10 fevereiro 2006

A reforma e a lei que a rege

Na caixa do correio encontrei este texto lapidar de Marcello Caetano:
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«Tem-se discutido na doutrina se pelo facto da inscrição como subscritor da Caixa o funcionário adquire ou não o direito a aposentação nos termos da lei vigente nesse momento. Sem dúvida que a inscrição do funcionário origina mera expectativa, a qual só se transforma em direito quando ele, nos termos legais, reúna as condições necessárias para ser aposentado. Dentro da orientação objectivista que prevaleceu durante muito tempo nos países latinos, negadora de direitos aos funcionários, entendeu-se que estes não gozavam de qualquer garantia jurídica no respeitante à aposentação, enquanto não se subjectivasse por um acto administrativo para cada situação de aposentado. Os funcionários ao serviço estariam completamente dependentes do legislador que poderia em qualquer altura aumentar a idade ou o número de anos necessários para a aposentação ordinária, diminuir a pensão ou até suprimi-la, pois o desconto feito nos vencimentos era simples expediente de contabilidade e não o pagamento de um prémio de seguro.Tais ideias estão inteiramente ultrapassadas e devem considerar-se obsoletas. Como tem sido frisado, a situação dos funcionários não pode ser menos favorecida que a dos empregados das empresas privadas, nem seria moral que o Estado procedesse com o seu pessoal em termos que condena no procedimento dos restantes patrões
O funcionário, ao pagar as quotas fixadas por lei, adquire o direito a, uma vez reunidas as condições nela estabelecidas, vir a ser aposentado e em termos não menos favoráveis que os então previstos».
Manual de Direito Administrativo, vol. II, 9.ª edição, pp. 778-779
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Em democracia tal actuação já é tolerável e moderna?...

2 comentários:

C.M. disse...

Como devem calcular, este postal do Senhor Conselheiro Simas Santos deu-me um enorme “gozo”: proporcionou-me uma grande alegria e, por outro lado, uma grande dor por ver que, afinal, regredimos nos conceitos e nas garantias oferecidas aos cidadãos em geral, e àqueles que trabalham na Administração Pública em particular, seja a que título for.

Este texto de Marcello Caetano é lapidar, e é um verdadeira "bofetada" nos políticos de hoje, ditos “solidários e democráticos”.
Mas a História tem destas surpresas...

Gostaria de voltar a este tema, pois “razões de Estado” reclamam a minha urgente atenção nesta sexta-feira que se anuncia “pesada”.

dlmendes

josé disse...

Quem, durante estes anos todos, abandalhou o Estado e o capou das suas potencialidades mais nobres, todas elas relacionadas com um Serviço Público decente, competente e honesto, na sua imagem geral?

Talvez não seja altura de apontar dedos, porque os juizos podem ser facciosos e errados e por isso, injustos.

Mas para entender o que é preciso, também é necessário saber o que se passou.

Quem há, hoje em dia, na teoria geral do Estado e da Administração Pública, por essas faculdades a eito, capaz de produzir um escrito como o que acima jaz, tendo ao mesmo tempo a autoridade intelectual e moral para o fazer?!

Anda cá outra vez, Diógenes- e traz uma foco de pilhas que as candeias já não se usam!