31 março 2005

Adeus tristeza, até depois...

Já dormi. Acordei, em sobressalto, voltei a ligar o computador - coisa demorada... - e estou de regresso. É claro que o que escrevi antes tem a ver com a intermitência do sono, com o clarão de luzes que me atormentam o sono, com esta dureza sempre inacabada, adocicada pelo chilrear dos pássaros, amigos, que saltitam de árvore em árvore, por aqui, numa sinfonia que não se escreve - que eu não escrevo, porque não não sei.

Voltei aqui para dizer que o Incursões, para mim, perdeu todo o sentido. Descaracterizou-se e eu ajudei - foi por bem. A partir do momento em que me convidaram para escrever aqui, tentei sempre que este não fosse um espaço estritamente corporativo, um blog dos problemas do MP. Daí ter sugerido alguns nomes que poderiam enriquecer o debate sobre todas as coisas o mundo, para além dos problemas restritos do MP e até mesmo da justiça. Sei que discutir as coisas do mundo num blog não é muito compatível com o dever de reserva dos magistrados. Do MP. E dos outros.

Fui dos mais resistentes a que o Inc. voltasse à "pureza" original. Barafustei quando LC quis recentrar o blog. Mundividências diferentes ou a consciência de que nunca deveria ter vindo cá. Eu - e outros como eu, os não magistrados - ocupámos aqui espaço indevido. Falámos de política, das nossas coisas, de tudo. E isso não é muito compatível com um blog maioritariamente de pessoas - ilustres pessoas - que vivem para defender a legalidade. Nem que seja a legalidade formal, coisa que agora não vem a propósito.

Foi isso que levou a que se criassem sucedâneos do Inc.. Foi isso que levou a que ilustres figuras - ah, admiráveis figuras! - deixassem de escrever aqui, para se dedicarem aos sucedâneos. Têm razão, claro que têm razão...

Deserto. Deserto. O que não significa que esqueça as boas - tantas! - pessoas que por aqui conheci. Quero continuar a olhá-las. Os outros? Que se lixem os outros!...

Um abraço especial ao LC, ao Compadre e - em primeiro lugar - à Kamikaze. Ao josé também. Ao JCP, à Silvia, ao MCR e a todos os outros com quem privei (com estes continuarei a falar, se me deixarem).

Dasse

Tenho andado silencioso, incapaz de reagir, petrificado, dorido, amargurado. Isto de ser ocasional advogado de crime traz coisas insupostas, revelações absolutamente inesperadas. E acasos. E clarificações. E desilusões enormes e coisas que precisam de ser digeridas para que se tornem reais, (in) compreensíveis. Pois é: nem todas as ameaças que sofri foram por causa das atitudes políticas que tomei. Demasiado triste para ser verdade... Fica aqui o testemunho. Tive o cuidado de colocar o testemunho noutros sítios. Obviamente, não vai acontecer nada. Uma coisa é certa: nunca tive um caso de crime tão mau como isto. Quanto ao resto, que Deus me ajude a continuar a ser como sou, a não perder a cabeça...

Já passou. Passa depressa. Porque eu não tenho medo.

30 março 2005

Ainda as férias (outra vez)

Começo a ficar convencido de que, afinal, as férias judiciais devem ser reduzidas a um mês. Talvez, assim, eu consiga um mês de férias. Upa! Nas férias de verão passado - como algumas pessoas daqui sabem - tive seis dias de férias... Eu quero um mês de férias só para mim. Pode ser? Obrigado.

Adiado o debate promovido pela APCNP

O debate com José Lamego sobre “A política de reconstruir estados”(teoria da " nation building "num contexto de relações internacionais conflituais: os exemplos do Kosovo, Afeganistão e Iraque) promovido pela APCNP foi adiado para o dia 19 de Abril.
Realiza-se, como fora anunciado, no espaço “café-concerto” do Teatro Rivoli.
Ver mais informações em: apcnp@nortemlinha.net

A Privatização como uma Questão de Tempo? Ou Anti-Justiça?

Título de oportuno post no Suo Tempore.

"A gestão dos Tribunais deve ser entregue a entidades privadas", afirma Rui da Silva Leal, o Presidente do Conselho Distrital do Porto da OA, numa entrevista dada à Vida Judiciária deste mês.Quando lhe perguntaram o que pensava acerca da privatização da Justiça, respondeu " É, sem dúvida, o futuro."

Para solidificar qualquer opção neste caminho tortuoso,eis uma boa bússula, com origem no Observatório Permanente de Justiça. O seu estudo comparado da Administração e Gestão da Justiça.

A polémica sobre as férias judiciais

(Post de 25/3, actualizado hoje.)

No Incursões: ver aqui, aqui e mais recentemente aqui.

Na Grande Loja do Queijo Limiano
aqui.

No Ciberjus,
aqui e aqui.

No É dia de sessão,
aqui.

No Cum Grano Salis, em post do Juiz Conselheiro Artur Costa, aqui.

(nos comentários aos posts linkados constam já outros links, designadamente para outros blogs onde foi opinado sobre esta vexata questio).

Seguem, entre aspas, excertos da carta do juiz desembargador do TRL, Manuel Fernando Almeida Cabral, ao jornal Expresso, publicada na edição de hoje.

24 horas na vida de um juiz

(...) " Não imagina aquele (o primeiro ministro) como felizes irão ficar os juizes portugueses com a referida medida (de reduzir as férias judiciais para 30 dias). É que:
Finalmente, não vão ter que trabalhar diariamente mais do que as oito horas, (...) a sua consciência e elevado sentido do dever (de qualquer juiz digno, empenhado e orgulhoso da sua profissão) impeliam-no, quantas vezes, a ter que o fazer durante todas as 24 horas do dia." (...)

magistrados com rigoroso controle de horário (*)

(...)"Finalmente, vão poder acalentar a esperança de verem melhorar a sua situação económica, com o pagamento de horas extraordinárias (que nunca lhes foi efectuado!)" (...)

(*) através de LPDB, para garantir o PTHE

29 março 2005

Uma boa notícia!

O site da Assembleia da República tem disponíveis para consulta on-line todos os debates parlamentares, desde a Constituinte de 1821 até à actualidade. Podem consultar-se, tanto a imagem do Diário, como a reprodução do texto, com busca por palavras ou data da sessão. Como é que se permite uma coisa destas? Há que tomar providências, pois por este andar ainda corremos o risco de nos tornarmos um país decente.

Encontro

Eram aveludadas a voz
e a pele.
Não poderiam ser diferentes
no esplendor do desejo.

E o olhar,
mar de palavras
não ditas,
debruçava-se sobre os corpos
desde o princípio.
Para além deles mirar o gozo.

Era um aroma inesquecível
como devia ser.
Um brilho musicalmente harmônico,
rítmico;
nos dias e noites
em que nada mais sabiam,
além de si mesmos.

E os gestos.
A medida exata dos gestos
a arrancar de um íntimo
que não haviam visitado,
a exclamação encantada
do encontro.

O sabor fresco
da umidade diluída
nos afagos
que jamais fizeram antes.

Perdida realidade
que não pensavam existir.

A todo o momento,
a memória e o ato,
o afeto e o fato,
não os abandonaram.

A verdade do encontro.


Silvia Chueire

28 março 2005

Base de dados genética

Segundo o DN de hoje, o Governo propõe-se criar uma base de dados genética de identificação civil que abrangerá toda a população portuguesa e que será utilizada na investigação criminal. E o ministro da Justiça assevera que este é um "objectivo a cumprir nesta legislatura" e é mesmo "uma das primeiras prioridades" da acção governativa.

Já em Outubro de 2001, António Guterres, então primeiro-ministro demissionário, anunciara, num debate mensal da Assembleia da República, a intenção do Governo de criar uma base nacional de ADN. O Prof. Doutor Daniel Serrão denunciou então, imediatamente, a violação do direito de cada um ao segredo da sua identidade pessoal, que tal base constituiria, até porque não haveria nenhum sistema de segurança capaz de garantir o bom uso de dados de tão alta sensibilidade.

Trata-se de uma medida altamente polémica, que levanta graves problemas éticos e que esbarra com sérias barreiras legais (sobre a legislação comunitária e nacional sobre a matéria, pode ser consultado o site da Comissão Nacional de Protecção de Dados).

Para termos a noção dos riscos que tal projecto acarreta, aqui ficam registados alguns aspectos da análise feita por R. Dawkins, num artigo intitulado “Arresting Evidence”, publicado pela revista “The Sciences”, da Academia das Ciências de Nova Iorque, no seu número de Novembro/Dezembro de 1998:

A investigação genética está a progredir nos tribunais penais, já que a prova do ADN é sem rival - permitindo identificar pessoas sem ambiguidade. O problema decorre do uso que podem fazer, desta prova, jurados e advogados, obcecados pela ideia de ganhar o seu caso. De facto, há muitas possibilidades de erro e sabotagem: um tubo de sangue pode levar uma etiqueta errada, por acidente ou por maldade; uma amostra de ADN colhida no lugar de um crime pode ser contaminada por células da pele, suspensas no suor, de um técnico de laboratório ou de um agente da polícia.
O perigo de contaminação é particularmente importante nos casos em que se usa uma técnica laboratorial destinada a criar milhões de cópias de uma dada sequência de ADN: uma gotícula de suor encontrada numa arma de um crime inclui o ADN, podendo ser multiplicada em amostra utilizável e analisável. Só que a multiplicação reproduz também os contaminantes, sendo por isso um potencial de injustiça. Aliás, até se podem misturar voluntariamente dados colhidos na cena de um crime, ou implicar pessoas que estão inocentes mas cujo ADN foi colhido na cena do crime, sem que elas tivessem nada a ver, tendo passado por lá com outros objectivos. Evidentemente, acrescentaremos nós, até se pode fabricar culpados pondo na cena do crime objectos com o ADN de algum inimigo que se gostaria de meter na prisão…
No caso de haver uma base nacional de sequências de ADN de cada homem mulher e criança, sempre que uma amostra de sangue, sémen ou saliva, pele ou cabelo, fosse encontrada da cena de um crime, a polícia poderia simplesmente procurar suspeitos na base de dados… Toda a população estaria sob suspeita! Até se poderia usar a identificação genética da Base para deter alguém, fosse onde fosse, mesmo se houvesse uma probabilidade reduzida de semelhança ou de coincidência entre uma amostra de sangue e os dados da Base.
Deixando de lado o crime, o autor reconhece que há o perigo real de que a informação genética caia em más mãos: seria praticamente impossível fazer um seguro de vida, se as seguradoras tivessem acesso a tais dados, que revelariam as probabilidades de doenças e morte. Do mesmo modo, pessoas que discriminam outras para o acesso a uma escola ou a um emprego, poderiam usar os dados contra essas pessoas.

La ñina italiana, 1917


Picasso

26 março 2005

Boa Páscoa

Boa Páscoa para todos. Estejam onde estiverem.

Mendes vs Menezes (parte II)

Há dias, disse aqui, que me incomodavam as pessoas que sempre viveram à sombra de Luís Filipe Menezes e que, agora, pressentindo a vitória de Marques Mendes, se mudaram de campo. Nessa altura não concretizei a questão. Mas referia-me a Jaime Neto, um médico-director-de-hospital, que sempre foi patrocinado por Menezes e que tem inflência em Penafiel. Menezes - segundo o Expresso - também não gostou. Lê-se no semanário que o edil de Gaia, quando leu nos jornais a atitude de Neto, enviou-lhe uma mensagem: "obrigado pela solidariedade". Menezes irónico, mas com razão.

Apesar do que digo atrás, não posso deixar de lamentar que Menezes seja apoiado por Valentim Loureiro. E, por isso, custa-me cada vez mais tomar posições: eu não tenho jeito para estar do mesmo lado de Valentim... O autarca de Gondomar não gosta de mim - faz bem... - e eu não gosto dele. É uma questão de química...

Ainda as férias

Hoje, por mero acaso, encontrei o director de um dos jornais regionais mais expressivos do país. Ele falou-me do Incursões. Lê-nos. Somos mais conhecidos do que pensamos e menos interessantes do que devíamos.

Não foi o interlocutor que me disse - sou eu que penso: devemos olhar menos para o umbigo e mais para a linha do horizonte. Longínquo horizonte....

E, daí, parto para outra questão: leio nos blogs e nos jornais que os magistrados (senhores magistrados, pois claro!...) dizem que estão todos contentes com a ideia de Mr. Sócrates sobre reduzir as férias judiciais. Horas extraordinárias, coisas assim, trabalho nas férias, coisas parecidas... Eu - crédulo - sempre achei que as férias de dois meses, mais os acrescentos, eram devidas. O peito-feito dos magistrados - dos senhores magistrados, pois claro - em relação ao assunto, até pode ser sério. Mas, de tão ostensivo, cheira-me a "bluf"... Merecem menos do que eu pensava.

Para além disso, leio com atenção o que os magistrados - senhores magistrados, pois claro... - vão dizendo. E fico com a sensação de que talvez seja mesmo melhor só um mês de férias. Logo se vê, senhores magistrados, pois claro...

24 março 2005


É um fórum que vale a pena consultar. O seu criador e dinamizador é Artur Castro Neves. Além de sociólogo prestigiado, é um amigo, um resistente e um homem muito culto. Para quem não o conhece, só duas notas: deu aulas na Sorbonne e na FEP. Foi um dos impulsionadores de uma publicação sobre “História das Ideias”.
O Castro Neves convida todos os incursionistas a participarem num debate com José Lamego sobre “A política de reconstruir estados”, a realizar no próximo dia 19, no Rivoli (Café Concerto), pelas 18 horas.
Apareçam!

"Sir" Mourinho

Ver aqui como a Câmara dos Comuns se pronunciou hoje sobre o diferendo entre José Mourinho e a UEFA. Independentemente de quaisquer considerações sobre o assunto em apreço, o que é certo é que se isto se passasse em Portugal vinha logo a habitual clique anti-futebol dizer que era um tema sem dignidade para merecer a atenção dos políticos e do parlamento. Coisas de ingleses…

Férias e mais lérias...

A Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais diz assim, no seu artigo 12.º:

As férias judiciais decorrem de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro, do domingo de Ramos à segunda-feira de Páscoa e de 16 de Julho a 14 de Setembro.

E se dissesse assim?:

1 - O ano judicial tem a duração de um ano e inicia-se a 15 de Setembro.
2 - À excepção dos períodos de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro e do domingo de Ramos à segunda-feira de Páscoa, o período normal de funcionamento dos tribunais judiciais decorre de 15 de Setembro a 15 de Julho, sem prejuízo da prática dos actos urgentes definidos por lei
.


Não seria a mesma coisa?

Será que, com esta redacção, alguém escreveria, por exemplo isto?:

A redução das férias judiciais é justa e só peca por defeito. Não há razão nenhuma para que os tribunais estejam encerrados durante tanto tempo -- se é que se justifica o seu encerramento de todo em todo (sobretudo tendo em conta a morosidade da nossa justiça) -- e que os agentes do sistema de justiça tenham na pratica mais férias do que os demais servidores públicos.

Vejamos agora.

O artigo 47.º do Regimento da Assembleia da República diz assim:

1 - A sessão legislativa tem a duração de um ano e inicia-se a 15 de Setembro.
2 - O período normal de funcionamento da Assembleia da República decorre de 15 de Setembro a 15 de Junho, sem prejuízo das suspensões que a Assembleia deliberar por maioria de dois terços dos Deputados presentes.


E se o n.º 2 desse artiguinho dissesse assim?:

As férias parlamentares decorrem de 16 de Junho a 16 de Setembro [três mesitos], sem prejuízo das suspensões que a Assembleia deliberar por maioria de dois terços dos Deputados presentes.

Também não seria a mesma coisa?

E então alguém, que já foi deputado e nunca se deu por achado, não deveria escrever, por exemplo, isto?:

A redução das férias parlamentares é justa e só peca por defeito. Não há razão nenhuma para que o Parlamento esteja encerrado durante tanto tempo – se é que se justifica o seu encerramento de todo em todo (sobretudo tendo em conta a morosidade da nossa produção legislativa) – e que os agentes do sistema parlamentar tenham na prática mais férias do que os demais servidores públicos.

Onde está a coerência?

Se é que não se poderia fazer idêntica transposição para o sistema educativo, designadamente o superior…

Moral da história: acabem-se com as férias judiciais, sim, mas também com as férias parlamentares e outras que tais! Abaixo todos os privilégios!

23 março 2005

A Pedra de Toque

Isto que se pensa
isto que se diz
é o toque da pedra
o milagre do giz.

É o deslumbramento
de se poder gravar
na ardósia do momento
o grifo do mal estar.

É o pressentimento
de se poder somar
o riso com o risco
o rictus com o mar.

É possuir-se o lento
tempo de calar
(mui leal conselheiro
dos que sabem cantar).

É esperar-se por dentro
o que nos vem de fora
e atirar a pedra
nos homens e na hora.

José Carlos Ary dos Santos

Ser testemunha

Dentro de dias, tenho de ser testemunha em processo de instrução. Andou um simpático agente da PSP a correr para o meu escritório, durante duas semanas, porque tinha uma notificação que só a mim podia ser entregue. Como durante o dia estou nos tribunais, empresas e outras actividades, foi difícil o encontro. O homem já devia estar farto, porque não me encontrava. Sugeri que deixasse a notificação. Assinei-a. E, ao ler o texto, fiquei a saber que alguém, que não conheço nem nunca me contactou, me indicava como testemunha. Não sabia de nada, nem quem me indicara, nem sobre que teria de depor. A solução foi contactar o tribunal. E com sorte lá consegui que, ao menos, vagamente me indicassem o assunto. Em boa verdade, não me lembro de nada. Os factos terão ocorrido há mais de 12 anos e reportam-se a processos judiciais dessa época, há muito arquivados no tribunal, de que nem sequer tenho registo no meu escritório. Estou avisado: vou ter que me lembrar de tudo, porque não quero que me acusem de falso testemunho. Como se a nossa memória fosse de elefante, tivessemos que escrever diários e mantê-los em arquivo. Nestes casos, não seria possível que o tribunal nos indicasse desde logo qual a matéria sobre que teremos de prestar depoimento? Abaixo o segredo de justiça!

Naturalmente, “tudo direitinho"

1. A bem da Nação

Segundo o “Público”, três dias após as eleições, foi assinado um despacho de adjudicação de um sistema de comunicação que custará ao Estado mais de 538 milhões de euros. O consórcio contemplado é liderado pela Sociedade Lusa de Negócios à qual está ligado Daniel Sanches, um dos ministros despachantes, e Dias Loureiro, ex-ministro de outros governos do PSD e influente político deste partido.

2. De pequenino é que se torce o pepino ou a “oficina” da política

Informa o C.P. que para a futura liderança da Distrital da JSD/Porto candidatam-se um vereador da Câmara de Gondomar (Telmo Viana), um vereador da Câmara da Póvoa de Varzim (Manuel Angélico) e um assessor da Câmara da Trofa. Mais informa que Filipe Meneses, presidente da Câmara de Gaia e candidato à liderança do PSD terá pressionado o vice-presidente da “jota” a não integrar determinada lista.

3. Um explicativo autarca

Avelino Ferreira Torres, presidente, em transição, da Cãmara do Marco, afirmou, segundo o “Público”, que a P.J. o convocou para explicar por que é que o Porto tinha perdido com o Nacional por 4-0.

4. Apocalipse now?


“Nos nossos sistemas, o indivíduo adula os seus superiores para avançar na carreira, deseja mais ser invejado do que respeitado, e a nossa sociedade, indiferente ao futuro, apresenta-se como uma selva onde reina a manipulação, a corrupção e a concorrência de todos contra todos.”
G.Lipovetsky, in: A era do vazio

Convite

O Blog do Alex convida-nos para o Jantar de Blogs da Pandora, em Lisboa, dia 2 de Abril (ver aqui). Alguém pode ir?
Entretanto, vale a pena visitar o blog: é divertido, instrutivo e tem coisas bonitas...
Obrigados pelo convite!

Família

Sei que hoje estou a abusar do espaço, que é tarde e que já devia estar a dormir, a aproveitar os últimos cartuchos das férias que Sócrates nos vai tirar, mais cedo ou mais tarde... Eu sei. Mas não consigo. Para além dos problemas diários, da vida que corre, tenho um problema de rebeldia para resolver. Coisa séria! Um "incêndio", que já consegui debelar, ainda que a floresta esteja armadilhada, um problema de autoridade, de pai para filha, enquanto o puto sobrevive colado sobre o meu peito de pai e encolhe os ombros, crítico não sei bem do quê, mas não do pai, isso eu sei.
Leio nos jornais polémicas sobre homens que batem nas mulheres (esquecem, quase todos, a violência das mulheres - física ou psicológica - que fustigam os homens), leio nos jornais polémicas sobre juízes que, estranhamente, retiram crianças a famílias de acolhimento para as entregar aos pais biológicos que as maltrataram e presumivelmente vão reincidir, leio... Leio que as mães são o elo mais adequado para tratar dos filhos, quando a família se desmorona. Leio tantas teorias, de teóricos, de pessoas certamente bem intencionadas, mas tão desafazadas da realidade...
Detesto - sempre destestei e passei a detestar mais quando teve que ser - direito da família. E é pena. Não fosse eu tão sensível às coisas que eu sei, às coisas que vivo, às coisas que me doem e, certamente, seria um especialista na matéria. Um verdadeiro revolucionário, pois claro...

Sorte...

Ontem, quando liguei o telemóvel, tinha várias mensagens de jornalistas que queriam saber coisas sobre a "passagem" de Avelino pela Polícia Judiciária, supostamente como arguido, supostamente no processo "Apito Dourado". Eu não tinha nada para dizer sobre o assunto. Pois, talvez não tivesse... Mas era o assunto do dia, a notícia... Pouco mais tarde, vim a saber que havia autarcas mais importantes do que o célebre Avelino que também estavam a "passar" pela PJ. Avelino deixou de ser notícia. Há gente com sorte...

Mendes vs Menezes

Como provavelmente já se percebeu, eu tenho resistido a comentar a disputa entre Marques Mendes e Luís Filipe Menezes na corrida pela liderança do PSD. A minha omissão não tem nada a ver com cálculos políticos - não estou para aí virado -, mas por uma questão de decoro. O mesmo decoro que me obriga a manter o silêncio para o futuro, ainda que, eventualmente, possa ir ao Congresso de Pombal. O mais que posso dizer é que, pessoalmente, gosto dos dois, por muito que, a ambos, possa apontar algumas falhas quando precisei do seu apoio.
Apesar de ter trabalhado com os dois, convém esclarecer que não devo nada a qualquer deles - pessoas que me foram próximas não podem dizer o mesmo, mas isso não vem a propósito -, a não ser a possibilidade que tive de conhecer "o outro lado" da política.
Mas há coisas que me doem: há pessoas que sempre viveram às costas de Menezes que, agora, falam na sua "postura errática", pessoas que nunca teriam passado do anonimato e da mediania de onde nunca deveriam ter saído, porque mais não merecem, e que apoiam Marques Mendes porque pressentem que é por ele que passa o poder...
Não tenho nada contra as pessoas que apoiam Marques Mendes. Obviamente. O que me incomoda são as "toupeiras"...

Caro MCR

Meu Caro:

Devo confessar-lhe que quando deixou aqui um comentário a pedir o meu endereço para me enviar um livro (e quando o deixei), pensei que havia uma brincadeira pelo meio. Qual não foi o meu espanto quando, hoje, cheguei ao escritório, e vi o livro da estória. Fiquei sensibilizado. Acho que não fiz nada para merecer tal amabilidade.
Pode estar certo de que vou devorar as histórias, apesar de sentir que o meu espanhol anda um bocado enferrujado. Estou grato. Muito grato. E ávido de poder retribuir a amabilidade.

Um abraço do Carteiro

22 março 2005

VOLTAIRE (1694 - 1778)

As autárquicas no Porto

As recentes sondagens vindas a lume, designadamente no “Expresso” e n’“O Comércio do Porto”, colocaram na ordem do dia a discussão sobre os melhores candidatos à autarquia portuense por parte dos principais partidos.
Da parte do PSD, parece incontornável o nome de Rui Rio, apesar de Luís Filipe Menezes surgir bem cotado na sondagem do “Expresso”. Rio reúne muitos apoios entre os sociais-democratas e só uma vitória de Menezes no congresso do PSD o poderia fazer desistir da recandidatura. Apesar das suas insuficiências e das “guerras” descabidas que foi abrindo com vários sectores, se Rio conseguir formar uma equipa forte será certamente um sério candidato à vitória. A teoria de que acabou com um certo regabofe nas contas municipais colhe apoios não despiciendos junto de muitos portuenses.
O PS depara-se com um cenário muito difícil para conquistar a Câmara do Porto. Nuno Cardoso apostava cegamente na sua indigitação e agora não vai facilitar a tarefa de quem for nomeado, como parece ser o caso de Francisco Assis. A cidade também não se entusiasma com Assis, nem o vê como um líder capaz de marcar o futuro da cidade. E não se vislumbram outros nomes da área do PS que se imponham como alternativas mais fortes e galvanizadoras. Uma coligação à esquerda, por sua vez, será difícil de aceitar e de explicar depois do PCP ter sustentado a actual maioria PSD/CDS, por troca com uns quantos pelouros e lugares. Perante isto, o que esperar?
Talvez devêssemos começar por discutir o que se espera de um presidente da Câmara do Porto. Queremos um líder capaz de projectar a cidade e a área metropolitana no contexto nacional e europeu ou contentamo-nos com um burocrata que trate das minudências do dia-a-dia? Os partidos já se fizeram essa pergunta? E os cidadãos que vivem e trabalham neste espaço geográfico não acham que deveriam influenciar essas escolhas partidárias? Debatamos então estas questões e não as deixemos exclusivamente nas mãos dos aparelhos.

Outro céu - I



É de outro céu que escrevo,
outras estrelas.
E de um mar imenso,
que desejo atravessar.
É da travessia que digo,
do sonho à realidade.

São outros rumos que procuro,
da minha verdade.
Outros caminhos,
suspiros,
mãos nervosas.

É de um certo escuro que dizia,
a lua clareando tudo.
Da ausência.
De um não estar
e querer ser.

Do desejo derramado
sobre todas as distâncias.



Silvia Chueire

Farmácia de serviço nº 3

1. Para os felizardos que aproveitam as mini-férias da Páscoa para viajar, duas dicas: em Paris, no Museu do Luxemburgo, uma exposição imperdível: “Matisse: une seconde vie”: as últimas e admiráveis obras de Henry Matisse. Guaches recortados numa orgia de cor. Estão em mostra as séries Jazz, La Perruche et la Syrene, Etudes Sentimentales de l’arbre, etc.
Em Madrid: Dürer assentou arraiais no Museu do Prado.

2. Sempre nesta mansa onda de férias, para quem optar pela Galiza, e teimar em dividir os parcos maravedis por livros e marisco, aqui se dão três nomes de livrarias em três cidades: Vigo "Casa del Libro": dois andares inteirinhos e um bar simpático para folhear um livro calmamente. Fica na rua Garcia Moreno. Em Pontevedra, na rua Michelena está ancorada a "Libreria Michelena": um cafarnaúm de livros absolutamente inolvidável. Tem uma boa selecção de revistas culturais. Não tem bar mas os proprietários e os empregados são duma gentileza e duma competência fora do vulgar. Em Santiago, perguntem pela "Follas Novas". Verão que não se arrependem. Em todas elas podem encontrar dezenas de versões do D. Quijote. Ora aí está uma bela sugestão de prenda pascal a nós mesmos!

3. E a música? A grande inolvidável música da Páscoa? Pois bem, dois discos: "Chants de la cathedrale de Benevento: semaine sainte et Paques" pelo Ensemble Organum, (Harmonia Mundi), e "Divine Liturgie Orthodoxe a Zagorsk" (Chant du Monde).
Por uma vez sem exemplo católicos e ortodoxos competem pacificamente.

PS: Esta entrega 3ª da farmácia não tem por objectivo aumentar a angústia do nosso "carteiro" que, aliás andou a passear-se por terras de Espanha não faz muito tempo.

21 março 2005

Redução das férias judiciais

No Expresso Online:

O primeiro-ministro anunciou hoje que vai propor a redução das férias judiciais de Verão de dois meses para um mês, mas as associações representativas do sector desvalorizaram o impacto desta medida na eficácia da justiça.

No início do debate do programa XVII Governo Constitucional, o primeiro-ministro, José Sócrates, propôs a redução para um mês do período das férias judiciais, argumentando que se trata de uma medida necessária para «uma gestão mais racional do sistema» judicial.

O bastonário da Ordem dos Advogados, Rogério Alves, considerou tratar-se de uma medida «emblemática» que, a ser tomada isoladamente, ignorando outras medidas de simplificação processual, nada trará de novo.

«Só por si não é uma solução mágica», afirmou, no mesmo sentido, a Associação Sindical dos Juízes Portugueses, considerando tratar-se de uma proposta que, caso não seja acompanhada de outras medidas que visem a simplificação processual, «pode gerar problemas no funcionamento dos tribunais».

O Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ) - que considera que a redução das férias judiciais em nada altera a situação dos funcionários - defendeu que seria preferível que os tribunais não encerrassem durante todo o ano.

«Esta é uma medida psicológica», reagiu o presidente do SFJ, Fernando Jorge, defendendo que os funcionários judiciais deveriam ser colocados em condições semelhantes às de qualquer outro trabalhador da Função Pública ou de empresas privadas, não sendo «obrigados a gozar férias quando o Governo quer».

Actualmente, os tribunais encerram de 16 de Julho a 14 de Setembro e os trabalhadores do sector da justiça têm de gozar férias nesse período.

Embora aberto ao diálogo, o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público lembrou que os dois meses de férias judiciais não são, na realidade, aproveitados pelos magistrados, alegando que a grande maioria dos juízes aproveita o período de férias judiciais para pôr despachos em dia.

Ainda na área da justiça, José Sócrates deixou no Parlamento outra promessa, a da revisão das normas do processo penal, «dentro da estrita observância das garantias penais», mas não a pormenorizou.

SER MULHER...

Da nossa já habitual colaboradora, Drª Isabel Batista, Juiz de Direito em Caldas da Rainha, recebemos este post que, com muito gosto publicamos.

A História da Mulher é também a História do Homem, é a História da relação entre os sexos. Existe uma relação dialéctica entre o feminino e o masculino. Cada um de nós transporta em si esta realidade.

A grande vantagem que retiro da passagem doa anos da minha vida é já ter tido tempo, (tanto tempo! ) para me relacionar com uma diversidade imensa de pessoas (homens e mulheres) nos mais variados locais e em circunstâncias muito distintas. Por isso a minha história é o resultado dessa mescla de encontros, de experiências adquirida em diversos locais e tempos. É a expressão da minha própria construção social, para além desta história estar marcada pela minha identidade genética. Sou Mulher! Sou Mãe! A minha condição biológica marca indelevelmente todo o meu percurso como ser humano.

Escolhi um poema da Maria Guinot, e do seu título fiz o tema deste texto a pensar no 8 de Março, o dia da mulher, das mulheres!

Roland Barthes afirmou que a linguagem é um enorme halo de implicações, de efeitos, de silêncios, de voltas e reviravoltas. É a partir das voltas e reviravoltas da leitura desse poema que construirei o meu excurso:

Esta Palavra MULHER! Esta linguagem feminina, porta-voz de ideias em que às vezes as mulheres não acreditam. Esta palavra MULHER, leito dum rio que não se sabe onde vai dar ...

Esta Palavra MULHER , feiticeira, forjadora de mistérios, nigromante na posse de todas as receitas da cabala...

Esta palavra MULHER, conciliadora da ordem e da aventura, da tradição e da invenção!

Esta palavra mulher nascida do medo tornado coragem; ideia que nos é magistralmente transmitida numa obra de Maria Câncio dos Reis (mulher de Soeiro Pereira Gomes, o homem que escreveu histórias para os homens que nunca foram meninos!) “Eles vieram de Madrugada”. Esta Mulher fala-nos da saudade do marido, preso político, mas também nos fala dos sentimentos partilhados entre mulheres, entre mãe e filha, entre ela e sua mãe: “A mãe chorava se ela chorasse e ela desejava que a mãe se fosse embora para poder chorar à vontade!

A coragem das Avós: mulheres duas vezes mães... Evoco aqui uma história contada num livro sobre a crise que se seguiu à implantação da República em Portugal, a história duma Ilustre Viscondessa que enquanto se trocam tiros entre Republicanos e Monárquicos, tendo o seu neto doente de difteria, se atreve a sair para a rua e subir a Rua Formosa, com o neto aconchegado ao peito, descer a Avenida, voltar a subir a rampa da Praça da Alegria, sempre debaixo do fogo cruzado, até entrar no Instituto Câmara Pestana até finalmente conseguir que o seu neto fosse assistido! Tanta coragem, num gesto tão simbolicamente feminino.

Esta palavra mulher, um corpo feito vontade de remar contra a maré...

Ao longo da História muitas foram as mulheres, a começar por EVA que se atreveram a remar contra a maré.

Três exemplos menos conhecidos:

1 - Dª Adelaide de Paiva, conspiradora contra a jovem República, presa na sequência do malogro do movimento de 21 de Outubro de 1913, ousada e frágil ao mesmo tempo. Conta-se que quando outro dos conspiradores monárquicos (o Marquês de Belas) lhe perguntou crê na vitória Srª Dª Adelaide? Ela lhe respondeu com radicalidade feminina COMO EM DEUS!, mas traída e abortada a conspiração, soluça mansamente enquanto o marquês ruge em desvario!

2 – Ainda durante o rescaldo dos combates ente monárquico e republicanos, à beira do primeiro conflito mundial, onde depois terá um papel de destaque o Pelotão de enfermeiras de Guerra: Dª Amélia Trigueiros, Dª Júlia de Azevedo, Lucinda Moreira e a fundadora da Cruzada das Mulheres Portuguesas (C/ sede no Limoeiro) Dª Ana de Castro Osório

3 – Por último, e também ligada à história da Implantação da República, Maria Guilhermina Ascenso que com as sua mãos uniu o verde-rubro da primeira bandeira da república a ser hasteada em Loures, no Largo que hoje toma o nome de Largo da República, no dia 4 de Outubro de 1910.

Mulheres de gritar tanta verdade, de ficar sempre de pé...

Alhandra, 8 de Maio de 1944, a marcha da fome: “E veio a hora em que a sereia da Fábrica e o sino da Igreja deram sinal que a marcha da fome se pusera a caminho: operários, acompanhados das mulheres e dos filhos começaram a caminhar direitos ao Largo da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, onde nunca chegaram pois foram brutalmente detidos pela polícia política...

Ai mulheres do nosso tempo... Mulheres de todos os tempos, Gertrude Stein: escritora americana nascida em 1874 e falecida em 1946, que poucos lembram. No seu tempo impôs-se não só pela sua obra, talvez quase desconhecida, mas mais pela sua presença. Interessou-se pela filosofia, pela psicologia, pela medicina. Em 1902 instala-se na Europa. Escreveu obras como Three Lives, ou a Autobiografia de Alice Toklas. Na sua casa encontravam-se escritores como Henimingway (por quem os Sinos Dobram) ou Scott Fitzgeral (Terna é a Noite e o Grande Gatsby), e pintores como Picasso ou Matisse. Aliás escandalizou a sociedade do seu tempo ao pendurar nas paredes de sua da sala as primeira obras cubistas de Picasso : “A fábrica” e “As casa na colina”.

Dizia ela que, “toda a obra prima veio ao mundo trazendo em si mesma uma certa dose de fealdade. Esta fealdade é o signo da luta do criador para dizer uma coisa nova, uma coisa diferente”, tal como qualquer a mulher, em si mesma uma obra de arte.

Esta palavra mulher feita de mães e amantes... Feita de Amor e cansaço.

Falo agora de ANGELICA, mãe de Apollinaire, mulher que no seu tempo teve a audácia de impor ao mundo dois filhos sem pai, mulher extravagante e imperiosa como só as mulheres que muito têm de se fazer perdoar podem ser!

E lembro o poema de Bridgman, que Picasso imortalizou num quadro onde plantou uma mulher de perfil graciosa, adormecida, nua sob um sudário já esfarrapado, os seios flácidos, o resto do corpo esfumado. Mulher que sonha e no seu sonho evoca um fantasma de homem de que são visíveis apenas a cabeça e a parte superior do corpo:
Somos virgens forçadas
A sê-lo por leis aborrecidas
Que nos tornam escravas
Dêem-nos a liberdade! Gozaremos o Amor
A túnica branca que envolve nossos corpos
Rasguemo-la: é a mortalha que oculta um tesouro.

Esta decisão de Mulher que recusa a ser palhaço!...

Não vou falar de figuras sempre evocada em cada 8 de Março: Maria Amália Vaz de Carvalho, Dª Filipa de Vilhena, Dª Filipa de Lencastre, nem sobre as duas rainhas portuguesa Maria I e Maria II, nem sobre a Rainha Stª Isabel ou a Rainha Dª Leonor .

Nem sequer falarei aqui da Maria da Fonte ou da Padeira de Aljubarrota as duas plebeias nacionais mais conhecidas.

Nem tão pouco irei falar de Irene Lisboa, ou Sophia de Mello Breyner Andersen nem de Maria Lamas que nos deixou essa fabulosa obra intitulada “Mulheres do meu País”

Vou falar de outras mulheres, uma menos lembrada, outra mal-amada pela História

1 - Dª Mércia de Haro chegada a Portugal por volta de 1240/1245 para casar em segundas núpcias dela (era viúva) com D. Sancho II, proclamado Rei aos 13 anos!

Como se sabe o casamento ao longo de séculos foi objecto de uma estratégia politico-económica, sendo as nubentes, em particular as de condição elevada, um instrumento ao serviço dessa estratégia. A principal finalidade do casamento era, então, construir alianças entre Estados, aumentar ou consolidar patrimónios. O casamento era um acto ritual e jurídico

O casamento de Dª Mércia com D. Sancho, desde logo visou fortalecer as relações comerciais entre o Reino e a Biscaia, mas a sua escolha não pode deixar de ser entendida por referência à debilidade mental do monarca e à necessidade deste ter um herdeiro. Mas esta mulher foi precisamente quem mais contribuiu para a queda de D. Sancho II, aliando-se ao seu cunhado, o futuro Rei D. Afonso III, O Bolonhês, (título que deve a sua mulher Matilde de Bolonha) que viria a ser o 5º rei de Portugal.

Não só não deu descendentes ao marido como se deixou fazer “prisioneira” em Ourém, aliás terra que recebera em dote. Do seu “cativeiro” concedeu benefícios vários, ” E até à sua morte manteve o Título de Rainha".

2- Dª Leonor Teles de Meneses, que viria a casar com o Rei D. Fernando.

A irmã de D. Leonor era dama duma filha de Pedro e Inês, outra mulher notável, mas que não irei falar aqui, por serem sobejamente conhecidas as suas penas e os seus amores. É através desta irmã (que se diz que D. Leonor vem a matar por ser um obstáculo à sua vontade de ser rainha) que D. Leonor conhece o monarca. Nessa época era casada e consegue a anulação do seu primeiro casamento com Lourenço da Cunha para casar com D. Fernando, no Mosteiro de Leça do Bailio. Este, cego de paixão, diz a História (escrita pelos homens), atreve-se a incumprir uma cláusula do Tratado de Alcoutim, que o obrigava a casar com uma infanta castelhana, (mais tarde vem a renegociar este tratado) e ousa enfrentar a oposição do povo de Lisboa: condena à morte o cabecilha dos revoltosos contra o casamento, o alfaiate Fernão Vasques.

Como é por demais sabido, após a morte do rei D. Fernando, D. Leonor toma o partido de D. Beatriz (Brites) sua filha e envolve Portugal numa crise que levaria ao início da II Dinastia.

Uma vez EVA.... Sempre EVA...

O masculino por si só já não representa a humanidade. Porém, ao nível da esfera pública ainda se faz sentir a exclusão das mulheres relativamente aos órgãos de tomada de decisão, ou pelo menos a partilha real do poder entre os dois sexos.

A problemática da igualdade de oportunidades entre o homem e a mulher, bem como a eliminação de comportamentos discriminatórios contra a mulher mantêm hoje plena actualidade e constituem objectivos programáticos com dignidade idêntica à defesa do ambiente, à atenuação de assimetrias regionais, à erradicação de pobreza, à melhoria do nível de educação. O 8 de Março é ainda e sempre uma data a manter viva na memória colectiva.

A problemática da igualdade é património da Humanidade e por isso Eu, Mulher, que sou o problema, sou também a sua solução.


ISABEL BATISTA
Caldas da Rainha



20 março 2005

Apito de lata

Um destes dias, tinha equacionado um texto sobre o "Apito Dourado". Assim uma coisa elaborada. Decidi não o fazer, porque as circunstâncias se modificaram nos últimos dias: fui constituído advogado de um dos mais recentes arguidos do processo. Daí a retracção...

Todavia, o que li nos jornais dos últimos dias animaram-me a não esquecer o tema. O que eu tencionava escrever era mais ou menos isto: o processo está a tornar-se numa coisa absolutamente desinteressante. O cerne da questão resume-se a arbitragens e a ligações perigosas entre agentes do futebol. Mas tudo dentro do futebol. Como se o futebol fosse a coisa mais importante deste país. Eu quero lá saber se o clube X ganhou ao clube Y porque houve tráfico de influências... E, para além dos fanáticos, alguém mais quer saber? Os contribuintes ficarão satisfeitos ao saberem que o dinheiro dos seus impostos é gasto a tentar descobrir estas coisas de faltas mal assinaladas?

Quando o processo começou, eu pensei que, finalmente, iria percorrer-se o caminho das ligações perigosas entre o futebol, as autarquias, os empreiteiros, coisas que verdadeiramente interessam ao presente e ao devir do país. Mas, não, nada disso, segundo as últimas notícias. Que frustração!

As escutas são nulas? Pois, parece que sim. É comovente que num processo desta envergadura e com os figurantes conhecidos não tenha havido cuidados acrescidos no respeito pela regularidade processual. Mas isso agora não interessa nada... Afinal o objecto do processo é uma coisa menor...

(Aproveito para esclarecer que o meu arguido não foi apanhado em escutas. É arguido porque, com as suas denúncias, ajudou a despoletar o caso. O que também é curioso...)

"A América está mais segura e o Iraque mais democrático"

os ditadores tambem se abatem

Noticiam os jornais que, em Madrid, na bonita praça de S Luis, foi finalmente desmontada uma imensa estátua de Francisco Franco. A direita espanhola dividiu-se. O catalão Piqué achou bem. O galego Mariano Rajov achou mal. Rajov não tem emenda: herdou o PP de Aznar e Fraga num estado paroxísitco: em vez de tentar perceber porque é que perdeu as eleições, chora a estátua equestre do caudillo.
A propósito: o caudillo e o seu bando de facínoras revoltosos mandaram executar, depois da guerra, mais gente do que a que morreu durante o conflito. A acusação era simples: rebelião! Está tudo dito. Já só resta uma estátua: Em Santander. vamos lá malta das Vascongadas: retirem-me esse monturo da vossa bela cidade!

Do El Pais de domingo: o "honrado" e "pobre" general Pinochet chegou a ter 125 contas em bancos, sob dezenas de pseudónimos. Quem o confirma é uma comissão do Senado norte americano e um juíz chileno. O general além de assassino era um gatuno. Sic transir gloria mundi.

A propósito de ditaduras e outras enfermidades da alma: acaba de sair em Espanha o notabilíssimo texto de Sebastian Haffner: "Alemania: Jekyll y Hide: 1939, el nazismo visto de dentro": o que era o Reich, visto por um alemão ariano que percebeu a tempo que a coisa não estava boa para as pessoas decentes.

PS: quarta feira, 23 de Março, começa no canal ARTE uma série documental sobre a resistência entre 39 e 45. só para quem tem tv cabo e power box....

Farmácia de serviço nº 2

Ognuno sta solo sull cuore della terra
trafitto da un raggio di sole:
ed è subito sera.
(cada um de nós está só sobre coração da terra/ varado por um raio de sol:/ e subitamente é noite.)

A farmácia, hoje, salda poesia e abre com um poema de Salvatore Quasímodo, prémio Nobel em 1959. Quem o quiser ler terá de pesquisar no mercado brasileiro ou, enchendo-se de coragem, ir ler em italiano: só fica a ganhar.

Cidadãos: em vez duma aspirina, um poema! Menos química e mais sol!

Proponho-vos dois excelentes poetas, editados in illo tempore pela excelente Centelha. Os livrinhos andam por aí á venda a rastos de barato. Em Lisboa, e aos Sábados de manhã, há uma espécie de feira de livros, na Rª Anchieta, ao Chiado: pés ao caminho e arejem uns trocos que estes livro são baratuchos.

De Luís Guerreiro: Guia de Salto

Levíssimo no ar
um pano seco tenso
luminoso

saia rasgada ou blusa
contamina o vento
da mancha viva
de tijolo e sangue

(poema V do capítulo mensageiros das calendas vermelhas)

De António Manuel Lopes Dias: País Ignorado

Às vezes uma
carta: “vou ficar por aqui
mais uns anos acumulando
neve debulhando
cisco histórico” e a tristeza
dentro da ironia o peso
dos nomes suas rugas
Às vezes uma
carta: diospiro aberto
na mão raiz de casa ou pátria
amigo para quem
já não tenho tabaco nem
palavras
(poema III de 6 cartas para amigos em viagem)

PS: o “Le Monde” com data de 18 de Março traz um suplemento especial de livros (8 páginas!!!) sobre Júlio Verne que, há dias, inaugurou esta farmácia.
O El Pais, com data de 20 repete a dose com seis páginas no seu suplemento Babelia
No dia 23, o “Público” oferece “Cinco Semanas em Balão”.

Avulso

O meu dia do pai foi um verdadeiro sucesso: o meu filho trouxe-me um presente, feito por ele, onde escreveu que quer ser como eu. Que melhor prenda pode um homem receber de um filho de oito anos?

O mundo está perigoso. Na semana passada, por terras de Espanha e de França, penei com temperaturas de 5 graus negativos. Ontem, em viagem, suportei 29 graus positivos. Hoje choveu. O mundo está perigoso. Será que a culpa é do governo?

Apetecia-me ir passar uns dias de férias fora. Não tenho dinheiro para isso. Um destes dias, um Mmo Juiz, que condenou a parte contrária como litigante de má-fé, em multa e indemnização, arbitrou os meus honorários. Fiquei indignado. Mais do que isso, envergonhado e, por causa disso, não digo quanto foi. É que contei à minha empregada doméstica e ela olhou-me com olhar sobranceiro. O canalizador olhou-me com ar desconfiado. É natural: eles ganham mais do que aquilo que o Mmo Juiz acha que eu devo ganhar... Bem, não me resta mais nada senão ficar por cá. A não ser que alguém me pague as férias. Eu até cheguei a pensar que o Incursões poderia fazer-me uma franqueza e pagar-me umas férias, sei lá, talvez no Porto Santo, a título de direitos de autor pelo insubstituível contributo que os meus textos têm dado para o prestígio do blog... Não se riam - não seria caso único... Li hoje no Expresso que há antecedentes muito semelhantes...

19 março 2005

PARA O DIA DOS PAIS



Poema Enjoadinho

Vinícius de Moraes



Filhos... Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!

________

DISCURSO SOBRE A SERVIDÃO VOLUNTÁRIA DOS HOMENS *

-excertos

por Etienne de La Boétie (1530-1563)

[……..]


No momento, gostaria apenas que me fizessem compreender como é possível que tantos homens, tantas cidades, tantas nações às vezes suportem tudo de um Tirano só, que tem apenas o poderia que lhe dão, que não tem o poder de prejudicá-los senão enquanto aceitam suportá-lo, e que não poderia fazer-lhes mal algum se não preferissem, a contradize-lo, suportar tudo dele.

[……..]

Tal entretanto é a fraqueza dos homens! Forçados à obediência, forçados a contemporizar, divididos entre si, nem sempre podem ser os mais fortes. Portanto, se uma nação, escravizada pela força das armas, é submetida ao poder de um só (como foi a cidade de Atenas à dominação dos trinta tiranos), não é de se espantar que ela sirva, mas de se deplorar sua servidão, ou melhor, nem espantar-se nem lamentar-se: suportar o infortúnio com resignação e reservar-se para uma ocasião melhor no futuro.
[……..]

Em primeiro lugar creio não haver dúvida de que, se vivêssemos com que os direitos que recebemos da natureza e segundo os preceitos que ela ensina, seríamos naturalmente submissos a nossos pais, súditos da razão, mas escravos de ninguém. Quanto a saber se em nós a razão é inata ou não (questão debatida a fundo nas academias e longamente agitada nas escolas de filósofos), penso não errar, ao acreditar que em nossa alma existe um germe de razão que, reanimado pelos bons conselhos e bons exemplo, produz em nós a virtude: ao contrário, esse mesmo germe aborta abafado pelos vícios que muitas vezes advém.

[……..]
Numa só coisa, estranhamente, a natureza se recusa a dar aos homens um desejo forte. Trata-se da liberdade, um bem tão grande e tão aprazível que, perdida ela, não há mal que não sobrevenha e até os próprios bens que lhe sobrevivam perdem todo o seu gosto e sabor, corrompidos pela servidão.
A liberdade é a única coisa que os homens não desejam; e isso por nenhuma outra razão (julgo eu) senão a de que lhes basta desejá-la para a possuírem; como se recusassem conquistá-la por ela ser tão simples de obter.

[……..]


Tomai a resolução de não mais servirdes e sereis livres.
[……..]

A verdade é que o tirano nunca é amado nem ama.
A amizade é uma palavra sagrada, é uma coisa santa e só pode existir entre pessoas de bem, só se mantém quando há estima mútua; conserva-se não tanto pelos benefícios quanto por uma vida de bondade.O que dá ao amigo a certeza de contar com o amigo é o conhecimento que tem da sua integridade, a forma como corresponde à sua amizade, o seu bom feitio, a fé e a constância.
Não cabe amizade onde há crueldade, onde há deslealdade, onde há injustiça. Quando os maus se reúnem, fazem-no para conspirar, não para travarem amizade. Apóiam-se uns aos outros, mas temem-se reciprocamente. Não são amigos, são cúmplices.
Ainda que assim não fosse, havia de ser sempre difícil achar num tirano um amor firme. É que, estando ele acima de todos e não tendo companheiros, situa-se para lá de todas as raias da amizade, a qual tem seu alvo na equidade, não aceita a superioridade, antes quer que todos sejam iguais.

* o texto completo do Discurso pode ser lido, entre outros locais (está editado em Portugal por ed.Antígona) - em http://www.geocities.com/Athens/Column/8413/servidao.html

18 março 2005

QUANDO O MAL É DE NAÇÃO,

NEM A PODER DE SABÃO

Ou
PROVÉRBIOS E LUGARES-COMUNS TRANSFORMISTAS
no É dia de sessão, de Clemente Lima.

O metro do Porto na Asprela (2ª parte)

Agora que a chegada do metro do Porto ao Hospital de S. João se tornou assunto de preocupação pública, com tomadas de posição de médicos, utentes e, pelo menos, de um recém-eleito deputado do PS, acompanhando finalmente a "resistência" quase isolada da Faculdade de Medicina do Porto, recordo o que aqui escrevi no início do mês passado.
A cidade e a universidade não podem ficar indiferentes a um projecto e a uma obra determinantes para o futuro de toda a zona da Asprela, uma das principais entradas da cidade e onde se insere um dos maiores pólos universitários do Porto.

Perdi a visão do Incursões

Tenho tentado desde há alguns dias aceder ao INCURSÕES e recebo sempre uma mensagem a dizer que o servidor não encontra o endereço.

Através de www.blogger.com consegui entrar numa página que me informa que posso introduzir texto no blog.

Vou tentar.

Se alguém souber como é que consigo resolver este problema e voltar a entrar no Incursões, por favor envie e-mail.

Programa do Governo para a Justiça

Ver aqui.

Destaque do dia:

5. Qualificar a resposta judicial

Para o Governo, a melhoria da resposta judicial é uma prioridade que passa por medidas de descongestionamento processual eficazes, pela garantia do acesso dos cidadãos ao sistema judicial, dando-se cumprimento ao disposto no artigo 20º da Constituição, pela gestão racional dos recursos humanos e materiais do sistema judicial e pela valorização da formação e das carreiras dos profissionais da Justiça.
(...)
A gestão racional do sistema judicial requer o ajustamento do mapa judiciário ao movimento processual, a adopção de um modelo de gestão assente na valorização do presidente e do administrador do tribunal e a reavaliação do período de funcionamento dos tribunais. Igualmente, o melhoramento da organização e funcionamento dos conselhos superiores das magistraturas tornam-se necessários para o exercício efectivo das respectivas competências.

Constituem medidas a destacar neste domínio: a agilização dos mecanismos de gestão de recursos humanos, designadamente através da possibilidade de colocação de magistrados e oficiais de justiça em tribunais que se insiram numa determinada área geográfica; a consagração do princípio da carreira plana dos magistrados judiciais e do Ministério Público, permitindo uma progressão profissional não condicionada pelo grau hierárquico dos tribunais e conferindo maior liberdade de escolha dos magistrados segundo critérios de competência e vocação profissional; e a formação específica nas áreas da gestão do tribunal e da movimentação processual para combater a morosidade e a pendência.

Para valorizar e dignificar as carreiras, deve promover-se a diversidade de competências dos candidatos a magistrado e melhorar-se o modelo de formação inicial e permanente, em articulação com a formação de advogados e de outras profissões jurídicas. Também neste sentido, devem ser aperfeiçoadas as formas de acompanhamento e avaliação do desempenho dos magistrados, valorizando a qualificação, o mérito e a transparência na evolução profissional, nomeadamente no acesso aos tribunais superiores.

O Governo incentivará, ainda, a articulação entre as universidades e as instituições responsáveis pela formação dos profissionais da Justiça, fomentando, nomeadamente, o desenvolvimento de projectos adequados a melhorar o funcionamento do sistema judicial.

Declaração de princípios

Houve um tempo, em que isto era Os Cordoeiros. Tinha uma impressão digital própria, vinda da Cordoaria (ou de parte dela), blog "dedicado a temas (sobretudo) da área judiciária." Havia regras próprias, havia postais que eram impublicáveis, porque poderiam contender com os princípios da Cordoaria.
Depois, isto passou a ser uma instância de retemperação. A impressão digital originária continuou, mas de uma forma muito mais esbatida. Já não era uma conversa sobretudo à volta do judiciário e do sistema de justiça, mas um espaço onde pessoas do direito e de outras áreas podiam trocar impressões, dizer coisas sérias sobre o direito e para além do direito, outras vezes coisas simples e banais. E eu tornei-me especialista das coisas simples e banais, com os meus postais intimistas, com as minhas provocações inofensivas, com os meus silêncios sugestivos.
Tal como disse aqui um dia, pela minha parte eu tentei que isto fosse um blog "familiar", um espaço de convívio, uma janela policromática para o mundo. Com polémicas, certamente (assim se faz um blog, não é?), mas sempre com os olhos postos na retemperação. Se não entendesse as coisas assim, o tempo que aqui perco, gastá-lo-ia a escrever coisas supostamente mais sérias para os jornais e ganhava dinheiro com isso.
Muitas vezes, calei-me. Completamente em desacordo com posições radicais que por aqui se estenderam. Em desacordo com o facciosismo. Em desacordo com a ortodoxia. Em desacordo com os dogmas. Creio que nunca me senti desconsiderado e creio que nunca desconsiderei ninguém.
Entendo isto como um espaço plural. Como um blog onde cabem todas as opiniões. Como uma tertúlia diversa, que - apesar disso - não transforma este blog num "albergue espanhol" ou, mais simplesmente, num "albergue". A não ser que haja quem entenda que a divergência de opiniões num mesmo espaço seja um albergue (espanhol ou não).

Gostava que as quezílias - as que funcionam em circuito fechado e as outras... - não passassem por aqui. Entendamo-nos: isto não é um blog do Ministério Público. Nem um blog das guerras do MP. Ou então, sou eu que estou enganado. Se tiver a certeza disso, "mais dia, menos dia, sem aviso..."...

17 março 2005

A hermenêutica

No conceito «hermenêutica» está implícito o nome de Hermes, que, segundo a tradição mítica, era mensageiro dos deuses. Isto é, alguém que tinha o dom de interpretar as palavras dos deuses.
A hermenêutica pode, em termos gerais, ser definida como teoria ou filosofia da interpretação (da arte, da história, dos textos, etc.), visando eliminara margem de erro, objectivo ou subjectivo, da interpretação da informação contida num documento. O intérprete para ser fiel à informação não pode abstrair-se da maneira de ser do autor do documento, do seu ambiente cultural, social, político, económico e até religioso, bem como do clima e do meio familiar. Isto é, não pode abstrair daquilo que pode constituir a tradição que influencia o autor ou que o contextualiza. É preciso compreender o “jogo de linguagem” utilizado pelo falante. Originalmente, a hermenêutica era uma exegese dos Textos Sagrados. Procurava interpretar o sentido literal, alegórico, etc. da Bíblia. A hermenêutica como actividade filosófica surgiu com Heidegger (1889-1976) e desenvolveu-se, sobretudo, com H.G. Gadamer (Marburgo,1900) e Ricoeur. Heidegger lembrou que o ser humano, ao desvendar o mundo, desvenda-se a si próprio. Isto é, descobre o seu significado no mundo, interpretando o sentido do mundo. Com Wittgenstein, a hermenêutica passou a designar uma técnica de desvendar o sentido oculto presente num “jogo de linguagem”.

A propósito de Ludwig Wittgenstein

L. Wittgenstein nasceu em Viena de Áustria (1889) e morreu em Cambridge (1951). Estudou engenharia que abandonou para se dedicar à filosofia. Foi discípulo de Bertrand Russell. É considerado o filósofo da mudança do paradigma cognitivista para o da linguagem. Durante a Segunda Guerra Mundial redigiu o “Tratatus Logicophilosophicus” que havia de marcar o positivismo lógico. Mais tarde, escreveu as “Investigações Filosóficas”. Estas duas obras estão traduzidas pela Fundação Calouste Gulbenkian.
Nas “Investigações Filosóficas”, Wittgenstein introduz o conceito de “jogos de linguagem”.
Compara a linguagem a uma caixa de ferramenta: as palavras são como etiquetas que colocamos no lugar onde estão as ferramentas e não um “retrato” da realidade. Só pode ser compreendida a significação de uma ferramenta conhecendo-se a sua função e a actividade humana que a utiliza. Sabemos, por exemplo, o que é uma sovela se soubermos que «serve para cortar o couro e é usada pelos sapateiros». E assim como os jogos de ferramenta estão associados a certas funções e actividades, também os “jogos de linguagem” se prendem com determinadas “formas de vida”. Além disso, tal como um jogo obedece a regras e instruções que, embora arbitrárias, são aceites tacitamente pelos jogadores, o uso das palavras prende-se com práticas colectivas quotidianas, que têm as suas próprias regras, muito embora não lhes prestemos grande atenção, mas que determinam o uso e, consequentemente, o significado das palavras. Elucidar o sentido e significado do uso das palavras obriga a procurar os contextos de uso, os quais são dados pelo estabelecimento de relações entre «formas de vida» e «jogos de linguagem». Há diferentes jogos de linguagem porque há diferentes «formas de vida».
Um conflito de interpretação dá-se pelo não enquadramento das palavras no respectivo “jogo de linguagem”. Nesse caso, utilizam-se as mesmas palavras, mas é-lhes dado um sentido diferente. A hermenêutica pode ser entendida como uma técnica para desvendar o sentido oculto das palavras num determinado “jogo de linguagem”.

16 março 2005

provincianos,diz ele...

No “Público” de 13 de Março, o principal responsável pelo “Metro” do Porto vem a terreiro defender a sua dama e desancar as pessoas que se opõem à construção de uma linha de metro de superfície na Av. da Boavista.
Recordemos resumidamente um par de argumentos dos contestatários cidadãos que tanto escandalizam o Sr. Eng. Marques. O metro com a obrigatoriedade de via dedicada ocupará a faixa central da Avenida, impedindo o transito de autocarros e táxis por essa via. Identicamente impedirá os automóveis de utilizarem alguns pequenos troços da via central para efectuar viragens á esquerda. Remeterá assim todos quantos pretendam virar á esquerda para o miolo dos quarteirões adjacentes cujas ruas são normalmente estreitas e estão já saturadas. Impedirá finalmente que se concretize a ligação da marginal do Douro a Matosinhos-sul por eléctrico e a instalação de uma linha de eléctrico entre o castelo do Queijo e a rotunda da Boavista onde se estabeleceria o interface com a estação de metro “Casa da Música”. Note-se que de Matosinhos-sul ao Castelo do Queijo já existe via dupla e ainda não estreada de eléctrico e que a linha da marginal está pronta até à foz do Douro faltando apenas completá-la durante a marginal marítima da cidade (Rª do Passeio Alegre e avenidas do Brasil e Montevideu). Falta igualmente a linha da Avenida da Boavista. Entendem os ingénuos e mal avisados contestatários do metro que só assim terão coerência os investimentos já feitos na eventual rede de tracção eléctrica e no viaduto entretanto lançado por sobre o parque da cidade. Tanto mais que a instalação do metro obriga a novo viaduto (mais um!) e implica, segundo informação pública e publicitada, um investimento cinco vezes superior ao do eléctrico ligeiro. (Quem quiser melhores informações terá de entrar no blogue “a baixa do Porto”).
E que vem então dizer o Sr. Engenheiro?
Vem dizer a) que está “ansioso” por poder debater o projecto da linha na Assembleia Municipal visto que esta (ao contrário daquele grupelho de cidadãos) é uma instituição legitimada para este debate; b) que o metro é um “problema metropolitano” e não apenas da cidade; c) que este abaixo assinado (que “lhe parece bem para mostrar uma disposição”) com “o tom com que é lançado, [ é] uma espécie de sucedâneo de referendo”, lhe parece ”provinciano” (!!!); d) que “aquilo é o início duma linha Nascente-Poente que não existe e que mais cedo ou mais tarde vai ter de existir” e) que uma discussão destas merece “uma reflexão cuidada e nos órgãos legitimados”; f) que se a sociedade civil não der “suporte ao projecto ...marcante...estratégico essa linha não vai ser construída porque aparecerá junto do Governo como uma proposta débil”
Ora vejamos. Vamos piedosamente acreditar que terá havido apesar de isso não ser visível, um resumo do que o Sr. engenheiro Marques quis dizer. É que nem a redacção é brilhante, sequer mediana, como também tão depressa ele fala da Assembleia Municipal do Porto como dum projecto metropolitano (onde entram ao que consta outros vários e mais populosos concelhos (Matosinhos, Maia, Gondomar e Gaia só para citar os mais próximos). Eu sei bem que um engenheiro não tem que saber demasiada geografia nem, muito menos, qual a competência dum órgão autárquico mas enfim... est modus in rebus.
Alguém de mau carácter poderia vir dizer que é a primeira vez que se fala de uma linha poente nascente e que isso é uma batota pouco digna numa discussão já aberta.
Fico encantado com a afirmação de que a Assembleia Municipal é um viveiro de pessoas que a tornam num órgão legitimado e preparado para esta discussão que o Sr. Engenheiro proclama técnica e estratégica. Também acho que há que dignificar esse areópago político que por vezes se perde em discussões um tanto ou quanto mesquinhas. Diria porém, pedindo desculpas ao novel politólogo e engenheiro, que a AM discute fundamentalmente política. E por aqui me fico.
Abismou-me a opinião contundente, mas seguramente esclarecida e digna de ser passada à posteridade, sobre os abaixo assinados. Bons para mostrar uma disposição mas péssimos quando se parecem com referendos. Alguém com má vontade poderia pensar que o Sr. engenheiro Marques não sabe o que é (e quais são os limites de) um abaixo assinado. E nesta maldosa onda de cavilações impróprias de uma pessoa de bem, também se poderia pensar que o referido Sr. engenheiro não tem qualquer noção do que seja ser “provinciano”. Claro que em defesa deste estrénuo profissional sempre se poderá dizer que o cosmopolitismo que se lhe reconhece (quanto mais não seja no corte de cabelo) lhe possibilitará enxergar com rotunda clareza o provincianismo com que brinda os que ele, no seu douto parecer, julga serem seus adversários. Não se pede ao Sr. engenheiro Marques um qualquer exercício de pensamento quanto ao que, à falta de melhor, chamaríamos uso das mais elementares regras de discussão democrática (oh horrível e malfadada palavra!). Sª Ex.ª entende que um inocente abaixo assinado que não cumpra a sacrossanta meta de mostrar “uma disposição” ( e por aí se fique...) é um abuso sobretudo se pretender substituir-se a um referendo!!! Eu não sei se não será de propor ao Professor Canotilho um doutoramento honoris causa para um constitucionalista do jaez do nosso querido engenheiro. Um talento com tal robustez não devia sequer ter de aturar a maçada de, numa entrevista, ter de rebater esta horda de provincianos ineptos que tentam por meios tão gravosos convencer a “sociedade civil” a debilitar a proposta a fazer ao Governo.
Um outro Oliveira, o falecido Dr. António de Oliveira Salazar não era engenheiro mas quanto a argumentos também não pedia meças a ninguém. Dizia ele que “se os portugueses soubessem quanto custa mandar prefeririam obedecer toda a vida” . Traduzindo no actual tecno-português à moda do Porto: cidadãos caluda que disto percebemos nós.
Foi com argumentos assim que se fizeram o Cachão, Sines e o Alqueva para só citar três aberrações. O dinheiro (dos contribuintes) é para gastar. O papel deles é calarem-se para não passarem por lorpas ou por...provincianos.
Já agora: porque não propor em vez duma ponte, uma nova travessia do Douro por submarino? Caramba! Isso nem os gajos de Lisboa têm!...
m.c.r.

Farmácia de serviço nº 1

1. O ano (como todos os restantes, há que dizê-lo...) é farto em comemorações e centenários. Comecemos, então, por Júlio Verne, escritor bem mais interessante do que corre por aí. Homem profundamente comprometido com o seu tempo, generoso e optimista fez a apologia do progresso técnico, científico e humano do seu tempo. O Público vai publicar uma recolha de doze das suas obras. Vale a pena ir até www.jules-verne.net

2. jfurtadocoelho.vega@oninet publicou em versão computador ALMADA DIXIT. Com jeito se lhe pedirem bem, talvez ceda um volume. Trata-se de uma recolha inteligente de pequenos textos de Almada Negreiros. Com um prefácio notável mas leve e bem humorado. Chama-se o autor João Furtado Coelho, vive em Lisboa, escreve bem e sabe do que fala. Aproveitem!

3. Há anos que faço traduções. Dois livros traduzidos no ano passado, foram muito bem referidos pela crítica e deram-me especial prazer. Ei-los: "Cem garrafas numa parede" de Ena Lucia Portela. Uma jovem escritora cubana, vivendo em Cuba, critica e inteligente. Um livro feroz e brilhante. Uma história bem contada que se desenvolve como um romance policial.
De Jesus del Campo, espanhol de Guijon: "As últimas vontades do cavaleiro Hawkins": um romance que se constroi sobre um sem número de histórias que se entrelaçam. Hawkins não é mais nem menos do que o Jim da Ilha do Tesouro: regressado a Inglaterra, e riquíssimo, o jovem Jim compra a estalagem onde tudo começara, e leva uma vida de cavalheiro enciclopedista. Os seus visitantes contam histórias fabulosas que perfazem a educação de Jim. Uma imaginação impar, um estilo brilhante, dum autor surpreendente que Luis Sepulveda considera um valor mais que seguro da moderna narrativa castelhana.

PS: entendi ir pondo apontamentos destes sempre que achar que valem a pena os temas e não houver reclamações. O título será sempre o mesmo, mudando apenas a numeração. Trata-se de uma pequena homenagem a Fielding, autor do Tom Jones e reflete um agradecimento sincero à pessoa que me tem ajudado a perceber como se utiliza o blogue.
mcr

Uma declaração eloquente

Rosado Fernandes, o professor de latim que presidiu longos anos à CAP e que foi deputado europeu do CDS, publicou ontem uma declaração, sob a forma de publicidade, no jornal "Público", onde dizia que o facto de ter acusado em 1998 o então ministro da Agricultura, Gomes da Silva, de ter uma doença pior do que a esquizofrenia e de alimentar compadrios e clientelismos à volta do seu ministério foi motivado por razões de aproveitamento político. Dizia também que não tinha quaisquer elementos que suportassem essas afirmações.
Eis um exemplo paradigmático da política trauliteira, sem preocupações éticas ou deontológicas de qualquer espécie. E agora, quem leu esta declaração? Quem vai fazer o "reset" das afirmações então proferidas? O que vale a honra de uma pessoa ofendida por um arrivista destemperado? Este exemplo faz-nos pensar.

Discurso de posse do Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados

Pode encontrar-se aqui.

15 março 2005

A coligação dos interesses

Como já aqui foi anunciado, as Distritais do Porto do PSD e do CDS chegaram a acordo para formar uma coligação eleitoral no Marco de Canaveses, que será encabeçada pelo actual vice-presidente de Ferreira Torres. Estou certo de que esta coligação é feita ao arrepio da vontade da maioria dos sociais-democratas marcoenses e envergonha todos aqueles que apoiaram e votaram nas últimas eleições autárquicas no projecto apresentado pelo PSD e liderado por Coutinho Ribeiro.
Esta coligação em perspectiva limita-se a fazer a soma dos vários interesses partidários e aparelhísticos e remete para segundo plano quaisquer preocupações com opções estratégicas relevantes para o futuro do Marco de Canaveses. Aliás, a JSD do Marco já veio a público defender ardentemente a coligação, dizendo que “este acordo permitirá também uma renovação política clara e inequívoca no concelho”. Quem conhece a realidade e os actores políticos envolvidos sabe quão ridícula é esta conclusão. Será mais do mesmo, com tendência para piorar.
Afinal, nada de que não estivesse à espera quando aqui dei conta da minha demissão da Assembleia Municipal de Marco de Canaveses em Dezembro último.

o fim de uma insensatez

Os jornais noticiam que as Secretarias de Estado deslocalizadas regressam a Lisboa. Ora aí está uma medida de higiene político administrativa que se sauda vivamente. Nada explica o afã semeador de Secretarias de Estado pelo território nacional. Vá lá que ninguém se lembrou de mandar um par delas para Porto Santo e para o Corvo. No segundo caso ainda se percebe. Os Açores eram governados pela oposição. Já quanto a Porto Santo julgo que terá sido o dr Alberto João que se opôs por lhe parecer uma medida (mais uma!) comprovante do colonialismo do Terreirpo do Paço.
O mal inspirado Dr. Santana Lopes, por ora triunfalmente regressado à Câmara Municipal de Lisboa (coisa que alegrou o coração de todos os bairristas do Porto que esperam que a sua governação acabe a tarefa do sismo de 1755) achava que a democracia e a descentralização administrativas se resolviam com o pobre artifício de oferecer às terras mais fieis um simulacro de poder central. Pouco lhe importava saber que nem um dos funcionários era enviado para esses cafundós, antes se recrutando in loco meia dúzia de pressurosos afilhados em cata de 1º emprego. A lei de facto permite que o funcionário se recuse a ser deslocalizado para uma distância superior a 30 quilómetros. O que tem como consequência ter de se recrutar no local meia dúzia de pessoas que abram a porta, atendam o telefone, varram o lixo, recebam os improváveis impetrantes que aí se deslocam etc... etc...
Entretanto os resistentes à deslocalização ficam no seu habitual poiso, se as intalações continuarem abertas. Ou vão até casa onde comodamente e sem risco de constipações recebem o ordenado ao fim do mês. Um que outro, possuído pelo secreto vício do amor à res publica, pede transferência para algum quadro remanescente onde mesmo que não seja especialmente necessário irá fazer qualquer coisinha.
Quanto aos responsáveis políticos e aos altos quadros a coisa fia mais fino e pode tornar-se numa espécie de regabofe: em primeiro lugar no caso de estabelecerem residência (ou apenas alugarem um quartinho na terra da deslocalizada Secretaria) têm direito a subsídios específicos, ajudas de custo e outras pequenas benesses. Como, de todo o modo, as coisas continuam a fazer-se em Lisboa, na sede do Ministério, lá se aumentam as despesas com viaturas, motoristas, e se perde o dobro senão o triplo do tempo com idas e vindas. Os fins de semana começam mais cedo e acabam mais tarde. E por aqui me fico neste rosário de alucinado escândalo e de custosas incompetência. Um certo dia tudo acaba. As casas alugadas voltam à posse dos legítimos proprietários carregadas de benfeitorias útei , inúteis e sumptuárias. Às vezes até dão direito a indemnizações. Os contratados no local ou são transferidos para serviços centrais, entrando no quadro pela porta dos fundos, ou são recolhidos pelos poderes locais que assim aumentam o seu efectivo de pessoal inútil mas politicamente protegido.
Tudo isto vem a propósito de um pequeno e torpe escandalozinho, com dez anos de duração. De facto o inimitável Dr. Santana, quando era Secretário de Estado da Cultura, no último consulado cavaquista, lembrou-se de deslocalizar a Delegação Regional de Secretaria de Estado da Cultura. Do Porto mandou-a para Vila Real, onde como é sabido, fervilhavam organismos culturais, criadores e instituições. Nenhum dos cerca de vinte funcionários da Delegação do Porto aceitou ir para tão longe. Alguns foram recuperados por um efémero Instituto que Lopes criou a partir do nada para fazer coisa nenhuma.
Outros, três ou quatro, foram aproveitados pelo IPPAR. Sete funcionários (entre os quais três técnicos superiores) foram para casa onde ainda estão, e continuam, tranquilamente a receber os seus ordenados enquanto não lhes concederem uma meritória reforma. Um, por acaso o responsável da Delegação, que também é quem estas mal traçadas linhas vai escrevendo, pediu transferência para o Centro Regional de Segurança Social do Norte, onde ainda permanece. E isso porque, quando pretendeu regressar a esse efémero instituto, para um lugar do quadro (assessor principal), foi-lhe respondido por um tal Xavier, presidente da dita instituição, que não era oportuna a sua vinda.
Deus, que escreve direito por linhas tortas, também já providenciou que o referido director geral fosse mandado embora pelo mesmo Secretário de Estado que o tinha nomeado. O dito Secretário foi pouco depois despedido pel o 1º Ministro. Não porque, como se pensou, tivesse afirmado a excelência dos concertos para violino de Chopin. Mas apenas e tão só por mera incompetência geral.
Passou pela Figueira da Foz onde plantou uma dúzia de palmeiras no areal e deixou a Câmara endividada. Em Lisboa, para cuja câmara regressou quase clandestinamente, já tem um buraco feito. A malta de esquerda reza fervorosamente para que ele anuncie a sua recandidatura: sempre é meio caminho andado para o PS só ou coligado ganhar as eleições municipais.
Muss es sein. Soll es sein.
Ou seja, que seja assim, tem de ser assim.

mcr
+

Mais dia, menos dia, sem aviso...

14 março 2005

VIVAM APENAS

Vivam, apenas
Sejam bons como o sol.
Livres como o vento.
Naturais como as fontes

Imitem as árvores dos caminhos
que dão flores e frutos
sem complicações.

Mas não queiram convencer os cardos
a transformar os espinhos
em rosas e canções.
E principalmente não pensem na Morte.
Não sofram por causa dos cadáveres
que só são belos
quando se desenham na terra em flores.

Vivam, apenas.
A Morte é para os mortos!

José Gomes Ferreira

(surripiado daqui)

O contra-governo provocatório

ver aqui a composição

"Este governo feminino e provocatório destina-se apenas a contestar alguns lugares comuns correntes ou desculpas de última hora. Afinal, entre socialistas, semi-independentes e independentes próximos do PS, não é tarefa difícil elaborar um elenco de mulheres em que a competência, a qualidade dos currículos e até, na maior parte dos casos, a experiência política nada ficasse a dever aos actuais ministros. Não seria invejável o papel da primeira-ministra Elisa Ferreira para coordenar este Executivo ficional, mas verosímil. Claro, algumas das indigitadas recusariam, por motivos políticos ou profissionais. Outras ficariam a aguardar a próxima oportunidade. O caso Vitorino não é exclusivo do "género" masculino e os poderes de quem forma o Governo - neste aspecto percebemos Sócrates - têm os seus limites."

Por Mário Mesquita e Ana Sá Lopes, no Público.

Um blog em circuito fechado

13 março 2005

metáfora e pó - VII



qual a metáfora que nos ressuscita,
o ar que respirado renova,
mudando-nos o olhar para a vida,
tornando-o vivo?

qual a palavra ou ato
que resgata a vida
e nos faz antes de pó,
sublimemente humanos,
no gozo e na lágrima?

a que nos ergue acima do pó
faz de nós irmãos, amantes,
próximos do outro,
sem medo de abraçá-lo?

qual a palavra desejante
o sussurro, o vôo largo,
o oceano vastíssimo,
nossa razão e loucura ?

silvia chueire

~ ~ ~

Mais coincidências:

ao
Incursões falta, cada vez mais, este acento.


"NÃO É CINEMA"

na Associação Abril em Maio, sempre às segundas, 22h
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Amanhã, 14 de Março

'PORTRAIT CROISÉ' DE SIMONE DE BEAUVOIR E JEAN-PAUL SARTRE"
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Madeleine Gobeil-Noel e Claude Lanzmann (1967)
(entrevistas para a Radio-Canada) 60'

O MP tem sido o elo mais fraco do sistema

A entrevista que António Cluny, ontem eleito Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, concedeu ao jornal O Diabo, em 8/3/05, pode ser lida, com proveito, aqui.

(nota: título da minha responsabilidade)

Juegos de agua

Maurice Ravel (1875-1937)

e

Dulce María Loynaz (Cuba, 1902)


Los juegos de agua brillan a la luz de la luna
como si fueran largos collares de diamantes:
Los juegos de agua ríen en la sombra...Y se enlazan
y cruzan y cintilan dibujando radiantes
garabatos de estrellas...

Hay que apretar el agua
para que suba fina y alta...Un temblor de espumas
la deshace en el aire; la vuelve a unir...desciende
luego, abriéndose en lentos abanicos de plumas...

Pero no irá muy lejos...Esta es agua sonámbula
que baila y que camina por el filo de un sueño,
transida de horizontes en fuga, de paisajes
que no existen...Soplada por un grifo pequeño.

¡Agua de siete velos desnudándote y nunca
desnuda! ¡Cuándo un chorro tendrás que rompa el broche
de mármol que te ciñe, y al fin por un instante
alcance a traspasar como espada, la Noche!

Dulce María Loynaz

Venda livre de medicamentos de venda livre: a bem da nação

Parece que, em breve, os atulhados carrinhos que as famílias portuguesas (estatísticamente constituídas, soube hoje, por 3 pessoas e meia) colectivamente empurram, orgulhosas, ao fim de semana nos hipermercados, vão passar a ostentar também a aspirina, o colírio, a pomada para as dores muscalares e toda uma interminável panóplia de medicamentos de venda livre (leia-se, que podem ser vendidos sem receita médica).

Diz o nosso primeiro, absolutamente maioritário, que a bem do consumidor - e a gente, até prova em contrário, acredita (pois não fora ele e as facturas detalhadas da PT, o controle das malandrices das seguradoras e certamente muito mais que já não me lembro, ainda seriam hoje uma miragem).
Então é assim: por um lado, a concorrência fará baixar os preços (será que também vai haver promoções? e estarão, ao menos uma vez por outra, incluídos nos "produtos de folheto"? e não dará mesmo esta inovação lugar à criação de mais postos de trabalho - especialistas em marketing e exposição de medicamentos, p. ex.?);
por outro lado, quem quer que ainda teime em viver naquelas inóspitas regiões da interioridade, onde a farmácia mais próxima fica, no mínimo, a umas dezenas de quilómetros, passará a encontrar, ao virar da porta, os adequados paliativos para uma aziazita mais inesperada e traiçoeira.
Bizarro, pensei. Que interior é esse onde não há farmácias por perto, mas há hipermercados?! Bem sei que do país real nada sei, a tal ponto que me passou pela cabeça, num momento de desvario, que não faltará muito para vermos justificada a abertura de mais um hiper, nalguma região mais desfavorecida, com a necessidade de levar os medicamentos para mais perto das populações (deve ser, aliás, nessa antevisão, que o presidente da Câmara de Viana do Castelo pondera seriamente dotá-la de 4 hipers - mais 2 para além dos 2 já existentes).

Desculpem esta tergiversação. O que eu queria realmente saber era a vossa opinião, avisados leitores, sobre outra ideia tresloucada que me passou pela cabeça (não por acaso tenho andado arredia das lides bloguistas):
- é sabido, de todos quantos já pretenderam obter uma simples factura de compras num hipermercado, que depois de penar na bicha de pagamento, há que penar numa outra bicha de um balcão distante e multifunções - o que em regra dissuade de obter a factura todos quantos não necessitem dela por razões de sobrevivência;
- é de prever, assim, que dos medicamentos vendidos em hipermercados poucos serão os levados à conta de despesas a abater em sede de IRS (als. a) e b) do nº 1 do art. 82º do CIRS) ;
Indo aos finalmentes: não terá a medida ora anunciada por Sócrates e já contestada pela ANF (todos sempre a bem da nação), um mui mais nobre objectivo que os publicamente já anunciados e acima referidos, a saber, o aumento das receitas fiscais e, consequentemente, a diminuição do défice orçamental, sem necessidade de subir os impostos?
Mas se é assim, porque é que não nos contaram? Só poderíamos aplaudir, né?

O Bem Amado

Foi-se o direitos, chegou o Neco Pedreira.
Ele há cada coincidência!
(para maior aprofundamento desta temática sugere-se leitura da obra completa de Paul Auster).

12 março 2005

Um espaço que fica vazio...

O blawg Direitos anuncia o seu termo:

The end

Ele e eu, ou, como diria um de nós, ambos os dois, decidimos terminar por aqui. Um irá dedicar-se à poesia; outro irá dar mais atenção aos fósseis que recolhe em Alcabideque. Agradecemos aos que, com boa vontade, nos leram e deram sugestões. Como nos filmes, talvez haja, algum dia, um remake.

Posted by: at / 10:31 AM

Um blawg que deixa marcas e o vazio dum silêncio.
Espera-se que o(s) seu(s) autor(es) apareça(m) noutro sítio qualquer.
Bem haja(m)!

Eleições no Sindicato dos Magistrados do Ministério Público

Realizaram-se hoje as eleições para os corpos sociais do SMMP.
Como era de esperar, foi eleita a única lista concorrente, liderada por António Cluny, que se apresentou sob o lema A mesma ideia, novas propostas, um outro alento e que obteve a seu favor 192 votos (89,72%). Houve ainda 15 votos brancos e 7 nulos. Alguns outros, mais de uma dúzia, não foram admitidos por os votantes estarem inscritos há menos de seis meses.
Votou uma percentagem de cerca de 23% dos recenseados e a votação por correspondência atingiu cerca de 75% dos votantes.
Agora, mãos à obra!
(actualizado em 14/3)

The White Horse


John Constable, The White Horse, 1918
The Frick Collection, New York

"Sartre e depois"

"Sartre e depois" é um execelente artigo de Augusto Santos Silva, hoje, no "Público" (já consigo linkar).
A melhor forma de comemorar o centenário de um filósofo é ler a sua obra. Transcrevemos um pequeno texto que julgamos ser significativo daquilo que podemos designar por "condição do intelectual" a que, no fundo, se refere Santos Silva, nesse artigo de despedida de articulista.

"Mas se verdadeiramente a existência precede a essência, o homem é responsável por aquilo que é. Assim, o primeiro esforço do existencialismo é o de pôr todo o homem no domínio do que ele é e de lhe atribuir a total responsabilidade da sua existência.(...)Escolher ser isto ou aquilo, é afirmar ao mesmo tempo o valor do que escolhemos, porque nunca podemos escolher o mal, o que escolhemos é sempre o bem, e nada pode ser bom para nós sem que o seja para todos. Se a existência, por outro lado precede a essência e se quisermos existir, ao mesmo tempo que construímos a nossa imagem, esta imagem é válida para todos e para toda a nossa época. Assim, a nossa responsabilidade é muito maior do que poderíamos supor, porque ela envolve toda a humanidade. (...)Se Deus não existe, fica o homem, por conseguinte, abandonado, já que não encontra em si, nem fora de si, uma possibilidade a que se apegue. Antes de mais nada, não há desculpas para ele. Se, com efeito, a existência precede a essência, não será nunca possível referir uma explicação a uma natureza humana dada e imutável; por outras palavras, não há determinismo, o homem é livre, o homem é liberdade. (...) O homem está condenado a ser livre. Condenado, porque não se criou a si próprio; e no entanto livre, porque uma vez lançado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer."

Jean Paul-Sartre, O existencialismo é um humanismo, Editorial Presença, Lisboa.