Feirar: 1. o mesmo que enfeirar; transaccionar (Houaiss).
2. Comprar na feira (GDLP).
3O mesmo que enfeirar; .fazer compras na feira ou fora dela (Cândido de Figueiredo ).
Desculpem o recurso às autoridades dicionaristas mas há um leitor (atrevido!) que me acusa de usar palavras inexistentes, esquisitas ou difíceis.
A feira está por aí a rebentar. A leitorinha prevenida vai até lá já com a lista feita. À cautela aqui vão umas sugestões que as férias (olha uma palavra com o mesmo étimo de feira) estão a anunciar-se e nada melhor que um guarda sol, cadeira confortável, muito mar e um livro para ler.
1 Erico Veríssimo. Esse mesmo, o do “Olhai os lírios do campo” mas agora em tom maior como convém a uma grandíssima e belíssima saga: “O tempo e o Vento”. Ou seja, a vida de várias famílias ao longo de um século (aliás mais) no Rio Grande do Sul. As guerras de ocupação e fixação de fronteiras, a revolução farroupilha o nascimento de um poderoso Estado do Brasil de onde vieram alguns dos mais notáveis políticos brasileiros. Saiu agora o segundo volume: “O Retrato”. Não percam. É absolutamente fascinante, está pejado de personagens fortes, já nem falo nas mulheres..., e para glória dos trinetos (a minha geração) aparece lá um certo dr. Winter. Eu não resisto a desvendar quem é: nada mais nada menos do que o médico prussiano, Ernst Richard Heinzelmann, nascido em Havelberg a 4 de Janeiro de 1820. Convidado a vir para o Brasil chefiar uma missão de combate a um par de doenças tornou-se cidadão brasileiro por decreto do imperador Pedro II e constituiu família neste pais e naquele Estado. Razões bur(r)ocráticas de um funcionário do Registo Civil impediram o meu pai de juntar este nome aos restantes de família.
Jorge Amado e Guimarães Rosa, consideravam Erico um grande escritor, uma leal amigo e um homem de grande qualidade. Basta ler a esse respeito o que Amado escreve sobre Veríssimo em “Navegação de cabotagem”.
2. E aqui está a segunda sugestão: “Navegação de cabotagem” o mais delirante livro de memórias que conheço. E o mais bem humorado... São às centenas as histórias sobre um gigantesco conjunto de escritores, pintores e músicos que encheram os anos 20 a 60. De todos os lados, todos os continentes, todas as línguas. Uma espécie de história intelectual da inteligentsia desses anos. Imperdível. Aconselhei este livro a um largo par de amigos que ainda hoje me agradecem!
3. E agora um velho amigo meu, trota-mundos, poeta, jornalista de viagens, romancista e historiador: Fernando António Almeida. Dele acaba de sair “Fernão Mendes Pinto”, que tem por base a tese apresentada há trinta e tal anos na universidade de Liége. Quem, pela feira, der com “Esmirna, cidade azul” ou “Marina noiva da vida”, arrisque que são duas agradáveis novelas.
4 Julgo que a “Taschen” não tem barraquinha na feira. Se tiver atirem-se a “Description de l’Egypte” (que é nada mais nada menos do que o sumptuoso relatório ilustrado da expedição científica que acompanhou Napoleão) e a “Berlin” um recentíssimo livro sobre esse especial lugar do meu contentamento: “Berlin, the spirit of Berlin” (há também em francês e alemão, 50 €).
5 Terminemos este pequeno périplo com António Faria, cineasta e escritor (“Emenda e soneto” para quem se lembra): “Linha estreita da liberdade (a Casa dos Estudantes do Império)”, Colibri ed.
A “casa”: um espaço mítico nos anos sessenta. O ponto de encontro dos estudantes vindos das colónias e dos seus (muitos) amigos metropolitanos. Ficaram lendárias as festas que lá se faziam, onde pela primeira vez se ouviram as “coladeiras” de Cabo Verde os a “marrebenta” de Moçambique! E os kwelas da África do Sul... A casa foi o viveiro de muito dirigente africano mas foi ainda mais um espaço de descoberta de uma outra realidade social e cultural. Foi na casa que primeiro se editaram Craveirinha ou Viriato da Cruz para já não falar em Luandino Vieira.
Ler hoje a história dessa associação de estudantes violentamente encerrada em 1965 é ler uma página de liberdade, da liberdade possível desse tempo.
Post-scriptum que não tem nada a ver: em tempos que já lá vão, a instâncias de um qualquer amigo comum, cometi a imprudência de emprestar vários livros editados pela Casa dos Estudantes do Império a uma pessoa que, dizia-se, andava a estudar literatura africana. Até hoje, várias décadas depois, os livros se bem que assinados ainda não regressaram ao seu lar de origem. Este é o primeiro aviso (e ainda não traz nome nem sexo de quem ilegitimamente os mantém na sua estante) no sentido de se obter a sua devolução: os leitores e amigos lisboetas fariam o favor imenso de fazer circular este apelo entre os seus conhecidos sobretudo se especialistas de literatura africana: mcr, o generoso (ou o parvo) requer imediato envio da sua propriedade. Senão...
Hoje, dia do jantar dos incursionistas, saem duas gravuras roubadas respectivamente aos livros citados (Berlin e Description...)
25 maio 2007
Farmacia de serviço 33
Marcadores: Farmácia de serviço, literatura/livros, mcr
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1 comentário:
Bom jantar!
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