Diziam-me há dias, por estas bandas: homem, você é um desafio! Talvez seja. Ou, mais do que isso, talvez seja um deficiente emocional. Um tipo de todas as paixões que, pelas circunstâncias, se tornou pouco menos que inexpugnável e que, porque amou tanto e se desiludiu de amor, se tornou um céptico, nunca um cínico, que isso não faz parte do código genético do miúdo que se apaixona, quase pueril. E tenho uma tragédia colada a mim: sou um desbocado. Tenho um imenso sentido estratégico e táctico, sou capaz dos melhores conselhos, sou um combatente (talvez um guerrilheiro), um senhor da guerra, um cavaleiro andante. Mas quando se trata de coisas minhas, sou o desajeitado, o provocador, o inadaptado, o auto-excluído, um tipo de rins pouco flexíveis e de coluna vertebral absolutamente inquebrável, mesmo quando fico inseguro das coisas de que já fui seguro e hei-de voltar a ser.
Sobrevivo assim. Gosto de mim assim, ainda que, assim, coleccione inimigos e perplexidades. Mas gosto de mim assim. Mesmo quando sei que, sendo assim, me prejudico.
(depois de uma interrupção duradoura, continuo o post, que já não será o mesmo)
Por força disso, e por causa de todos aqueles que veneravam a minha inquietude supostamente inteligente e cresceram na minha sombra, porque isso lhes dava jeito e subiram na vida e que depois, quando fui torcionado, me esqueceram, tornei-me um tipo demasidado cauteloso. Não apenas tímido, que isso sempre fui, mesmo quando as pessoas se riam quando eu dizia que era tímido (coisa que até parecia petulância), porque achavam que eu tinha um lata enorme e dizia as coisas a brincar.
Esta noite jantei sozinho. Na minha circunferência. Tinha um simpático e motivante convite para jantar em grupo. Recusado em nome de um compromisso que não havia e que inventei. Não ousei. Fui injusto com quem me convidou. Mas não tive coragem. Fui onde fui para conhecer uma pessoa que queria conhecer. Não quis que parecesse mais do que isso, ainda que eu saiba que o convite foi amigo. Fui eu quem perdeu. Todas as coisas. A sabedoria dos outros e a tese explicada do pássaro ferido na asa.
12 comentários:
V. é um tratante. Eu tinha tanto gosto em lhe apresentar. a prima Manuel, o Eduardo, o Mia, o Guedes e mais uns tantos. Apresentá-lo com o orgulho de quem apresenta uma pessoa curiosa, sensível e inteligente que escreve bem e é colega desta coisa pequena mas simpática e actuante que é o incursões. Apresentá-lo ao Fernando Almeida e ao Zé Carlos de Vasconcelos, coimbrinhas como nós, bons garfos e ainda mais faladores do que eu.
Ah, Carteiro duma figa!... V pode ser guerrilheiro mas eu também sei da poda. Para a príoxima vai nem que seja de rastos. E se alguma donzela ficar em sobressalto pelo seu inexplicável descompromisso, e por isso lhe disser umas e outras, não se desculpe comigo que a culpa foi sua. Um abraço de perdão. Afinal estamos em vésperas do 25 A.
Nesta manhã de segunda-feira, leio o Incursões. Vejos os últimos postais. Vejo este: com efeito, por vezes, com a nossa timidez, perdemos oportunidades. Se o MCR me fizesse esse convite, eu também tremia todo...adoraria ir mas esta minha proverbial timidez...às vezes até é inibidora...também ninguém diz que sou tímido, mas que o sou lá isso...
Acabo de ver a nora do MCR. Bem, pelos vistos, ele tem de arrastar mais um...
Perdão, enganei-me: eu queria dizer A NOTA...
Eu sei, MCR, foi uma imbecilidade da minha parte. Mas eu não queria parecer um intruso de última hora. Mas V. já me perdoou.
obrigado, chocolate.
Devia, devia ter aceitado o convite. Isso, MCR, da pr+oxima euvez arraste-o. Tem o meu apoio. : )
Abraços,
Silvia
Pois, de arrastão :-)
Querida Chocolate: então o Carteiro que é quem desconfia, quem se balda, quem foge pela esquerda baixa, enquanto eu, confiante, o convido a um jantarinho com gente interessante, depois dele ter feito o esforço de aparecer. E V. tímida (como eu minha querida, como eu, isto, esta desenvoltura, é só garganta, nem sabe por que aflições ás vezes passo, nem eu me atrevo a contá-las) diz ao Carteiro, que é um maganão, essas coisas magníficas?
Olhe vou-lhe dizer um segredo. Se calhar escrevo porque assim não tenho de falar cara a cara....
Felizmente a idade deu-me serenidade e distanciamento.
Que invejoso, este MCR! Olhe, meu caro, eu não desconfio: eu não quero é que desconfiem de mim. Que eu hei-de ser um crédulo toda a vida.
E, depois, eu é que sou o manganão! Eu, o que fujo pela esquerda baixa e essas coisas todas que, no caso concreto, foram verdadeiras, para mal dos meus pecados. Eu que ando a pensar no que hei-de fazer com a minha liberdade, imagine-se!
Volte, caríssima chocolate.
A minha inveja é sadia: eu uso a expressão ou metáforas que a signifiquem não com o intuito de me apossar daquilo que é dos outros mas tão só para lhes significar o meu apreço por essas coisas que continuarão a ser rigorosamente deles.
É terrível termos essa sensação de que estão a desconfiar de nós, a não acreditar no que dizemos, a julgar-nos por tudo e por nada. Está a ver Carteiro?
Essas sensações todos, mas todos, as temos.
Se eu lhe contasse o que perdi por ser assim tímido... Profissionalmente, economicamente, amorosamente... Jesus!
Caríssimo MCR: claro que aquilo da inveja foi uma brincadeira :-)
Quanto ao resto, vou tentar explicar melhor: há alguns dias atrás, li num blawg um interessante postal sobre uma questão de direito que me intressa particularmente, da autoria de um reconhecido jurista. Como o blawg em causa não tem caixa de comentários, enviei um mail ao autor para saber a sua opinião sobre uma questão relacionada com o postal. Como ao fim de alguns dia não obtive resposta, decidi insistir. Não me respondeu. Eu sei que a pessoa em causa me conhece. Mas nem imagina com estou arrependido de ter feito o que fiz! Provavelmente a pessoa em causa pensou que eu estava a fazer consulta jurídica para um qualquer caso concreto. E terá, porventura, pensado que se tratava de um abuso da minha parte. Não foi essa a intenção: era mesmo curiosidade de saber a opinião avalizada dele sobre uma questão candente, em abstracto. Sinto-me envergonhado de o ter feito. Por estas e por outras, é que sou cada vez mais cauteloso. Não porque desconfie das pessoas, mas porque tenho medo de parecer que abuso.
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