20 outubro 2005

Do outro lado

Cavaco Silva apresenta hoje a sua candidatura à Presidência da República. Dez anos depois da derrota face a Jorge Sampaio e depois da falta de coragem para se apresentar de novo contra Sampaio há cinco anos, Cavaco, o político-que-quer-fazer-parecer-que-não-é-político, volta ao palco de onde nunca saiu para tentar o “assalto” à Presidência.

Cavaco tem, naturalmente, toda a legitimidade para querer ser Presidente. Apesar dos “tabus” e do aparente desdém pela política e pelos políticos, Cavaco tem há muito a ambição de ser o supremo magistrado da República. Não trabalhou para outra coisa durante estes dez anos, mesmo se teve de ser inconveniente para os seus correligionários. Aliás, a lealdade nunca foi uma das suas virtudes – que o digam Francisco Balsemão, Fernando Amaral, ex-presidente da Assembleia da República, Fernando Nogueira e tantos outros. Até Santana Lopes, esse peculiar líder, tem fortes razões de queixa.

Há mais de vinte anos, era eu um jovem militante e dirigente da JSD, escrevi no jornal do partido um artigo muito crítico sobre Cavaco Silva e os seus apaniguados, que então moviam uma oposição cega e desleal à liderança e ao governo de Francisco Balsemão. Apesar disso, quando Cavaco ascendeu a líder do PSD, o meu primeiro voto em eleições legislativas contribuiu para a sua vitória e para a sua designação como primeiro-ministro. Contudo, cedo confirmei que aquela forma de estar e de governar, o quero, posso e mando, o “raramente me engano e nunca tenho dúvidas”, nada tinham a ver comigo. Entreguei o cartão de militante durante a campanha eleitoral para as legislativas de 1987, que deram a primeira maioria a Cavaco, porque já não conseguia rever-me nesse partido, na sua liderança, nas suas posições e nos seus projectos.

A verdade é que a minha viagem para terrenos mais à esquerda já havia começado e foi influenciada por vários factores – os meios universitários que frequentava, as leituras, a realidade urbana que reencontrei depois de alguns anos a viver num meio mais fechado e conservador, a intensa campanha eleitoral das presidenciais de 1985/86, uma maior preocupação com as questões sociais e a distribuição da riqueza num período de graves dificuldades económicas. É certo, porém, que as características impressivas da liderança de Cavaco contribuíram muito para me empurrar mais para a esquerda nesses meados dos anos oitenta.

Hoje, não sei ainda em quem vou votar nas próximas presidenciais. À esquerda, o panorama não é animador. Se nas eleições anteriores escolhi convictamente Mário Soares e Jorge Sampaio, revendo-me no essencial das suas presidências, neste momento apenas sei em quem não vou votar.

5 comentários:

Kamikaze (L.P.) disse...

Caro JCP,
O seu post, em que nos desvenda tanto de si, deve ser o mais comentado do incursões... de tal forma o que nele escreveu encontrou profundo eco em muitos dos seus leitores que se fez silêncio.Um silêncio compreensivo e até talvez solidário.
Deixo-lhe aqui um abraço de estima e consideração, companheiro!

M.C.R. disse...

Meu caro JCP
Votei convictamente soares e convictamente Sampaio. Por isso mesmo hoje voto convitamente Manuel Alegre.
As perspectivas de vitória são, reconheço-o escassas mas nem sempre o ganhar deve ser o nosso norte. Voto num amigo de há 45 anos, num poeta que cantou a esperança quando tudo no-la negava. voto porque nessa alturA FUI CAPAZ, ANIMADO POR UM VERSO,DE DIZER NÃO. Esta aventura de uma vida fará com que esta próxima segunda feira, amanhã, portanto, eu esteja no hotel Meridien do Porto,as 21:30 para com modéstia, alegria e sem especiais esperanças, para dizer SIM!
Um abraço do seu leitor e amigo
mcr

O meu olhar disse...

Pois é JCP, o seu testemunho vem confirmar a minha opinião sobre Cavaco.
MCR, comungo da sua esperança, mas com mais optimismo: acredito que a candidatura de Manuel Alegre vai marcar pontos, porque traz com ela a confiança, o retorno aos valores da cidadania e da solidariedade. Acredito que muitos daqueles que pensam que o actual estado de confiança da classe política bateu no fundo apoiarão Manuel Alegre com o envolvimento na campanha e com o seu voto.
Em conclusão: Manuel Alegre estará na segunda volta e fará o pleno da esquerda. Pena é que o PS não o tenha entendido.

M.C.R. disse...

Atenção amiga "o meu olhar" é preciso assinar a proposta de candidatura. Se quiser dê-me a sua direcção e mando-lhe as folhinhas. São duas: um pedido de certidão de eleitor e uma proposta para M. A, para PR. E pode fazer fotocópias para outros assinarem.
Não tenho especial esperança mas é como se a tivesse. Para já ainda não perdi e até ser que ganhe. de todo o modo estou neste combate por amor ao combate. E por razões de ética política, de amizade e estéticas.

M.C.R. disse...

Atenção amiga "o meu olhar" é preciso assinar a proposta de candidatura. Se quiser dê-me a sua direcção e mando-lhe as folhinhas. São duas: um pedido de certidão de eleitor e uma proposta para M. A, para PR. E pode fazer fotocópias para outros assinarem.
Não tenho especial esperança mas é como se a tivesse. Para já ainda não perdi e até ser que ganhe. de todo o modo estou neste combate por amor ao combate. E por razões de ética política, de amizade e estéticas.