12 julho 2006

Coisas mal amanhadas

O meu cliente tinha sido insultado através de um pasquim local, num mal amanhado escrito anónimo. Crime semi-público, denúncia por difamação através da imprensa. A directora do jornaleco não ligou à notificação para identificar o autor do escrito. Crime público: desobediência qualificada, diz a Lei de Imprensa.

Acusada pelos dois crimes. Julgada pelos dois crimes. Duas audiências de julgamento. Três, contando com leitura de sentença. Condenada pelos dois crimes. Multa pesada. Com uma particularidade: o Mmo., para desgosto meu, fez questão de salientar, de viva voz, que só condenava em 2.500 euros de indemnização, porque mais não tinha sido pedido. Ops!

Recurso da arguida. O MP na primeira instância bateu-se pelo decidido. Eu também. O MP na Relação entendeu que, sim senhor, a condenação pela desobediência estava bem, mas, quanto ao resto, não, não havia difamação. Respondi. Julgamento. Decisão: precisamente o que tinha dito o MP.

Ok. Não discuto. É precisamente para isto que existem os recursos. Paciência.

Olho para a parte final do acórdão. O meu cliente - ofendido, que afinal não foi, disse a Relação - condenado em 5 UC's por se ter oposto ao recurso. Qualquer coisa como 450 euros. Mais as duas UC's pela constituição como assistente. Qualquer coisa como 180 euros. 630 euros! Sim. Mais adiante: custas do pedido cível - o tal que foi contido - pelo assistente. Ainda não fiz as contas.

E também ainda não disse ao cliente. Vou dizer. Ele não me entregou provisão (não pedi). Presumo que vai perguntar-me quanto lhe devo. Entupido. Ele e eu. Entupidos. Não vou pedir-lhe honorários, nem sequer as despesas das minhas deslocações - três - para fora do Porto. É claro que eu não tenho culpa do que aconteceu. Ele também não. É a vida. E eu não tenho coragem...

Mais valia termos ficado quietos. Ambos. Ele não devia ter-se sentido ofendido - tem um ego demasido grande, disse o MP na Relação - , nem eu devia ter trabalhado - sou parvo, terá pensado a Relação. Não compensa.

E, já agora, sendo assim, acho que a arguida devia também ser absolvida do crime de desobediência. Claro que desobedeceu, mas que importa isso? Afinal, este crime era instrumental do de difamação e - diz a Relação - ela não difamou. E eu, que costumo estar precisamente do lado contrário, fico aqui na minha perplexidade...

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