09 setembro 2008

O Comunismo à Americana ou o Novo Estádio no Sistema de Acumulação Capitalista

A intervenção do governo americano, que levou à nacionalização das duas empresas hipotecárias, pelo volume de recursos envolvidos, ganha contornos de escândalo à escala planetária. Ou seja, o tesouro dos EUA vai pagar mais de 200 mil milhões de euros para evitar a falência das duas empresas e o desastre de muitos bancos e instituições imobiliárias.

O curioso é que toda a gente ficou satisfeita. Mesmo aqueles que sempre defenderam a não intervenção do Estado na economia – os fieis do “Menos Estado melhor Estado”, ficaram calados ou aceitam a nacionalização como o mal menor.

O BCP também pode encarar o futuro com mais tranquilidade. É que detém 55 milhões de euros em activos das empresas nacionalizadas, que desapareceriam no processo de falência, mas que agora estão a salvo graças à intervenção do governo dos EUA.

Em meu entender, esta história apresenta três facetas distintas.

A primeira, reconfirma a absoluta incapacidade do mercado em se autoregular, do que decorre a permanente necessidade do Estado manter em alerta a “mão visível”, para impor as regas e os limites na assunção do risco;

A segunda, mostra até que ponto o capital livre e desenfreado contém o gérmen das crises e como o governo americano se dispõe a chutar para a frente um problema, sem o resolver de facto;

A terceira, mas não menos interessante, mostra como o EUA não hesitam em deitar mão de um instrumento de política socializante para salvar grandes empresas e accionistas.

A partir de agora, face ao sinal dado pelo governo americano, os gestores de grandes grupos financeiros não terão e se preocupar com a qualidade da sua gestão. Se as coisas correrem para o torto, o Governo deitará mão do instrumento das nacionalizações e salvará as respectivas empresas. É de admitir que estes princípios sejam adoptados por outros países, incluindo o nosso.

Ou seja, o Governo de Bush deixa mais esta marca na economia. De ora em diante as nacionalizações passarão a ser um instrumento de correcção das ineficiências do mercado e poderão ser adoptadas por qualquer governo, sem correr o perigo de ser apodado de antidemocrático, socialista, comunista ou outra coisa qualquer.

Atingiu-se um novo estádio no processo de acumulação capitalista: O Mercado a funcionar sob a “mão visível” do Estado.

2 comentários:

jcp (José Carlos Pereira) disse...

Et voilá!

O meu olhar disse...

Acho curioso que se fale tão pouco desta questão que é uma machada incrível na famosa, apregoada e defendida auto regulação do mercado. É com base nesse princípio que se nacionalizaram bens básicos como os sectores da energia, por exemplo. Agora o mercado não funcionou e, em vez de se tentar corrigir o que lhe está na base, a grande especulação financeira, essa economia paralela que está a mimar a passos largos a economia real, tira-se um coelho da cartola, ou seja, umas centenas de milhar de milhões e resolve-se o problema. Claro que se isso não fosse feito a economia, não só a americana mas também a dos restantes países, iriam sofrer gravemente com essas falências. Mas isso resolve o problema de fundo? Claro que não. E a responsabilização política de Bush relativamente à instabilidade que criou no sector petrolífero com a guerra no Iraque? Quem ganhou com tudo isto? E quem perdeu e continua a perder?
É estranho tanto silêncio, tanto mais que parece que o governo americano se prepara para nacionalizar mais uma empresa. É o que está a dar.