A talho de foice
Vamos por partes: eu sou filho do litoral. De Buarcos para ser mais preciso. Ai aprendi a nadar e a comer. Peixe de preferência. Todavia é verdade que de há uns largos anos a esta parte faço as minhas férias de praia na Galiza. A sul de Sanxenxo para escapar à multidão ruidosa e banhista.
É curioso que Sanxenxo conheci-o quando era uma pequena aldeola ou coisa pior. Amigos meus, exilados, não podiam pôr o pé em Portugal. Assim para facilitar contactos com a família, vinham para uma casinha numa quinta em Noalla, uma aldeia minúscula junto da Lanzada. Ou seja entre Sanxenxo e o Grove. Naquele tempo aquilo era o deserto, parecido com a tal margem sul do ministro Lino. Mais parecido, até, porque de facto lá, à falta de camelos só se via um habitante local a olhar para ontem, sem saber que dali a anos aquelas praias desertas iriam povoar-se de dezenas de milhar de turistas.
A costa galega a sul do Finisterra está penetrada de rias baixas onde agora uma praia rende quase tanto quanto a droga que os barões da dita desembarcam pela ria de Arosa.
Contudo apesar das centenas de hotéis, dos campings, dos apartamentos, a zona de Sanxenxo não parece carregada de pessoas. O segredo está em que fora três ou quatro praias da moda há mais algumas dezenas que não estando desertas também não estão superlotadas. Basta ficar a sul de Sanxenxo fora do eixo Silgar-Portonovo-Lanzada.
Em segundo lugar o serviço de limpeza das praias é mais que decente. Há lugares para estacionar. Os bares, os restaurantes e os chiringuitos têm bom ar, boas esplanadas, menus excelentes e a um preço irresistível. Tudo isto e um apartamento óptimo com o mar a três metros e a um preço que desafia toda e qualquer concorrência portuguesa, tem feito com que a CG e eu nem pensemos duas vezes: para a Galiza e em força! Acresce até que este apartamento pode ser nosso em qualquer fim de semana no inverno e na primavera sem pagarmos um tostão. A nossa hospedeira é assim que é que lhe havemos de fazer...
Depois, se o tempo se estraga, estamos a dois passos de Pontevedra ou Santiago. A Corunha fica um pouco mais longe mas pela auto-estrada é um tiro.
Para quem, que como eu, no Verão, gosta de comer muito mexilhão, idem de amêijoas muita salada e uns pimentos (pimientos de Padrón unos pican otros non), não há melhor. Nem mais barato. Nem mais calmo. O mar é ligeiramente mais quente que o litoral oeste português. E mais para cima no fim das rias altas, a água é francamente boa graças a uns braços da corrente do Golfo. Portanto a Galiza impõe-se pela sua cozinha marinheira, pela abundância de peixe e marisco no mercado, pela modicidade dos preços da habitação, pelo sossego (não brinco) de muitas das suas praias e pela amabilidade dos nativos.
Agora vamos ao lirismo gastronómico de JCP. A Taberna do Rotílio é apenas um dos grandes restaurantes galegos ou, melhor espanhóis, e vem citada em todos os guias da boa comida. E pelo que se come nem sequer podemos achá-la demasiadamente cara. Um restaurante da sua qualidade em Portugal teria preços muito mais elevados, quiçá o dobro.
O nosso JCP é uma força da natureza. Pelos vistos aviou um tamboril, muita carne de fumeiro, polvo(s) sem falar no queijo e no que ele chama tapas. Isto deve ser o programa de várias refeições senão o homem explodia.
E não falou no vinho. Nos vinhos do Ribeiro, nos Alvarinhos e outra especialidades da zona. do Salnez. Terá sido para não se morrer de inveja. Também só faz uma referência ao charutame “enquanto a coisa dá”. Em suma, o JCP foi à Galiza vingar os roubos inauditos que o bispo Gelmirez de Santiago terá feito na região bracarense. Ao que parece o bispo desconfiava que o San Tiago não chegava para tornar a terra num farol de peregrinos. Vai daí passou-se para Braga onde obsequiou o bispo e o restante clero local com um valente almoço. Os portugueses quando toca a comer de borla são uns ogres. E a beber uns odres (rima e é verdade). Parece que no fim do almoço, o bispo, o cabido e restante clero presente estavam que nem se vedavam. Perdidos de bêbados. Vai daí o Gelmirez satânico fez mão baixa das relíquias bracarenses e mesmo de terras vizinhas. Só se salvaram as de São Torcato porque os seus devotos estariam alerta.
Feitas as trouxas com o produto miraculoso dos roubos, ala que se faz tarde: Gelmirez e acompanhantes escafederam-se asinha, asinha, para o outro lado do Minho. Santiago tornou-se grande enquanto Braga... se ficou por Braga, a ver as relíquias por um canudo.
As leitoras lembrar-se-ão do Teodorico peregrino a perguntar como era Jerusalém. E a resposta pronta: Pior que Braga!
Pudera! Uma cidade episcopal sem relíquias decentes na sua catedral é uma cidade condenada a não ser senão o que é: melhor que Jerusalém e bonda!
as fotografias referem-se ambas à praia de Areas onde este vosso criado estaciona de manhã. É nela que está o restaurante A Postiña glória das esplanadas e local de almoço diário.
5 comentários:
Bons olhos o leiam MCR!
Adorei as fotografias: muito azul e muito verde.
(Infelizmente não conheço a Galiza)
Foi com o prazer de sempre que o li nesta crónica de viagens mas também gastronómica.
Dois beijos
Sem palavras...Quanto ao vinho no Rotilio, foi a melhor garrafinha de 50 cl. que por lá havia (que a minha cara-metade recusa-se a beber outra coisa que não espumantes e champanhes). Nem Ribeiro, nem Alvariño, foi mesmo um Rias Baixas.
Só pensam em comer :-)
MCR: com um bocado de jeito e de paciência sua e da sua CG, o jcp e eu ainda nos metemos a caminho, no verão, para lhe fazer uma visita à Galiza. Não é por nada, mas eu confio mais no seu conhecimento do terreno do que nos guias do jcp...
abraços
Meu caro Carteiro
Estou encantado e ás ordens
Meu caro Carteiro
Estou encantado e ás ordens
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