Derivações

Eu não sou o típico advogado de crime, não entro no cambão, sou demasiado ríspido com os clientes do crime, não sou advogado do sindicato dos guardas prisionais, não sou peixe como água nas cadeias, tenho uma história jornalística complicada que me torna um mal-amado no sistema, mas adoro fazer advocacia do crime. Não sei porquê. Talvez seja porque entendo que o direito penal é a essência do direito. E é a essência da advocacia. E é aquilo que mais me motiva.
Tudo coisas demasiado complicadas para responder à pergunta típica e habitual de quem está por fora, Afinal, o que o leva a defender criminosos?
Com a idade, fui começando a encontrar uma justificação. Comecei a perceber que a linha entre o bem e o mal é muito ténue, é uma linha que a qualquer momento pode ser ultrapassada, até pela mais avisada das pessoas, pelas pessoas mais bem formadas, por pessoas com um insuspeito historial de adequação às regras do direito, da moral e dos bons costumes. Posso dizer um pouco mais: há pessoas boas tão acicatadas, tão torpedeadas, tão reiteradamente provocadas por gente tão má, que o facto de continuarem do lado do bem tem o seu quê de santidade.
Complicado? Acredito que sim. Mas também não é para perceber... É apenas mais um postal intimista. Meu. Hoje não há anónimos à mistura.