07 setembro 2006

Os comentários

Do DIZLEXIAS. Já por diversas vezes eu defendi esta tese por aqui. Por isso, só posso aplaudir a sentença em causa.

A responsabilidade do blogger II

Sentença judicial brasileira considera que os comentários são parte do blog.
O brasileiro Fernando Gouveia, responsável pelo blog
Imprensa Marrom foi condenado, em primeira instância, a pagar uma indemnização no valor de R$ 3.500,00 (cerca de € 1.200) devido a um comentário anónimo considerado ofensivo.
De acordo com a sentença, "Embora não seja o requerido (o blogueiro Fernando Gouveia) o autor das palavras ofensivas, por certo que, disponibilizando o espaço, tem responsabilidade perante o ofendido", acrescentando que "a responsabilidade do requerido se mantém, pois que, ao disponibilizar o espaço para divulgação democrática (termo utilizado na contestação) do conteúdo inserido por terceiros, assume o risco sobre as expressões ofensivas veiculadas".

6 comentários:

josé disse...

Caro carteiro:

Permito-me discordar, apresentando razões antigas e escritas aquando do desaparecimento do Espectro de VPV/CCS. Copio aqui um comentário que deixei no Informática e Direito de Francisco bruto da costa.
Era leitor do Espectro, como aliás de outros espaços em blogs. Por exemplo, o Barnabé ou o agora Aspirina b.

Nestes últimos, é frequente ler-se comentários da pior extracção, relativamente a postais também da mais libertária expressão.
Eu próprio coloquei há tempos um comentário em que subscrevia um postal de um tal Daniel Oliveira, a alargar a liberdade de expressão para limites muito amplos e que abrangiam até a possibilidade do insulto.

Os blogs são um meio marginal de comunicação. Se lhe caparem o espírito libertário, tiram-lhe uma essência fundamental: a de potenciar o escapismo e a possibilidade de alguém desabafar acriticamente e de modo acéfalo.

AS pessoas por vezes, sentem essa necessidade e os blogs apareceram como veículos ideiais para tal. Permitindo o anonimato, potenciam o aparecimento de anormalidades e imbecilidades também.
Mas esse preço a pagar pela total liberdade de expressão parece-me muito baixo e razoável de pagar.

Isso não quer dizer que não possa haver situações pontuais graves e que não devam ser resolvidas pelos processos e meios habituais.
Mas, que fosse do meu conhecimento, nunca vi em nenhum blog, factos que incluiria nessa panóplia de atentados à honra e consideração de alguém dignos de figurar num processo crime.

E no entanto, farto-me de ler insultos ( alguns dos quais de que também sou vítima por escritos que publico) que a meu ver, só atingem quem quer ser atingido.

Os insultos anónimos, não deveriam provocar qualquer reacção porque sendo anónimos não tem seriedade para ofender e há modos de lhes responder.

O que pode tornar-se grave serão as difamações sérias.
Isso talvez justifique medidas drásticas. Porém, tal pode acontecer em qualquer lado; em qualquer circunstância e sem sequer nos apercebermos.
Ou seja, totalmente anónimas.
Pelo menos nos blogs, sempre poderemos saber de onde vêm...

De resto, respeito a opção pela moderação de comentários a quem optou por ter caixas deles.

Nos meus blogs pessoais, não tenho disso. Mas também não são para o público ler..."

Depois ainda escrevi outro pequeno comentário que complementa esse:

"O exercício da liberdade de expressão vale bem o risco de uns insultos avulsos. E como também já escrevi acima, no caso de existir calúnia grave, se for possível identificar a fonte, será possível a responsabilização. Se não for, também a calúnia vale o que vale: zero! E pode sempre ser desmentida na hora. No limite, com um blog feito de propósito ou com comentários colocados, se tal for possível.

É um risco que se deve correr, a meu ver."

Tudo isto para dizer que num blog a capacidade de encaixe deve ser muito maior do que num jornal e para casos graves haverá sempre solução que esta mais radical nunca resolve e aliás, até complica.

Uma das "conquistas" mais importantes nestes últimos três anos de blogs, foi a de poder ler algumas pessoas que nunca se exprimiam publicamente porque não tinham acesso aos media.
Agora têm estes e é notável poder ler algumas pessoas que apresentam a profissão como razão de escrita, como é o caso de alguns blgos judiciários.
Notável, caro carteiro, a evolução a que se assistiu!
Até aqui, no Incursões que foi palco de algumas picardias que felizmente ficaram apenas a azedar por pouco tempo ( espero bem) relações pessoais.
Não concorda?

Informática do Direito disse...

O debate a que se refere o José pode wer seguido aqui - http://informaticadodireito.blogspot.com/2006/03/regime-jurdico-da-blogosfera.html.

Silvia Chueire disse...

A decisão judicial mencionada irá à segunda instância.
Mas o que eu gostaria de dizer é : penso que a nossa justiça ainda não está preparada para lidar com este tipo de caso.Não creio que saibam avaliar o que é exatamente um comentário e o que se pode fazer com eles. No Brasil não há proporcionalmente a Portugal por exemplo, muitos blogs de juristas ou jurídicos, ou de advogados, que discutam os meandros da justiça.Temos sim, muitos blogs de jornalistas.

Poderíamos levantar algumas hipóteses, levando em consideração ou não o fato de que o dito comentário que resultou na ação foi feito a um post que tinha sido publicado a seis meses:

Nem todos os blogs têm um sistema de moderação de comentários e em outros o "dono" do blog preferiu não exercer nenhum tipo de censura.

Alguns sistemas de comentários não nos avisam de que foi postado um novo comentário, como o Haloscan,por exemplo, que eu uso. De modo que a não ser que fiquemos olhando antigos posts todos os dias não ficamos sabendo.

Fazia parte da sentença citada o seguinte: ( palavras da juíza) "Por certo que a intimidade do autor foi atingida, ao ser chamado de viado, cafajeste, filho da puta. Considera-se, ainda, o fato de tais expressões terem sido veiculadas pela Internet, atingindo um numero incalculável de leitores".

Ao responsável pelos posts neste blog ( Imprensa Marrom ) não foi sequer pedido pelo autor que retirasse o comentário do ar.


Para algumas pessoas inescrupulosas pode ser lucrativo postar comentários insultuosos ou denegridores a si próprio num blog de outra pessoa e depois acioná-lo.

Um comentário feito seis meses depois pode ter sido "plantado" ali de propósito.Certamente não parece ter tido a intenção de visibilidade.

Há neste momento, no Brasil, políticos nomeadamente o ex-presidente José Sarney acionando blogs baseado em comentários que poderiam vir a ser prejudiciais na sua campanha eleitoral. Ou seja, não se poderá mais criticar um determinado em tal ou qual tom, com ironias, piadas ou farpas.
A levar estas ações em consideração, algumas pessoas ( o que é lamentável) estão acabando com as caixas de comentários. Em certos blogs os comentários são muito enriquecedores do post. Assim, perdemos todos, por muitas razões.
Enfim, a lei não é o meu métier, aos senhores que trabalham com as leis é que caberá pensar estas questões.

Acho lamentáveis certas consequências que me parece, sentenças como esta podem vir a ter.

Abraços,

Silvia

ps: o poema que posto hoje é um absoluto acaso, era para eu tê-lo colocado aqui há dois dias e vim adiando por falta de tempo.

josé disse...

Por exemplo, como é que se há-de lidar com postais de blogs como estee que atinge firmemente a honra de pessoas concretas, mesmo que em escritos pretensamente sarcásticos?

Por mim, dou de barato que não merecem a honra de um processo crime, mas sim a de uma resposta pública à altura.
E isso chegaria, talvez.

o sibilo da serpente disse...

Caro José:
Acho que V. descentrou a discussão. Pelo que leio, o que nos distingue neste problema não é o caso concreto dos blogs: é o insulto.
Tanto quanto parece decorrer da sua posição o José tende a desvalorizar o insulto. Relativiza-o. Mas admita que nem todos reajam da mesma forma. Por exemplo: como reagiria se, numa qualquer reunião pública, alguém de dirigisse a si como traficante de droga? Desmentia? Ia às trombas ao acusador? Movia-lhe um processo? Desvalorizava e nem sequer respondia?
A resposta que der a esta questão é fundamental para abordar a problemática dos insultos através da internet. Para mim parece de uma evidência claríssima que os responsáveis por um blog respondam pelo teor dos comentários anónimos que ali são colocados. Veja: ninguém é obrigado a criar um blog; ninguém é obrigado e ter comentários abertos. Se opta por este caminho, deve assumir a responsabilidade do por ali acontece.
Claro que, ainda aqui, há algumas nuances. Não será certamente exigível que um reponsável por um blog esteja em permanência à frente do computador a deletar comentários insultuosos. Mas já será exigível que o retire logo que o veja. Se não o faz, assume o comentário como fazendo parte do blog pelo qual é responsável.
Dou-lhe um exemplo: recentemente, em comentário a um postal que aqui coloquei, alguém comentou qualquer coisa: «Essa gaja é uma puta».
Investido dos meus deveres de co-administrador do sítio, deletei o comentário. Fi-lo sem consultar os demais administradores - o que não seria fácil, atentas as cirunstâncias do momento - mas fi-lo com comvicção. Mais facilmente deixaria de continuar a ser administrador do que permitiria que o comentário se mantivesse.
Agi como achei que devia. Não sei se a senhora em questão leu o comentário. Se leu, terá certamente achado que resolvemos o problema da melhor forma. Mas imagine-se que o comentário ficava ali? Não teria a senhora em causa o direito de demandar quem mantém de pé um blog que permite que alguém ali escreva, anonimamente, que ela é uma puta?
Que poderia fazer a senhora perante o insulto? Desvalorizar? Desmentir?
Os blogs democratizaram a expressão, é certo. Mas isso não basta para sejam acolhidos como locais onde todas as alarvidades são possíveis. Aceitar isto é o mesmo que aceitar que andar a escrever e enviar cartas anónimas insultuosas também cabe nos limites da liberdade de expressão.
Por isso, meu caro: por mim não há dúvidas. Os administradores dos blogs devem ser responsabilizados civil e criminalmente pelos conteúdos dos seus blogs nos precios termos em que o são dos directores dos OCS.

(Creio, Silvia, que também lhe respondi)

jcp (José Carlos Pereira) disse...

Confesso que não pensei muito sobre esta matéria, e o facto de não ser jurista impede-me de ter mais certezas ainda, mas inclino-me para estar de acordo com o Carteiro.
A via desresponsabilizante levaria a um caminho demasiado perigoso e à eventual banalização do insulto.
O insulto de EPC a António Fiúza, por exemplo, já analisado mais acima, é mais grave por estar escrito num jornal do que se o fosse num blog? Não creio.