13 dezembro 2005

They live!

"O director do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Coimbra, Euclides Dâmaso, apelou, anteontem, para que a lei-quadro de política criminal tenha como prioridade os crimes de corrupção, que considera intimamente ligados ao estado de menor desenvolvimento económico do país.
Para o magistrado, que intervinha, em Coimbra, numa conferência sobre as implicações daquele anteprojecto de lei para o Ministério Público, «em Portugal está por fazer o estudo sobre as relações entre a corrupção, que foi alastrando, progressivamente, ao longo dos trinta anos de regime democrático, e a actual situação de crise financeira ou de recessão».
Segundo Euclides Dâmaso, o país pode até desconhecer o que Daniel Kaufmann, do Banco Mundial, afirma sobre Portugal: que «podia estar ao nível de desenvolvimento da Finlândia, se melhorasse a sua posição no ranking do controlo da corrupção».
Não pode, todavia, é «continuar a ignorar os alarmantes sinais de disseminação do fenómeno corruptivo, que, ciclicamente, emanam do interior do próprio sistema»."

"Corrupção em todo o lado
Magistrado coloca a adjudicação de obras públicas, e a respectiva fiscalização, no topo da lista das áreas críticas da corrupção em Portugal. É a grande fonte de financiamento dos partidos, diz Euclides Dâmaso" (...)

A ler no Diário de Coimbra

21 comentários:

blábláblá disse...

Gostaria de saber se o director do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Coimbra, Euclides Dâmaso, depois destas declarações, também vai ser chamado a depor no Ministério Público (!!??) ou se vai ser aberta alguma espécie de investigação tal como aconteceu com outros responsáveis por cargos públicos que produziram afirmações semelhantes."

CAA no blog Blasfémias

Primo de Amarante disse...

Plenamente de acordo.

Um dos deveres mais importantes do cidadão é acompanhar e fiscalizar os governantes que elege. É ficar atento para que esses governantes não destruam o seu futuro. É função do cidadão impedir que o governo seja corrompido. No entanto, quem tem denuncado a corrupção de autarcas ou governantes tem sido acusado de difamação, em vez de se investigar se essas denuncias eram ou não justificáveis. Com isso, há cidadãos que andaram pelos tribunais cerca de cinco anos, muitas vezes com deslocações em vão, pois era adiado o julgamento, gastando o que lhes fazia falta e sendo humilhados em pleno Tribunal. Muitos destes cidadãos acham que têm o dever de recordar a sua "cruz" por fazerem o que deveriam fazer (denunciar corruptos)e esperam que não vejam nos seus desabafos algum rancor pelo mesmo.
Só querem que a postura de muitos magistrados seja a mesma que a do que é referido no post.

Primo de Amarante disse...

Lembram-se do Avelino Ferreira Torres?!... Leram o que ontem dizia o actual presidente da Câmara do Marco, no "Público"? O titulo era: «Marco de Canaveses vive situação de emergência municipal». Autarquia empenhada; só 24% do concelho tem abastecimento de áua, etc.,etc.

Passou por mim, ainda hoje, o dito ex-autarca num bruto Mercedes topo de gama. Não ia na direcção do Tribunal, onde estão pendentes inumeros processos e recursos de processos há já não sei quantos anos,mas na direcçao do Marco.

Perante estas situações, haverá estimulos para combater a corrupção?!...

M.C.R. disse...

Há, caro Compadre, claro que há. E também para, à sorrelfa, lhe pôr um risco gordo na viatura.
Li não sei onde que há 300 autarquias com processos pendentes (conselhos, freguesias etc...) na PJ.
Um jornal de ontem, trazia o impossível: um prédio em Lisboa ocupa grande parte do passeio!
Uma criatura vagamente aparentada com o futebol, as autarquias e as negociatas tonitroava ontem, noutro sítio do mesmo jornal que a linha do metro em frente da escola de enfermagem do Porto estava perfeita apesar de praticamente invadir a propriedade alheia e põr em risco a vida de quem entra e sai.
É gente desta, com atitudes destas, sem respeito pelos contribuintes, que dá azo á revolta pelo Zé Povinho e ao autoritarismo ilimitado das grandes empresas. É este clima malsão que permite a corrupção, o escândalo do sobre-endividamento das obras públicas e a pobreza generalizada da população que assiste a tudo sem um pio. E por vezes com inveja de não poder também meter a pata no prato das esmolas...

C.M. disse...

É toda uma geração de "patos bravos" que teve carta de alforria após 1974 e que não teme o poder coercitivo do Estado, pois sabe que este está nas suas mãos, precisamente dos homens que nada querendo saber da causa pública e do bem público, se servem da máquina administrativa para a prossecução dos seus interesses particularíssimos.

Interrogo-me como isto foi possível: como pôde, o actual regime político-constitucional, gerar uma sociedade onde, nos postos-chave, pontifica gente intelectualmente tão pobre, tão mesquinha, tão desligada da fraternidade, da solidariedade!

E não digam que é uma herança do passado...esta raça de “feirantes” surgiu precisamente depois de 74...talvez já existisse mas estava certamente “oprimida”...

Decididamente, não existe nesta ponta ocidental da Europa uma mentalidade finlandesa, sueca ou norueguesa...É pena. A sensação é que nunca sairemos desta vil tristeza.

Há tantos anos que ouvimos falar dos mesmos problemas, que continuam sem solução: o analfabetismo, a qualificação profissional, o desemprego, o PIB que é baixo, o fim do Estado Social (convém a certos senhores...), a falência da Segurança Social ( a propósito, para quem estamos hoje a descontar? Como viveremos amanhã se o Estado não nos pagar a pensão a que legitimamente temos direito? Vamos viver todos para debaixo das “pontes”?

E depois passamos o nosso dia-a-dia a ouvir certos senhores, muito contentes consigo próprios, a tecerem loas ao actual regime: pudera! Este é uma mina para as negociatas!

Primo de Amarante disse...

Caro amigo:
No antes de 74 (revolução de Abril) havia muita corrupção. Simplesmente denunciá-la era pôr em causa o regime. Da maioria dos casos, só se sabia quando se tinha acesso á imprensa estrangeiro. Quem não se lembra dos empreiteiros do regime, dos administradores que faziam lei dos seus actos, dos presidentes de Câmara nomeados que tinham estrada alcatroada até sua casa, do presidente do belenense que entrou de pistola na cabine do arbitro, etc., etc. Começava logo pela imoralidade do próprio regime que viciava resultados eleitorais, não respeitava a dignidade dos cidadãos, prendia-os por delito de opinião, combatia a organização autónoma dos trabalhadores, mantinha uma guerra contra tudo e todos, nomeadamente contra o pensamento da Igreja. Lembra-se do nepal lançado em Africa, dos crimes de Wiriamo (suponho que é assim que se escreve). E o que dizia o “Direito à Informação”, uma publicação clandestina de católicos? E a carta do Bispo do Porto e as intervenções de D. Florentino, Bispo da Beira?!... etc., etc.... A. hipocrisia do sistema político fazia dele um embuste. .Nada que se compare como Hoje.

Tenho admiração pelo meu amigo, mas não posso deixar de estar em total desacordo consigo nesta matéria. O meu amigo deve ser muito novo e não imagina as lutas pela liberdade e pela justiça que a minha geração travou, com prejuízos da sua vida pessoal e familiar. O MCR é testemunha da verdade do que lhe digo.

M.C.R. disse...

Caros Compadre e Delfim.
Têm, se me permitem este tom salomónic, os dois razão. E mais, noto um certo acordo nas entrelinhas do que escrevem.
De facto a corrupção não nasceu com o 25 A.
De facto, a actual corrupção é inimaginávelmente maior do que era no tempo da outra senhora. Apesar de tudo, os regimes autoritários não são são por definição sempre corruptos. Nem, muito menos, incorruptíveis.
A sensação actual é a do desbragamento dessa gentuça que, mesmo existindo (em menor escala Compadre, em muito menor escala, sem aceitação social e sem o actual atrevimento destes) não se arriscava como agora.
A imprensa livre (mas não tão livre assim: haverá alguém que se atreva a criticar o eng. Belmiro???) permite conhecer parte desta conspiração contra a "res publica". isto quando o jornalista não tem a pata escrevinhadora untada pelo gatuno...
As questões políticas que atravessaram o regime "marcelista" desde a denúncia da guerra e seus crimes (Wiriamo é uma forma sensata de falar de Wiriamu) até as chapeladas eleitorais só tiveram publicidade em círculos restritos e já os sessenta iam adiantadíssimos...
Compadre: chapeladas eleitorais houve desde que em Portugal começaram as eleições. Vêm do parlamentarismo oitocentista, prolongaram-se (e de que maneira!) na 1ª República e só não se mostraram entre 33 e 58 (as eleições do Delgado) porque não havia necessidade...nem concorrentes!
Esta é também para o nosso contrincante Delfim, claro. E que não se esqueça que o "Estado Novo" é também filho dos monárquicos que o apoiaram (e com que força!)
Quanto ao papel da Igreja, Compadre, façamos aqui um piedoso silêncio. A Igreja apoiou por boas (e houve-as...) e más (idem) razões o Dr Salazar que lhe deu poderes extraordinários desde as aulas de religião e moral, aos crucifixos nas escolas sem esquecer a concordata ea generosa ajuda às Misericórdias e às Obras de caridade eclesiais. E à imprensa católica. E a Fátima...
Houve momentos em que o estúpido anti-clericalismo republicano quase foi perdoado por gente tão fora disso como este vosso criado. Aquilo era demais: o doentio moralismo, o ataque ao casamento civil, os trajes de banho ridículos nas praias até aos anos 60. alguém se lembra dos "peitilhos" obrigatórios sob pena de multa que até miúdos de sete e oito anos tinham de usar na praia?
O que nos salvou foi o turismo (incluindo o espanhol...imaginem) eu que sou de uma praia lembro-me bem. E envergonhado1 aquilo era ridículo..
Um dia destes ahaveremos de falar disto. Até lá um abração aos dois que fazem este blogue respirar, ter vida.

C.M. disse...

Obrigado ao Compadre Esteves e ao MCR pelas suas belas exposições.

Creio bem que o MCR elaborou uma boa síntese dos problemas antes e depois do 25A:

De facto, "(...) a actual corrupção é inimaginávelmente maior do que era no tempo da outra senhora." (...) "A sensação actual é a do desbragamento dessa gentuça ..) "

As "razões" da Igreja também estão bem enunciadas...

Quanto ao Compadre, sei que não existem sistemas perfeitos, pois eles são feitos pelo homem, logo, imperfeitos serão por definição...

O que causa náusea é a falta de horizontes que a actual geração de políticos demonstra, a sua má preparação, humana e técnica (andamos há 31 anos a ouvir falar dos mesmos problemas e estes continuam por resolver, pois existe uma total falta de ideais, de objectivos, a ausência de um dinamismo que empolgasse a Nação para um dado objectivo. Ausência, no fundo, de interesse: desde que esses senhores orientem a respectiva loja…

Eu, ao ler a História de Portugal, as biografias de homens do Estado-Novo, como …olhem, deixem-me dar-lhes alguns exemplos para ficarem com uma ideia (e não para mostrar que leio alguma coisa, OK!):

Pedro Theotónio Pereira – Memórias;
Franco Nogueira – Juízo Final;
Marcello Caetano – Minhas Memórias de Salazar;
Tempo de Vésperas – Adriano Moreira;
Salazar e Caetano Falar Claro – Sá Viana Rebello, etc,
fico com a nítida sensação de que se tratavam de homens que tinham um sentido da História, um sentido do dever, da honra, de missão. Podemos não concordar com essa mesma visão, com os valores defendidos, mas creio que concordaremos que se tratava de homens honrados.
Vasco Pulido Valente (e eu não concordo muito com ele, acho-o um cínico…) no seu livro “ Marcello Caetano – As desventuras da razão”, escreve, a fls. 83: “O verdadeiro apelo que [Marcello Caetano] dirigiu aos Portugueses foi um apelo moral”, considerando ainda que a sua legitimidade advinha “da legitimidade cristã” do “recto e prudente exercício do poder”.

Mesmo numa obra crítica como é a de Helena Matos – “Salazar Vol. 1 – A Construção do Mito”, e “Salazar Vol. 2 A Propaganda”, da ed. Temas & Debates, é possível respirar a intensa febre que assolava o País em termos de realizações no campo da engenharia, da arquitectura, casas sociais, escolas, pontes, barragens…enfim, o MCR sabe o que eu quero dizer, pois já trocámos impressões sobre esta matéria, embora a respeito das Colónias…mas o princípio é o mesmo...

E hoje não existe esse espírito empreendedor! Apenas temos “feirantes” e “merceeiros” à frente do Estado!

Mas eu interrogo-me (é algo que me perturba): então que é feito daqueles que quiseram mudar o Regime? Onde estão eles? Que fazem? Estão satisfeitos? Contentes com os actuais “monstros”?

Pena foi, no limite, não termos feito uma transição pacífica e suave, como em Espanha…e ela aí está: uma potência! Marcello Caetano quase o teria conseguido…mas a História é madrasta!

Meu caro Compadre, concordo consigo que nem tudo é perfeito.

Lembro-me, para falar dessa coisa horrível, a guerra, que estive em vias de ir parar a África - foi o 25A que me “livrou”, “in extremis”, dessa viagem…com efeito, a guerra obcecava os jovens de então..apenas os adiamentos na universidade poderiam atrasar o “passeio”…

Mas creio que todos perdemos com os ventos da História: ficámos mais pobres, nós e os nossos irmãos de África…basta olhar para o estado caótico, a nível da economia, habitação, saúde pública, das nossas ex-províncias ultramarinas.


Enfim, isto é um tema infindável (e apaixonante!).


Um Abraço para os dois, MCR e Compadre!


Delfim Lourenço Mendes

Primo de Amarante disse...

Procuro só dizer o que penso e estou aberto ao contraditório. Não espero, por isso, uma solução que esteja acima de uma presumível contenda que não existe.

Continuo a pensar que antes do 25 de Abril não existiu apenas um regime autoritário, mas fascista e este regime é para todos os efeitos imoral. A corrupção é outra forma de imoralidade que pode existir sem a outra (forma de imoralidade) ou com ela. O regime que antecedeu o 25 de Abril (sem procurar entrar em polémica) juntava as duas imoralidades.

A democracia tem a vantagem de ser o único regime que se apoia numa noção de homem que valoriza a sua autonomia e dignidade natural.

A religião teve, como se verifica ao longo da história, aspectos de grande elevação na defesa do homem, dos seus direitos sociais,económicos e políticos. Houve outros tempos, outros responsáveis da Igreja que não tiveram tanto essa preocupação. No antigo regime, havia muitas posições de gente da Igreja que foram fundamentais para percebermos que o reino dos homens não deveria ser um reino da prepotência e do arbítrio. E muita dessa gente sofreu por isso, por defender os perseguidos, mal tratados, os que não tinham quem lhes garantisse o direito a viverem com a dignidade que naturalmente lhes está reservada. A esta gente prestarei sempre a minha homenagem, pois identifico-me com ela. Aliás, considero que lhes devo o sentido de fraternidade humana que existe em mim e me aproxima do espírito franciscano do compadre Delfim. Até rima, como se vê!
Aliás, como o compadre Delfim vai ler este comentário, queria dizer-lhe que hoje, pelo telefone, ofereceram-me duas chávenas de café desenhadas por José Rodrigues que foram apresentadas num jantar para apoiar uma acção franciscana. Veio no DN de ontem, na pag, 24(?). Lembrei-me do compadre franciscano (e já sei que vai dizer que não merece, mas eu já sabia que não merecia, pelo menos tanto como eu sei que tb não mereço) e pedi licença ao meu ofertante (e agora ao Delfim) para lhe enviar uma. Espero com isto juntar ao espírito franciscano o espírito da democracia económico-social que me veio do “Juízo Final” e do camarada Marx. E digo isto em comentário, porque não conheço o Delfim, nem ele me conhece a mim (e talvez nunca nos chegaremos a conhecer), mas é por isso que os gestos de empatia nos aproximam mesmo sem necessidade do conhecimento pessoal -- o que tem algum significado para se perceber a importância dos debates abertos e sem preocupações de impor soluções, do tipo "magister dixit". E isso, até tem piada! E como sabemos a piada também nos faz feliz, o que nesta época de natal está "nos conformes".

Um ou melhor dois abraços

Primo de Amarante disse...

Fiz o comentario antes de conhecer o do compadre Delfim. A velocidade desta navegação já é einstiniana, ultrapassa a relação tradicional tempo/espaço.

C.M. disse...

Ai Compadre, que até estou gago!!!

Não mereço, não mereço!!!

De mãos postas!!!

C.M. disse...

Vou para a cama a pensar na maravilha que é a fraternidade entre os Homens!

Apesar de tudo aquilo que é mau nos dias que correm e que nos cerca...eu acho que existem milagres como o do amor a unir-nos a todos...a todos os homens de coração puro...independentemente da diferença de perspectivas e de vivências..vou-me deitar com um sabor doce na boca...da fraternidade que aqui reina nestas páginas...É mesmo tempo de Advento...

Primo de Amarante disse...

Não há ninguém que não fale em valores. Inclusivamente, no Mein Kampf também são defendidos valores. Mas, os valores só existem, enquanto instituídos por um sujeito livre. Por isso, a ideologia que mais alto coloca os valores (o essencialismo) – porque os converte em absolutos – é a menos capaz de distinguir quem age moralmente e quem não age. Tal ideologia dá mais peso à acção justa (acção realizada de acordo comos modelos ou normas) do que ao homem justo (o que age de harmonia com a sua consciência).
Mas é muito pouco agir justamente, se essa acção não torna o homem num homem justo.
O valor da bondade não se pode separar do homem bom, o da justiça, do homem justo, etc. È ou não é esta a lição de São Francisco?!.... Os valores não podem ser configurados independentes de um modo de ver a vida e o mundo, de nela se estar e de nela se relacionar com os outros. Por isso diz Kant: «A preocupação fundamental do homem deve consistir em saber como há-de ele cumprir a sua missão no mundo e o que tem a fazer para ser verdadeiramente homem».
Nó precisamos de uma educação para os valores que tenha sempre presente que estes não são “realidades-essências” (que se impõem independentemente da vontade das pessoas), mas medidas do saber viver e do saber conviver. A amizade, a bondade, a beleza, etc., só é valor se soubermos se amigos, ser bons, ser belos (interiormente, pelo menos), etc. O valor da ordem independentemente da justiça é o autoritarismo, a arrogância, a prepotência.
Estou mais próximo de São Francisco do que de Platão. Talvez, por isso me ache de esquerda.

Primo de Amarante disse...

Mais uma vez ultrapassado. Depois de escrever o que escrevi, reparei que o compadre Delfim já tinha feito um comentário ao anterior post.

Mas acho que nada tenho a acrescentar. Só digo que nunca utilizei a medida do merecimento . Sempre preferi a do reconhecimento da bondade, da lealdade, etc.

M.C.R. disse...

O que eu aprecio no nosso querido Compadre Esteves (credo! Raio de nomem, homem de Deus. então V. não se lembra que era assim que chamavam ao Salazar: Esteves. E isso porque nunca se dizia nos jornais "o Sr Presidente do Conselho vai a tal parte..." mas "o Sr ... estevwe em tal parte"...) é a sua combatividade e a sua continua e proficua atitude filosofante. Bem haja pelas duas.
Vamos porém ao ponto de discórdia, que "dizer bem é supérfluo" (como se diz na minha terra).
eu entendo que em Portugal não chegou a haver fascismo no sentido rigoroso e político do termo. Para tal faltaram vários vectores essenciais e o primeiro de todos, claro: um autentico movimento de massas. Não houve nada disso. O regime instalou-se à sorrelfa, amparado pelas espadas duns militarões, perseguiu o punhado de "camisas azuis" de Rolão Preto, aquietou as hordas de jovens bárbaros e também não teve a visão paganizante da vida e do poder, como a Alemanha nazi ou a Itália mussoliniana. Nem sequer teve a emblemática dos canticos (quer, da Alemanha, o Horst Wessel ou a Giovinezza italiana). Também não conseguiu sequer disfarçar um vago toque proletário para ajuda. Lembremos que o partido nazista se chamava NSDAP Nazional Sozialistiche Deutsche Arbeiter Partei (Partido Nacional socialista dos Trabalhadores Alemães) e que o Mussolini tinha sido um dos principais dirigentes do PSI e organizou os "fascii di combatimento" a partir de ope´rios e pequeno burgueses desempregados.
O Estado Novo nunca comemorou as suas datas som manifestaççoes de massas (tinha medo e desprezo pelas massas) e mesmo no que copiou (Mocidade Portuguesa, Legião, FNAT etc... ) deu-lhe um toque miserabilista e demasiadamente enquadrado e subserviente. Ao contrário de Hitler ou Franco nem o exército o exaltava e diferentemente de Mussolini pouco lhe interessava arengar às multidões. Salazar era ascético e homem apegado à igreja. Era aliás um rural ao contrário de todos os outros.
Não quero com isto dizer que não houvesse (e houve) traços fascizantes, sobretudo até ao fim ada guerra, no regime.
Mas Salazar não estava para essas maçadas e por isso criou uma espécie de partido único, desideologizado, co, meras funções representativas e de capataz, sem iniciativa nem seiva. No Portugal do Estado Novo era o gonverno quem mandava e ponto. Tudo isto me inclina ( e não sou nada original, claro) para negar a natureza intrinsecamente "fascista" do salazarismo. Isto não o melhora nem o inocenta, apenas serve para uma vez mais falar do nosso atrazo até ideológico.
E já agora, um reparo ao nosso amigo Delfim.
A Espanha não se tornou uma potência com os franquistas de 2ª ou 3ª geração. A espanha pelo seu tamanho, população, desenvolvimento industrial foi SEMPRE uma potência importante na Europa. Era-o antes da guerra civil, foi-o a partir dos anos sessenta e continuou a sê-lo com o advento da monarquia. A transição tem aqui pouco lugar.
gostei muito de ter esta conversa convosco. Muito, mesmo, Isto obriga-me a dar às meninges.
Um abraço a ambos

C.M. disse...

Nesta fria mas bela manhã, em que o sol aqui em Lisboa brilha, acabei de ler o último comentário do Compadre Esteves.

È de um valor inestimável. E isto não é lisonja! O seu comentário é um verdadeiro “guia de bem-fazer”.

Vou-me sempre deixar guiar por esse pensamento: os “valores(...) não são “realidades-essências” (que se impõem independentemente da vontade das pessoas), mas medidas do saber viver e do saber conviver. A amizade, a bondade, a beleza, etc., só é valor se soubermos ser amigos, ser bons, ser belos (interiormente, pelo menos), etc. O valor da ordem independentemente da justiça é o autoritarismo, a arrogância, a prepotência.”

Não posso estar mais de acordo! Mas é isto que eu penso!

Mas aprecio uma ordem e uma autoridade do Estado que sejam fortes mas que sirvam para implementar o bem-comum, e deploro a existência de um Estado fraco, tímido, anémico, que querendo agradar a todos acaba por não agradar a ninguém, pois não soluciona os problemas de uma sociedade, deixando àquela “mão invisível” de Adam Smith a resolução dos mesmos...como está a suceder aqui em Portugal e um pouco por toda a Europa.

Recordemo-nos da tragédia de 39-45 ocorrida na Europa, em que aliás, e segundo João Paulo II referiu numa das suas Encíclicas ( não me recordo agora qual...) o Mal andou por aí à solta personificado pelo regime nazi, travestido de uma “ordem” social contrária aos ensinamentos de Cristo e da Sua Igreja, contrária ao Bem, contrária à Dignidade inerente a todo o Homem.

Mas também recordo aqui todo o horror do Leste Europeu, no qual foi instaurada uma “nova ordem” igualmente redutora da dimensão do Homem...

Parece-me; às vezes, que o Homem está um pouco espartilhado por ideologias...e vou cimentando cada vez mais a ideia de que apenas os valores plasmados no Evangelho são o guia mais seguro nesta nossa peregrinação terrena...

Um Abraço a todos,

deste vosso companheiro de “route”...

C.M. disse...

Ora bem, também fui ultrapassado pelo MCR...após o meu comentário é que vi o seu, MCR...como sempre, revelador e acutilante...

Realmente aprendemos todos e, como diz, pomos as meninges a trabalhar...Por falar nisso, a minha papelada está à espera...ahahahah...

Um Abraço ou meia dúzia deles, que a amizade não se gasta...

Primo de Amarante disse...

Esteves é uma homenagem a Salazar, não pelo seu governo, mas por que nunca deveria estar onde esteve. Esteves era o que deveria ter acontecido e, por isso, sou o compadre do outro lado da vida. Percebeu, caro MCR

Penso que tiivemos fascismo, tal como o analisa João Bernardo no seu livro "O fascismo"

Um abraço.

M.C.R. disse...

Também suspeitava (ou desejava?) que o caríssimo compadre usava o esteves armadilhado. Pois parabéns.
Já quanto ao João Bernardo, permita que não concorde com ele. Todos os classícos historiadores, sociologos e politólogos estarão mais de acordo com as minhas torpes linhas- minhas, isto é: fui eu que as escrevi mas a ciência vem de outros.
Caro Delfim: gostei dessa , do compagnon de route mesmo que a expressão costume ser usada para os compagnons de route dos partidos comunistas. Usando V. a expressão ela liberta-se um pouco dessa carga negativa...

C.M. disse...

Caríssimo MCR, gostei... "touché"!

M.C.R. disse...

É para que saiba...
Um abraço