18 agosto 2005

Esclarecimento do Procurador-Geral da República

Dirigido ao director do Jornal O Público e hoje publicado a págs. 11 deste diário (e sem chamada à 1ª página ... claro!)

"Dirijo-me a V. Exa. na qualidade de presidente do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, e indo ao encontro do deliberado por este órgão, na reunião que teve lugar ontem, dia 16 de Agosto.
Prende-se tal deliberação com a necessidade de esclarecer a notícia vinda a lume na edição de sábado, dia 14 de Agosto, do PÚBLICO, a páginas 19 e assinada pela jornalista Tânia Laranjo, com chamada à primeira página.
O título do artigo, em destaque, é “Procuradoria demorou 16 anos a decidir situação de um inspector da PT” na pág. 1, e “Procuradoria-Geral da República demora mais de 16 anos para qualificar ‘risco agravado’ de polícia, a páginas 19.
Acontece, porém, que, se decorreram 16 anos sobre a ocorrência que originou o pedido de parecer, o decurso de tal lapso de tempo não é minimamente imputável ao conselho Consultivo da PGR, ao contrário do que, para qualquer leitor, decorrerá do modo como a notícia foi titulada.
Na verdade:
- O processo deu pela primeira vez entrada na PGR em 29-5-2002 acompanhado de ofício do Ministério da Justiça.
- Distribuído a 12-6-2002, o parecer entretanto lavrado veio a ser votado na 1ª sessão após férias de Verão, a 26-9-2002. Ou seja, a menos de quatro meses depois. Tal parecer não foi favorável à pretensão de concessão de pensão apenas devido à carênncia de elementos de facto enviados, certo que, como é sabido, o Conselho não detém competências instrutórias.
Em 15-12-2004 o Ministério da Justiça solicitou novo parecer, sobre o mesmo caso, agora juntando os elementos de prova em falta.
O segundo parecer, favorável, foi votado na sessão de 3-2-2005, ou seja, cerca de um mês e meio depois.

Já que o caso mereceu ser noticiado, interessaria que também este esclarecimento fosse do conhecimento público.
Por um lado, prestar-se-á assim melhor informação aos leitores.
Por outro, isentar-se-á a PGR do odioso de uma responsabilidade que lhe não cabe.

José Adriano Machado Souto de Moura
Procurador-Geral da República

10 comentários:

Gato_Maltez disse...

Pois...
Apesar de o país estar literalmente a arder, a verdade é que os senhores jornalistas persistem na sua saga de querer vender cada vez mais papel, nem que para isso tenham de incendiar o bom nome das pessoas e das instituições, como é notoriamente o caso.
A Senhora jornalista Tânia Laranjo já nos habituou a este tipo de jornalismo - sem aspas - e é pena que prosssiga nesta sua "metodologia".
Enfim, os leitores julgarão este tipo de jornalismo...
Ps: Custará assim tanto aplicar (também) o princípio do contraditório ao jornalismo? Teria sido complicado para a Senhora jornalista pedir um esclarecimento à PGR? Será só preguiça? Ná...! Outros desígnios andarão decerto pelo ar...

Primo de Amarante disse...

Será que se vai regressar à teoria da conspiração dos jornalistas?!...
A jornalista em causa foi convidada para um outro jornal, onde irá ganhar quase o dobro do que ganhava. Naturalmente, não será por ser ser má profissional!

Gato_Maltez disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Gato_Maltez disse...

Conspiração...???? Mas porquê? Será assim tão complicado solicitar uma simples informação ao Conselho Consultivo? Creio bem que não...
Creio que apenas estão em causa três palavras: Investigação, Rigor e, acima de tudo, Respeito pelos outros.

Já agora permita-me uma observação: O que é que ir ganhar o dobro tem a ver com qualidade? Terá talvez mais a ver com vendas e profits...não?

josé disse...

Caros Gato Maltez e Compadre:

Rigor e respeito pelos outros, pelas instituições particularmente,são, neste caso, a chave.

O jornalismo que se vê, neste caso concreto e ainda noutros exemplos recente, como aquele sobre os processos nos tribunais de menores e família na área da PGD de Lisboa, é mau.
E mau é o contrário de bom.
Que passe a ser e não será apontado.
A crítica que se faz a esse jornalismo não é destrutiva a meu ver, mesmo que o estilo( no meu caso) possa incomodar.

A pessoa da jornalista em causa,aliás, quase que é irrelevante.
Para mim é, porque se fosse outra pessoa a assinar, nos termos em que se fez, continuaria a ser mau e não seria por isso que iria escrever que era bom, embora desse jornalismo mau se possam retirar virtualidades boas, como sejam as possibilidades de discussão dos assuntos.COmo agora acontece.

Um jornal tem um peso na opinião pública muito maior do que um blog; é um meio de comunicação profissional; está sujeito a regras deontológicas e éticas e o Público até tem um Livro de Estilo que aparentemente não respeita.
MUdar para melhor, torna-se por isso uma exigência que eu como leitor do Público desde o primeiro número, faço. UM quixotismo, sem dúvida, mas que me sabe bem.
BOm dia então!

Primo de Amarante disse...

Caro Maltêz, não lhe vou responder taco a taco, porque não quero entrar no terreno (movediço) onde se colocou. Só lhe digo, que a coragem de jornalistas, como a Tânia, é fundamental para a transparência que vamos tendo na democracia que temos. E depois, evidentemente que uma admnistração privada, quando paga a dobrar, só o faz por que tem com isso melhores serviços. Na imprensa privada há avaliação de desempenho, o que não acontece em todas as profissões.
E em jornais, como o "Publico" é impossível "vendas e profits...", sem uma reacção veemente de protesto e exclusão pelos pares, o que também não acontece em todas as profissões. Eu podia-lhe lembarar alguns casos, mas não quero entrar por aí.

Gato_Maltez disse...

caro Compadre Esteves

Antes de mais, não me coloquei em qualquer terreno, muito menos movediço. Desculpe dizer-lhe, mas o meu caminho defino-o eu...

Em relação à virtude da coragem, admiro-a de sobremaneira, mas para fins viruosos, não para outras situações como a da notícia em causa que objectivamente revela evidente desinteresse pela descoberta da verdade.

Convirá que o conceito que utiliza de "melhores serviços" corresponde a maiores lucros, o que não significa maior qualidade. Aliás, uma coisa pode nada ter a ver com a outra.

Em relação à avaliação de desempenho - subitamente tão em voga - sempre me ensinaram a ser exigente comigo próprio. Sempre o fiz e não me tenho dado mal. Se tivesse seguido esse princípio de vida, a Sra Jornalista não teria cometido o erro em causa.

No que respeita aos protestos dos pares, peço-lhe humildemente desculpa, mas creia que não entendi essa sua alusão. Limitação minha, certamente...

Independentemente da posição (pública) de cada um de nós sobre estas matérias, é lamentável que questões essenciais como esta passem ao lado das grandes discussões. Enfim, um país de telenovelas e políticos subita, inesperada e injustificadamente ricos...

Tenha uma boa tarde.

Primo de Amarante disse...

Caro gato Maltez: V.Exc. diz que é V.Exc. a definir o seu caminho e que é V. Exc que acerca de si próprio faz avaliação e que " não se tem dado mal".
Com tanta autosuficiência que V. Exc. possui, que lhe poderão dizer os mortais como eu?!...
Sabe, no meu conceito de serviço público está a ideia de vivermos numa sociedade em rede, em interdependência,onde ninguém se deverá considerar autosuficiente (ou acima dos mortais). Se todos utilizassem a sua bitola, já reparou como poderiam ser entendidas as suas considerações sobre a jornalista?!... É que o que queremos para nós devemos também querer para os outros. E este principio contraria todos os pontos de vista privilegiados. A avaliação das consequências dos serviços prestados não deve, por isso, caber unicamente ao próprio. No meu conceito de serviço público, uma profissão é uma actividade de que se ocupa um grupo de pessoas com formação especifica para o seu desempenho em função da necessidade de serviços exigidos pela vida em sociedade. Por isso, o Estado ao reconhecer uma profissão atribui-lhe um papel social. A avaliação do desempenho desse papel não pode estar no próprio profissional. Isto não é questão de moda, é uma questão de princípios: "ninguém é juiz em causa própria". E é no confrontar da nossa opinião com a dos visados que a avaliação se harmoniza melhor com o princípio da verdade.
Quanto à questão da censura dos pares, penso que ela é fundamental e poderia dar-lhe exemplos para lhe lembrar os efeitos perversos do corporativismo profissional. Mas não quero entrar em polémica. Uma profissão cria expectativas e por isso, o exercicio da mesma é sempre merecedora de valoração ou de repúdio. Se os próprios pares repudiarem a falta de sentido profissional, a preguiça, a incompetência, o compadrio estão a dignificar-se a si próprios. Caso contrário, os utentes dos serviços pretados por esses profissionais dizem, "pois, protegem-se uns aos outros".

Primo de Amarante disse...

Como V. Exc. se re fere a " um país de telenovelas e políticos subita, inesperada e injustificadamente ricos..." procurei o seu email para lhe enviar um texto interessante duma noticia muito comentada pela generalidade dos cidadãos. Serve de exemplo para se avaliar as instituições a quem cabe responsabilidades nesse "enriquecimento subito" por não funcionarem bem e por terem ao seu serviço profissionais que agem de forma, pelo menos, pouco profissional. Se me enviar o email terei muito gosto em enviar-lhe o texto, que, por circunstãncia que não sei explicar, lhe falta a data, mas facilente poderá ser encontrada.
Também a noticia, hoje, dia 24, do "Pùblçico" sobre a situação de Avelino Ferreira Torres (pag.10. nacional) pode ajudar a reflectir sobre esta matéria. Mas, como é a Tânia Laranjo que escreve (embora também venha noutros jornais) não sei se V. Exc.lhe reconhece interesse de leitura?!...

Primo de Amarante disse...

Esqueci-me de uma questão: a de delegar na consciência o juizo dos nossos actos,como repete num outro post.
Convém não esquecer o que foi dito por aqueles que muito reflectiram sobre esta questão. Lembro que Hegel considerava que a consciência estava cheia de contradições, dividida entre o puro dever e o fazer impuro. Nietzsche viu na consciência a “voz do rebanho” e fez notar que muitas vezes a consciência não é outra coisa senão a “voz da vizinha”. Freud lembrou que há um inconsciente que fala em nome da razão. E Karl Marx fez saber que a consciência não é pura, uma vez que reflecte os interesses da cultura dominante. Max Weber, por volta de 1917, numa conferência na Universidade de Munique, defendeu que a ética da convicção (baseada na consciência) e a ética da responsabilidade (baseada na avaliação das consequências previsíveis da nossa acção)são inseparáveis. No meu entender, o melhor é estar aberto à opinião dos outros, confrontá-la com a nossa para evitar pensar como os que só descobrem erros nos outros e não são capazes de os encontrar em si mesmos ou nos grupos profissionais a que pertencem