25 fevereiro 2006

Pequena dúvida


EXCERTO DE NOTÍCIA DO DN DE HOJE. Percebi perfeitamente. Vou ponderar o assunto. Mas há uma coisinha que eu não percebi: por que razão houve sorrisos na sala quando Rui Pereira disse: "Não me parece que os juízes dos tribunais da Relação sejam mais benevolentes com os políticos." Alguém me explica?

Eis o excerto: As buscas domiciliárias e escutas telefónicas a ministros e deputados deverão passar a ser autorizadas por juízes de tribunais superiores e não, como acontece actualmente, pelos juízes dos tribunais de instrução criminal. Esta hipótese está em cima da mesa na Unidade de Missão para a Reforma Penal (UMRP) (...).

Esta questão foi levantada, anteontem à noite, durante uma tertúlia promovida pelo SMMP. Aí Rui Pereira admitiu que esta alteração à lei está em cima da mesa: "É uma questão que vale a pena ponderar", disse (...).

A primeira reacção à proposta partiu de Cândida Almeida, directora do DCIAP. A magistrada foi clara: "Não estou de acordo com o foro [de julgamento] especial. Não me parece que haja necessidade." Perante algum burburinho que se gerou na sala do café Martinho da Arcada, Rui Pereira ainda afirmou tratar-se de uma hipótese, concluindo: "Não me parece que os juízes dos tribunais da Relação sejam mais benevolentes com os políticos." O comentário originou alguns sorrisos na sala. (...)

6 comentários:

Conservador disse...

O projecto significa desconfiança da 1ª instância. O sorriso tem a ver com a Relação de Lisboa...

o sibilo da serpente disse...

Obrigado pela explicação, caro conservador. Mas insisto: acontece só em Lisboa? Terá a ver com uma maior proximidade com os centros de poder? E, já agora, quem riu: os jornalistas presentes ou os próprios magistrados de 1ª instância?
Em qualquer dos casos é preocupante. Mas mais se as desconfianças existem entre magistrados. É que isso reconduz-nos a um postal que coloquei mais abaixo. Se os pares desconfiam uns dos outros, como pode o país confiar?
Esclareço: eu ainda confio. No dia em que achar que a minha ingenuidade se está a tornar insuportável, lá terei que mudar de vida.

o sibilo da serpente disse...

Caro Intrometido:
Não me diga as coisas com tal crueza, que me assusta. É que eu tenho 45 anos e já não me apetece mudar de vida e ainda quero acreditar em algumas coisas que me fizeram deixar o jornalismo para ser advogado.
Promiscuidade? Assim, tão óbvia entre magistrados e políticos?
Olhe. Um dia, já depois de sair do jornalismo, acedi a entrar para um gabinete do Governo. Foram duas as decisões dolorosas: a saída do jornalismo e a entrada para o gabinete. E por quê? Porque sabia que era uma saída sem retorno. Eu não me supunha voltar para o jornalismo depois de passar pelo "outro lado". E isto, mesmo com a consciência tranquila de quem sabe que, mesmo do outro lado, nunca fui capaz de enganar um ex-colega jornalista.
Mas o que diz é muito mais grave. Deixe-me continuar a pensar que os magistrados são pessoas impolutas...

Vítor Sequinho dos Santos disse...

Desculpem a intromissão, mas vou reproduzir um post que deixei lá no MONTE:

«A seguir, virá a consagração da chamada «carreira plana» para os juízes, que garantirá que só chegarão aos Tribunais da Relação as «pessoas certas», em vez de, como actualmente acontece, apenas os juízes de carreira que alcancem uma classificação de mérito e a antiguidade necessária.
Parece-me que é sob esta perspectiva que o projecto agora anunciado deve ser analisado.
Logo, a discussão em torno de saber se, com a composição actual dos Tribunais da Relação, os ministros e deputados beneficiarão, ou não, de um tratamento mais favorável relativamente àquele que teriam em tribunais de 1.ª instância, não faz sentido.
Repare-se, aliás, que o mote para esta descabida discussão foi lançado por quem anunciou o projecto (segundo a citada notícia, que pode ser lida, na íntegra, no VERBO JURÍDICO)!
Uma boa maneira de desviar as atenções relativamente ao cerne do problema é lançar uma discussão bem ao lado dele».

Estarei a ver bem o problema?

Mocho Atento disse...

Os magistrados não têm foro especial ?

Vítor Sequinho dos Santos disse...

«Mocho Atento»:

Têm, mas precisamente para evitar a suspeição que poderia resultar de serem julgados por um juiz da mesma instância.

Ou seja, não se trata de um privilégio, mas de um meio de o evitar ou, pelo menos, de evitar a sua aparência.

Se eu (que tenho a profissão de juiz de direito e estou na 1.ª instância) fosse acusado de cometer um crime e não tivesse foro especial, seria julgado por um juiz da 1.ª instância determinado em função das regras gerais de competência.

Porque tenho foro especial, seria julgado por juízes da 2.ª instância.

Isto é um privilégio?

A situação é, pois, completamente diferente daquela que se pretende criar através do projecto referido no post.