05 fevereiro 2006

O poder da cidadania

«Salvar a vida partidária (e, por extensão, a política) do descrédito, está na cidadania. O conceito é antigo. O Homem, pensava Aristóteles, é, por natureza, politico; isto é, não pode viver sem deixar de interagir com a polis ou cidade a que pertence. A cidadania associava-se à democracia directa: nas assembleias públicas, o cidadão tomava a palavra para exercer o seu direito/dever de defender o bem-comum. Nos nossos dias, a democracia é representativa e os partidos tornaram-se depositários da vontade dos cidadãos. Mas isso não significaria perda de cidadania, se os partidos promovessem espaços de debate público, que permitissem aos cidadãos debaterem programas, ideias e projectos com que apoiariam as suas escolhas. A ideia de “Novas Fronteiras” representa uma forma de abertura desse espaço público. Mas, mais importante que estes “fóruns”, é a promoção da virtude cívica de servir o bem-comum, pela integração dos militantes dos partidos em movimentos sociais que lutem por causas. Os cidadãos não podem confiar nos partidos, quando, por detrás do clamor pelos nobres ideais, só vêem grupos de interesses que arrebanham votantes para obterem as prebendas do poder. E isso configura a imagem dos partidos a partir do nível local. É exemplificativo o caso de, num só dia, numa determinada secção, aparecerem 30 inscrições de velhinhos que tinham em comum o pertencerem ao mesmo centro de dia e apoiarem um mesmo candidato a dirigente local. Esta fraude aparelhística (muitas vezes acumulada com a publicidade da amizade e apoio do “chefe” do partido) reflecte a degradação ética que vem fazendo sucesso nos partidos. É neste contexto, que o poder dos cidadãos (representado nos resultados de um candidato “rebelde”) aparece como contraponto ao descrédito dos partidos.

Manuel Alegre fez bem em retomar as suas funções partidárias. Isso torna-o consciência crítica do seu partido, obrigando a reformas que levarão a acção dos militantes a fundar-se nos programas, estatutos e inserção social e não em lógicas aparelhísticas. Surgirão, então, lideranças locais exemplares, capazes de se sujeitarem a um estudo alargado de opinião que avalie os seus méritos. E evitar-se-á, pelo poder da cidadania, a falência dos partidos».

JBM in JN

5 comentários:

Primo de Amarante disse...

O desejo é a projecção afectiva de uma crença.

Se os partidos não se reformarem, com o descrédito dos partidos desenvolver-se-à cada vez mais o descrédito da politica. E, nesta circunstãncia ficará aberto o caminha para o populismo e caciquismo (mais descarados).

Os partidos estão hoje dominados por uma oligarquia, com muitos interesses pessoais. A maioria deles, fora da politica não "sabem fazer nada"-- e esse é o grande entrave às reformas!

C.M. disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
C.M. disse...

Eu e o Compadres Esteves, ele que me perdoe se erro, somos, na verdade, uns "românticos"... o MCR também ele é um romântico: tal transparece dos seus escritos. Estamos todos, creio, desiludidos…tirássemos um retrato, e já formávamos um terceto dos “vencidos da vida”…

Cada um à sua maneira, sonhamos com uma outra sociedade, com uma outra “respiração”, que nos permitisse viver, estes nossos dias, com outra qualidade.

Uma sociedade mais fraterna, mais solidária, sem estes vícios que se instalaram no tecido social.

Mas creio bem que os defeitos que ele encontra nas máquinas partidárias e que eu secundo, são tão só o reflexo da nossa sociedade que está profundamente doente.

Não vejo, no horizonte, qualquer possibilidade de regeneração.

o sibilo da serpente disse...

Não, não sou candidato (postal que coloquei em www.marcohoje.blogspot.com, sobre uma aventada candidatura ao PSD local)

Inesperado: vários militantes activos do PSD do Marco, das diversas correntes, decidiram achar que eu devia liderar uma lista para a Concelhia nas eleições previstas para a próxima primavera. Não estranho os convites, vindos que quem vêm. Mas estranho alguns apoios que, segundo eles, podem trazer consigo.

Confesso que num primeiro momento - e porque ando irritado com algumas coisas, já aqui o disse - a proposta me fez reflectir. Depois achei que, decididamente, seria um erro da minha parte. Desculpem, pois, os que me convidaram e podiam apoiar-me. E sosseguem aqueles a quem o meu avanço iria provocar sobressalto.

São vários os motivos que tornam a minha descartada candidatura um erro. E o principal não é este sentimento de que sempre que dei parte de mim à vida pública, na volta, só recebi ingratidão. E muitos prejuízos.

Os verdadeiros motivos são outros.

O primeiro: decididamente, não tenho paciência para andar por aí a negociar apoios, a fazer pontes entre facções desavindas e a gizar listas de compromisso, a trocar princípios por votos, a prometer um lugarzinho na lista a troco de apoios. Não o fiz quando fui candidato à Câmara e não o faria agora. Dói muito ser assim, mas cada um é como é.

O segundo e fundamental: eu não interesso ao PSD. Sou demasiado livre, rebelde e irreverente para ser líder da Concelhia.

O meu princípio é este: aplaudo com entusiasmo quando devo aplaudir; sou bravo quando devo criticar. Fui sempre assim. Tenho sido assim quando escrevo neste blogue. A minha condição de militante não me trava quando acho que devo criticar o poder, mesmo quando o poder é o meu partido, ou de criticar a oposição, mesmo quando a oposição é o meu partido.

Uma postura que, como se sabe, é meio caminho andado para se ser ostracizado e para coleccionar uma vasta horda de inimigos. É que para alguns - para os que vivem à custa do que o partido lhes dá ou pode vir a dar - não é fácil perceber este exercício de liberdade.

Se eu fosse líder do PSD do Marco, não mudaria nem um milímetro esta minha postura. Seria, pois, um uma voz demasiado incómoda para o PSD que agora está no poder e que - aposto - tudo faria para inviabilizar o êxito da candidatura. As coisas que digo no blogue, continuaria a dizê-las, com o peso acrescido de ser um responsável partidário. Decididamente, não tenho emenda. Nem quero.

Ainda que não deixe de ser curioso que o motivo que levou alguns a assediar-me, tenha sido precisamente este meu irrenunciável defeito. O que significa que ainda há pessoas que preservam, como eu, o exercício da liberdade. E que ainda há pessoas que são capazes de perceber, como eu, o que realmente está a acontecer no PSD do Marco e, por consequência, no poder autárquico actual.

E o que está a acontecer - como se verá mais tarde - é grave. Não, não quero que nessa altura venham dar-me razão, não é preciso. Prefiro de longe que haja alguém que evite o meu mau pressentimento de agora. Antes que seja tarde de mais.

Mas eu vou andar por aí...

(Talvez ajude a perceber algumas coisas)

M.C.R. disse...

Boa malha Carteiro!

No que toca ao Manuel Alegre acho que fez bem em regressar ao parlamento. Aliás tinha um compromisso com os eleitores que o mandaram para deputado.
não creio porem que ele vá alterar a lógica partidária. Os votos que teve são uma junção de diversas correntes que efemeramente (e de mim falo) se aliaram, Mas que depressa regressarão ás respectivas bases.
Eu ando às voltas com um texto sobre a formação dos aparelhos mas aquilo não sai. Ou melhor o que sai parece-me banal , Se conserguir fazer coisa de jeito aqui o postarei para ver se abrimos um diálogo engraçado.