões derenraizadas, atiradas para uma espécie de lumpen-Welt...). Pior este mundo começa a estar cheio de mulheres, sinal evidente não só de democracia mas sobretudo de proletarização. (Quem tem unhas e oportunidades vai para gestão e cria negócios fantásticos, começa modestamente por um BMW série 3 e ja foi às Bahamas... e obviamente não vai a torremolinos, claro!)
O mesmo aliás de passa com a advogadagem por onde saltariquei até 74. Era gente séria, engravatadíssima, conheciam-se todos, eram "notáveis". Até sabiam escrever!...
Agora mal se distinguem dos clientes ou distinguem-se porque o cliente pode ter melhor aspecto.
Está V a ver onde quero chegar?
Há ainda uma aura, uma suspeita de privilégio (eu não falei em ordenados, caríssimo José. Por cá é tudo mal pago embora, e voltando a Orwell, há uns mal pagos mais mal pagos. V. sabe quanto é que ganha líquido um assesssor principal do último escalão ( o mais alto posto da FP? ) 1950 euros, José, posso mandar-lhe o recibinho, caso não acredite. E é aqui -ou devia ser aqui - neste grupo de pobretes mas alegretes que se recruta o pessoal dirigente. Os que com uma assinatura podem dizer sim ou não a um negócio gordo, de milhões.
Portanto e voltando ao seu, apesar de tudo, bastante razoável grupo profissional: as coisas mudam, o mundo muda e voc~es, como eu de resto ( ou não porque sou mais jogador de bridge e cínico

M.C.R. disse...

...como repararam deixei a frase a meio. A querida Kamikaze deve estar a torcer-se de gozo porque de facto, com um elegante toque de dedinho esquerdista e esquerdalhão, atirei tuso para sei lá onde. Mas eu volto á carga, que também sou teimoso como uma mula alentejana (de Niza se faz favor, e com mesa posta no Fialho...)
...estava a dizer que os tempos e os modos mudaram. Mais os primeiros que os segundos, confesso. E isso traz-nos para o senhor dr Cluny e a sua veemência sindical. Ele pelos vistos cita a Itália. Cita é pouco, pouquinho, quase nada. A Itália, de que o dr Cluny fala não existe. Ou existe de outra maneira. Lá, aquilo não é a feijões. Volta e meia há um juiz morto, vários até, se a memória não me atraiçoa. E o governo italiano, e esse "admiravel " Berlusconni (que tera passado pelo Marco de Canavezes e pela Madeira, para trocar algumas impressões com as locais autoridades políticas...)quando pode arreia forte e feio na magistratura. Lembram-se da operação "mani pulite"? Que é que foi feito dela?
Mas se a Itália não serve, servirá a França? Os petits juges de instrução e os políticos... Ou a história monstruosa daquele processo em que se inventou toda uma rede pedófila, cujo juiz ainda hoje se passeia calmamente. Ou a daquele conservadoríssimo Dominique Baudis (forte cretino...) a quem uma putéfia de bar de 2ª acusava das piores vilanias, que viu a carreira destruída, o nome na merda, e que foi salvo, isto é o cúmulo!, pelas gravações de vigilãncia da Assembleia Nacional?...
Este cidadão que vos está aqui a chatear tem no pequeno grupo dos seus amigos, um largo par de magistrados pelos quais arriscaria o pescoço. Sabe quem eles são, como são, e quão sãos são. Julga em conformidade que, não tendo estas amáveis criaturas três olhos nem aura á volta do crânio, que eles representam, talvez com mais um pózinho de virtude, a classe dos magistrados e juizes (uma vez por todas unidas aqui por minha inteira responsabilidade). Mas igualmente pensa, e morrerá nesse estado agónico que nesta poalha ora levantada com casas Pias, Souto de Moura, escutas, processos e férias judicias (e subsídios de renda de casa...) anda muita mistura. É tempo, para quem tiver coragem, de limpar as estrebarias de Áugias.
Se deve ser o Alberto Costa ou o Alberto Martins pouco se me dá: os dois são "albertos". E políticos...exactamente como muitos que se dizem "não políticos" mas que aabam fazendo política. Ou seja, anda por aí muito magistrado que poderia representar Moliére: monsieur Jourdain de preferência...
e desculpem lá qualquer coisnha...

o sibilo da serpente disse...

Pois, caro José, o Arnaldo Matos tem direito à opinião porque a RTP lhe deu. Mas, pelos vistos, se a coisa estivesse na mão do MP, às tantas não tinha...

o sibilo da serpente disse...

Ah, já agora: e se Arnaldo Matos estivesse a favor dos magistrado e contra o suspeito da Casa Pia? Já teria mais direito de opinião? Como sabe, nisso sou insuspeito: em todas as intervenções públicas que tive sobre a matéria tentei sempre, ainda que com prejuízos naturais, defender os magistrados contra juízos de valor que entendi precipitados sobre a actuação das magistraturas.

M.C.R. disse...

Ó mana, isso sim é que é ser mesmo uma irmã. Um bom restaurante a sul de Nisa (terra do meu avõ materno e perdição da minha mãe, qu lá passava belas temporadas...). Eu vou a todas, finesse ou "grossesse" (ah, ah, bom trocadilho à portuga antigo e analfabeto..) e se citei o Fialho é porque o conheço de há muito, ha tanto mesmo que lhe perco a conta. A coisa começou em tom simples bom abundante e a bom preço. Agora custa uma nota preta mas que quer V? Eu sou cão que conhece dono? em me tratando bem, ali estou, batidinho, pronto para tudo.
O molho de coentros deve ser coisa de arrebimba o malho...v. não terá por aí a receitinha?
quando precisar de informações sobre o Porto e peixe, bom e barato não hesite...
E finalmente: obrigado por achar que a nossa conversa tem alguma qualidade. É isso que torna confortavel este blogue: a malta consegue ainda conversar como pessoas de bem. Só por isso mereçemos, todos, o Fialho, a Regata o Portucale ou o Tavares que são sítios feitos para gente civilizada.

Primo de Amarante disse...

Caro José: não sou imaginativo e, por isso, não estou preparado para debates, onde não entenda os nexos entre as premissas e as conclusões. Tenho, como costumam dizer os juristas, a minha jurisprudência sobre as questões da justiça. E claramento devo dizer o seguinte: penso que funciona mal, a desoras, muito fechada sobre o seu próprio sistema, com certa arrogância e em roda livre. Sem a credibilização da Justiça não é possível desenvolver qualquer capital social de, por exemplo, um desígnio nacional. Também não é possível que outras instituições funcionem.
No meu entender, é necessário aplicar à avaliação deste sistema o mesmo processo que é aplicado à avaliação das questões da bioética.
Só ganhava o sistema da Justiça, se o seu funcionamento e a avaliação dos seus agentes fosse feita por comissões interdisciplinares (representantes dos magistrados, das universidades - direito, sociologia, psicologia -, dos advogados, do observatório da justiça,etc.etc, - com poderes de intervenção. Estas comissões, tal como as comissões de bioética, deveriam ser de reduzida dimensão para não desenvolverem no seu seio os vicios da retórica. Haverá quem diga que tais comissões poriam em causa a independência dos Tribunais. No entanto, é meu entender que, hoje, a independência tem de ser vista em função da avaliação de posturas,práticas, saberes, competências e rigor e não no garantir um rótulo para uma pseudo-autonomia (porque entregue ao "zelo" dos que no sistema têm mais poderes e, por isso, eventualmente mais interessados em manter esse privilégio). Numa sociedade muito complexa, como é a sociedade do conhecimento e da informação, tudo está ligado a tudo e, sendo assim, não há sistemas que possam funcionar bem entregues a si mesmos.O zelo da independência tem de ser garantido por múltiplas perspectivas interessadas em contruir avaliação objectiva. Temos de ter uma visão holistica do funcionamento dos sistemas e esse caminho vai acabar por se impor mais cedo ou mais tarde. Sei que não concordam comigo, mas é o que eu penso.Naturalmente, vâo-me falar no Conselho Superior de Magistratura, na forma como funcionam as inspecções, etc., etc., Mas o problema de leis mal feitas, da celeridade dos processos, da prescrição dos mesmos, do que se ouve nos tribunais e das criticas que aqui são colocadas de forma directa ou indirecta ao próprio processo de avaliação e promoções fica claro que o sistema não funciona bem. É preciso pôr a engrenagem a funcionar de outra maneira. Como já tenho referido, o meu problema é só um: uma justiça justa, porque é célere, competente e aplica-se com os instrumentos do saber actual de igual forma ao "pilha galinhas" como a um qualquer "pseudo-notável". Sei que há muitos magistrados competentes, dedicados á causa da Justiça. Tenho por eles o maior apreço. Mas o problemas não é dos bons profissionais, mas do mau funcionamento do sistema (que muitas vezes até é madrasto para os melhores que nele trabalham).
Talvez esteja a ser inconveniente, mas há muito que queria despejar tudo o que acabei de dizer. Prometo que vou virar a página e não "chatear" mais Vossas Excelências.
Vou-me entregar à poesia.

josé disse...

Nã, nã, compadre! Agora é que a festa vai começar! E até a poesia pode ajudar!

Concordo com tudo o que disse! Tudo, até na parte em que se refere á avaliação do sistema feita por outras pessoas que dele não façam parte.

Também sinto os mesmos problemas que são complexos e para quem tem uma inteligência feita de experiências e de saberes reduzidos, todas as contribuições são úteis. O problema dessas contribuições reside nos...paradoxos!
COmo na economia e noutras ciências sociais, a solução que parece ideal, muitas vezes, é a pior das soluções.
O marxismo-leninismo é o exemplo mais flagrante deste embuste intelectual ( uma provocação dirigida ao estimabilíssimo MCR...).

Na Justiça tudo ganharia e todos aproveitariam se tudo fosse posto em equação! Na Justiça, a meu ver, um dos problemas mais graves e solenes é a gravitas da magistratura em geral, no ofício em particular e que é aquela postura assumida por aquele gavião dos Marretas ( série da tv, nos anos setenta, de Jim Henson) que denota logo a vacuidade de pensamento encoberta pela vestimenta preta.
Porém, o paradoxo da Justiça ( e de outros sectores da administraçáo pública) parece-me ser este:

Há uma grande, enorme preocupação com os direitos, liberdades e garantias e essa preocupação parece um bem indiscutível.
Contudo, o excesso de preocupaçáo com essas garantias todas redunda na maior desprotecção que pode haver e que é a injustiça e iniquidade prática a que conduzem directamente as interpretações e o jogo com essas regras.
Hoje em dia, qualquer advogado que se disponha a tal, emperra a máquina da justiça penal durante anos a fio, muitos anos mesmo, só com base na aplicação literal dos preceitos processuais. Há inúmeros exemplos disso! Essas regras que se destinam a garantir direitos, acabam por garantir iniquidades e injustiças, pois a aplicação do direito anos e anos após os factos ocorrerem,mesmo se for feito correctamente, pouco ou nada vale. As pessoas adaptam-se a novas realidades; a natureza gravosa do crime esbate-se e a justiça fica-se pelo passar do tempo e pelas adaptações ao sentimento difuso de que não vale a pena andar pelos tribunais. O sentimento é semelhante ao daqueles que alguma vez foram vítimas de crime de furto no carro: não adianta fazer queixa porque a polícia não mexerá uma palha para tentar decobrir os autores e se o fizer, não tem meios suficientes para ser eficaz!

Assim, o que proponho, em concreto?

Apenas isto: desburocratizar o processo, para todos os crimes que não assumam gravidade pública relevante! Acabar com o segredo de justiça, a não ser que se criem condições em concreto e em certos casos julgados sensíveis pelas partes ou pelos magistrados e nesse caso fechar os papéis a sete chaves e vigiar os guardiães que devem ser reduzidos ao mínimo. Assumir aberta e legalmente como provável e possível a violação do segredo e por isso garantir eficazmente a sua não violação. E não há outro modo de evitar fugas!
Até agora, a obrigação é genérica, estende-se a todos os intervenientes sem excepção; abrange jornalistas, o que é uma aberração, em certa medida, e por isso não há controlo eficaz nem meio de evitar as fugas.

Quanto ao modo de processamento, deve imperiosamente acabar a exigência de formalismo exacerbado com cópias de tudo e mais alguma coisa; notificações formais, com prazos rígidos e controlados formalmente e principalmente erigir-se o princípio contrário ao vigente: deve iniciar-se um princípio da confiança e da boa fé geral e não o contrário, na maior parte dos processos. Pelo menos deveria ser essa a regra geral e as excepções ficariam contadas aos casos mais graves em termos materiais e de valor das acções.
E mesmo essas excepções deveriam sempre assumir um risco inerente à actividade juridico processual- que existe, pois quem demanda nem sempre vê acatado o que pretende e quem se defende nem sempre sai vencido...

Costumo apresentar um exemplo da confiança que existe hoje em dia no comércio: quem quer vai ao site da ebay, que é de leilões e compra o que quiser que esteja à venda!
Basta preencher uns formulários básicos para se dar a conhecer e para se saber que está interessado em negociar seriamente e ...já está!
Não há notários; prazos peremptórios; duplicados, triplicados e quintuplicados; notificações em forma de aviso de recepção, etc. etc.
Há emails a avisar e obrigações assumidas em nome de um interesse negocial comum.
COnheço o caso de um indivíduo que comprou há uns anos um automóvel na ebay, por um preço inferior ao valor que normalmente seria de pagar.
Comprou, pagou, andou uns meses e após algum tempo a PJ bateu-lhe à porta para lhe comunicar que o carro tinha sido roubado no leste dxa Europa e fora posto à venda por um italiano. FIcou sem o carro e sem o dinheiro.
Este é um exemplo que seria dado por um jurista para justificar o articulado de uma lei que impusesse uma série de entraves burocráticos para prevenir que alguém pudesse ser burlado. Mas é esse exactamente o exemplo que pode ser dado para se entender a vida como um risco assumido. E nas leis processuais penais e civis que temos, a preocupação em assegurar que estão fechadas todas as frinchas por onde possa entrar o vento da burla e da má fé, leva a que se escancare a porta da injustiça e da iniquidade.
É esse o paradoxo que nos aflige e que importaria elaborar mais um pouco- caso o comentário não fosse t
ao longo como já vai.

M.C.R. disse...

Meu Caro José.
marxismo-leninismo é em si mesmo um contra-senso: a teoria leninista é apenas um amontoado de apontamentos sobre a conquista do poder e jamais sobre a origem dele. Morreu, se alguma vez viveu.
Marxismo bom, nem sequer o de Grouxo que, quand même...
Todavia o velho Karl teve alguns lampejos geniais e o menor deles não terá sido aquela do fantasma que percorria a Europa assustando a burguesia. E esta assustou-se. E de que maneira!
A 2ª contribuição do barbaças já a citei: ele não terá sido o descobridor mas foi ele quem vulgarizou algumas questões candentes sobre o processo de formação do capitalismo e sobre os reflexos disto nas nossas sociedades.
E era disso que eu falava. Quanto ao resto Marx é tão só um degrau na história da filosofia política alemã. Nem mais mas também nem menos. E, politicamente, muito mais importante do que Hegel.
Quanto á parte substantiva das suas propostas não arranja quem esteja mais de acordo. As liberdades, o seu bom uso, a defesa delas, não podem estar à mercê do abuso, da tratantada dum advogadeco. Tempos houve em que também os advogados eram, em teoria, membros do tribunal. Havia até um estatuto que lhes prescrevia comportamentos e lhes aceretava o passo se saíssem do bom caminho. E um organismo, a Ordem, que arreava forte e feio nos que se esqueciam das boas regras. como é que tudo isso parece tão longínquo e esquecido?
Se calhar também aqui a proletarização deu no vinte. hoje há mais advogados que reus, a concorrência é tremenda e o resultado é um farwest sem regras. Vale tudo mesmo tirar olhos. A ordem já não controla nada e os tribunais assistem ao cruzamento de acusações de litigancia de má fé, impávidos.
E não nos enganemos: a desburocratização da justiça pode aliviar mas não resolve o problema da crise de valores que está na base da tropelia geral.
O fim de formalismos ridiculos e desgastantes só poderá ocorrer sem perigo para os valores que se pretendem salvaguardar se a atitude social em relação ao delito for outra que não a que hoje impera. Mas V. vai acusar-me de ser um "m-l" moralista e anti capitalista só porque digo que este desabrido liberlismo que se vive propicia o abandono de valores morais e éticos mínimos.
É que é este o clima que permite que uma senhora que anda a monte, fugida ao tribunal possa voltar a ganhar uma camara municipal, que o pus da Madeira insulte tudo e todos e que o arganaz do Marco vá cabriolar para um concelho vizinho dizendo alto e bom som: roubo mas faço.
Por estas e por outras é que veno bradando (no deserto?...) que é de política que se trata. E de uma revolução outra que não se limite a mudar o mundo ou, antinomicamente, a mudar a vida como diziamos em 68 (cá em 69, que andamos sempre um pouco atrazados...). Que o Santo patrono se chame Karl é coisa que não me incomoda. Pior seria Vladimir...