Bom vento para o Verão
Andava fugida a farmácia e boas razões havia. Em primeiro lugar o blogue aniversariava e havia que celebrar o primeiro e tenro ano do dito cujo com umas prosas que andavam por aí meio perdidas: para evitar um engarrafamento de mcr optou-se por encerrar a botica para obras. Depois com a controvérsia das férias judiciais e os gritos e sussurros que isso tem dado, entendeu este ajudante de farmácia de 2ª classe manter o estabelecimento em obras só permitindo a abertura para casos de venda de arnica ou alguma pomada para a eventualidade dos excessos da discussão descambarem numa feira de varapau á antiga portuguesa (versão minhota, claro). Não há minhotos ou, se os há, estão civilizadíssimos; preferem provavelmente discutir antes o marxismo-leninismo do que usar uma boa bengala nos lombos do contrincante. Nem o nosso caro José nos salva deste marasmo estival.
Bom, aviada que está a desculpa pela demora aqui vai: Ou melhor, há-de ir depois da historieta correlativa,
Andava este vosso criado a comparar os direitos (e na passada a fazer o possível por comparar alguma anatomia que se deixasse comparar...) pelas itálias do nosso contentamento (esta é para o nosso LC que anda muito "operário") quando numa preguiçosa tarde romana, cerca do Caffe Greco encontra a sua prezada amiga Montserrat Poblet (Montse para os amigos), colega de belas estúrdias comparatísticas acompanhada por um alegre grupo de espanholagem variada. Havia um secretário de embaixada (que dizia morras ao Franco ao segundo copo de Lambrusco, duas jovenzinhas com ar de estar a descobrir a Europa e os seus pecados (e eu prontamente me ofereci para cicerone, há que confessá-lo despudoradamente...) e uma senhora com cabelo curto e ar suave.
A Montse apontou-me esta última e disse: "claro que já ouviste falar da Carmen Laforet..."
Embatucado, e mais ignorante que uma batata doce, fiz peito e respondi, "claro então não havia de conhecer..." (e com os meus botões jurei matar a doida da Montse por tão insólita quão provocativa apresentação).
É que eu nunca tinha ouvido falar da criatura e, apesar do ar doce da senhora, do cabelo cortado curto à Jean Seberg tinha sérias dúvidas quanto ao que dizer-lhe. Optei por lhe oferecer figos. Abençoados figos que tinha mercado um pouco mais abaixo a um fulano com ar de abexim! E devia ser pelo negrume estranho da pele e pelo italiano mascavado que falava.
E fomos todos num ápice beber mais um café antes de, guiados pelo secretário de embaixada, aterrarmos no Trastevere" para um jantarinho prolongado e, ao que me recordo, bom e barato.
Entretanto já tinha estorquido à Montse um par de dados sobre a misteriosa Carmen. Tratava-se de um escritora que tinha há já um bom par de anos escrito um romance "Nada" que ganhara o primeiro prémio Nadal!!! Convenhamos que se eu estivesse a inventar não faria melhor...
O romance que li nessa mesma noite, graças á boa vontade do dito secretário alcoolicamente anti franquista era ABSOLUTAMENTE GENIAL. E meço as minhas palavras. Li-o porque ficara com curiosidade, porque a Carmen era uma excelente conversadora e sobretudo porque o meu ataque frontal á virtude das espanholitas em vias de europeização não dera imediatos resultados e carecia de mais embalagem e tempo. Ora como combináramos ir todos no dia seguinte a Ostia antica, achei melhor dar uma volta ao livro para manter a conversa em tom que me não envergonhasse. Ao fim e ao cabo representava ali, junto daqueles peninsulares, a pátria valente e imortal e não convinha envergonhar os heróis de Aljubarrota, padeira incluída.
O resto da história é vulgar. O Verão é sempre uma boa estação e o Verão italiano é para quem viu "Estate violenta" de Valério Zurlini (com Eleanora Rossi Drago e o Trintignan) uma coisa de comer e chorar por mais. Ainda encontrei mais um par de vezes a Carmen e soube há meses da morte dela.
E agora a receita do dia: A revista "Clio" nº 42, referente a Abril de 2005 mas só agora distribuida nos quiosques nacionais traz como oferta, nada mais nada menos, do que o "Nada" da Carmen Laforet. Tudo por € 3,50. Corram, manos! corram e leiam. É um romance fabuloso e a revista também não é má.
E já que falei no Zurlini, para quem for a Itália, bom será que procure os dvd deste grande senhor do cinema italiano. Aí vão alguns títulos: "la ragazza con la valigia" (com a sublime Cardinale, um dos primeiros filmes dela, ah, meu deus que me dá uma coisa...) "le ragazze de san Frediano" e "Cronacha familiare" dois filmes retirados de romances de Vasco Pratollini (leiam o Pratollini, manos, que para lá de um certo toque neo-realista, há boa e sólida literatura e ainda por cima as histórias passam-se sempre em Florença) o já citado "estate violenta" e "ma notte di quiette".
Andava fugida a farmácia e boas razões havia. Em primeiro lugar o blogue aniversariava e havia que celebrar o primeiro e tenro ano do dito cujo com umas prosas que andavam por aí meio perdidas: para evitar um engarrafamento de mcr optou-se por encerrar a botica para obras. Depois com a controvérsia das férias judiciais e os gritos e sussurros que isso tem dado, entendeu este ajudante de farmácia de 2ª classe manter o estabelecimento em obras só permitindo a abertura para casos de venda de arnica ou alguma pomada para a eventualidade dos excessos da discussão descambarem numa feira de varapau á antiga portuguesa (versão minhota, claro). Não há minhotos ou, se os há, estão civilizadíssimos; preferem provavelmente discutir antes o marxismo-leninismo do que usar uma boa bengala nos lombos do contrincante. Nem o nosso caro José nos salva deste marasmo estival.
Bom, aviada que está a desculpa pela demora aqui vai: Ou melhor, há-de ir depois da historieta correlativa,
Andava este vosso criado a comparar os direitos (e na passada a fazer o possível por comparar alguma anatomia que se deixasse comparar...) pelas itálias do nosso contentamento (esta é para o nosso LC que anda muito "operário") quando numa preguiçosa tarde romana, cerca do Caffe Greco encontra a sua prezada amiga Montserrat Poblet (Montse para os amigos), colega de belas estúrdias comparatísticas acompanhada por um alegre grupo de espanholagem variada. Havia um secretário de embaixada (que dizia morras ao Franco ao segundo copo de Lambrusco, duas jovenzinhas com ar de estar a descobrir a Europa e os seus pecados (e eu prontamente me ofereci para cicerone, há que confessá-lo despudoradamente...) e uma senhora com cabelo curto e ar suave.
A Montse apontou-me esta última e disse: "claro que já ouviste falar da Carmen Laforet..."
Embatucado, e mais ignorante que uma batata doce, fiz peito e respondi, "claro então não havia de conhecer..." (e com os meus botões jurei matar a doida da Montse por tão insólita quão provocativa apresentação).
É que eu nunca tinha ouvido falar da criatura e, apesar do ar doce da senhora, do cabelo cortado curto à Jean Seberg tinha sérias dúvidas quanto ao que dizer-lhe. Optei por lhe oferecer figos. Abençoados figos que tinha mercado um pouco mais abaixo a um fulano com ar de abexim! E devia ser pelo negrume estranho da pele e pelo italiano mascavado que falava.
E fomos todos num ápice beber mais um café antes de, guiados pelo secretário de embaixada, aterrarmos no Trastevere" para um jantarinho prolongado e, ao que me recordo, bom e barato.
Entretanto já tinha estorquido à Montse um par de dados sobre a misteriosa Carmen. Tratava-se de um escritora que tinha há já um bom par de anos escrito um romance "Nada" que ganhara o primeiro prémio Nadal!!! Convenhamos que se eu estivesse a inventar não faria melhor...
O romance que li nessa mesma noite, graças á boa vontade do dito secretário alcoolicamente anti franquista era ABSOLUTAMENTE GENIAL. E meço as minhas palavras. Li-o porque ficara com curiosidade, porque a Carmen era uma excelente conversadora e sobretudo porque o meu ataque frontal á virtude das espanholitas em vias de europeização não dera imediatos resultados e carecia de mais embalagem e tempo. Ora como combináramos ir todos no dia seguinte a Ostia antica, achei melhor dar uma volta ao livro para manter a conversa em tom que me não envergonhasse. Ao fim e ao cabo representava ali, junto daqueles peninsulares, a pátria valente e imortal e não convinha envergonhar os heróis de Aljubarrota, padeira incluída.
O resto da história é vulgar. O Verão é sempre uma boa estação e o Verão italiano é para quem viu "Estate violenta" de Valério Zurlini (com Eleanora Rossi Drago e o Trintignan) uma coisa de comer e chorar por mais. Ainda encontrei mais um par de vezes a Carmen e soube há meses da morte dela.
E agora a receita do dia: A revista "Clio" nº 42, referente a Abril de 2005 mas só agora distribuida nos quiosques nacionais traz como oferta, nada mais nada menos, do que o "Nada" da Carmen Laforet. Tudo por € 3,50. Corram, manos! corram e leiam. É um romance fabuloso e a revista também não é má.
E já que falei no Zurlini, para quem for a Itália, bom será que procure os dvd deste grande senhor do cinema italiano. Aí vão alguns títulos: "la ragazza con la valigia" (com a sublime Cardinale, um dos primeiros filmes dela, ah, meu deus que me dá uma coisa...) "le ragazze de san Frediano" e "Cronacha familiare" dois filmes retirados de romances de Vasco Pratollini (leiam o Pratollini, manos, que para lá de um certo toque neo-realista, há boa e sólida literatura e ainda por cima as histórias passam-se sempre em Florença) o já citado "estate violenta" e "ma notte di quiette".
4 comentários:
Já se sentia a falta da farmácia de serviço. E das respectivas receitas!
Vou ver se encontro esse "Nada" antes de ir a banhos.
Esqueci-me de dizer que o texto é em espanhol.Mas acho-o extremamante acessível pelo que não desanimem.
Meu caro MCR! Nem de propósito! Hoje, em Lisboa, dei com a Clio a olhar para mim, na Tema dos Restauradores. Não resisti ao convite, como habitualmente e ainda por cima, o tema de capa é aliciante: os meandros do Vaticano! Tema com interesse tremendo e actualíssimo, como sempre o foi.
Estude-se o Vaticano e percebe-se o funcionamento de todas as cúrias religiosas e profanas que por cá também temos, com os seus rituais e as suas secretas câmaras e os seus segredos de polichinelo que se escancaram às portas dos gabinetes quando o não são na própria rua, à entrada para os carros e perante microfones indiscretos...
Bem, esta CLio é de Abril e em Espanha já saiu a de Julho ( com o tema de capa sobre a Guerra Civil espanhola) mas ainda assim, agora há pouco poucochinho, ao tirar do plástico a revista, remirei o livro "attached" e por um momento, não foi parar ao cesto de papéis que jaz silencioso atrás de mim, porque costumo guardar as coisas que compro em papel impresso. Não sei bem para quê, mas não tem explicação plausível que se possa desenvolver aqui. É uma tolice, uma mania que só confesso depois de ter lido, há uns anos atrás e quando ainda era vivo, um certo Leonardo Ferraz de Carvalho que coleccionava tudo o que apanhava de revistas. COntou numa certa crónica que enquanto esteve no Brasil, foi Veja; foi Manchete, foi Time e foram muitas outras que o obrigaram a pagar grossa maquia em peso suplementar, na viagem aérea de retorno. Desde então que durmo descansado com a minha consciência de coleccionador atávico de papel de revista e cromos a condizer, pois sei que houve pelo menos um português pior do que eu, nessa condição viciosa.
Mas, como dizia, o livrito esteve mesmo quase, quase a provar o fundo limpo do cesto, por ter sido ainda ontem desbastado pela prestimosa empregada. A razão, era...o aspecto datado da capa que é simplesmente feia. Não a Carmen, mas a capa! Ainda por cima com um título como "Nada", nada mesmo o recomendava; e nem sequer a leitura enviesada da contracapa me demoveu da intenção inicial: lixo!
Mas não foi e agora, depois de ler esta elegia, é que já não vai e arrisca-se a ser leitura de cabeceira de umas próximas noites de insónia ou dias de...praia!
Nem sei como agradecer. Talvez lendo a obra, não?!
Nem mais, meu Caro, nem mais! O livro merece. Eu já me habituei a comprar as revistas espanholas com atrazo. Ao fim e ao cabo também não tratam de temas actuais. Mas o "Nada" é um excelente romance sobre um ambiente e uma época quase já delidos pelo tempo.
Um abraço e outro para o JCP: já o imagino pendurado num imenso charuto Montecristo nº5 a repassar o livro...
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