A sanha com que alguns apaniguados de ocasião continuam a defender a possibilidade de o PGR voltar a apresentar ao CSMP o nome por este vetado para a nomeação como Vice-PGR, leva, na verdade, a temer que o caso venha a ter desenvolvimentos mais próprios de uma novela mexicana que de um Estado de Direito.
Como creio já ter afirmado, nada me move a favor ou contra o PGA Dr. Gomes Dias. Com a informação de que disponho, não estou, sequer, em posição de opinar sobre a razoabilidade da sua eventual nomeação.
Tenho porém como certo que, à luz de qualquer elemento – literal, lógico, teleológico, histórico... – a interpretação do disposto no Estatuto do MP é clara no sentido de que um nome “vetado” não pode ser sujeito a nova votação, como já foi sobejamente justificado em numerosas opiniões fundamentadas sobre essa matéria, publicadas na imprensa e na blogosfera. Essa interpretação era, aliás, corrente e incontestada, até ao momento, recente, em que, para alguns, pelos vistos se tornou inconveniente.
Na verdade, o Estatuto do MP não prevê qualquer mecanismo destinado a ultrapassar uma deliberação do CSMP que vete um “nome” para Vice-PGR. Como tal, uma vez deliberado, um “veto” produz plenamente os efeitos que lhe são próprios, ou seja, formula um juízo definitivo sobre a não adequação do perfil proposto, excluindo o indigitado da nomeação em causa. Para evitar situações de impasse – já que a lei pressupõe que o CSMP possa, legitimamente e com toda a normalidade, ter um entendimento diverso do do PGR nesta matéria - a opção do legislador foi no sentido de consagrar um limite máximo de nomes (leia-se: diferentes magistrados) cuja nomeação pode ser vetada (dois). Caso sejam vetados dois nomes propostos pelo PGR, um terceiro nome proposto não poderá ser vetado, prevalecendo o entendimento do PGR quanto à adequação desse nome, em caso de divergência com o Conselho.
Nem se diga que esta solução é absurda, por conduzir, hipoteticamente, o CSMP a ter de aceitar um nome “pior” que os anteriormente vetados. Antes de mais, convirá ter presente que todos os sistemas pressupõem e exigem bom senso na sua aplicação. Assim, no caso de o PGR não estar seguro da receptividade do CSMP face à sua primeira escolha, mandaria o bom senso que apresentasse, desde logo, três nomes, para que o Conselho pudesse conhecer o universo das possíveis escolhas e para que o nomeado não aparecesse como uma segunda ou terceira escolha. Porém, em última análise - e em bom rigor – o Conselho nunca será forçado a fazer uma escolha que seja realmente “pior”. Os nomes propostos, ou são julgados adequados, ou inadequados, decisão que, em matéria deste melindre, não é seguramente tomada de ânimo leve. Face a um juízo de inadequação, qualquer gradação é irrelevante, não sendo legítimo afirmar que, afinal, o Conselho fez “melhor” ou “pior” “negócio”. Se o terceiro nome proposto também não for considerado adequado, prevalecerá, por força da lei, a vontade do PGR – que será a exclusiva fonte de legitimidade dessa escolha.
Face à letra e ao espírito da lei em vigor, a reapresentação de um nome anteriormente vetado, no mesmo processo de nomeação, essa sim, seria manifestamente um absurdo. Pressuporia que a anterior deliberação do Conselho, no sentido de julgar o nome proposto inadequado à nomeação em causa era, afinal, uma deliberação “não séria”! Ou que poderia ser alterada por razões ou pressões diversas da estrita bondade da decisão... A partir daí, pela mesma ordem de ideias, qualquer deliberação do CSMP, ainda que acabada de tomar, poderia ser novamente levada a votos, havendo inconformados, para ver se, por efeito de forças cósmicas ou jogadas de bastidores, se alteraria. Quem consiga perfilhar um tal absurdo, jurídico, institucional e moral, poderá, já agora, propôr que o CSMP adopte, como hino oficial – que os conselheiros entoarão solenemente no início de cada reunião - a conhecida canção dos “Rádio Macau”:
“...amanhã talvez seja a valer, hoje é a brincar...”.
O PGR é um magistrado. Com especiais responsabilidades de cumprir e fazer cumprir a lei em vigor. Convém que tenha presente que o seu crédito ficará irremediavelmente abalado se, neste caso, se comportar como um “rapaz do trapézio voador”, defendendo acrobacias interpretativas manifestamente “contra legem”.
Veremos se a legalidade e o bom senso prevalecem...
1 comentário:
A sanha com que alguns apaniguados de ocasião continuam a defender a possibilidade de o PGR voltar a apresentar ao CSMP o nome por este vetado para a nomeação como Vice-PGR, leva, na verdade, a temer que o caso venha a ter desenvolvimentos mais próprios de uma novela mexicana que de um Estado de Direito.
Como creio já ter afirmado, nada me move a favor ou contra o PGA Dr. Gomes Dias. Com a informação de que disponho, não estou, sequer, em posição de opinar sobre a razoabilidade da sua eventual nomeação.
Tenho porém como certo que, à luz de qualquer elemento – literal, lógico, teleológico, histórico... – a interpretação do disposto no Estatuto do MP é clara no sentido de que um nome “vetado” não pode ser sujeito a nova votação, como já foi sobejamente justificado em numerosas opiniões fundamentadas sobre essa matéria, publicadas na imprensa e na blogosfera.
Essa interpretação era, aliás, corrente e incontestada, até ao momento, recente, em que, para alguns, pelos vistos se tornou inconveniente.
Na verdade, o Estatuto do MP não prevê qualquer mecanismo destinado a ultrapassar uma deliberação do CSMP que vete um “nome” para Vice-PGR. Como tal, uma vez deliberado, um “veto” produz plenamente os efeitos que lhe são próprios, ou seja, formula um juízo definitivo sobre a não adequação do perfil proposto, excluindo o indigitado da nomeação em causa. Para evitar situações de impasse – já que a lei pressupõe que o CSMP possa, legitimamente e com toda a normalidade, ter um entendimento diverso do do PGR nesta matéria - a opção do legislador foi no sentido de consagrar um limite máximo de nomes (leia-se: diferentes magistrados) cuja nomeação pode ser vetada (dois). Caso sejam vetados dois nomes propostos pelo PGR, um terceiro nome proposto não poderá ser vetado, prevalecendo o entendimento do PGR quanto à adequação desse nome, em caso de divergência com o Conselho.
Nem se diga que esta solução é absurda, por conduzir, hipoteticamente, o CSMP a ter de aceitar um nome “pior” que os anteriormente vetados.
Antes de mais, convirá ter presente que todos os sistemas pressupõem e exigem bom senso na sua aplicação. Assim, no caso de o PGR não estar seguro da receptividade do CSMP face à sua primeira escolha, mandaria o bom senso que apresentasse, desde logo, três nomes, para que o Conselho pudesse conhecer o universo das possíveis escolhas e para que o nomeado não aparecesse como uma segunda ou terceira escolha.
Porém, em última análise - e em bom rigor – o Conselho nunca será forçado a fazer uma escolha que seja realmente “pior”. Os nomes propostos, ou são julgados adequados, ou inadequados, decisão que, em matéria deste melindre, não é seguramente tomada de ânimo leve. Face a um juízo de inadequação, qualquer gradação é irrelevante, não sendo legítimo afirmar que, afinal, o Conselho fez “melhor” ou “pior” “negócio”. Se o terceiro nome proposto também não for considerado adequado, prevalecerá, por força da lei, a vontade do PGR – que será a exclusiva fonte de legitimidade dessa escolha.
Face à letra e ao espírito da lei em vigor, a reapresentação de um nome anteriormente vetado, no mesmo processo de nomeação, essa sim, seria manifestamente um absurdo. Pressuporia que a anterior deliberação do Conselho, no sentido de julgar o nome proposto inadequado à nomeação em causa era, afinal, uma deliberação “não séria”! Ou que poderia ser alterada por razões ou pressões diversas da estrita bondade da decisão... A partir daí, pela mesma ordem de ideias, qualquer deliberação do CSMP, ainda que acabada de tomar, poderia ser novamente levada a votos, havendo inconformados, para ver se, por efeito de forças cósmicas ou jogadas de bastidores, se alteraria.
Quem consiga perfilhar um tal absurdo, jurídico, institucional e moral, poderá, já agora, propôr que o CSMP adopte, como hino oficial – que os conselheiros entoarão solenemente no início de cada reunião - a conhecida canção dos “Rádio Macau”:
“...amanhã talvez seja a valer,
hoje é a brincar...”.
O PGR é um magistrado. Com especiais responsabilidades de cumprir e fazer cumprir a lei em vigor. Convém que tenha presente que o seu crédito ficará irremediavelmente abalado se, neste caso, se comportar como um “rapaz do trapézio voador”, defendendo acrobacias interpretativas manifestamente “contra legem”.
Veremos se a legalidade e o bom senso prevalecem...
Enviar um comentário