21 fevereiro 2005

Perdi, sem surpresa

Votei em quem perdeu, não me espanta, já me aconteceu muitas vezes e nem sequer estou surpreendido. A única coisa que me surpreende, é a tremenda viragem à esquerda que o país votou. O que vem confirmar aquilo que tantas vezes sublinhei: o grande centro é muito vulnerável, na vertigem de estar ao lado de quem está mais perto de ganhar.
Paulo Portas. O homem demitiu-se, fez bem, mas eu não acredito que ele não volte. Vai voltar. Vai voltar porque, afinal, ele não foi assim tão derrotado como nos disse. Vai voltar, porque ele acredita naquilo que diz e naquilo que faz. E vai ser obrigado a voltar, porque assim vai ser obrigado pelos militantes do CDS-PP e porque, neste momento, quem se perfila para o suceder é a incontornável Zézinha, coisa que não pode ser pior.
Fez mal Manuel Monteiro em embarcar na sua aventura. Uma aventura que estava condenada à partida. Mas o Manel sempre foi assim: sempre desconfiou da sua própria sombra. Conheço-o bem, e às suas desconfianças que o levaram a romper com o CDS.
Santana Lopes. Perdeu em toda a linha. Repito: o homem não é tão mau quanto mostrou enquanto primeiro-ministro. Continuo a pensar que ele é melhor do que Barroso. O grande problema: assumiu o poder em circunstâncias excepcionais, sem nunca ter sido líder da Oposição, num momento difícil para o país, num momento em que não estava preparado para assumir a função. Esse foi o seu grande erro. Deveria ter deixado que Manuela Ferreira Leite sucedesse a Barroso enquanto primeiro-ministro, assumindo ele a liderança do PSD. Tudo teria sido diferente. Provavelmente, nem teria havido eleições antecipadas.
Sócrates. Ouvi-o já depois de conhecidos os resultados. Continuo a pensar o mesmo que pensava sobre o senhor. Não me convence. Nunca irá convencer-me, creio. Espero que me engane. Sinceramente. Eu quero que Portugal avance. Seja quem for primeiro-ministro. Milito, mas não sou fundamentalista. E estou preocupado com a hipótese de começar a aceitar a postura de Miguel de Vasconcelos...
Governo. Há pouco estive a falar com o jcp deste blog. O que vai acontecer? Um governo do aparelho ou um governo pintalgado de independentes que confiram credibilidade à governação? Claro que vai haver independentes. E claro que vão existir até que haja a primeira remodelação governamental. A partir daí, manda o aparelho...
Futuro. O tempo que falta até às autárquicas é demasiado curto ou demasiado longo? Faz toda a diferença. Se é demasiado curto, a onda rosa vai reflectir-se nas autarquias. Se for demasiado longo, talvez o PS comece a pagar a factura e comece a perder o estado de graça. E começa tudo de novo. As férias pelo meio abonam a favor do PS, mas não podemos esquecer que o próximo governo vai ter de ser impopular. Logo se vê.
Jerónimo melhor que Carvalhas. Não surpreende. Como não surpreende o resultado do BE.

3 comentários:

Kamikaze (L.P.) disse...

Pois a mim surpreende-me quase tudo. Maioria absoluta do PS: não esperava, a campanha de Guterres teve muito mais élan e entusiasmo e não a conseguiu. Pelos vistos os eleitores estavam tão convencidos então de tal maioria que não foram votar. Ou Guterres errou ao não fazer dela um leit motiv de capanha. Não foi assim agora mas, pelos vistos (pudera!), votaram sem entusiasmo. Basta ver que nas ruas, esta noite, era mais o sossego que a algazarra.
Subida do PC - não esperava que descesse, mas tambm mais 3 deputados nunca imaginei. BE - subida prevista, mas sempre achei as sondagens irrealistas - 1 por Setúbal e mais 1 por Lisboa era o que previa, eventualmente mais um pelo Porto. CDS - esperava que subisse e... desceu! Como desceu a abstenção, exactamente ao contrário do que supunha...
Conclusão: andava tudo ainda mais zangado com a situação do que supunha... :)
Se não me falham as contas,o BE suplantou o PCP em 11 distritos e em 2 ficou taco a taco; suplantou o CDS/PPem 7 distritos e em 3 ficou taco a taco!

Conclusão: mesmo com maioria absoluta o PS vai ter que se cuidar (à esquerda)! Ainda bem!

jcp (José Carlos Pereira) disse...

Amigo, há ganhar e há perder. Quem milita por gosto, não cansa. Por isso, compreendo a tua posição.
No dia em que tive dúvidas em votar no partido de que era militante, saí para não mais voltar.
Para os eleitores e militantes do PSD chegou a hora da verdadeira luta...interna.

M.C.R. disse...

Vocês desculpem lá! Se calhar, e porque venho de tempos dificeis, custa-me a perceber essa lógica simplista do perdi, ganhei, empatei: quem nos anos 60 e 70 lutava pelo simples direito de votar ( e ia "dentro" por isso...) tem um imenso gozo em votar. Acha que, se forem muitos a votar, a democracia avança. Pouco, mas avança. Votaram muitos. Mais até do que as sondagens da abstenção confessam (é que ainda andam por aí muitos mortos por enterrar e muitos fantasmas nos cadernos eleitorais). Essa é já uma vitória. A segunda vitória é a da indignação: ser representados por uma aberração (Vasco Pulido Valente dixit) como Santana era demais... A subida generalizada de todas as esquerdas é um sinal que não deve fazer esquecer que o mesmo aconteceu em Espanha (legislativas) França (locais, regionais e PE) Itália (locais e regionais) e cá mesmo ainda não há um ano (PE). A maioria absoluta do PS era visivel (5 em 6 sondagens da última semana davam-na como certa) e a extrapolação dos números da votação para o PE já o tinha anunciado. Além do mais convenhamos: alguém percebeu o que queria fazer o governo PPD/PP? aquela gente governava?
A possível subida do PC não era uma miragem: quando os tempos são duros, os que lhe sofrem as consequências lembram-se da (indesmentivel) combatividade social dos comunistas. Já tenho mais dificuldade em perceber a subida do BE ou melhor a enorme subida. Novas gerações de eleitores? transferencia de votos directa da franja descontente do PPD/PSD que não quer engrossar as listas do eterno adversário? Porque há que convir: o BE sobe à custa de alguém. Ora se todos os outros sobem... As transferências directas direita esquerda não são novidade, nem o seu contrário: Na Alemanha houve transferências directas para os neo-nazis, como recordarão. Finalmente não vejo em que é que o BE pode incomodar o PS. Decerto que não é com o referendo do aborto ou com o casamento dos homosssexuais que vai ter grandes ganhos por muito respeitaveis que tais causas sejam. Quem votou quer medidas mais prosaicas, menos exaltantes mas de maior alcance imediato nas suas vidas. Quando o BE perceber isto, a famosa "análise concreta das situações concretas" do falecido Lenine, então sim, poderá começar a "ameaçar" a estratégia dos partidos de poder.
Que o Portas com os seus quatro inacreditáveis objectivos (ganhar as celeições, passar dos 10%, impedir a maioria absoluta e ficar á frente do PC) não tenha percebido o mundo em que vivia ainda vai. Que a malta de esquerda, que devia ser perspicaz e estar atenta aos ruídos da rua, não tivesse visto a tempestade engrossar, eis o que me surpreende. Ou seja: quase nada me surpreendeu e tudo me dá um grande gozo. Não a vitória seja de quem for mas o toque a rebate a que os portugueses responderam pacificamente: despedindo um incompetente.
Sem medo e sem ceder a uma carta choramingona, mentirosa e chantagista. O PPD/PSD está em dívida com todos quantos, derrotando-o, lhe dão a hipotese de mandar embora um líder tonto, presunçoso e irresponsável.
Agora é convosco malta laranja!
MCR