27 fevereiro 2006

Integralismo Lusitano: Quid Novi?


Eis os "rapazes", que sofreram na pele as tropelias de Afonso Costa (a "coisa" passa-se em 1915, aquando de umas ingénuas Conferências da Liga Naval acerca da "Questão Ibérica", tema então muito na moda; da esquerda para a direita, em pé: Ruy Ulrich, Hipólito Raposo, Luís de Almeida Braga e José Pequito Rebelo. Sentados, da esquerda para a direita: António Sardinha, Vasco de Carvalho, Luís de Freitas Branco, Xavier Cordeiro e Alberto Monsaraz.


Perguntou-me hoje o meu amigo MCR o que é isso do Integralismo, nos dias de hoje?! assim "a modos" como quem diz: para que serve isso nos dias que passam?...
Pois é, meu caro, eu tenho a "mania" destas "velharias"...

(adivinho o sobrolho um pouco carregado…que raio! O que é que o homem aí traz hoje de fracturante?

Pois bem, como me dá aliás um grande prazer escrever para os nossos Incursionistas, uma “elite” direi eu! e concordem eles ou discordem, que é para isso que aqui estamos, e independentemente da bondade das ideias, penso que há que trazer à superfície dos dias que passam, temas que fizeram a paixão dos homens pensantes de cada época, temas esses que ajudam a reflectir sobre a sociedade que agora nos é dada a viver, porventura ajudando-nos a melhor interpretá-la ( será esse um dos contributos para os nossos dias, o repensar este tema) e, quanto mais não fosse, dar esses mesmos temas a conhecer a uma geração que por vezes, poucos mais horizontes possui do que o “enter” e o “escape”. (não é mau…)

Mas então vejamos só um pouco desta "matéria":

Segundo o recentemente falecido (2003) Henrique Barrilaro Ruas (andava ele a transcrever as Homilias do Padre Vitor Feytor Pinto, que “pontifica” ali na Igreja do Campo Grande, para as verter em livro – asseguro-vos que são pérolas, de uma dimensão muito abrangente, nada de “beatério”) o Integralismo Lusitano constitui uma visão geral do Povo Português como Nação, vendo o mundo e a vida como uma filosofia coincidente com o que se pode chamar Humanismo Cristão, e fazendo a defesa de uma constituição natural e histórica da Nação Portuguesa, fundamentada na dignidade da pessoa humana e num sistema de instituições organicamente encabeçadas pela Instituição Real.

Ora aí está uma dada visão do Integralismo.

Curioso que antigamente pensava-se…

Hoje vivemos tempos “ pós-modernos” nos quais se pretende desconstruir os nossos “ mitos” (também vivemos deles não é verdade? Olhem, um exemplo: a Nação) os nossos símbolos a nossa História.

Perdoem-me, mas admiro um António sardinha. Vejam este percurso:

Tendo sido um destacado republicano, após a implantação da República deu-se nele uma profunda desilusão com o novo regime. Convertido ao Catolicismo e à Monarquia, juntou-se a Hipólito Raposo, Alberto de Monsaraz, Luís de Almeida Braga e Pequito Rebelo (os nossos rapazes da fotografia) para fundar a revista Nação Portuguesa, publicação de filosofia política a partir da qual foi lançado o movimento político-cultural denominado "Integralismo Lusitano" em defesa de uma "monarquia tradicional, orgânica, anti-parlamentar".

Ai este “antiparlamentar” dá-me hoje um especial gozo!


Durante o breve consulado de Sidónio Pais, foi eleito deputado na lista da minoria monárquica.

Em 1919, exilou-se em Espanha após a sua participação na fracassada tentativa restauracionista de Monsanto e da "Monarquia do Norte".

Et voilá! Não me posso alongar muito mais neste postal, pois a intenção não é maçar-vos mas trazer, praticamente por acaso, um tema que apaixonou uma geração.

A História de Portugal está recheada de deliciosas “historietas”. É destas que se faz uma Nação!

dlmendes

6 comentários:

M.C.R. disse...

Como V. sabe, os integralistas tiveram depois a sua pequena revanche. Digo pequena porque um professor de finanças de Coimbra apoderou-se da herança e votou-os a um dourado ostracismo. Isto pela história nua e crua. Pelo lado do social, o integralismo era pouco ou quase nada. Pelo lado do intelectual, a sua melhor herança é poética. De facto o integralismo terá deixado um escasso rasto na constituição de 33 mas a sua eventual e virtual aura foi comida pelos camisas azuis de Rolao Preto e traída por António Ferro e a sua abertura ao modernismo.
Em consequência: ao seu "quid novi?" responderei em catalão "Res" ou em português: nada.
Como sabe já aqui mantive, em discussão com o compadre Esteves, a ideia que em Portugal não houve fascismo mas tão só um sistema arcaizante, autoritário, católico anti-social, e sem apoio de massas (no sentido de apoio de massas organizadas num partido, com poder nos organismos de classe e estruturado por uma elite cultural dirigente). O Dr Oliveira Salazar, que a sabia toda, fez como os eucaliptos: secou tudo á volta. Por isso os arroubos de Caetano (anti liberal, anti-moderno etc..,) não tiveram nem eco nem efeitos. O autoritarismo ruralista de Salazar domesticou integralistas, camisas azuis e restante parafernália. Claro que também limpou o sarampo ao reviralho republicano, rebentou a CGT anarco-sindicalista, calou o evanescente partido socialista e preparou o terreno para o mais duradouro partido comunista europeu (e talvez o mais autónomo de Moscovo, tese de Pacheco Pereira que compartilho). Lateralmente criou a mais longa ditadura moderna não só europeia como, suponho, mundial. É obra.
Mas nisso os integralistas não foram tidos nem achados. E por isso mesmo são já só um paragrafo na história do seculo XX. E se não tivessem feito versos (Sardinha, Monsaraz e Lopes Vieira, um pouco) nem sequer seriam conhecidos.

C.M. disse...

Adorei o seu comentário, MCR. Aliás, confesso, esperava-o...

Já sabia que ia ser um bom comentário! E isto independentemente de quaisquer posições…

Concordo em geral consigo, MCR. E V. deve ser uma das poucas pessoas que sabe da matéria...

Concordo, em termos gerais, com a sua análise da situação social e política.

Excepção feita à sua afirmação de que tivemos, em Portugal, um regime “anti-social e sem apoio de massas”.

Bem, efectivamente não tivemos as massas organizadas num partido tipo nazi, como foi moda ao tempo – veja-se a Itália que copiou a Alemanha nazi. Felizmente!!!

Mais tarde tivemos isso sim a União Nacional, a qual congregava os “próceres” do regime, como o meu amigo gosta de dizer…

Quanto à não existência de uma “elite cultural dirigente”...bem, parece-me que todas aquelas figuras do Estado Novo eram figuras bem pensantes, que lideraram um desígnio, um projecto para Portugal e não quiseram abdicar dele. Não queriam um País algo medíocre como é hoje…

Nos dias que correm talvez já não se compreenda bem essa mentalidade.

Temos de ter em atenção que o mundo era outro, a sociedade bem diferente. Tenhamos presente a conhecida desconfiança de Salazar para com tudo aquilo que parecia moderno: a expansão
industrial, a urbanização, a sua fixação da pequena aldeia que devia ser o País…cuja matriz, veja, MCR, vai buscar, de algum modo, aos ideais integralistas!

Mas é claro que ele os “cilindrou!
Que ingenuamente ( hoje dizemos ingenuamente, pois já conhecemos o desfecho da História…) bem pensaram os Integralistas que Salazar haveria de restaurar a Monarquia!

Enganaram-se, com efeito.


Mas os ideais do Integralismo, pelo menos alguns deles, sempre servirão, creio, para uma reflexão acerca dos valores em geral que devem reger os homens em sociedade. Que sociedade queremos e quais os valores que nela devem prevalecer.

Um abraço para si, meu caro amigo.

dlmendes

M.C.R. disse...

Terá V., caro amigo, também a sua razão no que respeita ao "regime social e sem apoio de massas". Eu, neste ponto, terei recorrido à minha parca herança marxista para finalmente querer significar que a UN como ela própria orgulhosamente se definia não era um partido e muito menos de massas. Por outro lado o sindicalismo vertical e a sua fusão nas corporações falseiam, como sabe, qualquer ideologia "social" na medida em que os mecanismos reguladores de conflitos ou não existem ou estão dentro do sistema não para os regular mas para os abafar "em ovo".
A questão das elites tem tambem sentido diverso para nós: eu falo de uma comunidade que se sente como tal e que tem um projecto geral de sociedade apoiado numa cosmovisão ( a tal Weltanschaung"... de meritória história) comum. Ora os intelectuais do Estado Novo estavam unidos na... desunião. Representavam-se a si próprios, não foram capazes de constituir um lobby sequer a menos que por isso entendamos uns vagos empregos em jornais do regime, eles próprios caricaturas (Novidades, A manhã, A voz, Diário do Norte etc...).
Não quero com isto dizer que Século, Diário de Notícias, Diário Popular ou Comércio do Porto, Primeiro de Janeiro e Jornal de Notícias fossem oposição. Nada disso mas disfarçavam a carga enorme de submissão ao regime e à censura mediante pequeníssimas impertinências políticas que davam ao leitor desprevenido a ideia de equidistância.
Claro que a oposicrática (termo muito meu) também não tinha grande sorte com a Republica e o Diario de Lisboa ou o efémero e interessante Diário Ilustrado. O país era periférico, isolado pela Espanha, pela censura e pelo analfabetismo.
Vale a pena dizer que andava eu na 3ª classe quando se tornou "obrigatória" essa mesma 3ª classe (acho que se chamava exame do 1º grau... mas não garanto). Isto em 1949/50!... Haveria no país vinte liceus e trinta escolas comerciais e industriais o que daria para o ensino secundário oficial entre 50.000 e 80.000 alunos. As três universidades (ou 4 com a "técnica" de Lisboa) não deveriam ter mais de 15/20.000 alunos se a tanto se chegava. Está a ver do que falamos? Porque isto, o final de 40 e os primeiros anos 50, representou o auge, o apogeu do sistema salazarista. Depois do abalo Delgado, da nascente tecnocracia dos anos 60 e das guerras africanas tudo mudou ainda que a ritmos lentos, preparando o caminho para a debacle marcellista. Insisto muito nisto, na debacle porque o marcellismo não foi senão isso: a tentativa de retardar o inevitável. Ah, se abril de 74 tivesse sido em 69... mas isso daria pano para mangas.

C.M. disse...

Bom desejo esse, MCR!

Marcello Caetano convidou aqueles "rapazes" com mentalidades arejadas, como Sá Carneiro, Rogério Martins...Miller Guerra, creio, era enfim a ala liberal da “NA”, outros que não me lembro agora, a fim de, no seu governo e na Assembleia Nacional, darem o seu contributo. Pena foi que mais tarde se desse a debandada...

Mas, na conjuntura de então, seria possível discutir África? Não creio pois, para a mentalidade da época - leia-se Franco Nogueira, por ex., discutir África era um sacrilégio: era discutir o Portugal do Minho a Timor.

Creio que há problemas, na História, insolúveis.

Mas essa sua tese é sedutora. Se temos conseguido fazer uma transição pacífica, dado autonomia às colónias, perdão, termo incorrecto já à época, às províncias ultramarinas, estas não teriam conhecido a guerra fratricida; não teriam sido destruídas as obras que Portugal lá tinha feito. Os Portugueses brancos não teriam saído de lá. Poderiam ter lá ficado, a par dos naturais para, em parceria, continuarem a construir uma sociedade que hoje, a ser assim, poderia ser um colosso!

Teria sido bom para eles, em África; teria sido bom para nós em Portugal.

Mas “rapazes” como “Rosas Coutinhos” nunca quiseram equacionar essa hipótese, em nome de ideologias que hoje, suprema ironia, estão defuntas!

Creio que foi este o erro trágico: para uns, a intransigência, não sabendo dar o salto definitivo, em direcção ao futuro; para outros, a cegueira ideológica, a destruição sistemática da nossa presença em África, restando hoje uma caricatura de sociedades livres, livres sim para viverem na miséria e no subdesenvolvimento.

74 em 69 isso… dava um filme…

Mas olhe, MCR, deu-me a oportunidade de reflectir acerca de uma solução alternativa ao corte abrupto que representou Abril 74 e, hoje é unânime, do retrocesso que tal provocou na estrutura económica do País. Perdeu-se tempo com questiúnculas de cariz marxista, ao tempo muito na moda…só que os países não se alimentam das mesmas, não é verdade?

Bem, um bom feriado. Vou aproveitar e vou ao Museu da Marinha, mergulhar na Sala do Século XVIII, quando Portugal era ainda um império e o oceano o elo que assegurava a união entre as partes desse mesmo império, espalhadas pelo mundo…

Bom feriado MCR e a todos os Incursionistas!

dlmendes

M.C.R. disse...

Delfim, eu sei pouquíssimo disto. Aliás sei pouco de tudo. o problema é que agora ninguém quer saber nada de nada. Mas creia-me. a minha ignorãncia assusta-me. Mas saber isso já é um consolo. Há quem nem sequer saiba que não sabe... coitados.

C.M. disse...

Meu caro amigo: não me "ofenda"...o MCR tem uma cultura invulgar...ao pé de si, não passo de um ignaro...