18 julho 2004

Ainda a formação dos magistrados em Portugal

Para quem se interessa por este tema, é imprescindível a leitura do estudo de Boaventura Sousa Santos, elaborado no âmbito do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa e subordinado ao título "A formação dos magistrados em Portugal. Que renovação?".
 

2 comentários:

Kamikaze (L.P.) disse...

Muito brevemente, atentas as dificuldades de manutenção da ligação à rede que me andam a azucrinar:

BSS faz um correcto enquadramento inicial, na senda do que sobre esta matéria ele próprio e a equipa que dirigiu no âmbito do Observatório da Justiça vêm defendendo. Mas quando tenta passar essas consideraões genéricas à prática já não bate a bota com a perdigota.
Segundo ele, o 2º ano de formação inicial no CEJ (formação específica para cada magistratura, embora ainda com a possibilidade de alargamento da formação conjunta do ano anterior a determinadas matérias)seria ainda de formação "teórico-prática". Presume-se, quer do que diz quer do que resulta, a contrario, do conteúdo sugerido para o 1º ano de formação inicial (comum) que neste 2º ano haveria maior incidência em matérias jurídicas. No fundo, aquilo que se faz agora nos 6 meses iniciais de formação no CEJ. Ora, enquanto actualmente os auditores estão, a seguir a essa fase inicial no CEJ, 1 ano nos tribunais antes de irem para o estágio (outro ano), BSS propõe que a passagem pelos tribunais antes do estágio seja de apenas 2 meses. Ora, por mais "prática" que seja a formação "teórico-prática" no CEJ, a prática a sério só nos tribunais! Dar a volta a isto não só não é praticável como nem sequer me parece conceptualmente defensável!

A não ser que BSS, quando refere que no 1º ano de formação inicial comum no CEJ uma parte do tempo seria passado em contactos com "instituições relacionadas com a vida judiciária" esteja a incluir aí, também, os tribunais... não parece poder ser essa a interpretação a fazer, mas ainda que assim fosse, esse "contacto" entre muitos outros, pela sua curta duração e natureza, não lograria nunca levar à aprendizagem e exercitação suficientes para, com apenas mais dois meses de prática, se poder passar logo ao estágio (onde já se despacha sob responsabilidade própria)!

Enfim,e com toodo o respeito, academismos...

Kamikaze (L.P.) disse...

No JN de hoje, pela pena de Tânia Laranjo, dá-se eco deste estudo, em notícia com o seguinte título/síntese: Como já referi no comentário anterior, a análise de BSS até coincide, em boa parte, com a que faço.
Agora não se pode é ter a ilusão que se quebra a tal cultura técnico-burocrática que grassa nos tribunais transformando o CEJ num curso de pós-graduação (que é o que, na verdade, BSS propõe) e, simultaneamente, num, laboratório de simulação de despachos, completamente à margem da prática judiciária dos tribunais.
É claro que a formação no CEJ deve contribuir fortemente para a difusão de factores de inovação! Mas pensar-se que isso se consegue mantendo os auditores em "laboratório" durante dois anos, com simulação de despachos no quarto final desse período e apenas dois meses para o contacto com a realidade real da prática judiciária, é votar tão nobres intentos a um fracasso óbvio: sem tempo de adaptação ao ritmo de trabalho exigível, ou se cai rapidamente no facilitismo reprodutor das tais burocracias, ou se afunda um tribunal em dois tempos...

Só mais umas notas:
- o contacto com instituições relacionadas com a vida judiciária parece-me essencial durante o período formativo. E tem vindo a ser sistematicamente feito, nos últimos anos, pela direcção de estágios do MP - ainda que com um âmbito menos alargado do que o preconizado por BSS. No ano 2003 foi também efectuado, por um conjunto de auditores, um trabalho nas prisões, por iniciativa de um docente juiz, que se traduziu num trabalho depois apresentado a todo o curso. Não se repetiu em 2004, por falta de apoio do CEJ, cuja direcção a nível da magistratura judicial configura este tipo de actividades como perda de tempo (sic).
- o CEJ está há 3 anos sem director do gabinete de estudos jurídico-sociais (que é membro da direcção do CEJ, a nomear pelo M. da Justiça,tal como o director e os directores adjuntos)que desde então está completamente inactivo. Este facto diz tudo, ou pelo menos diz muito, das condições que (não)têm sido dadas ao CEJ para desenvolver a sua actividade!
Por esta e muitas outras (a mais elementar, mas quiçá a não mais imoportante: falta de preenchimento do quadro de funcionários) penso que é caso para dizer que, nas condições de trabalho (in)existentes, m'espanta como, ainda assim, o CEJ tem, com os contributos individuais de muitos, continuado a dar formação de qualidade e a inovar nalguns pontos importantes, não avergonhando nos resultados.