20 junho 2005

Justiça, a crise e a confiança

Pelo Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, António Henriques Gaspar, hoje, no Público:

A confiança dos cidadãos nas suas instituições tem de ser ganha, pois, e primeiramente, pela acção quotidiana: as instituições serão muito o que forem os agentes que nelas servem, e que pelo seu rigor, competência, disponibilidade e serviço exprimem e revelam a sua legitimidade.
É assim acrescidamente nas intituições judiciárias.
...
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10 comentários:

josé disse...

No Público, de manhã, tentei atacar este texto, mas desisti logo nos primeiros parágrafos.
Custa muito ler um texto destes. Para explicar que tem havido uma quebra na confianças que os cidadãos devem ter na justiça, não é preciso nem desejável que se escreva assim.
Para dizer que a opinião pública tem perdido a confiança nos agentes da justiça por causa da falhas de comunicação não é preciso escrever "A tarefa complexa para repor os níveis de confiança há-de contemplar, igualmente, formas de comunicação que permitam a lisibilidade e a compreensão de actos e decisões."
Para dizer que as pessoas na sua generalidade não entendem o funcionamento do sistema de justiça e estão mal informadas sobre o mesmo, não é preciso rebuscar e escrever "A crise, ou com maior rigor analítico que descole de pré-compreensões acríticas, o discurso da crise - recorrente, impressionista e nascido de fragmentos ocasionais - produz uma devastadora afectação da confiança"

No fundo, este texto é revelador da dificuldade de os profissionais do foro fazerem passar uma mensagem simples e directa. Preferem, como no caso concreto, o gongorismo que centuplica as palavras necessárias a um texto simples e escorreito e assim as ideias nem se chegam a
transmitir devidamente, por defeito de forma.

Que me desculpe o autor esta frontalidade atrevida, mas é o que penso, sem querer ofender. E devia dizê-lo pois também é um dever de cidadania escrever para quem sabe ler pouco e mal.

Primo de Amarante disse...

Não é só através da publicação de textos explicativos que se repõe niveis de confiança na justiça. Hoje, estive no Tribunal do Marco. O presidente da Cãmara, ferreira Torres, era assistente num processo: referiu-se a um arguido pela sua alcunha, recusou-se a responder a um advogado, disse que o arguido não podia com duas latadas e, quando lhe lembraram que já havia sido condenado por insultos, respondeu que não foi condenado a indemnizar, mas deu uma esmola. Foi admoestado, mas pouco alterou o seu estilo. Pergunto: o que aconteceria se este procedimento fosse desenvolvido por um outro indivíduo que não fosse o Presidente da Câmara?!...E este tipo de "tolerãncia" para com os poderosos não fará crescer a quebra de confiança dos cidadãos na Justiça?!...

Primo de Amarante disse...

Senti a verdade do que magnolia diz de forma arrepiante. Não tenho experiência de andar pelos tribunas e nunca pensei poder assistir ao que assisti. Tanto mais que um dia antes tinha (na Amarante)tomado posição contrária a um conhecido advogado de Coimbra (que escreve no Expresso e é de Amarante) que defendia haver na justiça dois critérios: um muito condescendente para com os poderosos e outro muito severo para com os pobres.

Primo de Amarante disse...

Se for tomado como lema o que diz magnolia «Os níveis de confiança na Justiça têm que essencialmente se ir buscar ao dia-a-dia dos tribunais através das decisões que proferem», não tenham dúvida que terão todo o apoio da opinião pública para todas as reformas que exigirem. Há na história vários exemplos que confirmam isso. Os psicólogos dizem, como sabem, que esses niveis de confiança foram acreditados por "validadores afectivos" da sociedade. Faltando isso, é pregar no deserto.

josé disse...

A confiança na Justiça que temos, parece-me também que depende mais do exercício diário da função judicial do que de outros factores mais subtis.

A tal "lisibilidade" ( neologismo de origem desconhecida...)e "compreensão de actos e decisões", contende essencialmente com a noção de justo, no seu sentido mais nobre: conceder a alguém aquilo que lhe pertence.
Não há compreensão alguma quando as decisões se enredam em paráfrases e peredendo o sentido da realidade das coisas, deixam essa noção a perder de vista.

A independência constitui um sine qua non; mas a honestidade, o saber e a dedicação, complementam o bouquet.

O resto, tudo aquilo que causa ruído e prejudica o ofício, deve ser denunciado clara e directamente, sem peias nem rodeios.
Provavelmente, a confiança dos cidadãos, perde-se mais depressa em decisões contraditórias e que a opinião pública ( vox populi...)reconhece como materialmente injustas do que com as
dificuldades no exercício do munus, derivadas das leis confusas, dos regulamentos caducos e da sub-orçamentação continuada.

Kamikaze (L.P.) disse...

Vcs. terão razão, meus caros . Mas parece-me de elementar justiça referir aqui que o artigo em causa aborda, de forma muito estruturada e séria, questões absolutamente essenciais para centrar o debate e o gizar de medidadas para debelar a "crise da justiça" num caminho que não termine em beco. Um texto que devia ser de leitura obrigatóriaa para todos os operadores judiciários,logo para começar (e mau sinal será se não compeenderem o seu alcance).
Penso eu de que.

O meu olhar disse...

Eu que não sou do meio, gostei do texto. Pareceu-me claro e com uma abordagem a questões essenciais que não se restringem, obviamente, ao sector da justiça. Parece-me a mim que o importante não é discutir formas mas sim conteúdos, apesar daquela ser muito importante quando se quer passar mensagens a determinados públicos. Todos os actores do sistema de justiça se deveriam preocupar com a imagem pública deste. Eu sou responsável pela gestão de uma pequena empresa, e posso garantir que se os nossos clientes tivessem 10% dessa imagem relativamente ao nosso trabalho, esta empresa já não existiria. È fundamental ler com atenção e respeito a avaliação que fazem do nosso trabalho os seus destinatários. Aprender com isso e modificar tudo o que estiver ao nosso alcance, no quotidiano, é fazer a diferença. Se cada um fizer a sua parte, este país avança.

josé disse...

Já ressalvei que a intenção não foi a de ofender quem quer que seja, com a crítica ao texto.

Porém, malhando o ferro frio, apetece-me dizer que a escrita para o público em geral, sobre assuntos de justiça, precisa de maior clareza e melhor mediatização.

A escolha de termos rebuscados, em estilo barroco, nada ajuda para quem quiser ler e perceber e nalguns casos torna-se prejudicial porque acrescenta incompreensão, pelo hermetismo que afasta a leitura.

A propósito disto, aqui há uns bons dois anos, uma cronista, bióloga, emigrada, escritora nas horas vagas chamada Clara Pinto Correia publicou um livro.
O prefácio vinha assinado por...Carlos Amaral Dias, o inefável psiquiatra da pantalha.
Escrevia assim:

"Este livro de Clara Pinto Correia retrata, possivelmente, a condenação crítica a que o cosmopolitismo contemporâneo se (obrigatoriamente) auto-propõe. (...) Torna-se assim tão insuportável o politicamente correcto de algum discurso norte-americano, como a forma pela qual abandalhamos o nosso património arquitectónico-ambiental. Tornam-se também assim tão intoleráveis ao quotidiano os brinquedos que impingem aos nossos filhos nos EUA, os filmes cognitivamente toscos que lhes normatizam o imaginário, como os besuntos de cimento armado que se fazem, lá onde se catrapiscou uma lontra sob a luz indízivel da juventude."

E ainda assim:

"(...) a heteronimia emocional e identitária da autora permite-se à polissemia da escrita onde perpassa, por isso, a mulher, a universitária, a cidadã, a escritora, a mãe.
Curioso "pot pourri", ainda por cima feito como Atlântico entre dois continentes, ou seja, entre a América e a ponta ocidental da Europa. Por isso mesmo, atravessado por um português de uma portuguesa, algumas vezes emigrada, outras emigrada no seu próprio país, outras vezes ainda transmigrando a sua subjectividade sobre pequenos/grandes acontecimentos que vão de Entre-os-Rios a entre as falas e as suas disjunções."

Há quem goste?!

Talvez.

josé disse...

E, tal como cereja no topo do bolo:

"Sabe-se, ainda, que os que usam a personalidade como máscara e a máscara como atributo da personalidade se auto-condenam à observância pública da perscrutação mais ou menos paranóide do sujeito mascarado. Mas essa é também a condição de um tempo, bem como o tempo e o modo nacionais.
Em todo o caso, o leitor que esteja disposto ora a rir-se, ora a indignar-se, ora ainda a pensar as questões que Clara Pinto Correia põe neste livro, não se arrependerá."

Por mim, e com um prefácio destes, nunca tentei sequer o arrependimento...

O meu olhar disse...
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