04 novembro 2004

FOLHETIM DE DOMINGO (em formato de blog)

por marinquieto

Capítulo VI


Não foi de simpatia a imagem que dela me ficou quando a vi pela primeira vez. Só mais tarde lhe conheci o sorriso e percebi que era nos momentos de fragilidade que a sua face se fechava, que os gestos se embrusqueciam. E também era nesses momentos que mais me apetecia abraçá-la, convencido de que seria capaz de lhe ofertar o calor de que precisava para que reencontrasse o côncavo do colo dos dias.
Cedo percebemos que tínhamos alguns interesses comuns e quisemos cultivá-los exageradamente para que nos envolvessem num anel persistente. Que durante algum tempo pensámos ser de uma liga indestrutível. Agíamos como se não soubessemos que tinham, rapidamente, deixado de ser a razão da nossa convivência, mas sim o pretexto. Assumíamos, sem o dizer, essa utilidade. Por motivos diferentes, contudo. Com expectativas diferentes, também.
Dei-me sem condições e, conhecendo-a agora, culpo-me de não lhe ter dado a satisfação da conquista. Talvez por isso tenhamos saturado os sentidos e com a mesma facilidade os tenhamos abandonado, um a um, a começar pelos mais íntimos - o paladar e o olfacto.
Teria ficado a capacidade de nos adivinharmos?

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