Geração
Escreve-me um velho companheiro dos tempos de faculdade que ele não completou graças “à merda da tropa”. Felizmente, digo-lhe depois de o saber em confortável situação, rodeado de filhos (cinco!!!) e farta dose de netos. Mas o Zé Carlos, não era de filhos nem de netos que me escrevia. Em primeiro dizia-me, com a completa cegueira de uma velha amizade, que me lia e que me apreciava a prosa que vou extraindo das cansadas meninges. E a mulher também me lê mais duas filhas que os rapazes estão pouco para tais cavalgadas bloguistas.
E que recado me dava esse inesquecível companheiro duma Coimbra irrequieta e pouco respeitosa (lembras-te pá, diz-me ele, da bruta confusão de 69?, o que a malta se divertiu, acrescenta com o agrément da mulher, caloira e grevista assanhada, nessa altura)?
Oh lá se me lembro, companheiro, se me lembro. E não me puxes muito pela memória que ainda aqui sai uma daquelas tuas aventuras libertinas, o quartinho que alugaste na baixa e o uso que lhe davas.
Mas não era destas pequenas liberdades (tão grandes, enormes naquela altura) que o Zé Carlos me falava mas doutra coisa que resolve encomendar-me para o blogue. Fala da nossa geração pá, dos anos sessenta em Coimbra, penico das Beiras (esta é da minha lavra, mcr), que só tinha vantagem da malta estar a milhas da família, à vontade e sem horas de entrada em casa.
E dizia-me que lera o artigo do Vasco Pulido Valente, que gostara, que ficara espantado e não sei que mais. Pois também eu li, mano, li e reli. Eu, de vez em quando, dou uma bicada no VPV mas confesso aqui muito à puridade que faço parte do numeroso grupo de fãs daquela escrita luminosa, daquele estilo falsamente simples, inteligentemente simples, daquela argúcia rápida, daquele português que o torna provavelmente no melhor cronista destes últimos anos. Fosse eu de invejas e o VPV estava morto. O raio do homem de vez em quando irrita-me mas, mesmo nesses momentos, reconheço-lhe a coerência interna e a qualidade literária. Por mim o texto dele, na aparente secura, na sua brevidade já terá dito tudo o que havia a dizer. Mas o Zé Carlos conjura-me em nome de um par de vezes em que me emprestou o quartinho milagroso na Baixa, que diga de minha justiça. E a mulher, em post-scriptum telegráfico secunda-o.
Pois aí vai. E começa-se já pelo p.s. da Julinha. A nossa geração, ó caloirinha de 68/69, teve esse primeiro privilégio, assistiu e participou na libertação da mulher, na assumpção de uma nova maneira de estar na faculdade, no amor, na tomada de decisões. E por vezes com coisas tão inocentes como essa agora inimaginável: foi nos anos 60 que as raparigas universitárias puderam começar a usar calças!
E recordo a esse respeito uma anedota do mais verdadeiro que há. Uma rapariga entrou na Faculdade de Letras de calças. O egrégio director, avisado por um contínuo diligente, apanhou a prevaricadora portadora de calças e disse-lhe que assim não podia entrar. Ao que ela respondeu: se for caso disso tiro-as já! O Pimpão (esse mesmo) corou, esbracejou, olhou a turba multa que se ia juntando, engoliu a prosápia e foi para o gabinete. E as raparigas de Letras passaram a usar calças...
Já antes se tinham habituado a ir às Assembleias Magnas, aos cafés (cafés, digo, e não pastelarias) sozinhas ou com uma amiga. Isto a que ninguém hoje dará importância é anos sessenta. E iam ao cinema sem o viático dum chaperon. Claro que ainda havia montes de lares de freiras onde as meninas se recolhiam a salvo do macho latino estudante e coimbrão. Mas começava a haver raparigas que alugavam um apartamento ou uma casa para viverem autónomas. Isto é anos sessenta. Como é anos sessenta (e bem que eu o disse a uma senhora jornalista que inutilmente me entrevistou e gravou horas de conversa) a espantosa participação nas lutas estudantis, onde as vimos corajosas, combativas, solidárias, leais, ao lado (e não atrás) dos colegas, dos namorados, dos amigos.
Poderia dizer, porque é verdade, que essa foi uma década dourada na música portuguesa (o Zeca, o Zé Mário, o Sérgio, o Adriano fazem todos parte dessa época mesmo que se deva dizer que o Zeca é bastante mais velho; só que foi nos anos sessenta que ele se tornou no arauto da nova geração) e anglo-saxónica (ai meu Em Órbita) e que também por aí os novos tempos (Times they are a changin’ do Dylan) entravam nas nossas vidas com um ímpeto hoje insuspeitado. Good vibrations, mano e camarada, good vibrations!
Continuando a falar de quotidianos menos conhecidos, é provável que já ninguém recorde que foi (entre nós) no inicio da década que começaram a aparecer os snack-bares e pouco depois os self-services que vem modificar hábitos de consumo. E que, noticiava um jornal, uma mulher, num café do Porto, rapou dum cigarro e, pimba!, acendeu-o! E foi posta fora pelo imbecil do gerente. E a freguesia, indignada, fez greve ao café! Como em Coimbra a malta fez greve ao cinema até obter bilhetes mais baratos mediante apresentação do cartão da AAC. E assim se ia criando a ideia de uma força, da força da solidariedade, ou seja, sem o saber deitavamos a primeira pedra da tal “geração”. E começávamos a conhecer a malta do Porto e de Lisboa, a sair daquele espaço fechado, mesmo se de “lavados ares” que era Coimbra. A polícia ministerial e o policial ministério da Educação deu uma ajuda ao expulsar estudantes e fazê-los circular pelas diferentes universidades. Ah dias do Estudante em Lisboa, continuamente proibidos, os autocarros parados à entrada das cidades universitárias e a malta a pé um bom par de quilómetros (lembras-te Manuel Sousa Pereira da maior caminhada da tua vida, terminada entre vivas e effe erre ás na Praça da Republica? Lembras-te Emanuel Nunes, flor e honra da actual grande música portuguesa, da tua estreia em Coimbra, lisboeta perdido numa cidade desconhecida mas solidária que logo te recebeu com dois copos e uma festarola na “Pra-kis-tão” onde foste eleito “cabide” honorário?). Onde estarão as minhas amabilíssimas hospedeiras lisboetas, que me receberam e acolheram num apartamento sei lá eu onde quando fugia da polícia e receava ser identificado pela capa e batina, burrice supina para quem ia tratar de coisas sérias. E a roupa que me arranjaram para poder sair ir até à Cantina (nova na altura, hoje velha, onde até joguei brídege com um animoso grupo de grevistas, devidamente autorizados pelo Eurico de Figueiredo e o Jorge Sampaio!!! Depois de andar vestido de espantalho estou por tudo.
E a Casa dos Estudantes do Império, o Clube Universitário de Jazz, o Cineclube, as múltiplas manhas para nos reunirmos, juntarmos, para discutir e poder começar a pensar?
Não posso falar se não pelo que sei, pelo que vivi, mas não tenho rebuço em declarar que esses anos foram de formação me abriram imensas portas, algumas delas em falso mas isso é outra música, e os meus actuais gostos desde o jazz ao cinema, do teatro à poesia, nasceram ou cresceram todos nessa época em fartas doses de discos emprestados, de programas geniais de música que nos mantinham acordados pela noite fora, dos ciclos de teatro do CITAC, em Coimbra onde se via um concentrado do melhor que se fazia em Lisboa e no Porto, os concertos da Juventude Musical Portuguesa, a literatura cineclubista (literatura digo e repito em homenagem a Orlando de Carvalho que anos a fio escreveu sobre filmes com um gosto, uma finura e uma argúcia exemplares), as grandes revistas (Seara Nova, Vértice Tempo e o Modo, Almanaque) que se aguentavam apenas á base de vendas e assinaturas, perseguidas mas nunca vencidas (haviam de morrer quase todas já depois de 74, quando a possibilidade de fazer outras coisas mais imediatas destruiu quase completamente esse imenso associativismo cultural e cívico de círculos musicais, cineclubes, associações teatrais, teia robusta e imensa (vista hoje) que unificava gentes e terras e onde se aprendia a difícil tarefa da democracia e se experimentava a conviver em liberdade.
Acho, Zé C., que tivemos uma sorte do caraças. Apanhámos o boom do primeiro turismo, o fim do salazarismo, graças a uma cadeira que merecia ser beatifica pelos descrentes que ainda por aí andam. A guerra com todo o seu corteja de horrores e infâmias, permitiu a muito amigo e colega perceber coisas que nunca teria percebido não fosse o medo, a morte, “máfrica” (lembras-te?) e o a necessidade de entender aquilo. Também a prisão, o exílio, permitiram a tantos outros tentar perceber (olha aí está um título de um livro do Vasco). Eu declaro aqui uma dívida de gratidão ao senhor ministro que nos encomendou uma estadia em Caxias em 62. Aquilo foi uma segunda universidade, um treino para épocas piores, um relâmpago.
Eu não sei se concordas, mas estou em crer que foi nesses anos de vinho e rosas, de chumbo e ameaça, que paulatinamente substituímos o você pelo tu, que trocámos a gravata pela camisola de gola alta, a calça engomada pelos jeans, ou como o António Barreto gosta de dizer pudemos começar a usar calças de bombazina, que conforto!
Apetecia-me agora escrever um inteiro parágrafo com títulos de canções que nos iluminaram noites de insónia e de dança, mas receio cair na pieguice. Todavia a tua carta, relembra-me pelo menos esta que poderia ser um aviso, um slogan, um sinal. É que, ao escrever apressadamente este postal, fiquei com a ideia que, mesmo jarretas, mesmo avós, mesmo com mais barriga do que cabelo, estamos “on the road again”. Ou estaremos, se for preciso. Estão avisados!
PS: estava a pôr isto no blog e na TVapareceu um gajo a dizer que a ofensiva do Tet foi uma grande vitória americana e que as baixas vietcong foram dez vezes superiores às americanas: Valente besta! então este cretino não percebeu ainda, tantos anos depois que há vitórias que são derrotas? E não percebeu que, perdendo, os viets ganharam nesse dia, graças às televisões de todo o mundo, um claro mito de invencibilidade, de controlo do terreno, de heroísmo que aterrou a América? Estás a ver, Zé C. o que é ser geração 60? É não ser como aquele desgraçado comentador que ainda não percebeu nada de nada e que reduz tudo a números.
E que recado me dava esse inesquecível companheiro duma Coimbra irrequieta e pouco respeitosa (lembras-te pá, diz-me ele, da bruta confusão de 69?, o que a malta se divertiu, acrescenta com o agrément da mulher, caloira e grevista assanhada, nessa altura)?
Oh lá se me lembro, companheiro, se me lembro. E não me puxes muito pela memória que ainda aqui sai uma daquelas tuas aventuras libertinas, o quartinho que alugaste na baixa e o uso que lhe davas.
Mas não era destas pequenas liberdades (tão grandes, enormes naquela altura) que o Zé Carlos me falava mas doutra coisa que resolve encomendar-me para o blogue. Fala da nossa geração pá, dos anos sessenta em Coimbra, penico das Beiras (esta é da minha lavra, mcr), que só tinha vantagem da malta estar a milhas da família, à vontade e sem horas de entrada em casa.
E dizia-me que lera o artigo do Vasco Pulido Valente, que gostara, que ficara espantado e não sei que mais. Pois também eu li, mano, li e reli. Eu, de vez em quando, dou uma bicada no VPV mas confesso aqui muito à puridade que faço parte do numeroso grupo de fãs daquela escrita luminosa, daquele estilo falsamente simples, inteligentemente simples, daquela argúcia rápida, daquele português que o torna provavelmente no melhor cronista destes últimos anos. Fosse eu de invejas e o VPV estava morto. O raio do homem de vez em quando irrita-me mas, mesmo nesses momentos, reconheço-lhe a coerência interna e a qualidade literária. Por mim o texto dele, na aparente secura, na sua brevidade já terá dito tudo o que havia a dizer. Mas o Zé Carlos conjura-me em nome de um par de vezes em que me emprestou o quartinho milagroso na Baixa, que diga de minha justiça. E a mulher, em post-scriptum telegráfico secunda-o.
Pois aí vai. E começa-se já pelo p.s. da Julinha. A nossa geração, ó caloirinha de 68/69, teve esse primeiro privilégio, assistiu e participou na libertação da mulher, na assumpção de uma nova maneira de estar na faculdade, no amor, na tomada de decisões. E por vezes com coisas tão inocentes como essa agora inimaginável: foi nos anos 60 que as raparigas universitárias puderam começar a usar calças!
E recordo a esse respeito uma anedota do mais verdadeiro que há. Uma rapariga entrou na Faculdade de Letras de calças. O egrégio director, avisado por um contínuo diligente, apanhou a prevaricadora portadora de calças e disse-lhe que assim não podia entrar. Ao que ela respondeu: se for caso disso tiro-as já! O Pimpão (esse mesmo) corou, esbracejou, olhou a turba multa que se ia juntando, engoliu a prosápia e foi para o gabinete. E as raparigas de Letras passaram a usar calças...
Já antes se tinham habituado a ir às Assembleias Magnas, aos cafés (cafés, digo, e não pastelarias) sozinhas ou com uma amiga. Isto a que ninguém hoje dará importância é anos sessenta. E iam ao cinema sem o viático dum chaperon. Claro que ainda havia montes de lares de freiras onde as meninas se recolhiam a salvo do macho latino estudante e coimbrão. Mas começava a haver raparigas que alugavam um apartamento ou uma casa para viverem autónomas. Isto é anos sessenta. Como é anos sessenta (e bem que eu o disse a uma senhora jornalista que inutilmente me entrevistou e gravou horas de conversa) a espantosa participação nas lutas estudantis, onde as vimos corajosas, combativas, solidárias, leais, ao lado (e não atrás) dos colegas, dos namorados, dos amigos.
Poderia dizer, porque é verdade, que essa foi uma década dourada na música portuguesa (o Zeca, o Zé Mário, o Sérgio, o Adriano fazem todos parte dessa época mesmo que se deva dizer que o Zeca é bastante mais velho; só que foi nos anos sessenta que ele se tornou no arauto da nova geração) e anglo-saxónica (ai meu Em Órbita) e que também por aí os novos tempos (Times they are a changin’ do Dylan) entravam nas nossas vidas com um ímpeto hoje insuspeitado. Good vibrations, mano e camarada, good vibrations!
Continuando a falar de quotidianos menos conhecidos, é provável que já ninguém recorde que foi (entre nós) no inicio da década que começaram a aparecer os snack-bares e pouco depois os self-services que vem modificar hábitos de consumo. E que, noticiava um jornal, uma mulher, num café do Porto, rapou dum cigarro e, pimba!, acendeu-o! E foi posta fora pelo imbecil do gerente. E a freguesia, indignada, fez greve ao café! Como em Coimbra a malta fez greve ao cinema até obter bilhetes mais baratos mediante apresentação do cartão da AAC. E assim se ia criando a ideia de uma força, da força da solidariedade, ou seja, sem o saber deitavamos a primeira pedra da tal “geração”. E começávamos a conhecer a malta do Porto e de Lisboa, a sair daquele espaço fechado, mesmo se de “lavados ares” que era Coimbra. A polícia ministerial e o policial ministério da Educação deu uma ajuda ao expulsar estudantes e fazê-los circular pelas diferentes universidades. Ah dias do Estudante em Lisboa, continuamente proibidos, os autocarros parados à entrada das cidades universitárias e a malta a pé um bom par de quilómetros (lembras-te Manuel Sousa Pereira da maior caminhada da tua vida, terminada entre vivas e effe erre ás na Praça da Republica? Lembras-te Emanuel Nunes, flor e honra da actual grande música portuguesa, da tua estreia em Coimbra, lisboeta perdido numa cidade desconhecida mas solidária que logo te recebeu com dois copos e uma festarola na “Pra-kis-tão” onde foste eleito “cabide” honorário?). Onde estarão as minhas amabilíssimas hospedeiras lisboetas, que me receberam e acolheram num apartamento sei lá eu onde quando fugia da polícia e receava ser identificado pela capa e batina, burrice supina para quem ia tratar de coisas sérias. E a roupa que me arranjaram para poder sair ir até à Cantina (nova na altura, hoje velha, onde até joguei brídege com um animoso grupo de grevistas, devidamente autorizados pelo Eurico de Figueiredo e o Jorge Sampaio!!! Depois de andar vestido de espantalho estou por tudo.
E a Casa dos Estudantes do Império, o Clube Universitário de Jazz, o Cineclube, as múltiplas manhas para nos reunirmos, juntarmos, para discutir e poder começar a pensar?
Não posso falar se não pelo que sei, pelo que vivi, mas não tenho rebuço em declarar que esses anos foram de formação me abriram imensas portas, algumas delas em falso mas isso é outra música, e os meus actuais gostos desde o jazz ao cinema, do teatro à poesia, nasceram ou cresceram todos nessa época em fartas doses de discos emprestados, de programas geniais de música que nos mantinham acordados pela noite fora, dos ciclos de teatro do CITAC, em Coimbra onde se via um concentrado do melhor que se fazia em Lisboa e no Porto, os concertos da Juventude Musical Portuguesa, a literatura cineclubista (literatura digo e repito em homenagem a Orlando de Carvalho que anos a fio escreveu sobre filmes com um gosto, uma finura e uma argúcia exemplares), as grandes revistas (Seara Nova, Vértice Tempo e o Modo, Almanaque) que se aguentavam apenas á base de vendas e assinaturas, perseguidas mas nunca vencidas (haviam de morrer quase todas já depois de 74, quando a possibilidade de fazer outras coisas mais imediatas destruiu quase completamente esse imenso associativismo cultural e cívico de círculos musicais, cineclubes, associações teatrais, teia robusta e imensa (vista hoje) que unificava gentes e terras e onde se aprendia a difícil tarefa da democracia e se experimentava a conviver em liberdade.
Acho, Zé C., que tivemos uma sorte do caraças. Apanhámos o boom do primeiro turismo, o fim do salazarismo, graças a uma cadeira que merecia ser beatifica pelos descrentes que ainda por aí andam. A guerra com todo o seu corteja de horrores e infâmias, permitiu a muito amigo e colega perceber coisas que nunca teria percebido não fosse o medo, a morte, “máfrica” (lembras-te?) e o a necessidade de entender aquilo. Também a prisão, o exílio, permitiram a tantos outros tentar perceber (olha aí está um título de um livro do Vasco). Eu declaro aqui uma dívida de gratidão ao senhor ministro que nos encomendou uma estadia em Caxias em 62. Aquilo foi uma segunda universidade, um treino para épocas piores, um relâmpago.
Eu não sei se concordas, mas estou em crer que foi nesses anos de vinho e rosas, de chumbo e ameaça, que paulatinamente substituímos o você pelo tu, que trocámos a gravata pela camisola de gola alta, a calça engomada pelos jeans, ou como o António Barreto gosta de dizer pudemos começar a usar calças de bombazina, que conforto!
Apetecia-me agora escrever um inteiro parágrafo com títulos de canções que nos iluminaram noites de insónia e de dança, mas receio cair na pieguice. Todavia a tua carta, relembra-me pelo menos esta que poderia ser um aviso, um slogan, um sinal. É que, ao escrever apressadamente este postal, fiquei com a ideia que, mesmo jarretas, mesmo avós, mesmo com mais barriga do que cabelo, estamos “on the road again”. Ou estaremos, se for preciso. Estão avisados!
PS: estava a pôr isto no blog e na TVapareceu um gajo a dizer que a ofensiva do Tet foi uma grande vitória americana e que as baixas vietcong foram dez vezes superiores às americanas: Valente besta! então este cretino não percebeu ainda, tantos anos depois que há vitórias que são derrotas? E não percebeu que, perdendo, os viets ganharam nesse dia, graças às televisões de todo o mundo, um claro mito de invencibilidade, de controlo do terreno, de heroísmo que aterrou a América? Estás a ver, Zé C. o que é ser geração 60? É não ser como aquele desgraçado comentador que ainda não percebeu nada de nada e que reduz tudo a números.
2 comentários:
Gostava de ter vivido esse tempo. Que revolucionário eu não seria? Calhou ter passado mais tarde, numa geração que produziu pouco. Lembro-me, até, que um dia perante uma imensa plateia da Faculdade de Letras (já não me lembro a que propósito) eu fui enunciando as coisas que tantas gerações de Coimbra tinham produzido e nós... nada! Sinal dos tempos. De uma revolução que ainda nos trazia aparvalhados e de que nunca recuperámos.
Tenho um grande orgulho de ter pertencido a esta geração ( é a mesma, penso). Ser jovem na decada de setenta foi um privilégio. Um dia escrevo um post sobre a minha visão disto.
Abraços,
Silvia
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