Jorge de Sena faleceu a 4 de Junho de 1978.
Neste tempo (como diria Augusto Abelaira) de bolor, em que nada é sagrado, tudo é denegrido, vilipendiado, destruído, faz-nos falta a visão crítica de um homem desta têmpera. Concorde-se ou discorde-se das suas tomadas de posição em diversas matérias.
Aqui deixo, no aniversário do seu passamento, o poema (intemporal) “ No País dos Sacanas”
No País dos Sacanas
Que adianta dizer-se que é um país de sacanas?
Todos os são, mesmo os melhores, às suas horas,
e todos estão contentes de se saberem sacanas.
Não há mesmo melhor do que uma sacanice
para poder funcionar fraternalmente
a humidade de próstata ou das glandulas lacrimais,
para além das rivalidades, invejas e mesquinharias
em que tanto se dividem e afinal se irmanam.
Dizer-se que é de heróis e santos o país,
a ver se se convencem e puxam para cima as calças?
Para quê, se toda a gente sabe que só asnos,
ingénuos e sacaneados é que foram disso?
Não, o melhor seria aguentar, fazendo que se ignora.
Mas claro que logo todos pensam que isto é o cúmulo da sacanice,
porque no país dos sacanas, ninguém pode entender
que a nobreza, a dignidade, a independência, a
justiça, a bondade, etc., etc., sejam
outra coisa que não patifaria de sacanas refinados
a um ponto que os mais não são capazes de atingir.
No país dos sacanas, ser sacana e meio?
Não, que toda a gente já é e pelo menos dois.
Como ser-se então nesse país? Não ser-se?
Ser ou não ser, eis a questão, dir-se-ia.
Mas isso foi no teatro, e o gajo morreu na mesma.
10/10/1973
04 junho 2006
"No País dos Sacanas"
Marcadores: Cabral Mendes
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2 comentários:
como poema não é famoso.
O Sena era de facto um excelente poeta (não tão genial como ele a mulher pensavam que ele era) mas verdade seja dita que sempre confundiu algumas coisas. Uma e a mais importante é que boa parte da pátria (a melhor) não lhe regateou aplausos e amparo. A segunda é que ele próprio com uma carrada de filhos chegou à conclusão que regressar para ser cá professor na universidade era economicamente inviável. E disse-o em cartas que estão aí publicadas.
A terceira questão prende-se com algo que a mim me repugna bastante. Sena nunca publicou em vida os poemas depois saídos enm que ataca tudo e todos. Deixou portanto essa armadilha, essa bomba por rxplodir, para quando já se não pudesse responder. E isso é mesquinho e prova, infelizmente, que o país dos sacanas torna toda a gente sacana inclusivamente quem denuncia a sacanice dos sacanas.
Não como desse pão. E tenho pena pelo Sena. Porquer isto emporcalha uma memória que se queria limpa e luminosa. Mas os homem são assim: pecadores!
A chama não desceu sobre todos, não é, DLM?
Um abraço
pois é verdade, caro amigo...
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