A vida explicou-me muitas coisas. Coisas a mais, talvez, que algumas delas eu preferia não ter aprendido, preferia tê-las sabido pelas experiências dos outros, mas não, sofri-as na pele, de uma forma violenta, dura, agreste, de tal forma tudo isto, que por vezes pensei em renegar princípios e valores, pensei renunciar a tudo a aquilo em que acreditava, e mudar. Mudar para ser mais dos tempos que correm, usar alguns méritos que tenho em proveito próprio, ser mais egoísta, marimbar-me para os outros, calcular, ser mais flexível, assumir um ar mais grave, deixar de ser o tipo próximo. Pensei, mas não passei disso. Nunca iria conseguir. E também é verdade que nunca quis conseguir. É mais ou menos a mesma coisa que pensar deixar de fumar, mas nunca ter levado a coisa a sério, e continuar a fumar.
Durante alguns anos fui o puto reguila, o adolescente bravio, o combatente nem sempre consequente, mas sempre convencido de que a vida haveria de perceber-me tal como eu era. A vida nem sempre me percebeu assim, mas habituei-me a ser assim. E, houve um tempo em que fui eu a ter de perceber como era a vida.
É duro ser assim, ser do contra-poder, ser um bocado duro de rins, desbragado, provocador. É a receita certa para coleccionar mais inimigos do que amigos, porque os tempos não se compadecem com os "bons selvagens". Mas continuo a ser o mesmo. E gosto. E porque continuo a ser o mesmo, quedei-me, em tudo o mais, no tempo. Violentamente, percebi que os amigos que tenho foram aqueles que fiz enquanto estudante, na Secundária, na Faculdade, no jornalismo. São esses os que perduram. Dos que vieram mais tarde, sobram poucos. O que acabou por fazer de mim um céptico. Na minha inalienável liberdade.
PS: Em nome dos poucos amigos que conquistei nos últimos anos. E em nome deste blog. E, também, em nome dos inimigos que fui coleccionando.
2 comentários:
«A amizade não se busca, não se sonha, não se deseja; exerce-se (é uma virtude)»
Foi Simone Weil quem o disse. Eu concordo e subscrevo.
Caro Carteiro,
Aqui lhe envio também uma citação:
“Sou demasiado céptico para ser incrédulo”. Não sei quem o disse mas também não interessa. O que importa é ter oportunidades para acreditar.
Um abraço
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