18 julho 2006

( 13)
Salvados e memorias perigosas


E outra vez a guerra, a voraz sombra da espera, as árvores municipais podadas a vitríolo, os húmidos cabelos do nevoeiro.

Em 18 de Julho de trinta e seis, até os zimbros arderam nas malhas da neve. Quem isto te contou vai morrer na casa entre medronheiros, os estuques gastos pelo olhar. Um cartaz de touros, e uma travessa velha (feridas na parede acima da masseira).

O silêncio tinge os vidros da solidão que te prende o pulso sobre as lágrimas. Atrás de ti há um relógio cansado e indiferente, um cinzeiro de latão e quatro livros de Chandler.

De rugas e desencontros teceste o dia como uma carta que não mandarás. Rodeias-te de máscaras, usas as máscaras, as ágeis paredes da fuga. E do remo que já não queres, do rumo em que te esqueces, das feridas do rumor. E do amor (pouco).

Uma torneira canta e tu tão quieto. De paciência e insónia e parcos instrumentos esquadrias as palavras. Devagar: como quem enrola um cigarro. Ou a tremer como quem recorda a boca da terra, o cheiro da chuva em Nampula e – mais longe – a poupada respiração do mar em Janeiro.


O texto acima reproduzido pertence a uma serie chamada Roteiros Inventa(ria)dos é da autoria de Manuel Heinzelmann e está dedicado à memória de Ana Alatha v.d. B. (1946-1977). Incidentalmente refere a data de início da guerra de Espanha.

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