“Do rio que tudo arrasta se diz que é violento.
Mas ninguém diz violentas
As margens que o comprimem.”
Bertolt Brecht
Na pátria dos direitos humanos, da bandeira da liberdade, igualdade e fraternidade, uma violência juvenil barre os subúrbios das suas grandes cidades e ameaça alastrar-se a toda a Europa. Só um mundo vivido em revolta poderá alimentar essa fúria descontrolada.
Está posto em causa o modelo neoliberal de desenvolvimento que tem privilegiado políticas monetaristas em detrimento das questões sociais E é ilusório pensar-se que a prisão e condenação de alguns dos responsáveis pelos desacatos fará restabelecer a ordem e a segurança. Coloque-se cada um de nós na pele de jovens que vivem em ghetos, a quem é recusado emprego (que lhes possibilitaria sair do inferno em que vivem) por aí viverem, tratados como estrangeiros na terra onde nasceram, olhados com suspeita por serem negros, mulatos ou amarelados, tidos como "porcos, sujos e maus" e perceberá esta erupção de violência irracional. Provavelmente, entre eles, também haverá gangs organizados, mas a questão de fundo continua a ser uma questão social. A ghetização, o etnocentrismo, o desemprego, o falhanço da escola pública, o racismo e a xenofobia promovem uma cultura de revolta que, a nível do simbólico, se expressa por uma vingança em relação a tudo o que possa significar acomodação ao sistema que os humilha. E sendo assim, a primeira conclusão a tirar é a de que a nossa segurança depende da nossa solidariedade para com os mais desprotegidos.
Temos de exigir do poder público (em Portugal e na Europa) a implementação de políticas de solidariedade social, respeito pela dignidade da pessoa humana e da sua cultura, defesa de um urbanismo com qualidade de vida, criação de escolas de proximidade que abram espaço à troca de afectos, polícia de proximidade que desenvolva empatias cívicas, assistência social de integração que respeite o multiculturalismo, apoio a organizações que estabeleçam mediações entre culturas diferentes, etc. por forma a que o desespero seja ultrapassado pela esperança.
Sem politicas de solidariedade social, a raiva dos desesperados da vida acabará sempre por fazer arder cidades.
JBM
in: JN 13/11/2005 (coluna "Educação e cidadania)
13 novembro 2005
Os desesperados da vida
Marcadores: Primo de Amarante (compadre Esteves-JBM)
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