Começou a primavera que agora, como os meses, se deve escrever com letra pequena, pelo menos pelo que manda essa aberração a que chamam acordo ortográfico.
Convenhamos que isto de dizer mal do acordo não condiz com o vago retrato deste vago esquerdista envelhecido e cansado. Eu devia achar que o acordo é um progresso e que não somos donos da língua e que o Brasil é dezoito vezes maior do que nós e que a na concorrência internacional não "acordar" é perder pontos. Será que esta gente acredita mesmo nisso? Que uma grafia em constante deriva (como se tem visto desde o primeiro acordo...) nos vai pôr ao lado do espanhol, do chinês, do russo, para já não falar do inglês? E que vamos vender muitos livros para o Brasil e que vamos ser importantes porque esta língua vale quase trezentos milhões de falantes?
Eu não tenho nada contra os linguistas, excepto quando eles se tentam apropriar da língua de que não são mais do que guardas ajuramentados, nada mais. Mas já tenho tudo quando, armados em donos, eles se metem a mudar a grafia sem darem cavaco à malta. Eles e os governos que são supostos tratar doutras coisas mais imediatas e obvias.
Esta discussão sobre hífens, maiúsculas, cês que caem, parece uma mania dos “anti-acordo” mas não é exactamente o que parece. É que este pôr-se sistematicamente de cócoras diante dos nossos amigos brasileiros sobre questões de grafia esconde outra pior e mais estranha coisa. Não é a grafia que nos divide, é a semântica, são as palavras a que damos sentidos diferentes. Escreva-se renda cá e lá que o significado é diferente. Ou rapariga. E contra isso népia.
O resto, a grafia (de que nem sequer o inglês se salva: experimentem a palavra teatro dos dois lados do atlântico...) não adianta nem atrasa. A importância do português de Portugal ou do Brasil está nesta simples coisa: para um estrangeiro é mais fácil aprendê-lo via Brasil do que via Portugal. Porque nós emudecemos as vogais e tornamos a língua ainda mais arrevesada para os estudantes estrangeiros que, por isso, preferem o brasileiro.
E contra isto não há acordo que nos salve. Ou melhor: basta mudarmos o sentido de umas centenas (muitas centenas) de palavras, a pronúncia e já está. Para gáudio do senhor Malaca Casteleiro, e do historiador da última página do “público”. E para perda de uma das poucas coisas que nos restam, a identidade. Valha a verdade que serve para pouco. Viva o acordo.
Eu ia escrever sobre dois desaparecimentos e nenhum deles era a pobre grafia onde consigo dar alguns poucos erros. Ia falar do João Gama e do galgo doido e brincalhão que assombravam com a sua alegria este jardim. Fica para outra ocasião.
Convenhamos que isto de dizer mal do acordo não condiz com o vago retrato deste vago esquerdista envelhecido e cansado. Eu devia achar que o acordo é um progresso e que não somos donos da língua e que o Brasil é dezoito vezes maior do que nós e que a na concorrência internacional não "acordar" é perder pontos. Será que esta gente acredita mesmo nisso? Que uma grafia em constante deriva (como se tem visto desde o primeiro acordo...) nos vai pôr ao lado do espanhol, do chinês, do russo, para já não falar do inglês? E que vamos vender muitos livros para o Brasil e que vamos ser importantes porque esta língua vale quase trezentos milhões de falantes?
Eu não tenho nada contra os linguistas, excepto quando eles se tentam apropriar da língua de que não são mais do que guardas ajuramentados, nada mais. Mas já tenho tudo quando, armados em donos, eles se metem a mudar a grafia sem darem cavaco à malta. Eles e os governos que são supostos tratar doutras coisas mais imediatas e obvias.
Esta discussão sobre hífens, maiúsculas, cês que caem, parece uma mania dos “anti-acordo” mas não é exactamente o que parece. É que este pôr-se sistematicamente de cócoras diante dos nossos amigos brasileiros sobre questões de grafia esconde outra pior e mais estranha coisa. Não é a grafia que nos divide, é a semântica, são as palavras a que damos sentidos diferentes. Escreva-se renda cá e lá que o significado é diferente. Ou rapariga. E contra isso népia.
O resto, a grafia (de que nem sequer o inglês se salva: experimentem a palavra teatro dos dois lados do atlântico...) não adianta nem atrasa. A importância do português de Portugal ou do Brasil está nesta simples coisa: para um estrangeiro é mais fácil aprendê-lo via Brasil do que via Portugal. Porque nós emudecemos as vogais e tornamos a língua ainda mais arrevesada para os estudantes estrangeiros que, por isso, preferem o brasileiro.
E contra isto não há acordo que nos salve. Ou melhor: basta mudarmos o sentido de umas centenas (muitas centenas) de palavras, a pronúncia e já está. Para gáudio do senhor Malaca Casteleiro, e do historiador da última página do “público”. E para perda de uma das poucas coisas que nos restam, a identidade. Valha a verdade que serve para pouco. Viva o acordo.
Eu ia escrever sobre dois desaparecimentos e nenhum deles era a pobre grafia onde consigo dar alguns poucos erros. Ia falar do João Gama e do galgo doido e brincalhão que assombravam com a sua alegria este jardim. Fica para outra ocasião.
1 comentário:
Caro MCR, subscrevo todas as suas reservas às virtudes e ao (in)êxito do acordo. Quem pensa que vamos inundar o Brasil com a nossa literatura está bem enganado. E, ou muito me engano, ou cada um continuará a escrever conforme aprendeu e de acordo com os hábitos enraízados de cada um dos lados do Atlântico.
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