11 novembro 2004

Invocação da moral

“O objecto da moral terá de ser constituir um mundo de pessoas. Mas o que ela procura antes de tudo é constituir a própria pessoa. Porque é impossível defender que a pessoa é posta antes e que só numa segunda etapa é que ela procura produzir o valor moral ou sujeitar-se a ele. As duas etapas fazem apenas uma. A característica da moral é precisamente convidar-nos a criar-nos a nós próprios como pessoa. Ela obriga-nos a querermo-nos a nós próprios; e vê-se claramente que esta vontade é necessariamente um valor absoluto: porque toda a vontade é primeiramente vontade de si, há entre a vontade e o eu consciente de si uma imediação de que toda a vontade relativa a um fim é apenas uma expressão ou um meio. Na investigação intelectual, queremos conhecer as coisas tais como são, na investigação estética queremos encontrar nelas o que nos permite alegrarmo-nos que elas sejam o que de facto são, mas na investigação moral é de nós próprios que se trata. É puro cinismo usar a moral como arma de arremesso. O que a moral trata em primeiro lugar é da nossa própria postura na relação com os outros, a vida e o mundo. Pretende criar-nos de tal modo que possamos estar de bem com o que somos.
A relação entre a pessoa e a moral é tão estreita que pode ser convertida: não só a moral implica sempre a pessoa e refere-se a ela, mas também o que constitui a pessoa e permite defini-la por oposição ao indivíduo é a ideia de um valor moral que ela reconhece ou ao menos que ela procura para a ele se submeter.”


L. Lavelle, Traité des valeurs, TII, P.U.F. Paris, 1955. pp. 390-391

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