22 junho 2005

Fascismo e futebol

Ontem à noite, a 2: passou um documentário da BBC muito interessante sobre a forma como os regimes fascistas de Itália, Alemanha e Espanha utilizaram o futebol como meio de propaganda de massas, tirando partido do grande entusiasmo popular em torno da modalidade. Mussolini levou a Itália à vitória no Mundial de 1934, realizado no seu país, designando ele próprio os árbitros dos jogos decisivos. Hitler, que procurou obter a consagração das suas teses racistas com os Jogos Olímpicos de 1936, também apostou no futebol após a anexação da Áustria, que tinha na altura uma das melhores selecções da Europa. Sindelar, o melhor jogador austríaco e que nunca aceitou vestir a camisola da Alemanha, cometeu a ousadia de brilhar e marcar no último jogo entre as duas selecções. A sua morte, em condições estranhas, ainda hoje não está totalmente esclarecida.
No auge da guerra-fria, Franco não permitiu que a Espanha defrontasse a União Soviética no Europeu de 1960, retirando o seu país da competição. O futebol era uma arma política e o Generalíssimo fez do Real Madrid a bandeira do país. O domínio do clube branco sobre as outras equipas era avalizado pelo próprio regime, como foi notório no caso de Di Stefano, que estava praticamente contratado pelo Barcelona e foi compulsivamente encaminhado para o Real Madrid. Aliás, o Barcelona servia de trincheira para muitos republicanos e democratas afrontarem o regime. A vitória do Barcelona sobre o Real Madrid, um mês depois da morte de Franco, foi festejada como se se tratasse de uma manifestação de libertação.
A promiscuidade a que hoje se assiste entre política e futebol não é, por isso, nova. De todo. Contudo, a forma como, à sua escala, alguns políticos têm procurado alicerçar o seu poder em torno do futebol, investindo somas exorbitantes de dinheiro público, deve interrogar-nos sobre as razões que conduzem a que esse tipo de manipulação continue, no dealbar do séc. XXI, a produzir os seus efeitos.

1 comentário:

O meu olhar disse...

Hoje, acredito, que a promiscuidade é menos "política" e muito mais "económica".
São múltiplos os interesses e muitos os agentes que interligam a "função política" a muitos outros interesses económicos, entre os quais também está o futebol.
Por outro lado, a valorização do curriculum político com o desempenho de um lugar do topo (Ministro, Secretário de Estado, Chefe de Gabinete, etc.) não tem em conta a qualidade do desempenho desse cargo, mas o facto de o ter desempenhado, o que constitui a chave para abrir muitas portas no futuro. Como dizia o outro, um Primeiro Ministro conhece muita gente, logo não é complicado arranjar emprego. Hoje o desempenho de um alto cargo político, a nível central ou local, funciona como um seguro de vida (boa), quer para o próprio, quer para o seu clã.