06 julho 2008

Au Bonheur des Dames 129


“figures in the landscape*”

Algures, numa dobra da memória, existirá um filme com este título. Quase o vejo, pelo menos pressinto-o mas a memória sendo o que é prega destas partidas. Obviamente, ou talvez não, que a menção (Farmácia de Serviço 44, 30 de Junho) está aí em baixo meio escondida e provavelmente esquecida, refiro-me à inauguração da instalação “le passeur” da Filipa César, na “Ellipse Foundation”.
Casa simpática, esta, de acesso difícil para quem não conhece a zona mas que vale a pena visitar. Uma fundação que é mesmo uma fundação, sem benesses públicas, sem mão estendida ao depauperado (e tantas vezes mal gasto) orçamento do Estado, uma tentativa (conseguida ou em vias disso) de erguer uma colecção de arte moderna num país e numa época pouco propícios a aventuras destas.
Aí em baixo estará a direcção da fundação (e o telefone para pedirem mais informações se quiserem passar uns momentos na companhia de quatro pessoas que a Filipa filmou com um imenso carinho, respeito e paciência. Já foram identificados (outra vez aí em baixo) mas repito que se trata de uma mulher e três homens que numa altura das suas vidas entenderam dar o corpo ao manifesto e erguer a partir apenas da consciência de serem contra uma rede de passagem clandestina em terras do Alto Minho, Melgaço para sermos mais precisos.
Dos quatro, por razões várias, fui o único que pode estar presente na inauguração da exposição. Não vou todavia falar dela por uma razão simples: estou lá exposto, falando de mim, dos meus amigos, desse tempo de chumbo e rosas, duma aventura que se ia esquecendo docemente e que, subitamente, se reavivou graças ao trabalho da Filipa.
Eu que quase a vi nascer, amigo que sou da Elsa César e do Jaime Azinheira, ambos escultores, fico comovido e perturbado ao ver como o talento desta jovem mulher se vai afirmando. Mais lá fora do que cá dentro, o que é, para mim, um excelente sinal. Desconfio da bacoquice dominante, destas maravalhas geniais que duram o tempo de um suspiro e que naufragam á vista de um primeiro e único olhar critico. Todavia, a Filipa vem-se afirmando num território duro, difícil, onde a competição não é a feijões. Trabalha em Berlin, cidade que –já aqui várias vezes o disse – é também muito minha por razões inclusivamente familiares.
Deixo-vos pois, esta lembrança, este velado convite: vão ver “le passeur” e de caminho dêem uma volta pelo resto da fundação. Aquilo é gerido por gente nova, entusiasta, dedicada, com amor à camisola. Com sorte, uma bonita rapariga propor-vos-á uma tisana bem fria em que até se sente um toque de cravinho. Com sorte encontrarão a responsável da fundação ou um dos curadores Pedro Lapa que no próximo dia 12 orientará uma visita guiada.

Ellipse Foundation, Rª das Fisgas, Pedra Furada Alcoitão, Cascais (visita guiada: 12 de Julho, 16.00 marcação prévia 21469 18 86 info@ellipsefoundation.com

Esquecia-me! A exposição é patrocinada pelo Banco Privado Português, mecenas exclusivo, desta feita. Já não há respeito: um banco financia um documentário sobre as duvidosas e esquerdizantes actividades de quatro pessoas nos anos de 72/74!

1 comentário:

M.C.R. disse...

suponho que se trata de um filme de Losey (finais de 60 início de 70?)
E não me venham falar da obra do Bacon com o mesmo título. Eu queria referir-me ao filme e só a ele.