24 julho 2007

Diário Político 59


Enquanto as férias não começam

Às vezes uma pessoa interroga-se sobre o que se passa na cabeça dos outros. Tomar-nos-ão por tolinhos? Desprezam-nos? Serão de tal modo ingénuos que não sabem do que falam? Será o Verão, que mesmo sem chegar, lhes incendeia a cabecinha?

Comecemos por este grupo de coreanos que caiu numa cilada em plena zona tribal do Afeganistão. Zona em que ninguém anda sem forte escolta e mesmo assim... Os jovens eram evangelistas. Iam levar a boa palavra aos pagãos. Ou seja iam ensinar aos “estudantes de teologia muçulmana” a beleza de outras convicções absolutamente estranhas aos indígenas. Mas por quem se tomavam estes jovens que hesito em qualificar de ingénuos porque há ingenuidades de tal modo ingénuas que roçam o cretinismo. Quereriam ser mártires? Ainda há disso? E metade do mundo fica sobre brasas, exércitos, enfim não exageremos, alguma tropa é despachada para o local onde certamente vai haver mortes, cheira-me que, como vem sendo um triste e sinistro hábito, quem vai apanhar tiros é o pópulo que já grama em cima com os talibans e a tropa ocidental.
Quem deixou os meninos evangelistas passear por ali? Porque os deixaram? Responda quem souber.

O presidente Bush continua a achar que está a ganhar a guerra contra o eixo do mal no Iraque. Os jornais já nem sequer contam os mortos. Alguém sabe quantos americanos morreram nos últimos meses? Não são notícia, são uma espécie de fait divers no país da morte. Saddam Hussein está vingado: já morreram mais iraquianos neste curto espaço de tempo do que em todo o seu longo e sangrento reinado. E isto ainda só agora começou. Porque com americanos ou sem o morticínio vai continuar. Vai, presumivelmente, aumentar. Enfim são iraquianos, logo infiéis, que se lixem.

Continuando sempre nestas festivas paragens do Médio Oriente, temos que o mundo ocidental olha embevecido para a Cisjordânia. Olha tanto que se esquece de Gaza. Provavelmente julgam que os de lá, sob a férula do Hamas, morrerão de fome, cercados como estão. É possível mas não acredito. Não que ache o Hamas simpático. Longe disso. Acho-os mesmo tão antipáticos como o Likud. Todavia, e se bem me lembro, eles ganharam umas eleições organizadas pelos seus próprios adversários. Agora anda toda a gente a acarinhar o presidente da Autoridade Palestiniana, Israel liberta 250 presos (de um universo de 8 ou 9.000 detidos a maior parte dos quais há anos, muitos sem julgamento). Até Blair, o rapaz que viu claramente visto o milagre das rosas iraquiano (armas de destruição maciça por toda a parte), vai lá. Vai dizer aos palestinianos da Cisjordânia que o Ocidente os ama desde as cruzadas. O mundo endoideceu, ou isto é apenas uma inocente brincadeira de Verão?

A Turquia votou. A esquerda e o centro laicos foram derrotados. Sem apelo nem agravo. Os islamistas “moderados” de Erdogan ganharam. Eu, se fosse mulher, e turca, ficava um bocado atrapalhada. Bem sei que ninguém fala em impor o véu, muito menos o tchador e a charia. Ainda não! Mas lá chegaremos. Ou poderemos chegar. A Turquia é uma caixinha de surpresas, eu que o diga que tive por esse mundo fora um bom número de colegas turcos. Gente da melhor, garanto. Laicos, alegres, não desprezando uma cervejola discreta. Entretanto, vejamos o que a Europa lhes destina. A Europa, a União é o último travão à deriva islamista. A Turquia é o único baluarte contra uma outra concepção do mundo, claramente anti-europeia. Não sei porquê mas esta minha ideia não deve ter muitos entusiastas pela Europa sarkozo-polaca.

E a Polónia? Pois a Polónia agora que já entrou, começa a achar que os direitos e liberdades que a União partilha não são exactamente os que ela, melhor dizendo, os que os gémeos presidente e primeiro ministro partilham. O engenheiro Sócrates vai suar um bocado durante o Verão para os convencer.

E nós por cá, todos bem? Enfim... A habitual algazarra antes do Verão e o romance por capítulos semanais do PPD. O Dr Mendes farto de apanhar na cabeça marcou as “directas”. Previa-se uma multidão de candidatos. Mas não. Até agora o dr. Mendes está sozinho na corrida. Então, não há corajosos? Tanta crítica, tanta farronca e agora passa tudo. No meio destes não-candidatos, custa-me dizê-lo, só um apresenta um argumento decente: o Dr Rio. Diz –e acredito – que tem um mandato para cumprir. Até ao fim. Ora aqui está uma coisa que aquele senhor ex-juiz do constitucional poderia aprender. Se ainda fosse a tempo. Mas já não vai.

Sincerely yours
d’ Oliveira

o desenho reporta-se a uma antiga ilustração sobre as cruzadas.

Sem comentários: