17 novembro 2005

estes dias que passam 5

A nossa Kamikaze balda-se para Paris e o pessoal fica na pátria ingrata a babar-se de inveja. E o caso não é despiciendo. Mesmo que seja por pouco tempo vai deliciar-se com a exposição “Dada” no Centro George Pompidou; uma espectacular reunião (a maior até á data) da parafernália dadaísta. O catálogo (quem não pode ir manda vir o catálogo num saudável exercício de auto-flagelação e de masoquismo, sem falar já no cacauzinho que o calhamaço custa…) é uma coisa do outro mundo, perdão deste mas em dada.

O nosso querido companheiro José (esse mesmo, o das observações argutas…) perguntava-me noutro dia pelo Joaquim Namorado, “que não lhe apanhava o rasto nem na Internet” etc, etc… Convém lembrar ao ousado navegador do espaço virtual que basta ir ao google para se apanhar com 39.000 (trinta e nove mil, compadre!) referências. Se o Joaquim fosse vivo muito se devia rir. Estou a vê-lo, risonho, o olho azul e generoso para o Paulo Quintela: chega tarde a fama. E o velho rezingão, tradutor de teutónicos (56.000 referências) a concordar com um desalentado aceno. Faz bem a este vosso criado ver dois dos seus (múltiplos…) maîtres a penser assim divulgados.

Em Tombuktu (ou Timbuktu) no Mali há um clã (os Haidara) que conserva como bem precioso uma biblioteca com cerca de 10.000 volumes, alguns datando do século XIV!!!
Vivem pobremente mas uma lei não escrita e por isso ainda mais respeitada inibe este punhado de homens do deserto de vender os seus livros. Começa agora a gerar-se um movimento mundial que pretende ajudar a salvaguardar esta colecção única, que entre outras coisas vem provar que África tem, ela também, a sua memoria histórica e cultural escrita. A ver vamos se conseguimos obter elementos que permitam aos bloguistas mais generosos mandar um óbolo para ajuda da imensa tarefa de salvaguarda e divulgação deste tesouro.

Um padre operário francês foi acusado por três crianças de actos pedófilos. Um senhor psicólogo garantiu a veracidade das declarações das mimosas criaturinhas. O tribunal pimba, arreou forte e feio. No julgamento de recurso os bondosos anjinhos confessaram que tinham inventado tudo. O padre já saiu da cadeia onde entretanto passou cerca de dois anos. O psicólogo disse, e eu ouvi-o incrédulo, esta pérola: “as expertises são pagas a preços que envergonhariam uma empregada domestica. Quem assim paga não se admire de obter en troca expertises ao nível sopeiral” (sic).
Como prometi não falar de processos mais próximos deixo-vos com este animador panorama.

A senhora Ministra da Educação entendeu que o ensino secundário está feito ao bife. Concordamos. Resolveu que quando um professor falta há que eliminar o furo e dar muita e boa ciência infusa aos alunos. Também se concorda. Esqueceu-se porém de algumas pequenas minudências: o professor que vai fazer o frete de ensinar (ou entreter) as cândidas alminhas jovens não conhece o seu público, não conhece a disciplina e em troca estas não estão minimamente interessados no que aquele desconhecido vem ali fazer. Portanto vale tudo: jogos, sessão de anedotas, leitura do jornal etc. Chama-se a isto pedagogia!
Nas mesmas escolas, os professores tem de estar lá as 35 horas semanais. Concorda-se outra vez. Mas há um problema. Nas escolas, em todas as escolas da pátria valente e imortal, apenas há uma sala de professores onde com boa vontade cabem vinte ou trinta. Os restantes cinquenta, sessenta ou setenta que se amanhem…
Costuma dizer-se que o Brasil é o país do Carnaval. Errado, caro Watson, errado: é Portugal. Só que em vez de mulatas esplendorosas, temos a Senhora Ministra vestida de minhota. Ora porra!

Cada um dos cartazes grandes da campanha eleitoral, os de oito metros por cinco, custa a ninharia de 500 contos dos antigos. Alguém me explica onde é que alguns dos candidatos, que já se afixam em pré campanha, vão buscar tanto dinheiro? Alguém sabe quantos destes cartazes são necessários para cobrir o país? E não há uma comissão fiscalizadora de contas para evitando abusos garantir a todos os candidatos igualdade de possibilidades? E funcionará?

Os bloguistas amadores de boa poesia podem ir procurar os inéditos de Alexandre O’Neil acabados de sair na Assírio & Alvim. Valha a verdade que estavam anunciados há quase um ano, mas a malta é paciente e espera. Agora já por aí circulam. Secundando o Compadre Esteves, experimentem comprar o livro numa verdadeira livraria em vez de recorrerem a esses gigantes da distribuição livreira que se especializaram na venda e na promoção da literatura mais bastarda e ordinária que se faz.

Terminemos voltando à viajeira Kami. Segredou-me que ia levar para ler na viagem “Paris não acaba nunca” de Enrique Vila Matas. O diabo da criatura tem mesmo bom gosto.

4 comentários:

josé disse...

Bem...
botei a googlar, um madeiro.
Espetei-lhe a frase e os termos.
Com palpite marinheiro, medi os 39 mil co-senos
Deu-me o clicar de feição
levou-me a um sítio profundo
pelote desamparado
rebotalho de ocasião.
Dormi em certas passagens
Pasmei na orla de outras
Andei e passei à frente
Senti o interesse nestas:

"João Carreira Bom / Maria José Mauterrin(entrevista de), “Joaquim Namorado: "Estaline só é Problema para os Anticomunistas"“, Expresso, 24/4/1982."

"Joaquim Namorado,“Só a ortodoxia é uma aventura”, O Jornal, 4/2/1983"


Tremi no escuro dos ditos
alambique de passados
Entendi que o poeta
Teve destinos marcados.

"O meu sabor é diferente
Provo-me e saibo-me a sal
Não se nasce impunemente
nas praias de Portugal."

O pot pourri é da minha autoria( com excepção do "poema da malta das naus", claro).
As citações vêm todas daqui

M.C.R. disse...

Ora aí está!
O stalinismo do Joaquim era mais uma das suas boutades: aliás que é que se pode e deve esperar do poeta jovem nosa anos de chumbo e dor (os primeiros da década de 40) que se passaeva pela baixa coimbrã com um lagarto pela trela? Oiu do pooeta que vem citado e antologiado por Cesariny em "Surrealismo-Abjeccionismo"?
Ou ainda do director da revista "Vértice" que não admitia interferências no que lá se escrevia (e tantas houve...) mesmo que viessem directas de Cunhal?

josé disse...

Estou a ver...o Joaquim falecido era um magnífico blogger avant la lettre. Não se levava a sério...

Rui do Carmo disse...

Foi meu explicador de matemática quando eu era miúdo. Quando algum de nós se queixava de dor de cabeça, dizia-nos sistematicamente: "dor de cabeça não é, pode ser é dor de crâneo!".