Nós bem sabemos que o verdadeiro “enfant terrible” deste blog é este meu amigo (apesar de não nos conhecermos, algo de muito fraterno nos une…) d’Oliveira. Então não querem lá ver que ele afirmou que eu “exumei” um cartaz do Almada Negreiros?
Então, meu bom amigo, as obras de arte, mesmo “engagées” ( e esta, hem?!) estão sempre vivas. Logo, essa figura da “exumação” é forte... não é verdade? Penso eu de que…
Estava a pensar que bom seria agora deixar-me deslizar suavemente pelo rio da História, em busca das suas nascentes, à semelhança dos Anjos de Fassbinder que pairavam nos céus de Berlim, perscrutando curiosos as pequenas histórias dos comuns mortais.
Então, meu bom amigo, as obras de arte, mesmo “engagées” ( e esta, hem?!) estão sempre vivas. Logo, essa figura da “exumação” é forte... não é verdade? Penso eu de que…
Estava a pensar que bom seria agora deixar-me deslizar suavemente pelo rio da História, em busca das suas nascentes, à semelhança dos Anjos de Fassbinder que pairavam nos céus de Berlim, perscrutando curiosos as pequenas histórias dos comuns mortais.
Lembrei-me de aportar às margens da civilização grega, intelectual e espiritual. Mas destas matérias é Mestre o nosso Dr. Marcelo Ribeiro…
Fazendo o percurso inverso, chegaremos a Roma, com a sua estrutura imperial, o seu cosmopolitismo e a sua burocracia complexa, com a omnipresente estrutura administrativa, a qual já continha no seu âmago um despotismo exercido por uma elite romana, apoiado num sistema constitucional. A civilização helénica tinha já feito a simbiose entre o Oriente e o Ocidente. Roma limitou-se a continuar esse processo.
Das suas cinzas evolou-se, qual Fénix, a civilização da Europa a qual, no dizer de Soares Martínez, (ai!) “viveu na nostalgia do Império Romano”.
Com efeito, o ideal da República Cristã centrava-se na unidade pretendida por Roma, difícil de obter, pois não existiu consenso acerca da questão de saber qual a autoridade sob a qual a Cristandade havia de organizar-se politicamente. Vejam que tal ausência de consenso levou ao enfraquecimento daquela. Na verdade, nos séculos XVI e XVII, as unidades políticas da Europa, mais do que Estados, eram propriedades fundiárias, operando-se a sua junção através da guerra, do casamento e da herança. As fronteiras eram assim instáveis, mudando o seu recorte conforme esta ou aquela porção de território passava de um governante para outro.
Por aqui, vemos que o Estado, com as suas fronteiras bem definidas, é hoje um bem que não deve ser malbaratado.
Hoje, a Administração Pública, quer ao nível central quer ao nível local, exerce uma enorme influência na vida de todos nós, cidadãos e, “pour cause”, na das empresas. O seu bom desempenho constitui factor de progresso que se repercute nas condições de vida dos cidadãos, nos aspectos sociais e económicos.
O Estado, uma vez constituído, realiza os seus fins através de três funções em que se reparte a sua actividade legislativa, administrativa e jurisdicional. E tem (deve) de ser obedecido, sob pena de ser instaurado o caos na sociedade, caos este que não aproveita a ninguém, excepto a grupos marginais.
O Estado apenas surgiu para assegurar à comunidade um conjunto de funções que seriam apenas cabalmente garantidas se exercidas de modo colectivo.
Com os tempos, as funções do Estado foram aumentando até atingirem as proporções que actualmente lhe conhecemos.
Algumas delas resultaram de preocupações colectivas recentes, como seja a protecção do ambiente, o ordenamento do território ou a defesa do consumidor.
Talvez seja um “mal” necessário, pois o Homem não pode viver na anarquia: destruir-se-ia a ele próprio.
Mas reparem que, todos os dias, se opera este “milagre”: existe um Direito Constitucional e um Direito Administrativo que asseguram os direitos dos cidadãos de uma determinado Estado; no dizer de Gustav Radbruch, significam um não-direito do Estado e uma não-razão da Administração. Personificam, para mim, as garantias de todos nós, cidadãos, em que não existirão actuações desviantes por parte da Administração e, se as houver, existem suficientes meios correctores de tais desvios.
Desta tensão, permanente, resulta o Estado de Direito. Sem ele, não é possível viver em sociedade. O Estado é, no fundo, um conceito existencial ( aqui clamo por socorro pelo nosso Dr. Marcelo...não, obviamente não é aquele da TV...).
Há que preservá-lo e não o considerar como um fardo, como fica bem dizer nos dias que correm…
Nota: a pintura que o texto me suscitou é de Vassili Vassilyeviеtch Kandinsky, intitulada "Journée d'hiver. Le boulevard Smolenski" Galerie Nationale Tretiakov (Moscovo)
4 comentários:
Pelo que li suponho que d'Oliveira apenas quis referir as razões que assistem a quem quer ter um Estado forte e são. Sem mais nem menos atribuições do que as necessárias. De facto havia (e há alguma ganga inútil agarrada ao estado que é desnecessária e até o impede de cumprir bem a sua missão. É possível pensar uma administração pública sem pedreiros ou carpinteiros, sem pessoal de limpesa, provavelmente sem arquitectos ou engenheiros sempre encontráveis no privado. A Administração porémm não passa sem médicos e enfermeiros nos hospitais, sem professores nas escola, sem investigadores na universidade, sem quadroe técnicos ou sem pessoal administrativo. Também necessita de juízes, procuradores, agentes policiais e guardas florestais Etc... Mas passa bem sem se substituir á sociedade civil nas tarefas que esta sempre levou a cabo. Um teatro ou uma banda existem antes da administração e não devem ser substituidos por ela e muito menos funcionarizados. Ou não.
O Kandinsky é muito bonito. Aliás tive a sorte de passar dois meses numa cidade onde ele viveu: Murnau, no "Gebiet" de Garmish-Partenkirschen, a oeste de Munique. Kandisnsky viveu aí com Gabrielle Muntner que era de lá e também boa pintora. Nos arredores de Murnau há museus dedicados a alguns dos seus amigos expressionistas. Um deles Macko está até muito bem representado no Museu de Kochel. E em Munique na Lembach Haus há um inteiro museu dedicado aos expressionistas, Uma maravilha. Imperdivel!
voltando á nossa "vaca fria": é evidente que estou de acordo com a defesa do Estado de direito e da exist~erncia de uma Administração Pública dignificada e com meios para levar a cabo as tarefas que legalmente lhe cabem e QUE SÓ ELA PODE DESEMPENHAR COM ISENÇÃO E AO SERVIÇO DE TODOS OS CIDADÃOS.
Julgo ter sido mal entendido, ou então, o que é mais provavel, fui eu quem se exprimiu mal.
Eu entendo que 4m certos domínios da vida colectiva o Estado tem sido ao mesmo tempo a vítima preferida pelo "cravanço" dos particulares e o agente intrometido que se substitui aos cidadãos. O exemplo mais frisante é o da "acção cultural" ou da "política cultural" do Estado.
Não há agente cultural que não apareça nas repartições de mão estendida a pedinchar um subsídio, uma esmola, uma ajuda, um sei lá o quê. O Estado contentíssimo regateia, obriga, responsabiliza e no fim lá solta uns míseros tostões porque sabe que assim tem na mão o formidável poder de domesticar boa parte da inteligentsia.
Isto era o que eu pretendia dizer.
Não significa que o Estado não se deva empenhar na criação de uma rede de bibliotecas ou na defesa dos museus e monumentos nacinais. Devia mesmo, já que de certo modo a tutela, põr á consideração da Academia da Língua Portuguesa a necessidade de fazer um dicionário decente, de periodicamente o renovar, de constituir um "Thesaurus" da língua... Devia proteger eficazmente os Arquivos Nacionais. Devia criar verdadeiras e boas escolas de Teatro e de Música já que as belas Artes estão assim assim. Depois, deixar ao livre alvedrio da sociedade civil as ajudas pontuais às artes e aos espectáculos, usando os dispositivos da lei do mecenato de forma a proteger com identica eficácia o teatro nacional, a música erudita ou certas formas marginais e minoritarias de cultura. É incrível que as camaras sobretudo as da província dêem dez vezes mais dinheiro á animação e ao desporto do que á cultura. E que venham de chapeu na mão pedir ao poder central um tostão para por exemplo um teatro retintamente popular cujas origens se perdem no tempo. O Estado não tem de dar instrumentos às bandas musicais; tem de lhes fornecer formação, cursos, premiação em concursos. Não tem de dar dinheiro a todo o gato sapato que se lembra de criar um grupo de teatro. Tem de atribuir prémios bons aos melhores, em dinheiro, se quiserem. mas não pode ser o sustentáculo primeiro e quase único de centenas de grupos que se arrastam penosamente por aí. Em Portugal não há teatro independente. Há só teatro subsidio-dependente. livra! Como resultado por cada Cornucópia surgem dez mediocridades. Dez? vinte, trinta, cem!
A lei do mecenato, ou uma melhor se quiserem, pode estabelecer descriminação positiva neste capítulo.
E nem quero falar no caso extraordinário do senhor Berardo. O homem quer ou não mostrar a colecção? Quer. Muito bem. Mas não deve andar a exigir mundos e fundos ao Estado. Isto parecia um romance policial.
Depois conviria não ser parolo. A colecção Berardo é boa mas não irá por si só transformar a vil e apagada tristeza lisboeta num novo farol das artes. Parece que ninguém conhece os museus das três mais próximas capitais. Ou o Gugenheim de Bilbau. ou o CAM de Valencia. Ou os Picassos e Mirós de Barcelona. Anda tudo tolinho ou quê?
Em que estado está a casa Vieira da Siva Arpad Szenes?
Onde é que doravante se farão as grandes exposições internacionais ou nacionais (caso de um Pomar ou de um Lanhas)? O Centro de Belém fica completo. Há alguma sala em vista?
Dr. Cabral Mendes, era isto ou coisas como esta que eu queria no meu velho (de vinte anos) texto dizer, suscitar, chamar a atenção. Muito em breve falarei dos vexames, vergonhas e crimes que a nossa Adimistração Pública sofre, está a sofrer e vai sofrer. Penso que não mudarei o mundo ou o país com essa reflexão mas agora parece imperioso tomar uma posição.
Seu sempre
d'Oliveira
Concordo, plenamente, nesta perspectiva aqui enunciada, com o MCR e com o d'Oliveira.
E creio bem que (ambos) têm uma visão muito aprofundada da missão que, a nível cultural, o Estado deve desempenhar.
Bem que poderiam ser os Ministros ou Secretários de Estado da Cultura...
Pela parte que me toca ( e nisso julgo que o nosso confrade d'Oliveira diria o mesmo: Deus me livre!!
Já agora: gosto muito do actual Secretário de Estado da Cultura, Professor Doutor Mário Vieira de Carvalho. É verdade que somos amigos desde pequeníssimos, mas posso garantir que se trata de um homem cultíssimo, talentoso e jovial. só esta última qualidade já dava pano para mangas mas ele de facto tem real qualidade.
A ministra é uma excelente especialista em literatura portuguesa. Não é por acaso que é a futura coordenadora da famosa História da Literatura Portuguesa de Oscar Lopes e A.J. Saraiva. Conheço-a pessoalmente mas nunca falámos muito. suponho que tem sido pouco apoiada e que o habitual machismo jornalístico a tem tratado mal. E já não falo na seita dos donos da cultura que já a crucificaram um par de vezes. todavia, como disse, conheço-a mal e o fogo de barragem jirnalístico impede-me de a ver bem.
Enviar um comentário