09 outubro 2004

Breviário de ideias avulsas sobre Formação de Magistrados

.../cont.

Cap. II – Escritos reeditados.

Desta vez, Mangadalpaca© preferiu compendiar alguns escritos, menos ou mais recentes, sobre o tema da Formação de Magistrados. Mais esclarecedor do que se supunha. Ora leiam os seguintes contributos, mais ou menos esquecidos:
«...– o referido Centro de Estudos Judiciários; aspiração de hoje, realidade de amanhã, estou certo, tendo na devida conta a inevitável modernização científica e institucional da carreira judicial e tendo sempre presente o crescente estreitamento e entrelaçamento interdisciplinar das chamadas Ciências Humanas: o Direito, a Antropologia, a Psicologia, a Sociologia, a Demografia, etc.».

«Bastarão para o magistrado se adaptar, psicológica e tecnicamente, às diversas categorias de tribunais e de instâncias, e para acompanhar, com proveito e eficácia profissionais, o fluxo incessante das inovações e reformas legislativas que a evolução do novo sistema jurídico determina – evolução esta ditada, por sua vez, por uma sociedade em franco crescimento – a capacidade de estudo, o lastro de conhecimentos acumulado ao longo dos anos, o treino profissional, o adestramento psicomental à função...?
Chegará para o apontado efeito a leitura ruminativa, mas passiva; atenta, mas sedentária; comparativa e apoiada numa urdidura de anotações e comentários, próprios e alheios, mas contingencial e assistemática, dos códigos e mais textos legais?»

Flávio Pinto Ferreira, Juiz Conselheiro (jubilado), in «Uma abordagem sociológica da magistratura judicial», ROA – CD do Porto da OA, 1972.

«Um bom magistrado não é, normalmente, o que melhor conhece as leis e sobre elas constrói raciocínios lógicos precisos. Por aqui se compreenderá que, nalguns países, o acesso à magistratura profissionalizada não deva ser restrito apenas aos licenciados em direito, e se explique que, nas provas de selecção, a valoração de conhecimentos sociais, políticos, económicos e culturais possa sobrelevar a dos conhecimentos jurídicos».

[Na formação dos magistrados tem de se pensar] «em três aspectos: na erudição jurídica, na cultura geral, no fortalecimento das qualidades morais e psíquicas»

Irineu Cabral Barreto, orientador do Grupo Orientador de Estágio para Delegados de Procurador da República, in O recrutamento e a Formação de Magistrados do Ministério Público.

«Mais importante que apetrechar os novos magistrados com grande soma de conhecimentos, é dar-lhes uma perspectiva dinâmica do Direito, dar-lhes pistas para a leitura que eles irão fazer das leis do país. Temos como certo que um magistrado para bem interpretar e aplicar o direito não pode prescindir de sólidos conhecimentos económicos, sociológicos, ideológicos, de história do direito, de política legislativa, entre outros. Mais do que nunca, em suma, um jurista necessita de actualizada cultura geral».

Ilídio do Nascimento Costa, Juiz de Direito, in Estatuto do Magistrado e Perspectivas Futuras do Direito.

«O esforço observado na generalidade dos países no sentido de garantir a profissionalização dos quadros...tem de ser correspondido por um empenhamento social que não se circunscreva a aspectos técnicos, mas que esteja fundamentalmente orientado para o enriquecimento da personalidade, com acento tónico no aperfeiçoamento da cultura e do carácter».

Cunha Rodrigues, então ajudante do Procurador-Geral da República (actual Juiz no TJC), «O Magistrado Hoje: exegeta ou arquitecto social? Crise e indefinição da identidade das magistraturas nas sociedades modernas», BMJ, n.º 272 – 1978.

«O novo perfil do magistrado deve ter, em meu entender, as seguintes características: em primeiro lugar, é fundamental que se substitua a cultura normativista, técnico-burocrática por uma cultura judicial democrática: uma cultura que tem a justiça como estratégia e que permite, com base nisso, tratar os processos e a actividade judicial estrategicamente. E a estratégia é que a justiça está ao serviço da coesão social e do aprofundamento democrático. São os dois objectivos, os dois pilares que devem comandar o dia-a-dia desta nova cultura, que existe numa sociedade não separada dela. Esta sociedade é atravessada por desigualdades e tem como modelo constitucional a coesão social, o que significa respeito efectivo pelos direitos humanos. Mas é, ao mesmo tempo, uma sociedade onde o aprofundamento da democracia, pela via da garantia dos direitos e da transparência, tem que ter lugar.
«...a cultura geral tem sido desclassificada pelo CEJ, não entrando efectivamente no currículo, ou porque os formadores não tinham cultura geral, ou porque não queriam uma rival às suas culturas técnicas ou burocráticas. No quadro de um novo CEJ, os magistrados não deverão representar mais do que 50% dos professores».

Boaventura de Sousa Santos, in «Que formação para os magistrados nos dias de hoje?», Ed. do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, 2000.

«Por outro lado, por idênticas razões se torna agora urgente intervir em matéria de formação de magistrados e de advogados. Mas fazendo-o correctivamente, na decorrência de uma política previamente definida, inspirada numa clara definição de objectivos a atingir, e não através de alterações pontuais, de necessidade mais intuída do que comprovada e de oportunidade mais desejada do que demonstrada.
Na verdade, constitui esta uma área particularmente sensível na qual a urgência em intervir não poderá dispensar uma preparação cuidada, hábil a alicerçar um modelo de formação estável, capaz de dar resposta a um vasto e complexo conjunto de solicitações. Não importa, por exemplo, propor o aumento das fases de estágio, ou substituir a extensão destas pelas de formação mais teórica se antes não tiver sido desenvolvida uma orientação de política que defina os objectivos a atingir e o tipo de magistrado que se pretende vir a formar. E, desde logo, uma primeira questão haverá de colocar-se, qual seja a de saber se se pretende instalar um sistema de formação reprodutor, privilegiando-se, então, o estágio em jurisdição, ou antes, como parece dever ser, um sistema inovador, importando dar maior relevo à fase de preparação teórica e de reflexão, sem embargo do peso que não pode deixar de atribuir-se à vertente prática da formação em causa».

Laborinho Lúcio, in «Justiça e Política – um simples contributo», Rev. Ministério Público, n.º 90, 2002.

Por mim, poupei um post e fiquei bem mais ilustrado com todos estes contributos. Espero que o mesmo aconteça com os demais leitores.


contributo de Mangadalpaca©

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