(esta semana à 2ª feira por problemas técnicos)
por marinquieto
Capítulo III
Os dias estavam maiores. Os fins de tarde iam ficando mais lentos, o tempo percorria com outra suavidade os trajectos da luz e a noite, quando chegava, já não era um solavanco. Tinham aprendido a provocar um jogo de acasos para se encontrarem sem que o sentissem como um compromisso. Foi ele, desta vez, quem o provocou. Queria surpreendê-la.
Acompanharam o pôr-do-sol com sons lidos nos lábios e silêncios de expectativa. Ambos adivinhavam que este encontro ia ter um final diferente. Para sempre associado àquela mancha difusa, cor de fogo, que traçava os contornos dos prédios. Ali, o Sol não dormia no mar. Açucena começava a ficar impaciente, olhava para o relógio, "o tempo passou depressa, já são 8 horas". Ele não conseguia disfarçar o embaraço. Mas nem um nem outro tomava a iniciativa de se despedir. Ela, sem que disso tivesse consciência, esperava. Eduardo travava-se de razões com as suas costumadas hesitações.
Num impulso, disse-lhe "gostava que lesses isto que eu escrevi", estendendo-lhe um caderno aberto na página em que tinha enlaçado as palavras com que, na ausência, a tinha lembrado. Um poema. Procurou concentrar-se nas palavras, decifrar-lhe a letra, ele continuava ali, estava agora a olhá-la. Leu apressada e sobressaltadamente. "É bonito". Devolveu-lhe o caderno que ele voltou a guardar.
O encontro tinha, naturalmente, terminado. Eduardo e Açucena despediram-se com uma espontânea e inabitual cerimónia. Não era um gesto de distanciamento, mas de celebração.
1 comentário:
A cada capítulo as palavras ganham fragrância e cor, levando-nos a (pre)sentir os ambientes e as personagens.Parabéns, marinquieto.
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