E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
Carlos Drummond de Andrade
13 julho 2004
José
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
8 comentários:
Maria
E agora, Maria ?
Maria titubeia,
hesita, duvida,
espera, não sabe.
E agora, Maria?
Maria, onde estão ?
O amor por José,
carinhos, ardores,
no dia sem luz ?
E agora, Maria,
José, onde está ?
José que era teu
sem muitas palavras.
E quando falava
dizia poemas.
Ou silenciava
pensando a existência.
Estará sozinho,
perdido de ti,
enquanto tu choras
em todas as horas?
E agora, Maria ?
E se pegasses
o cavalo baio
e corresses mundo
em busca de José,
nos campos, no prado
em todos os livros,
em todos os cantos,
na casinha branca,
no alto do monte,
tu o salvarias?
Tu te salvarias?
Os mesmos braços,
a mesma angústia,
os mesmos olhos
acesos no dia.
O mesmo acalento,
a mesma dor
deitada em teu colo,
o mesmo calor
queimando-te a pele,
os mesmos beijos
de puro desejo.
E agora Maria?
Viverás sem ele?
Maria parada,
os olhos de pedra,
os olhos de mar,
só dá meia volta,
embrulha o seu medo,
mui bem embrulhado,
arreia o cavalo.
E parte pro mundo.
Salvar o seu homem,
é só no que pensa.
Que será de Maria?
Silvia Chueire
O José da Loja arrasa corações
José Barroso e a pós-modernidade...
Ahahahahah!
O José do Drummond é lá dos anos quarenta! É uma referência tal que até o Cardoso Pires, José, nos anos setenta se lembrou de intitular um livro dessa maneira: " e agora, José?"
É essa a minha referência, aliás. A do Cardoso Pires, José que não a do Drummond, Carlos.
Deste, guardo o poema Construção musicado magistralmente pelo Chico Buarque e que em crescendo acrescenta notas que se encastelam numa melodia lindíssma.
Quem me dera ser José!
José foi o homem de Maria
e ser maria
é ter José.
Compadre esteves não rima
É preciso não ter sorte!
Pois não é caso único, compadre Esteves.
Também o Moustaki, Georges se lembrou disso, antes e escreveu os seguintes versos cuja música também é de antologia e ainda hoje se escuta com muito proveito:
Voilà c'que c'est, mon vieux Joseph
Que d'avoir pris
La plus jolie
Parmi les filles de Galilée
Celle qu'on appelait Marie
Tu aurais pu, mon vieux Joseph
Prendre Sarah
Ou Deborah
Et rien ne serait arrivé
Mais tu as preféré Marie
Tu aurais pu, mon vieux Joseph
Rester chez toi
Tailler ton bois
Plutôt que d'aller t'exiler
Et te cacher avec Marie
Tu aurais pu, mon vieux Joseph
Faire des petits
Avec Marie
Et leur apprendre ton métier
Comme ton père te l'avait appris
Pourquoi a-t-il fallu, Joseph
Que ton enfant
Cet innocent
Ait eu ces étranges idées
Qui ont tant fait pleurer Marie
Parfois je pense à toi, Joseph
Mon pauvre ami
Lorsque l'on rit
De toi qui n'avais demandé
Qu'à vivre heureux avec Marie..
Isto é para me redimir da calinada de ter escrito que o Construção era poema da autoria do Drummond de Andrade. Não é! É por inteiro, do Chico Buarque. Desculpas.
Este belogue já parece a «Travessa do Cotovelo».
Onde está o Marquês???
Verdadeiramente, a retoma não está connosco!
Enviar um comentário