por Artur Costa, juiz conselheiro, no JN de hoje:
O que acho surpreendente em todo este imbróglio das "cassetes roubadas" é a forma como certos comentadores têm tratado os acontecimentos. Em primeiro lugar, tem-se passado uma esponja (não foi o caso de Vital Moreira, de José António Lima e de alguns mais) sobre a violação de regras deontológicas que tocam a essência do jornalismo. Para esses comentadores, este aspecto da questão pura e simplesmente não existe, o que denuncia, logo à partida, o ponto de vista tendencioso em que se colocam. Em segundo lugar, essa tendenciosa posição, levada ao extremo, vem a desembocar numa montagem dos acontecimentos que é no mínimo chocante pelo seu carácter abominável: pessoas altamente colocadas nas instituições judiciárias, como o procurador-geral da República, queriam fazer passar determinadas informações com intuitos manipulatórios. Para tal, serviam-se de assessores de Imprensa e de jornalistas, como instrumentos veiculadores dessas maldosas intenções. E vão ao ponto (esses comentadores) de passar um atestado de inimputabilidade a tais jornalistas, considerando-os uns papalvos (ou uns anjinhos) ao serviço de desígnios que os ultrapassavam. Bonita concepção de jornalismo, ao mesmo tempo tocada de angelismo e de ingenuidade. Em terceiro lugar, é de registar o conceito elástico de violação de segredo de Justiça, umas vezes esticado e outras encurtado até ao limite. Pelos vistos, toda a informação que vem dos meios judiciais (em sentido amplo) é violação do segredo de Justiça, independentemente de se saber se a informação teve origem num rumor, num boato, numa conversa ouvida à mesa do café, entre colegas, ou escutada num corredor, ou se proveio de fonte caracterizadamente processual.
2 comentários:
Da mesma forma que na semana passada atirei pedras retóricas ao cronista, desta vez aplaudo. Assim, sim!
Coerentemente, como da outra vez, mantenho o anonimato esforçado. Mas, desta vez, com agrado.
Déjà vue. Podia fazer muito melhor.
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