23 fevereiro 2009

estes dias que passam 144


A propósito de um comentário

Copiei aqui abaixo um texto inspirado e inspirador da autoria de uma dignitária do regime. Pequena dignitária, mas dignitária apesar de tudo. Recebi-o com outra forma que denotava a sua origem e só não publiquei assim por não saber passá-lo tal e qual para o blog.
Tive o cuidado de verificar a sua autenticidade não só porque quem mo enviou é pessoa honrada (e ainda por cima militante com quotas pagas do P.S.) mas também porque tendo lido mais prosa da mesma criatura logo verifiquei (ou não tivesse exercido durante uma boa década crítica de livros) que o estilo se mantinha em todo o seu formidável esplendor.
Um amigo e leitor perguntou-me se eu garantia a veracidade do texto. A pergunta é legítima mesmo que me surpreenda. Eu ando nesta lide vai para três anos, tenho aqui publicados cerca de quinhentos posts, tenho alguma coisa publicada em diferentes jornais e revistas nos últimos cinquenta anos, e nunca me deu para, em casos deste género que podem envolver polémica, falsificar sequer uma vírgula. A palavra escrita permanece e a batota sempre vem ao de cima.
Nisto e no jogo. E em ambos é igualmente repelente.
Para mim estas croniquetas são, mais do que algum putativo dever cívico, um prazer simples e descomplicado que, para o continuar a ser, tem de se basear na simples verdade. A menos que me dê para a ficção (e já deu) e por isso me permita um toque álacre de fantasia sobre a nudez forte da verdade, como aconselhava Eça.
Todavia, quando me dou ao desagradável trabalho de criticar os poderes constituídos, sejam eles quais forem, como já terão reparado, tenho o cuidado de investigar as fontes. Por mais de uma vez, não escrevi o que me apetecia por duvidar destas. Ou, como há bem pouco, e sobre o FRIPÓR, defendi com unhas e dentes uma criatura de que não gosto, digamos mesmo que me suscita uma certa repugnância quando não algum desprezo, apenas por que não vi até agora indícios suficientes para a acusar. Alguns meros pontos circunstanciais não fazem um acusado. Defeitos da minha formação jurídica, se calhar. Mas defeitos de que me orgulho porque me evitam linchar alguém só porque não me agrada.
Dito isto, e porque a dúvida expressa por um leitor pode ser extensiva a outros, poucos ou muitos, tenho a declarar que aqui não se serve política requentada, não se perseguem justos, não há arcas encoiradas nem lobbies de qualquer espécie. Sou um pobre homem de Buarcos, louvo-me na franqueza, dou ao demo quaisquer interesses políticos ou outros e uso a pequena liberdade que ajudei a conquistar(quando muitos, uma imensa maioria, assobiavam para o lado) para discutir como português e cidadão questões portuguesas que interessam a portugueses. Como tenho muito pouco de nacionalista, também arrisco palpites sobre outros lugares. Mas sempre com a mesma linha de rumo: “a verdade, a áspera verdade” de que falava Danton. E não vou abonar-me no brocardo de Lenin (“a verdade é sempre revolucionária”) mesmo se a prática deste nem sempre foi tão concorde com a frase que, hoje, me parece ser apenas um truque retórico que serviu a causa do totalitarismo bolchevique. Mas isso são outras histórias...
Os leitores ficam pois prevenidos. É provável que muitas vezes me engane (e se puder retratar-me-ei), mas podem ter a certeza duma coisa: aqui não se serve gato por lebre nem se cede à propaganda ou ao amiguismo.
Amicus Plato sed magis amica veritas, como bem ensina Aristóteles (Ética para Nicómaco, I,4), o que em português dará: sou amigo de Platão mas mais ainda da verdade.

* a gravura: "O Tempo eleva a Verdade dentre a Disputa e a Inveja", Poussin (1640-2)

5 comentários:

Albino M. disse...

Marcelo...
Marcelo?
O brocardo não é de Lenin, é de Gramsci, Antonio Gramsci (embora passasse no nosso PREC, sempre, por V.I.).
Mas... a verdade é revolucionária, com efeito.
Abc.

Primo de Amarante disse...

Outro texto, sobre a mesma questão:

Escreve, hoje, no JN, António Pina:

O Carnaval da sintaxe
00h30m

Agora que o ME divulgou novos programas de Português preconizando que, no final do Ensino Básico, os alunos devem ser capazes de produzir "textos coesos e coerentes" e "correctos em português padrão", o caso da DREN continua a ser exemplar do "português padrão" em uso no ME e do nível de exigência do Ministério em relação à avaliação das "competências" dos seus altos (ou baixos, sei lá) funcionários.

Depois do histórico ofício sobre os "Magalhães", a directora de Educação do Norte (que é suposto ter concluído o Básico) escreve agora, em novo ofício, coisas "coesas e coerentes" como: "Sendo certo que muitos docentes não se aceitam o uso dos alunos nesta atitude inaceitável"; ou: "a sua [da escola] missão de processos de socialização"; ou: "razão central porque", e por aí fora.

Pelos vistos, as palavras e a gramática insistem em não respeitar a autoridade da senhora directora e, folionas (o ofício é, apropriadamente, sobre o Carnaval), fazem dela gato-sapato e escrevem-se como muito bem lhes apetece. Eu já lhes teria posto, como ao outro da piada sobre a licenciatura, um processo disciplinar.

António Pina(JN)

Sobre a questão da verdade.

Alexandre Koyré tem uma interessante reflexão sobre a mentira.

jcp (José Carlos Pereira) disse...

Caro MCR, nunca duvidei, como saberá, de que é fiel à verdade. Questionei-o apenas porque, tendo já recebido por e-mail imensas cartas e documentos falsos, desde a carta "lamexas" de Gabriel Garcia Márquez até muitas outras, podia dar-se o caso de não poder garantir a veracidade da carta da DREN. Se pode, estamos entendidos sobre a senhora Directora...

O meu olhar disse...

MCR, eu percebo a sua reacção e reforço o que referiu, nomeadamente quando afirma que “aqui não se serve gato por lebre nem se cede à propaganda ou ao amiguismo”.
Gostei.

Quanto à carta da DREN convenhamos que é tão má que, de facto, compreendo que até custe a acreditar. Segundo diz o Primo de Amarante este não é exemplar único e até haverá outros piores. Assim sendo, o que me ocorre perguntar é se não haverá ninguém na DREN que escreva correctamente português e faça o favor de secretariar a Directora. Outra pergunta que decorre naturalmente de tudo isto é: e não se pode substitui-la?

M.C.R. disse...

Raios! sempre pensei que era de Lenin... E eu a julgar que tinha lido Gramsci...


Caro JCP eu percebo a sua pergunta mas aproveitei-a para de uma vez por todas explicar a minha linha de rumo.

quanto à triste criatura que chefia a DREN nem vale a pwena comentar. aquilo é mesmo assim como aliás são assim boa parte dos nomeados pelos governos. com este a coisa vai mais fundo apenas porque a gula foi maior e a maioria absoluta os anestesiou. Pensaram que tudo lhes era permitido,,,