Depois do 25 de Abril é a primeira vez que vamos ter eleições autárquicas com candidatos “fora-dos-partidos” (e não independentes!) por serem acusados de agirem “fora-da-lei”. E o mais paradoxal desta situação é o apoio que tais candidatos recebem das respectivas populações locais, a ponto das sondagens indicarem que podem obter a maioria das intenções de voto.
Uma das causas desta situação é, certamente, a perda de legitimidade dos partidos perante a opinião pública. Prometem e depois não cumprem, perderam o carácter ideológico, não cultivam o respeito por regras e não estimulam uma militância de inserção nos movimentos sociais. Aliás, de uma forma geral, os directórios locais dos partidos estão mais empenhados nos jogos de poder aparelhístico que no apoio aos militantes ou simpatizantes envolvidos em causas sociais. E as denúncias de corrupção e favorecimentos pessoais, que atingem todos os governos, acabam por justificar um pessimista lugar-comum: os partidos só servem para beneficiar alguns e não o povo.
Os partidos, aos olhos dos eleitores, foram-se tornando em meras legendas de reprodução de interesses individuais ou de grupo e, assim, abriram caminho ao populismo que, rapidamente, foi promovendo uma espécie de privatização de mandatos. A acção politica deixa de ser mediada pelos partidos e no quadro do respeito pelas leis para passar a conjugar-se unicamente na primeira pessoa: “eu faço, eu quero, eu mando”. Em nome pessoal, promete-se a resolução de todos os problemas e a vontade do povo passa a ser a única lei. É neste contexto que surge uma nova categoria de independentes: a dos que não são independentes por razões ideológicas, mas porque, sendo suspeitos ou acusados de crimes, os partidos (como é sua obrigação) não apoiam as suas candidaturas a autarquias. São os “fora-de-partido” por serem os “fora-da-lei”. Estes “chico-espertos” servem-se da erosão dos partidos para invocarem a vontade do povo e afirmarem, como Valentim Loureiro, que nada devem ao Partido ou se gabarem, como o senador do CDS, Ferreira Torres, que valem mais do que o Partido.
É urgente fazer reformas que ponham a funcionar as instituições, antes que a proliferação dos “fora-da-lei” acabe com a democracia.
JBM, no JN de hoje
21 agosto 2005
Os “fora-da-lei”
Marcadores: L.C.
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8 comentários:
excelente.
Isto está bom é para os fora da lei, compadre...
Mas isso só vem confirmar o sentido do meu texto e esse está na questão "os directórios locais dos partidos estão mais empenhados nos jogos de poder aparelhístico que no apoio aos militantes ou simpatizantes envolvidos em causas sociais. E as denúncias de corrupção e favorecimentos pessoais, que atingem todos os governos, acabam por justificar um pessimista lugar-comum: os partidos só servem para beneficiar alguns e não o povo.
Os partidos, aos olhos dos eleitores, foram-se tornando em meras legendas de reprodução de interesses individuais ou de grupo".
Por isso, não me refiliei e considero que os partidos estão, com a sua prática, a desacreditarem a democracia.
E quando os forqa-da-lei são absolvidos?
É preciso deixar de pensar que a inabilidade política e pessoal resulta a acusação pelo MP.
Por muito que custe a muito boa gente, não é ao MP que compete julgar as pessoas.
E, de uma vez por todas, havia que repensar a teoria dos indícios (conceito perfeitamente absurdo e monstro que vai devorando a nossa liberdade.
A acusação devia exigir provas suficientemente fundadas e credíveis de que um crime possa ter sido cometido pelo acusado.
E talvez se pudesse acabar com o estatuto de arguido.Ficavamos só com a noção de suspeito.
Enfim, não sou especialista, mas fico estupefacto com a sentença de Águeda. Não basta dizer que o sistema de Justiça funcionou. Era preciso sabermos como funcionou, ou não funcionou!E essa análise nunca a vimos feita. Até porque tem que se respeitar a "autonomia" de cada magistrado. E o que acusa não é o que apresenta as provas em julgamento. A culpa morre solteira (se houver culpa e pode não a haver).
Com situações daquelas até posso acreditar na inocência da Fátima Felgueiras (que alguns vão ridicularizando).
PS - AFT é outro assunto! Valentim não conheço, mas tanto quanto sei os factos de que o "indiciam" nada têm a ver com a Câmara.
Caro mocho: á mulher de César não basta ser séria, é preciso parecer séria. Os que escolhemos para nos governar vão ser referências no desempenho de um serviço à comunidade. A comunidade deveria escolher os que não são suspeitos de crimes. E se o forem, devem esperar que tudo seja esclarecido. É que não vão fazer um concurso para um emprego, mas representar-nos e fica mal a uma pessoa honesta, como o meu amigo, ser representada por um vigarista ou suspeito de o ser.
Dizia-me, hoje, um antigo aluno que dá aulas numa univeridade americana. No Estado onde ele vive é impossível alguém ser candidato sem uma "folha limpa". As suspeitas são resolvidas pela polícia e pelos tribunais rapidamente. Falou-me em dois meses e ninguém recorre, porque, geralmente, os recursos são agravados. E isto dá um prestigio muito grande à Justiça.Veja o que acontece aqui! Hoje, foi aceite a candidatura de AFT, mas se o recurso tivesse tido despacho, talvez não fosse aceite e é esta circunstância que sugere a impunidade do Avelino e dá da Justiça a imagem que sabemos.
Caro Compadre,
Eu defendo e sempre defendi que as pessoas devem ser sérias e honestas.
Mas há-de reconhecer que em Portugal é fácil ser-se suspeito. Basta uma qualquer queixa, até anónima!
Há uma presunção de honestidade que merece ser preservada a favor das pessoas de bem, que todos devemos ser (não só os políticos).
Já agora, tenho para mim que a América não devia servir de exmplo. Trata-se de um sistema em que quem arranja dinheiro é candidato. E a qualidade dos decisores políticos eleitos deixa muito a desejar quer quanto à inteligência, quer quanto à honestidade intelectual.
E já agora o que seria de nós sem recursos? No actual estado do Direito, em que predomina o voluntarismo, cada julgador faz a sua lei!!!
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