01 janeiro 2008

Pinto Monteiro e o MP

O PGR tem beneficiado, desde o início do seu mandato, daquilo a que soe chamar-se “boa imprensa”. Depois de ter feito punching bag do seu antecessor, Souto de Moura, outra coisa não seria de esperar da nossa comunicação social a pouco mais do que uma voz.
Mas Pinto Monteiro chegou “em alta” ao final de pouco mais de um ano como PGR, tendo-o o Correio da Manhã apontado como “figura nacional de 2007”. Haverá nisto já algum mérito seu?

Do meu ponto de vista, a entrevista que deu à Revista deste diário (dia 30 de Dez.), quer pelo tom quer pelo conteúdo, não só não envergonha em nenhum ponto como é digna de aplauso na generalidade dos aspectos focados (esqueço o último destaque da entrevista, que estamos em época de indulgências).
Também me pareceram adequadas e pertinentes as palavras que dirigiu ao MP no jantar de inauguração da nova sede do SMMP, a 7 de Dez., que aplaudi com sinceridade e até algum entusiasmo. Mais, seguramente, do que os muitos que me estavam próximos (e, para que conste, não eram nada, mas mesmo nada, afectos à direcção do SMMP!).

Na verdade, ao contrário do que Pinto Monteiro refere naquela entrevista, a maioria do MP, desde os servos da gleba aos seus mais nobres elementos (que P. Monteiro e seus colaboradores próximos, quais avestruzes de cabeça enterrada na areia, teimam em confundir com o SMMP) está ainda longe de se sentir representada por este PGR, a que manifestamente ainda não aderiu pela razão e muito menos pela alma e coração.
E também creio estar errado P. Monteiro quando aponta como "prova" desse desamor a oposição do CSMP (que também teima em "colar" ao SMMP) à nomeação para Vice do magistrado por ele indicado. Alguma desconfiança que possa ter havido logo de início, se passou a desamor foi-o por via da forma como reagiu à dita oposição, tudo agravado com declarações posteriores, naquele estilo populista light que vinha, até agora, caracterizando as suas entrevistas e ditos em aparições públicas ou entrevistas "de rua".

Mas parece então, retomando o fio à meada, que Pinto Monteiro fez progressos, o que permite um fio de esperança para as bandas do MP/sistema de justiça em 2008. Sei que, ao escrever isto, muitos do MP pensarão que estou a ser ingénua, outros tantos que sou tola. Talvez, mas não se iludam, ao ver a árvore não esqueço a floresta:
o episódio da nomeação do Vice gerou “traumas” sérios, expressos só de forma aparente como boutade, a dos condes, duques e marquesas… e por muito que P. Monteiro faça por ter a imagem de paladino da defesa da autonomia do MP perante o poder político, convém não esquecer que essa autonomia passa muito pela composição do CSMP, matéria à qual, uma vez que está na calha a revisão do estatuto do MP, o PGR tem vindo a dar especial atenção, sabendo-se que a actual composição e, maxime, forma de nomeação de alguns dos seus membros, não são do seu "agrado", nem, presumivelmente, do Governo.

Em 2008 não faltarão a Pinto Monteiro ocasiões para demonstrar que sabe e quer tomar medidas para melhorar o funcionamento da estrutura e performance do MP (para além das pontuais de forte impacto mediático mas pouca ou nenhuma ressonância interna geral).

Fico, desde já, na expectativa de conhecer as medidas (tão necessárias e algumas tão óbvias e simples!) que vai tomar para cumprir o dito ao CM: "Vou oficializar em 2008 o seguinte: no Ministério Público quem investiga tem de acompanhar o julgamento."
E, claro, também fico na expectativa das revelações sobre "tanta mentira e meias verdades" que diz ter lido e ouvido sobre "a chamada violência na noite do Porto".
E fico, sobretudo, na expectativa de saber até que ponto está Pinto Monteiro disposto a pugnar para que o Governo, em cuja boa vontade tanto diz confiar, atenda os seus, aliás, bem moderados pedidos, desde a alteração de certas normas do CPP, mormente no que respeita aos prazos para investigação dos crimes mais complexos e "de colarinho branco", à atribuição de poderes ao MP para fiscalizar processualmente as polícias, passando pela promessa de criação de um sistema de base de dados que, ao que sei, está longe de vir a ser concretizada em moldes minimamente aceitáveis.

Se, como diz na entrevista, «o que dá prestígio ao Ministério Público é a opinião do pedreiro, do médico, do taxista», o que dará prestigio duradouro a Pinto Monteiro não são as amáveis crónicas jornalísticas mas o reconhecimento, por parte da generalidade dos magistrados do MP, de que ele é, por via dos actos praticados e das atitudes tomadas, não só um dos seus mas o melhor dos seus.

Assim seja, a bem dos cidadãos deste país.

4 comentários:

M.C.R. disse...

Pimba!, na parte óssea da barriguinha!

Isto dizia a minha primeira sogra, Alcinda Delgado, que Deus tenha.
Queria apenas significar acordo total e satisfação pelo que acabava de ver ler ou ouvir.

O meu olhar disse...

Kami, o seu texto expressa algo muito pouco comum no que costuma ser escrito e dito neste nosso país. De facto, as análises costumam ser do tipo “anjo ou demónio” e, muitas das vezes, passa-se de um para o outro num abrir e fechar de olhos. O que pude ler no seu texto foi uma análise a aspectos positivos e negativos, ora reforçando uns ora outros e concluindo com uma esperança atenta, mas não ingénua. Tomara que esta fosse uma prática mais corrente.

Dr. Assur disse...

Salvo melhor opinião e com a devida vénia, Souto Moura era entrevistado pelas actuações do MP, Pinto Monteira, sempre que pode, dá entrevistas soltas. De trabalho conhece-se a nomeação de Morgado para o processo Apito Dourado e a equipa especial enviada para investigar a criminalidade do Porto. Nomeação que parece ter atrapalhado a investigção do MP local.

A continuar assim, do trabalho do actual PGR só se poderá comentar as muitas entrevistas dadas.

Kamikaze (L.P.) disse...

Assur.

O que me parece resultar da entrevista que menciono é a existência de pensamento estratégico do PGR sobre o MP na actual sociedade: suas funções, suas estruturas, seu presente e seu futuro. Concorde-se ou não com tal pensamento, facto é que ele parece começar a emergir com alguma coerência.
Compreender a função e a organização de qualquer estrutura liderada é, para quem lidera, creio, o 1º "trabalho". Depois há que concretizar na prática claro. Por isso digo que vou esperar para ver.
Na minha irrelevante mas não desconhecedora opinião, se Souto Mouro falhou foi, mais que noutro aspecto qualquer, no ter-se sempre alheado das questões organizativas do MP e no não se ter assumido como voz-líder de uma mudança de mentalidades e comportamentos que há muito tarda no MP.