Eu que sou um tipo medianamente inculto e vivo carregado de dúvidas - as dúvidas que decorrem do olhar atento que lanço sobre o mundo e da reflexão quase obsessiva sobre o mundo - pergunto: afinal o que quer o islão com a sua guerra? Que espécie de cruzada é esta que eles trazem, carregados de bombas, semeando o terror?
Li, por estes dias, que estamos a viver um período de cruzada sinal contrário e que o combate do islão fundamentalista é contra a decadência da sociedade ocidental.
Entendamo-nos. Eu, que tenho uma visão catrastofista do mundo e sofro por isso, também acho que o mundo ocidental vive uma crise de valores que, a não ser travada, faz perigar este mundo em que vivemos. Vivemos, por aqui, num mundo em que ninguém se entende. O sucesso pessoal passou a ser a regra. Tudo o mais é quase nada. Quem quer saber da família, dos filhos, da convivência sã, da solidariedade? Cada vez menos. Em nome do sucesso e da carreira pessoal, coisas que, como nos conta o exemplo de Margarida Marante, é passageiro e tantas vezes cruel quando se cai do pedestal.
Crise de valores, pois claro. Vivemos num tempo em que há mulheres que querem casar com mulheres e homens com homens. Vivemos num tempo em que casais homossexuais querem adoptar crianças. Virá aí o tempo em que ainda vão exigir que do Estado a possibilidade de terem filhos biológicos, digo eu, agora já com ironia. Vivemos num tempo em que vale tudo, até obrigar crianças a sevícias sexuais. Vivemos num tempo em que se maltratam crianças, às vezes os próprios filhos. Vivemos num tempo em que os pais preferem deixar os filhos à solta - não vá alguém acusá-los de serem retrógados - quando isso dá jeito às suas vidinhas de festas e luzinhas e de relações pessoais que podem contribuir para o tal sucesso. Vivemos num tempo em que não acreditamos em nada. Deixamos de ser crentes. Dizemos que somos católicos mas não praticantes, coisa que eu também faço, embora tente ser um homem bom, mesmo quando não vou à missa nem gosto de padres.
Pois é. O nosso mundo, o nosso mundo ocidental é isto. Mas se o queremos mudar, somos nós que teremos de o mudar. Não são os fundamentalistas do lado de lá que nos vão impor a mudança, uma mudança gizada nas suas próprias crenças e convicções. Não quero os valores deles. Nem as convicções deles. Apesar de eu achar que andamos depressa demais, acho que eles andaram demasiado devagar.
Mas voltemos a entender-nos. Se eles não têm o direito nos dizer como devemos viver, e menos ainda o direito de nos obrigar a viver como eles querem à custa de bombas, também nós, de uma vez por todas, teremos de deixar de tentar ensinar-lhe como devem viver. Eles podem casar com várias mulheres? Pois que casem. As mulheres muçulmanas não têm direitos? Pois que não tenham. Eles apedrejam as mulheres adúlteras? Pois que apedrejem. Passemos ao lado dos abaixo-assinados que protestam contra essas coisas.
Do mesmo modo que nós só mudaremos quando quisermos mudar - e não porque eles o impõem - também eles só mudarão quando quiserem mudar. Se todos percebermos isto, talvez a coisa acalme um bocadinho. De outro modo, daqui a pouco nós e eles não estaremos aqui para discutir o assunto.
12 fevereiro 2006
Entendamo-nos
Postado por o sibilo da serpente
Marcadores: carteiro (Coutinho Ribeiro)
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3 comentários:
Caro CR, as questões colocadas no seu postal são totalmente pertinentes.
Afinal, que cada um viva o melhor possível as suas crenças, a sua Fé, qualquer que ela seja.
E que não tente impô-la pela força!
Mas,realmente, junto a minha visão pessimista à sua...
Creio que estamos de novo, aqui no Ocidente, como os Romanos, que levaram o seu Império à ruína, através da dissolução dos costumes...
Pois é, caro DLM, e já no tempo do Império Romano, os costumes obrigaram a que fossem publicadas leis a proibir os bacanais (já não sei escrever em latim o nome da coisa). Esta é a resposta que eu costumo dar a quem, ainda mais pessimista do que eu, diz que mundo já não tem cura. Eu acho que o mundo avança, avança... e chega ao ponto de ruptura e retrai-se. E tudo volta a começar. Não sei onde estarei quando as coisas começarem a recompor-se...
(ah, amanhã já lhe mando aquilo.)
Linda foto, CR!
Eis aqui a beleza do ser humano, em contacto íntimo com o transcendente!
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