Sabemos que os valores integram-se em padrões ou modelos culturais da sociedade a que pertencemos e, de certa forma, correspondem a uma medida para avaliar as acções ou formular juízos.
Tradicionalmente, há dois modos de entender esta medida:
a)- uma medida fixa, definitiva e fechada.
Corresponde à posição dogmática e tradicionalista. O que está de harmonia com essa medida é correcto, o que não está de harmonia com essa medida é incorrecto. Aplica-se “mecanicamente” regras e valores previamente definidos, sem ter em conta as situações, outros pontos de vista, o contexto no qual se deve determinar a acção.
b)- uma medida flexível (o que não significa relativista).
Corresponde a posições abertas e progressistas. O valor não orienta a acção independentemente de uma avaliação consciente que o sujeito moral faz das consequências que derivam da escolha desse valor. Tem em conta outros pontos de vista e o contexto da aplicação do valor.
A posição do dogmatismo moral levanta duas questões:
1ª.- A moral implica responsabilidade. E perguntamos: quem é mais responsável, aquele que aplica mecanicamente um valor ou quem tem em conta as consequências da aplicação desse valor no contexto de outros valores?
2ª.- Desde os antigos, a prudência foi sempre a virtude que orientou a moral. Por natureza, a moral é prudente e uma moral cega é a imprudência tomada por moral. Agarremos um exemplo dado, hoje, por Saramago: “Imaginemos que um caricaturista dinamarquês, em vez de fazer um desenho a ridicularizar Maomé, faz um desenho em que sugere que o director do jornal é um imbecil.”Usou o direito de expressão, mas no outro dia teria sido despedido.
A posição da flexibilidade dos valores salienta o seguinte:
Só o homem valora e, por isso, não se pode separar os valores de uma estrutura de convicções, organizada em costumes ou numa religião ou, de uma forma mais geral, numa cultura. De facto, os valores não têm uma estrutura própria, independente das situações que os geraram ou a que se aplicam. O homem, ao longo da sua história e conforme as culturas, foi modificando a sua maneira de ver o mundo e nele actuar; e, por isso, de valorar. Os valores mudam, porque é o homem que os cria.
Mas será que não há valores que transcendem o homem?!...
Na verdade, para além das diferentes culturas, o homem tem uma dignidade, donde deriva um mínimo conjunto de valores aceites universalmente. São aquisições culturais opu civilizacionais que transcendem o homem individual e constituem princípios universais que fundamentam o respeito de um homem por outro homem. O valor fundamental é a dignidade humana: é sempre o homem o fim último de todos os valores, como diria Kant.
Há, então, uma hierarquia dos valores.
Há valores que em determinado contexto são preferíveis a outros valores. Por isso, há situações, nomeadamente as situações dilemáticas, que só podem ser resolvidas com competência ética.
A competência ética traduz-se no saber responder á seguinte questão: «que devo fazer para que seja um homem justo?». Por exemplo: será mais justo servir a pátria como voluntário das forças armadas ou ficar em casa a olhar pela sua mãe?!...
Retiro duas conclusões:
Os valores foram criados para servir o homem e, por isso, a doutrina que mais alto coloca os valores – porque os converte em absolutos – nem sempre é capaz de distinguir uma acção justa (acção realizada de acordo com os modelos ou normas dominantes numa determinada cultura) do homem justo (o que age de harmonia com a avaliação que na sua consciência faz das consequências dos valores que adopta para a sua conduta).
Mais importante que defender acções justas é tornar o homem justo, capaz de desenvolver uma competência ética que lhe permita escolher os valores que mais se harmonizam com a dignidade e o respeito por outros homens.
10 fevereiro 2006
Uma reflexão, a propósito de VALORES
Marcadores: Primo de Amarante (compadre Esteves-JBM)
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