11 maio 2008

Missanga a pataco 52


Perplexidades de um da Naval (Associação Naval 1º de Maio, se faz favor)

Não percebo nada de futebol. Ou, pelo menos, deste futebol. Sou do tempo em que se dizia off side, back e outras inglesices do mesmo teor. Sou do tempo em que raramente um jogador mudava de clube, ou porque o dinheiro não era o mais importante, ou porque mesmo sendo havia o brio de defender o clube do coração.
E sou da Naval. E de Buarcos. E do futebol na praia, com banho de mar no fim. Enfim, sou um inocente.
Dizem-me que nas decisões agora anunciadas (Porto, Boavista e Leiria, mais um par de árbitros) a prova produzida decorre da intercepção de telefonemas que no processo principal (o famoso Apito Dourado) não terão cabimento por não terem sido obtidas segundo as regras da arte. É assim? Assim mesmo? Ou seja, por não se respeitarem determinados formalismos, a prova cai inexoravelmente até ao ventre da mãe terra ajudada pelo autoclismo legislativo. É assim?
Concorde-se ou não com este excesso formal, ele existe e faz lei. Essa lei, e só essa é a que deve ser aplicada pelos Tribunais. Dura lex sed lex, ou branda lei mas lei e basta!
Não acredito em tribunais de outro tipo, mormente os desportivos. Não acredito em tribunais ou em juízes eleitos, provavelmente porque não sou americano. Aceito mal esses tribunais especiais (a simples palavra arrepia-me, mesmo se não forem “plenários”...Explico-me?) e no caso em apreço só os tolero se a sua disciplina for idêntica aos Tribunais comuns, se a prova produzida correr pelo mesmo caudal que a que se produz nos Tribunais.
Em segundo lugar, repetindo que sou da Naval e de mais nenhum clube, muito menos de qualquer “grande” e jamais do Boavista, meu desagradabilíssimo vizinho, desagradou-me saber pelo noticiário das sete da manhã o que só foi oficial às cinco da tarde. Acho o processo deselegante para não dizer infame. Venha ele de um juiz togado ou dum assistente da faculdade de Direito de Coimbra (a minha faculdade e a minha universidade).
Mais me perturba verificar que afinal o “apito final” se resume a três clubes e não à boa vintena de que toda a gente fala. Então a corrupção é assim tão pouca?
Não vou cair na inocência de pensar que um clube que ganha (no mesmo ano da tentativa de corromper árbitros) o campeonato português, o da Europa e o do Mundo andasse a tentar ganhar a dois clubes pequenotes, frangões, mesmo, passe o termo que não pretende ser insultuoso.
Eu, navalista, sei bem que o meu clube é o melhor do mundo. Todavia rir-me-ia a bandeiras despregadas se o senhor Pinto da Costa achasse necessário comprar um árbitro para garantir uma vitória do FCP sobre a gloriosa (e mais antiga, como se sabe) Associação Naval 1º de Maio. Eu sei que somos temidos mas tanto também não, que diabo!
Outra coisa que me suscita alguma perplexidade, pese embora estar do outro lado um jovem assistente que até tem um diploma seguramente maravilhoso em Direito do Desporto (boa piada, em Portugal, esta do direito do desporto numa terra em que o desporto é de bancada e se chama futebol...) é a tal alegação de “coacção”. Eu já disse que não gosto do Boavista, muito menos dos seus dirigentes mas coacção? Coacção é uma palavra grave, carregada de significado que não se pode perder por veredas subtis e imaginativas. Eu ainda me recordo do dr. Santana Lopes (outro que tal) a sportingamente avisar de conspirações em Canal Caveira, ameaçando varrer tudo como numa feira em Fafe (com que ninguém fanfa) ou os eternos dirigentes de outros clubes mal habituados a perder que avisam que vão estar atentos, atentíssimos, que não se responsabilizam pelo que as massas associativas possam fazer quando justamente indignadas pelas barbaridades arbitrais se virem forçada a fazer justiça pelas próprias e inocentes mãozinhas. Nem assim se falou de coacção, pelo que presumo que desta vez a coisa foi mesmo à moda de Chicago dos velhos tempos: “ou marcas uns pennaltys para a malta ou comes...” Uma espécie de Jorge Coelho mais encorpado e menos parlapatão, estão a ver o estilo?
Fico-me por aqui porque não compete a um paisano de Buarcos, navalista, meter-se no curral dos grandes. Todavia mantenho: sinto-me perplexo. Provavelmente é porque não sei o suficiente de futebol e muito menos de Direito. Se for esse o caso, não leiam o que está escrito aí em cima. Se o leram já, esqueçam-no. Se não o esquecerem rezem por mim um Pater e cinco Ave Marias. Se não me servir por demasiado pecador talvez sirva aos da Liga no caso de se verificar que eles meteram o pézinho delicado na argola. Vale?

4 comentários:

josé disse...

Eu acredito, e explico já porquê.

As escutas, tal como o algodão, não engangam. Na América, terra de liberdades amplas, este tipo de prova, admite-se. Noutros lados, idem.

Por cá, no processo penal não se admite porque a escola de Coimbra, consultou os oráculos alemães que lhe mostraram aos seus docentes, o horror de alguém se fiar em escutas, cujas regras, podem não observar os requisitos definidos pelos próprios como aceitáveis como prova em função de teorias rebuscadas que germinaram na mente de fanáticos pela paranóia de poderem ser apanhados inocentes na trama ubuesca de um enredo kafkiano.
Esta matéria, do ãmbito da ficção, fez curso, nos corredores do Instituto Jurídico, onde passam os lentes que rebuscam pensamentos recônditos, acerca do erro judiciário, como sendo o maior dos horrores que a Humanidade já produziu.
Isto num país em que as penas de prisão por vezes são quase simbólicas e nunca vão para além de duas dúzias de anos, no máximo dos máximos possível e imaginário. Em 99% dos casos, nunca ultrapassam os 15 anos.

Mesmo assim, o horror ao erro judiciário em Portugal justifica todos os cuidados e cautelas que existem numa sociedade que admite a prisão perpétua.

Então, andamos nisto.

E no procedimento disciplinar, até se colocam as questões do processo penal, também com medo de errar e cometer o inefando acto de obrigar o Porto a descer de divisão.

O que- diga-se- era de toda a justiça, pelo que se sabe.

E não era nada de mais, tendo em conta o que sucedeu ao Fiorentina e á Juventus.

M.C.R. disse...

O meu problema é outro. pode um "tribunal" desportivo criado dentro de uma federação desportiva ou de uma liga ir mais além, na produção e validação da prova, do que os tribunais comuns? Isto será legal? será constitucional?
Pessoalmente estou-me nas tintas para o FCP, Sporting, Bnfica e restantes vacas sagradas, Académica incluída. O país (e eu) passava bem sem "Champions, sem UEFA, sem Campeonato e sem Taça.

jcp (José Carlos Pereira) disse...

Diz-se que seria de toda a justiça que o FC Porto descesse de divisão, pelo que sabe. Sabe-se o quê? Por quem? Pelos jornais, esses eternos manipuladores?
Sou sócio do FCP mas acho-me capaz de analisar racionalemnte tudo o que está em cima da mesa. E não é nada bonito aquilo que se vê.
Deixo aqui o que já escrevi n'O Anónimo:
Eu sei que a generalidade do país exulta com as decisões "espectaculares" da Comissão Disciplinar da Liga. O show-off do seu presidente, um anónimo senhor que encontrou agora as luzes da ribalta, foi deprimente. Finalmente, os maus do futebol são apanhados!
Independentemente dos delitos que eventualmente foram cometidos - e que devem ser punidos quando e se provados - tudo isto me parece pouco sustentado e sem base para vingar quando for apreciado pelas instâncias superiores. E já não falo do que vai acontecer no processo que decorre nos tribunais comuns. As escutas ilegais, as coacções, as tentativas de corrupção, a origem dos depoimentos acusadores, tudo isso parece demasiado leviano para conduzir a penas tão pesadas.
Já escrevi que defendia que o FCPorto deveria recorrer para as instâncias superiores. A honra não se troca por um qualquer campeonato. Mas não deixo de compreender as razões aduzidas pelos dirigentes para não recorrerem, apesar de não concordar com essa decisão.

Mocho Atento disse...

Esta questão move paixões e é dificil manter um discurso racional.
Não sou sócio do FCPorto, mas sou adepto.
Como já escrevi aqui, parece-me que a estratégia do Clube é muito simples e eficaz.
Assim como não ponho em causa a competência e idoneidade da Comissão Disciplinar (questiono é o modo como se apuraram os factos provados), também me espanta o ruído que surge, por antecipação, quanto à competência e idoneidade do Conselho de Justiça. A ver vamos!

Quanto às escutas telefónicas, apenas me espanta que neste país seja o único meio de prova, quando sabemos que as conversas em privado têm um registo que muitas vezes induz em erro quem as ouve.