12 julho 2007

Au bonheur des Dames 76



Os político-empresariais, as politico-juvenis e nós

O dr. Mendes teria indelicadamente insistido com uma empresa pública a favor de uma privadíssima de que ele é ilustre membro da mesa de assembleia geral. O país ou a sua parte mais virtuosa levantou-se numa indignação apopléctica. Consta que uma virgem (??) do PPD rasgou o vestido de alto a baixo em sinal de repulsa. Quem assistiu (e do género masculino) mironou embevecido as carnes expostas esquecendo por um momento o ar de desgosto que se impunha.
Ora vamos lá a ver se nos entendemos. Declaração de interesses: eu nunca vi o dr Mendes senão na televisão nacional de que fujo a sete pés perante o silencioso protesto da família que acha insuportável a minha mania cosmopolita de só ver da TVE para lá.
O pouco que vi, e ele não dá para mais, não me convenceu. Por junto opôs-se a Santana mas isso que é muito para um ppd normal, para mim soa-me a pouco. Suponho não tenha grandes amigos no seu partido mas também isso me interessa pouco. Qualidades de estadista ainda não lhas vi mas se calhar é por eu também não as ver no dr. Meneses ou no dr. Jardim. De qualquer modo, o ppd não é da minha missa, sequer da minha rua e por isso até acho bem que ele presida aos destinos do seu partido: menos trabalho para a minha gente.
Agora a história da confusão entre o seu cargo de deputado e de empresário já me interessaria. É que, em boa verdade, eu gostaria que os deputados deputassem e basta. Claro que não é assim, nem nunca, entre nós, será assim. Os deputados recebem um estipêndio modesto, dependem da boa vontade do seu partido mais que da do eleitorado, o que significa que uma vez fora da assembleia, tem de ganhar a vida. O nosso sábio legislador entendeu que os negócios, as administrações, as assessorias (ah o que eu poderia contar sobre isso...) não estragam a qualidade do deputado. E tanto é assim que, ainda há dias, os jornais falavam de alguns deputados com fartos interesses fora do parlamento. Se bem lembro havia mesmo dois campeões: Vitalino Canas e António Vitorino para já não falar em alguns ex-ministros hoje reciclados nas grandes administrações de multinacionais, da Banca e doutras miudezas altamente pagas. E cito estes só porque eram os citados no jornal.
Portanto se o dr Mendes entendeu fazer lobbying, coisa que ele desmentiu apressadamente, não terá feito mais do que tantos outros. Com uma diferença notável. O dr Mendes está na oposição e pelo andar da carruagem vai continuar nesse aborrecido posto. A menos que as habituais multidões ululantes, muito comuns nos partidos “que não mamam” o defenestrem num futuro próximo. Quando se está na oposição, arranja-se com facilidade um bode expiatório, como é sabido. Mendes parece destinado a esse final pouco glorioso, mas muito comum que o digam Ferro, Constâncio ou Sampaio (que entretanto com um golpe de rins notável conseguiu apoderar-se de Lisboa e ser presidente incontestado).
Num sistema como o nosso, convém não enterrar a cabecinha numa metafórica duna e pegar o touro de frente. O sistema admite deputados cheios de cargos em empresas, em grandes escritórios de advocacia, em clínicas privadas. Só por ingenuidade estrénua é que se acreditará que eles não exerçam discretas influências quando os seus interesses estão em jogo. Não estão sozinhos, antes pelo contrario: a Europa regurgita de deputados que vêm das grandes empresas e a elas regressam sem nunca ter exactamente saído.
Pessoalmente, prefiro os deputados que já vêm aureolados por uma bela carreira empresarial àqueles que, quando saem, vão, sem se saber por que razão, para as grandes administrações. E os exemplos também não faltam. Piedosamente não os vou aqui recordar mas quem me lê deve saber a quem me refiro.
Antes que alguém me acuse de cinismo, quero dizer que preferia deputados bem pagos mas proibidos de fazer fosse o que fosse fora do parlamento. E também os preferia em círculos uninominais. Entre estar à mercê do aparelho ou do eleitorado prefiro esta última fórmula mesmo correndo-se o risco a ver multiplicarem-se os caciques. Olhando para vários países europeus não vejo especial perigo nessa fórmula. Finalmente nada tenho contra uma carreira puramente política (e por cá já as há). Enquanto isso não for normal teremos que o parlamento não atrai as elites, como aliás se vai vendo.

Vem isto a propósito de uma história mirabolante que me chegou há momentos via internet: uma jovem que ainda não fez vinte anos terá sido nomeada para a Administração de um Centro Hospitalar. A notícia completa-se com dois pormenores extraordinários: a precoce criatura recebe o ordenado desde Fevereiro mas até à data ainda não se apresentou ao serviço.
Vendo a notícia como a recebi com um senão: não dou o nome da criatura, nem a região do seu pingue emprego. Quem quiser saber mais sobre este novo milagre das rosas aqui vai o endereço: www.bragancanet.pt/voznordeste/complecta.php3?id= Vamos supor que isto é verdade. Estará nisso algum vício ou apenas se trata de potenciar o emprego jovem, meta aliás do actual governo. Objectar-me-ão que a criatura não tem currículo. Mas como é que havia de o ter se ainda não completou os 20 anos? Aliás a menina não vai presidir mas tão simplesmente ser “vogal” da administração em causa. Vai, numa palavra vocalizar. O presidente diz vamos aprovar a compra de uma cama articulada para o hospital X. A nossa vogal dirá “á”. O presidente diz: o senhor secretario de estado vem cá. E a vogal, já experiente, responderá “ó”. O presidente diz que o bloguista é um filho da mãe. A vogal acrescentará lacónica “é”... E por aí fora...
Todavia, eu não acredito nesta história. Parece-me um ataque insidioso às autoridades locais, regionais e nacionais, sem falar no sr. deputado por ***. Às tantas foi o sr. Mendes que resolveu vingar-se de quem lhe descobriu a careca.
O senhor Mendes ou alguém por ele deveria ter tento na língua e sobretudo não atacar as autoridades legítimas e regularmente constituídas num momento em que Portugal ( o nosso torrãozinho de açúcar...) desempenha a difícil tarefa de presidir aos destinos de trezentos milhões de pessoas. Alguém anda a fazer o jogo da reacção, é o que é. Calabouço com ele! Já!

na gravura: uma vogal de um centro hospitalar a preparar-se para entrar ao serviço.

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