24 março 2006

Contra Legem



Quando nasceu Portugal?

Quando Afonso Henriques foi proclamado rei, a seguir à batalha de Ourique em 1139?

Ou aquando da Conferência de Zamora em 1143, através do acordo com o Rei de Leão, de quem Afonso Henriques seria vassalo, que reconheceu a independência de Portugal?

Ou ainda através do reconhecimento pela Santa Sé, em 1179?

Independentemente da resposta, Portugal já “vivia” desde os fins do século IX.

Tem, pois, uma longa História. Bem como as suas Instituições. Como as Comarcas. As Comarcas que, por via de uma ideia peregrina, estão em risco de acabar no nosso País, sendo substituídas por uma (maravilhosa) “unidade de referência”, a qual terá um maior âmbito territorial.

Permitam-me que discorde. É tão só mais uma medida que vai contribuir para a crescente desertificação do interior do nosso País. As localidades que “são” Comarca, deixando de o ser, perderão importância, gente, movimento. O fluxo económico e demográfico diminuirá. Contribuirá tal medida para um declínio mais acelerado daquelas que serão atingidas.

Para além desta figura ser uma referência na nossa História. Estou a lembrar-me do cuidado que com elas teve o nosso Rei Dom Dinis.

Veja-se também a figura do Corregedor, antigo magistrado representante do Rei, com o cargo de administração local, que tinha jurisdição numa circunscrição judicial do País ou Comarca, “competindo-lhe essencialmente fiscalizar a aplicação da justiça e corrigir os abusos das autoridades judiciárias”...

No período do governo pessoal de D. Maria I, de 1777 a 1792, é dada ordem para ser realizada uma nova demarcação das comarcas do Reino. Uma nova demarcação, não a sua extinção!

As Instituições devem ser preservadas sob pena de, amanhã, sermos uma Nação vazia de conteúdo e sem Memória.

A própria Magistratura rejeita esta ideia.

A Associação Sindical dos Juízes já veio contestar esta reorganização, bem como a deslocalização dos Magistrados, argumentando que não podem ser considerados como “caixeiros-viajantes”.

Mas nada mais nos pode deixar perplexos. Se em Portugal estamos todos mais tristes, mais pobres, mais indefesos, mais humilhados…


Nota: foto do Tribunal de Bragança

7 comentários:

C.M. disse...

Cara Kami, este espaço que se formou no final do texto...não consigo rectificá-lo...mistérios da blogosfera...

Até amanhã...

C.M. disse...

Incrível! esta nossa Kami é supersónica!!!

Obrigado, Kami.

M.C.R. disse...

Meu Caro DLM
Vezes sem conta temos estado em desacordo. Outra tantas temos verificado que perante uma determinada situação temos posições concordantes. Tudo civilizadamente e, ousarei dizê-lo, amigavelmente.
Quero agora expressar-lhe a minha concordância quanto ao fundo mesmo que, eventualmente pense que hája comarcas que deixaram de o ser por razoes naturais. A história é o ligamento, o cimento, que nos une a nós cidadãos com o país (a terra) e com os outros. Tem de ser e deve ser preservada. E para a preservar não se pode muito simplesmente arranjar uma qualquer forma liofilizada de jargão politiquês como essa das unidades sei lá de quê. Isto é como os nomes das ruas. quando se argumenta que "rua direita" nao é nada está-se apenas a dar mostras de burrice supina, de estupidez congénita e desprezo pelos outros. A rua direita é a rua que vai directamente a um ponto de referência essencial, palácio, mercado ou - as mais das vezes - igreja, catedral, sé, o que quiserem. A sua Rª dos Douradores é isso mesmo. Mesmo que já não haja douradores. Fornece uma pista sobre como se dividia a cidade, sobre os mesteres, a sua importãncia cidadã. E poderia dizer o mesmo de muitas outras designações. Em França ainda hoje de fala por exemplo dos pays de la Loire ou do Languedoc que não tendo já finalidades práticas subsistem como referente geográfico cultural. Não falo dos condados eternos ingleses ou das divisões geográficas alemãs e italianas. É verdade que na organização política Renânia só não é nada. Mas não foi abolida. Criou-se por cima um Land a Renania Palatinado. E por isso oficiosamente há sempre uma Renãnia ou uma Suábia. E por aí fora.
Entre nós reina a ideia peregrina de dinamitar tudo para fazer novo mau e feio.
No fundo, muito no fundo (ou nem isso) o que se passa é que estamos perante um bando de mariolas e patos bravos que tentam disfarçar a sua mediocridade e a sua vasta incultura atrás destas denominações vazias de sentido. É gente infrequentável. Não os aturaria à minha mesa de jantar, de café ou de bridge.

C.M. disse...

Plenamente de acordo, MCR, plenamente de acordo. Trata-se, efectivamente, de pretender apagar a História sem cuidar dos seus reflexos na vida das populações.

Informática do Direito disse...

Seria muito interessante ver a reacção de autarcas e populações locais se um Ministro viesse a público dizer que se preparava para acabar com os concelhos e que estes seriam substituídos por uma "unidade de referência" mais vasta, acrescentando, condescendente, que mais lá para o fim do ano (9 meses depois !) daria notícias...

Mocho Atento disse...

Todos somos a favor do Interior, mas ninguém quer lá viver. Veja-se o exemplo dos professores que se queixam de ser saltimbancos, mas que são contra concursos que os mantêm 3 anos na mesma escola.

Não vão só extinguir-se comarcas, mas também escolas, hospitais, maternidades, juntas de freguesia, concelhos.

E todo este movimento é contestado pelos mesmos que o exigem. Porque o que está na moda é dizer que o Estado deve mingar, que os serviços devem ser eficientes, competitivos e económicos, que não pode haver desperdício; enfim as "tretas" dos ideólogos do fim do Estado. Mas depois descobrem que essas soluções criam desemprego e desertificação.

Entendamo-nos! Quem quer pagar impostos para sustentar serviços públicos que têm reduzida produção ?

Eu pago! Mas não deve haver muitos mais!

M.C.R. disse...

eu já estou a ver o momento em que criadas as tais cinco regiões, começa cada de seu lado a recusar-se a pagar impostos para os outros. esta divisão economicista do território reduzindo grande número de cidades vilas e aldeias a fantasmas tem como resultado a quebra da ideia de solidariedade nacional. porque é que habitando no Porto hei-de pagar um hospital na Covilhã. eles que se amanhem ... etc...
O reducionis,+mo a que vimos assistindo dá nisto. Ou pode dar nisto. depois a quem é que se vai pedir responsabilidades?