07 agosto 2004

Mais polémica no processo Casa Pia

Público «Gravações feitas por jornalista no âmbito do caso Casa Pia agitam meios judiciais»

«A polémica parece estar de regresso ao processo da Casa Pia, desta feita devido ao facto de terem caído no domínio público mais de 50 horas de diálogos entre Octávio Lopes, jornalista do “Correio da Manhã” (“CM”), investigadores, juristas, advogados, o director nacional da Polícia Judiciária (PJ), a assessora de imprensa da Procuradoria-Geral da República e outras personalidades relacionadas com aquele inquérito. (...)

As conversas terão sido transferidos para suporte digital, na sequência do furto das respectivas gravações, de acordo com uma carta remetida para o nosso jornal às 23h42 de anteontem. Octávio Lopes anunciou que já apresentou uma queixa-crime, formalizada ontem de manhã, não obstante o rumor sobre a existência das gravações terem começado a circular na semana passada.

Os registos em áudio poderão indiciar eventuais violações do segredo de justiça e outros ilícitos consumados nos diálogos entre as figuras do meio judicial e aquele jornalista.

As gravações contêm demoradas conversas de Octávio Lopes com a inspectora Rosa Mota, o desembargador Adelino Salvado, Catalina Pestana, os advogados Pedro Namora e Adelino Granja. E também declarações prestadas ao “CM” pelo penalista Figueiredo Dias e pela procuradora-geral adjunta Maria José Morgado. É por isso a circulação das gravações está a gerar incredulidade e preocupação entre alguns dos interlocutores de Octávio Lopes, tendo alguns deles, como é o caso do desembargador Adelino Salvado, remetido-se ao silêncio.

O jornalista, numa carta que enviou ao PÚBLICO, exprime a sua oposição quanto à divulgação das conversas e identidade dos respectivos interlocutores. “Tais gravações são um instrumento e o resultado do meu trabalho”, afiança (ver carta na íntegra). No entanto, contactado pelo PÚBLICO, o professor Rui Carlos Pereira, penalista e membro do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), não pareceu dar cobertura à tese do jornalista. “Admitindo que as gravações são ilícitas, ele [o jornalista] apenas é dono do objecto corpóreo [as cassetes]. Quem as levou cometeu o crime de furto, mas isso não significa que as declarações delas constantes sejam ‘propriedade intelectual’ do dono das fitas, no caso de não ter havido autorização para a respectiva gravação.”

Relativamente à exigência de Octávio Lopes de não ser feita qualquer referência à identidade das fontes cujos telefonemas foi gravando ao longo de muitos meses, o membro do CSMP afirmou: “A referência à existência das gravações, isto é, à eventual prática de um crime, não constitui em si mesmo crime algum e pode até servir para nos sensibilizar para situações com algum melindre.”

Nos registos armazenados durante um largo período pelo redactor do “CM” haverá pelo menos uma pessoa que, por três vezes, questionou Octávio Lopes para se assegurar que a conversa não estava a ser gravada, facto que foi desmentido pelo jornalista do “Correio da Manhã”, que ontem se remeteu ao silêncio. E contactada ontem à tarde pelo PÚBLICO, Maria José Morgado confirmou que falou com Octávio Lopes, para lhe prestar alguns esclarecimentos sobre questões de índole jurídica. “Eram declarações para serem publicadas, mas não me foi pedida autorização para as mesmas serem gravadas”, esclareceu Maria José Morgado. “O facto de as minhas palavras serem para publicação não exclui a ilicitude da respectiva gravação sem o meu conhecimento”, acrescentou.

O crime de gravações ilícitas e da respectiva divulgação sem consentimento do visado está previsto no Código Penal. Como esclarece Rui Carlos Pereira, “a existência deste crime pretende defender um direito de personalidade, o direito à palavra (falada), que por sua vez é uma expressão dos direitos à liberdade e à reserva de vida privada”. “Significa isto que, quando alguém fala deve ser livre não só de escolher o que diz, mas também de escolher a quem diz”, acrescenta. “Compreendo que, por vezes, um jornalista tenha a tentação de gravar palavras proferidas por uma ‘fonte’, sem esta lhe dar autorização, até para se defender de um eventual desmentido. No entanto”, alertou o penalista, “o jornalista deve resistir a essa tentação e construir com a sua ‘fonte’ uma relação de confiança — que é ambivalente — e nessa base publicar as respectivas declarações”.» (...)

JN «Gravações sobre Casa Pia agitam Polícia Judiciária»

«A circulação em diversos meios, nos últimos dias, de um conjunto de gravações de conversas, supostamente confidenciais, entre um jornalista do Correio da Manhã e diversos intervenientes judiciais no processo Casa Pia - entre os quais se encontrará, alegadamente, o próprio director da Polícia Judiciária, o juiz desembargador Adelino Salvado -, está a provocar grande agitação naquela corporação, tendo mesmo chegado a ser equacionada, ontem, a hipótese da demissão daquele dirigente.

Em causa estarão pormenores da investigação que poderão ter sido divulgados, por vários intervenientes processuais, em violação do segredo de justiça.

O mal-estar estende-se a outras área da Justiça, designadamente ao Ministério Público, que poderá acabar por ser envolvido neste caso.(...)

Ao princípio da noite de ontem, diversas fontes garantiram ao JN que, apesar de o cenário da demissão de Salvado ter estado sobre a mesa, tudo apontava, no entanto, para que, ao menos no imediato, a Direcção Nacional da PJ vá desvalorizar o caso, e sustentar que tudo não passa de uma manobra para tentar descredibilizar a imagem da polícia e do seu responsável máximo.

Ainda ontem, a revista Sábado citava fontes próximas de Adelino Salvado que admitiam que o juiz desembargador não iria renovar a comissão de serviço, porque estava cansado de "ver a sua vida esmiuçada nos jornais".»

6 comentários:

António Balbino Caldeira disse...

A "soltura" das gravações há tanto tempo em carteira, e anunciadas, pressagia a falta de controlo sobre o juiz que analisa o recurso?...

Qual o motivo porque se filtram as gravações nesta altura?

Anónimo disse...

Parece é que o novo Ministro da Justiça vai chumbar no primeiro grande exame sem apelo nem agravo...

Manuel disse...

Ó til,

é óbvio que o que circula é um best-off cirúgico... Aliás basta saber por alto o que publica o Correio da Manhã para ser no mínimo curioso que sobre algumas alminhas ou não apareça nada ou apareçam apenas coisinhas inócuas...

Manuel disse...

Carteiro,

Aposte na tripla e ligue-se ao MSN

Kamikaze (L.P.) disse...

Correio da Manhã, 9/8"Segundo as nossas fontes, depois de cerca de um mês de trabalho profissional, num pequeno mas bem apetrechado estúdio, com meios áudio e vídeo, situado na zona da Lapa, em Lisboa, a selecção das horas de conversa entre o jornalista Octávio Lopes e terceiros ficou feita. Dos iniciais 52 CD, em que terão ficado formatados todos os sons para posterior trabalho de escolha, ter-se-á passado para uma selecção final com cerca de vinte horas de conversas.

A este material decantado do bruto só o comprador inicial teve acesso. Mas – e aqui entramos na já referida segunda fase da estratégia de comunicação definida –, é feita uma selecção apertada dos “momentos mais quentes” das conversas entre o jornalista do CM e vários dos seus interlocutores ao longo dos últimos meses de trabalho. A estes destaques já tiveram acesso vários agentes da defesa de alguns arguidos do processo e restritos círculos políticos, nomeadamente, da área socialista.

Segundo fontes que reputamos de confiança, também nos últimos dias, alguns jornalistas já tiveram acesso a sons da demonstração, mas apenas um órgão de comunicação terá mostrado total disponibilidade para publicar partes das conversas seleccionadas e retiradas do contexto em que tiveram lugar.

Ainda segundo as mesmas fontes, este CD de demonstração ultrapassa uma hora de duração e tem dez faixas devidamente separadas em razão da pessoa que o jornalista Octávio Lopes tem como interlocutor. Segundo fonte por nós contactada, ainda não é líquido que todos os pedaços de conversa, que terão sido adquiridos por um dos arguidos do processo por larga maquia – as versões oscilam entre os “dez mil euros”, e “os vinte mil contos”(cem mil euros) – sejam provenientes da mesma acção criminosa.

GRAVAÇÕES OU ESCUTAS

Durante o último ano, os métodos de alguns dos profissionais ligados a “investigações privadas” – levadas a cabo por jornalistas ‘freelancers’ e outros – no âmbito do processo Casa Pia refinou-se com o recurso a meios tecnológicos de ponta. É admitido por fontes policiais e judiciais que parte dos sons possa ter origem em escutas ilegais de telemóveis." (...)

Manuel disse...

Meios tecnológicos de ponta !!!!!!!!!!!!!!! Então não era o Octávio Lopes que gravava os duetos todos ?

Só há uma coisa que não percebo (além de tudo o resto) com tanta "informação" supõe-se que na queixa que o CM fez sobre "material" roubado estejam em anexo estes dados todos, sim porque jornalistas sérios não atiram para o ar e depois não vão à PGR concretizar particularmente quando os visados senão principais suspeitos são eles próprios...