25 abril 2007

missanga a pataco 10


Falemos então, pouquinho mas com alegria, no 25 A. Já aqui contei as histórias que um grupo de amigos viveu desde os dias imediatamente anteriores. Como na nossa escassa, mas total, possibilidade nos entregámos de alma e coração à empresa. Também já referi, há-de ter sido no ano passado, a emoção e a determinação (uma coisa não retira a outra e nas mulheres até parece que ajuda) da Teresa Feijó e da Maria João Delgado naquela madrugada duvidosa em que tentávamos perceber se o dia ia ser de festa ou se dali a pouco estaríamos guiando carros cheios de derrotados rumo à fronteira.
Falo hoje de dois homens já maduros, que tinham visto outras, sempre desagradáveis, mas que nem hesitaram quando fui pedir-lhes ajuda e colaboração, contando o mínimo indispensável e pedindo o máximo (im)possível. Falo de Rui Feijó e de Jorge Delgado.
Que um rapazola, enfim, um tipo de 33 anos (essa era a minha idade) se metesse nestas conspiratas era coisa fácil. Mas eles já tinham passado os cinquenta, já tinham conhecido a prisão e o rosário de coisas de desagradáveis que acompanhava qualquer democrata que desafiasse o poder. Tinham posição, família, negócios, e os anos não ajudavam. Ora bem. Acreditem ou não, nem pestanejaram. É para já, responderam. Com uma diferença: o Rui ficou em pulgas enquanto o Jorge, mais experimentado, disse que o chamassem só quando fosse necessário pois entretanto dormiria o sono dos justos (e ele era-o) dos habituados (idem, aspas, aspas) e dos decididos. E assim foi. Por isso não se meteu às ruas da noite e da madrugada connosco, enquanto o Rui fervilhante dizia que não podia estar em casa.
O Jorge morreu já, deixando entre amigos e conhecidos uma rasto luminoso de um militante critico e ponderado da liberdade. Faz falta, muita falta.
O Rui vai nos oitenta e cinco se não estou em erro, tem os achaques da idade, e dos rins a desfuncionar, da vista já cansada, das pernas que pouco lhe obedecem, mas a cabecinha continua fresca como no primeiro dia. Costumamos falar-nos neste dia, mas hoje ele teve de ir para a sua diálise e sai de lá desfeito. Amanhã também é dia, é sempre o primeiro dia de uma outra coisa que por muito desgostante que esteja, é melhor do que o 24 de Abril de 1974.
E o meu recado é simples: a democracia é coisa que está sempre em obras, o que é uma chatice. Mas mais vale viver entre andaimes do que entre grades sejam de ferro ou tão só tecidas de medo. E é isso que não é fácil de ensinar a quem nessa altura tinha dez, doze quinze anos para já não falar nos outros ainda mais ovos. E todavia foi por eles, para eles que alguns se arriscaram. Não estou a pedir grande meditação sequer um minuto se silêncio. Prefiro mesmo que o dia tenha sido passado como qualquer outro feriado porque isso é o verdadeiro sinal da vitória: viver na normalidade.
E por isso, só por isso, digo in imo pectore: viva o vinte e cinco de Abril, sempre!
a ilustração de hoje: cerejas. Lembrando a velha canção de combate:
Quem te pôs na orelha
essas cerejas, pastor?
São de cor vermelha,
vai pintá-las de outra cor.

1 comentário:

ferreira disse...

Adoro cerejas MCR-:)
ah, mudei para harpadecristal.blogspot.com
Abraço