Que nalguns círculos/comarcas o défice de magistrados do MP é um facto parece-me indiscutível – não só o quadro existente muitas vezes não está preenchido como, em muitos casos, esse mesmo quadro é desajustado das necessidades (caso flagrante são muitos Tribunais de Família e Menores). Aqui tenho que dar razão ao Til, no seu comentário ao post “Mais?”
O aumento – e, claro, preenchimento – do quadro do MP parece-me, assim, desejável. Em que medida exacta, desconheço – não tenho os dados do levantamento que parece ter sido feito pelos procuradores-gerais distritais e que pode ter sido hoje debatido no CSMP. E também não sei em que premissas se baseou e é evidente que elas condicionam os resultados numéricos…
Quanto aos funcionários o problema é, para além da sua escassez, a sua falta de preparação.
Do que há demasiado tempo me venho apercebendo - e parece confirmar-se também da leitura do último Boletim do CSMP disponível no site da PGR, o nº 66 - é que as hierarquias continuam a reduzir os problemas com que esta magistratura se debate, no seu exercício funcional, ao número excessivo de inquéritos pendentes. Daí a cair no logro de se pensar que, com o aumento de quadros e a clonagem de diaps e diapinhos o MP ganhará o céu, é um pequeno passo.
Ora, no meu modesto entender, ao MP falta, acima de tudo, uma orientação estratégica que mobilize os seus magistrados para o exercício das suas funções socialmente (mais) relevantes, que combata a acomodação e o imobilismo, que aposte numa gestão de quadros que valorize a formação profissional e as melhores características de cada um e dela saiba tirar partido em benefício do todo funcional.
Uma orientação estratégica que deixe de encarar o despacho final no inquérito como o nec plus ultra, só porque é mais uma baixa na pendência - sem dar qualquer enfoque na imperativa qualidade intrínseca desse despacho, enquanto desfecho de um processo de investigação.
Uma orientação estratégica que passe a encarar como uma prioridade a formação dos magistrados do MP em geral e especificamente nas áreas da investigação criminal, em tipos específicos de criminalidade mais complexa, na da direcção do inquérito.
Uma orientação estratégica que revalorize a fase do julgamento, como o culminar de todo o trabalho prévio na fase de inquérito – ainda que o número de processos de secção não conte para as estatísticas do MP.
Uma orientação estratégica que, por via dessa revalorização, acabe com o fosso perverso, criado pela forma como estão organizados os diaps, entre a fase de investigação e a fase de julgamento.
Uma orientação estratégica que impeça o acantonamento do MP ao exercício – aliás, nobilíssimo – da acção penal, criando estruturas que lhe permitam exercer, efectivamente, as prerrogativas que a lei já lhe concede na defesa dos interesses difusos, em matérias cada vez mais relevantes nas sociedades democráticas, como sejam o direito dos consumidores, o urbanismo, a saúde pública, o ambiente.,
Uma orientação estratégica concretizada na redefinição de funções de algumas estruturas internas como procuradorias–gerais distritais, procuradorias de círculo/coordenação, diaps…
Uma orientação estratégica, enfim, que possibilite ao MP contribuir para melhorar significativamente o sistema de justiça e dar resposta aos desafios do futuro.
07 junho 2004
O LOGRO
Marcadores: direito/justiça/judiciário, kamikaze (L.P.)
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4 comentários:
Bravo, kamikase!
O MP afinal, ainda tem gente que pensa! Falta a acção...e a ultrapassagem de muito e variados obstáculos.
O primeiro é o exercício garantido da liberdade de expressão dos magistrados. Sem medos de perseguição profissional; sem recearem a temeridade de opiniar livremente.
Às vezes, parece que os direitos, liberdades e garantias que muitos apregoam, é assim uma espécie de verbo de encher discurso de ocasião e só para uso externo.
Também aí se impõe uma mudança, porque quem fala, é para bem da instituição, mesmo que alguns não gostem.
Na mouche, Nicodemus...
A resposta à sua pergunta começa assim, na Grande Loja:
"Numa altura em que no seio da Magistratura, e nomeadamente da magistratura do MP, há um esforço cada vez mais vísivel de adaptação aos novos tempos e realidades não deixa de ser sintomático e anacrónico, o último gesto do até agora discretíssimo Procurador Geral Distrital do Porto. Com efeito, pedir a abertura, junto do Conselho Superior do Ministério Público, de um processo de averiguações ao nosso escriba Pinto Nogueira, por alegadamente este ter violado o "dever de reserva" (!) aquando das declarações que proferiu ao JN (ver aqui) não lembra nem ao careca."
Peço desculpa, mas tanta "orientação estratégica" faz lembrar o General Loureiro dos Santos!
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