24 abril 2005

Para onde íamos em Maio? Para Abril

No dia 19 de Maio de 1962, duzentos e cinquenta estudantes de Coimbra barricaram-se na Associação Académica. Protestavam contra um acordo para encerrar a crise académica de 62 que, segundo eles, não defendia suficientemente os colegas de Lisboa nem resolvia os problemas que tinham feito parar a vida estudantil coimbrã. A polícia, a pide e guarda nacional republicana atacaram a sede da associação, aprisionaram-nos e algumas horas depois, feita a triagem, mandavam quarenta rapazes e quatro raparigas para Caxias. Nas ruas da cidade, entretanto, centenas de outros jovens manifestavam-se e eram convenientemente agredidos.
Nos autocarros que nos levavam para Lisboa, havia quase tantos polícias de choque quantos presos. Eu ia na primeira fila e do lado de fora. Volta e meia olhava para trás e observava os meus companheiros de infortúnio. Duas ou três filas atrás um jovem frágil e com ar extenuado dormia com a cabeça no ombro de um guarda de aspecto facinoroso. A placidez do dormente, o ar incomodado do polícia que, apesar de tudo, não se atrevia a acordar o rapaz que dormia, fizeram-me rir, ainda que silenciosamente. Por um lado íamos presos. Para uma cadeia de políticos, ainda por cima. Mas por outro a calma do dorminhoco dava-me uma coragem só ultrapassada pela ironia da situação: um polícia façanhudo com receio de acordar o preso.
Nesse momento percebi que, mesmo presos, éramos os vencedores.
13 anos depois, numa noite de 24 para 25 de Abril, aguardava com mais outros, poucos, conspiradores pela senha que nos enviaria para algumas missões de apoio à intentona. Noutro ponto desta cidade, o mesmíssimo jovem, agora com menos cabelo mas com a mesma determinação fazia o mesmo. Éramos colegas no mesmo escritório de advogados, defendíamos políticos e sindicalistas e nesse momento, preparávamos uma revolução.
31 anos mais tarde, mais velhos, mais gordos (pelo menos eu) escrevemos no mesmo blogue. Com uma diferença: enquanto eu avio umas trivialidades bem humoradas ele presenteia-nos com o belíssimo poema mesmo aqui debaixo. Tenho orgulho em dizer que fui eu quem o propôs para colaborar nestas incursões.
Viva o 25 de Abril!
Viva a amizade, saravah meu querido Anto: estamos vivos!

2 comentários:

Amélia disse...

Gostei de revivere sss momentos.Eu era caloira, vinda de Viseu. e foi o meu baptismo de fogo a sério na política.Só tenho ideia que o dia em que se tomou de assalto a então sede da AAC, no Palácio dos Grilos, foi 10 de maio de 1962...estarei enganada?De repente vieram-me tantas memórias...E ainda lembro os dirigentes de então...Um abraço e que a esperança continue a tornar-nos fortes!

M.C.R. disse...

Houve duas ocupações: a primeira foi pacíficamente feita e os ocupantes sairam. Falo da seguinte.Um abraço, Amélia. Eu era "semi" e o Anto caloiro estrangeiro.
mcr